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Confissão em matéria tributária.

Seu verdadeiro significado

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28/01/2010 às 00:00
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1. Confissão como categoria de prova – Direito Processual

Moacyr Amaral SANTOS asseverou que "o principal fundamento da confissão é de ordem psicológica, consistente na regra moral que obriga a dizer a verdade" [01].

Elencando a confissão como um dos meios de prova, diz Fabiana Del Padre TOMÉ: "As provas são sempre indiretas (pois jamais alcançam o fato que se pretende provar), pessoais (por decorrerem de produção humana) e documentais (exteriorizam-se em suporte físico permanente)" [02]. Assim, o fato em si não é levado para o processo. O que se junta aos autos é a representação do fato.

Confissão é o reconhecimento da verdade. Tratando dos meios de prova, em Seção que leva o título DA CONFISSÃO, dispõe o CPC, no art. 348: "Há confissão quando a parte admite a verdade de um fato, contrário ao seu interesse e favorável ao adversário. A confissão é judicial ou extrajudicial".

Da redação do CPC se dessume, imediatamente, o objeto da confissão: o fato.

O fato simples ou o fato jurídico?

Como já dito linhas atrás, o fato somente se torna jurídico quando o Direito lhe atribui conseqüência. Dessa forma, a lei (do latim ligare) passa a ser o elo entre o antecedente (fato) e o conseqüente (conseqüência jurídica). É só assim que a lei consegue transformar fato simples em fato jurídico – fazendo nascer a relação jurídica. Noutras palavras: o fato somente é jurídico porque o Direito lhe atribui conseqüência.

Deflui dessa premissa que a confissão somente pode ter como objeto o fato simples, pois a conseqüência jurídica está fora de seu alcance. É como discorre Américo Masset LACOMBE:

A confissão só pode se referir a fatos concretos, antes de se tornarem fatos jurídicos. O contribuinte só confessa o fato. (...) a confissão só pertine ao fato enquanto fato puro, sem qualquer preocupação com a significação jurídica do fato. Ou seja: o contribuinte só pode confessar fato concreto. Ele não confessa as conseqüências interpretativas da lei. Não existe confissão de hermenêutica. Existe confissão de fato.

Daí a possibilidade de revogação da confissão (como previsto, aliás, no art. 352 do CPC [03]). E prossegue LACOMBE:

E se ele verificar que o fato realmente não ocorreu, ele pode, por óbvio, revogar essa confissão e dizer: "o fato não ocorreu; eu estava errado". (...) destarte, a confissão nunca interfere na significação jurídica do fato, ela não faz nascer nenhuma obrigação tributária. A obrigação tributária decorre da lei – que previu, em hipótese, a ocorrência de determinado fato no qual a norma jurídica incide e faz nascer a obrigação tributária.

Com efeito, nenhuma eficácia terá a confissão em torno de fatos que, efetivamente, não ocorreram. Do contrário, poderei confessar qualquer evento: que desatei o nó górdio; que domei Bucéfalo; que construí os jardins suspensos da Babilônia; que ateei fogo a Roma; que dei a volta ao redor da lua ou que viajei ao centro da Terra.

Entre as hipóteses de revogação previstas no CPC, a que mais interessa é o erro, campo no qual é cabível a lição de TEIXEIRA FILHO:

Já estava no Direito antigo o reconhecimento de que a pessoa induzida em erro era destituída de vontade ("cum erratis nulla voluntas sit’). Não é qualquer erro que autorizará o desfazimento da confissão, mas somente o erro substancial, assim considerado o que interessa à natureza do ato, o objeto principal da declaração, ou alguma das qualidades a ele essenciais (Código Civil, art. 87) [04].

Não há como negar, no âmbito do Direito Tributário, que o erro que diga respeito à ocorrência do fato gerador ou ao montante da base de cálculo seja essencial.

Esclarece LACOMBE, por fim, os efeitos da confissão (que o contribuinte pretende revogar) no âmbito da relação jurídica tributária: "Dirão os senhores: então a confissão é inútil para a Fazenda Pública? Não. Não é inútil. A confissão somente inverte o ônus da prova: se, antes, da confissão, o Fisco deveria provar a ocorrência do fato imponível, após a confissão passa esse ônus para o contribuinte – ele é que passa a ter que provar que o fato não ocorreu e que sua confissão, portanto, não foi válida. A confissão pode, pois, ser revogada se houver erro de fato". [05].

Exemplos ilustrativos da irrelevância da confissão em derredor de categorias jurídicas ou conceitos do Direito são dados por Eduardo MANEIRA:

Quando o fato confessado, por exemplo, tiver por conseqüência jurídica o nascimento de uma obrigação tributária, ou, por outras palavras, quando o fato confessado corresponder a uma hipótese de incidência tributária, a confissão é relevante; nos demais casos, é irrelevante para o Direito Tributário. Por exemplo: se o contribuinte confessa que obteve ganhos de capital com a venda de um bem imóvel, tal confissão é relevante; se o contribuinte confessa que vendeu produtos sem nota fiscal, tal confissão produz conseqüências tributárias e penais; no entanto, se confessa ter obtido renda com algo que recebeu a título de indenização, tal confissão é ineficaz, uma vez que confissão não tem o condão de transformar indenização em renda. Da mesma forma, será ineficaz se o contribuinte confessar que receita financeira se enquadra no conceito jurídico do faturamento – que é o caso da Lei 9.718" [06].

O mesmo raciocínio é válido em quaisquer outras disciplinas jurídicas. Figure-se o exemplo em que, no Direito do Trabalho, autor e réu discutem judicialmente a existência de relação de emprego (negada veementemente pela contestação). Tendo em vista que relação de emprego é categoria jurídica, caberá ao Juiz reconhecer (ou não) sua existência, dirimindo a controvérsia. Será irrelevante que o demandado (em depoimento pessoal – e contrariando os termos da defesa) a "confesse". Nesse campo, a confissão somente terá valor se tiver por objeto os fatos que farão emergir o elo empregatício: onerosidade, pessoalidade, não eventualidade e subordinação – arts. 2º e 3º da CLT.

Também no Direito Civil, v.g., será irrelevante "confessar" a propriedade (categoria jurídica) de bem imóvel, se o fato que lhe dá ensejo (registro imobiliário) não ocorreu – art. 1.245 do Código Civil. Outrossim, será inútil "confessar" a ocorrência de novação (cabendo lembrar a controvérsia existente nos tribunais: a adesão a parcelamentos especiais configura novação?).

Cumpre notar, por relevante, que não é cabível a confissão onde não houver possibilidade de renúncia. É o que dispõe o art. 351/CPC: "Não vale como confissão a admissão, em juízo, de fatos relativos a direitos indisponíveis". Ensina Moacyr Amaral SANTOS: "Quem confessa pratica atos a serem emparelhados a atos de verdadeira disposição" [07].

Interessante exemplo, no campo do Direito do Trabalho, é dado por Manoel Antônio TEIXEIRA FILHO:

(...) estará destituída de validade a confissão – ainda que feita judicialmente – do empregado, no sentido de que concordou em receber menos que o salário mínimo, conquanto cumprisse jornada de trabalho normal e não fosse aprendiz; considerando-se que as disposições legais concernentes ao salário mínimo são de ordem pública, a confissão que implicar renúncia a esse direito de índole constitucional (CF, art. 165, I) é absolutamente ineficaz [08].

No Direito Civil, v.g., exemplos precisos foram dados por Caio Mário da Silva PEREIRA: "Não obstante reputar-se probatio probantissima, há fatos que a lei não admite se provem por confissão. Assim, nas ações de divórcio e anulação de casamento, como nas de nulidade de testamento, não pode o juiz proferir sentença baseada em confissão real ou ficta do fato alegado, porque há aí interesse público em jogo, insuscetível de transação privada. Nestes casos o juiz não pode decidir com base na confissão, real ou ficta, sendo mister a produção da prova cabível [09]".

Na medida em que a obrigação tributária decorre da lei, e tendo em vista que o princípio da legalidade é matéria de ordem pública, segue-se que não é admissível qualquer idéia de "renúncia ao princípio da legalidade".

Interessantes digressões teóricas têm sido feitas acerca do chamado "elemento intencional" da confissão:

Vem afirmando a doutrina, de maneira praticamente uniforme, que a confissão pressupõe a vontade de o confitente reconhecer como verdadeiros os fatos narrados pelo adversário, de tal modo que nesse ato volitivo se assenta o animus confitendi. Acreditamos, todavia, que essa afirmação não pode ser feita em caráter genérico, porque se é verdade que o elemento intencional preside a confissão espontânea, não menos certo é que ele está ausente na confissão provocada e na fictícia. Não atinamos como se possa sustentar, com êxito, que o animus confitendi ocorra nestas duas últimas modalidades, quando se sabe que, na provocada, a confissão é extraída e, na fictícia, decorre de uma presunção; significa dizer que a intenção do confitente inexiste, nada obstante os efeitos processuais sejam os mesmos da confissão espontânea [10].

Sendo assim, tem-se que a confissão espontânea é necessariamente expressa, não podendo ser inferida por meio de procedimentos presuntivos ou operações lógicas e interpretativas. Não se admite, desse modo, "confissão espontânea implícita" (expressão que traz em si o vício da contradictio in terminis). A respeito da confissão espontânea, são pertinentes as seguintes observações de SANTOS: "A confissão é uma declaração. Quer isso dizer, antes de tudo, que é uma manifestação expressa, feita com palavras, pelo pensamento. Não pode ser nunca uma operação, ou seja, não pode inferir-se a confissão de um comportamento da parte" [11].


2. Confissão no Direito Penal

Dispõe o Código de Processo Penal:

CAPÍTULO IV

DA CONFISSÃO

Art. 197.

  O valor da confissão se aferirá pelos critérios adotados para os outros elementos de prova, e para a sua apreciação o juiz deverá confrontá-la com as demais provas do processo, verificando se entre ela e estas existe compatibilidade ou concordância.

Art. 198.  O silêncio do acusado não importará confissão, mas poderá constituir elemento para a formação do convencimento do juiz.

Art. 199.  A confissão, quando feita fora do interrogatório, será tomada por termo nos autos, observado o disposto no art. 195.

Art. 200.  A confissão será divisível e retratável, sem prejuízo do livre convencimento do juiz, fundado no exame das provas em conjunto.

Como se vê, em matéria penal, a confissão é meio de prova que, longe de ostentar valor absoluto, deve ser visto com reservas. Pode-se dizer o mesmo com relação ao Direito Tributário. Estes são ramos da Ciência Jurídica regidos pelo princípio da especificidade conceitual. Se o fato (fato típico no Direito Penal ou fato imponível no Direito Tributário) ocorrer no mundo concreto e corresponder rigorosamente à descrição hipotética (tipo penal ou hipótese de incidência tributária), incidirá a conseqüência da norma jurídica (sanção penal ou obrigação tributária). Nesses dois ramos jurídicos (penal e tributário) somente por meio desse caminho lógico (consonância absoluta entre fato efetivamente ocorrido e fato abstratamente previsto no antecedente da norma) é que se chega à conseqüência jurídica.

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Daí decorre que não é possível chegar-se, per saltum, ao conseqüente da norma jurídica tributária, por outros caminhos tais como: a analogia (expressamente vedada pelo art. 108, § 1º, do Código Tributário), o ato de vontade, o contrato (encontro de vontades), a declaração ou a confissão. Se isso é possível em outros ramos do Direito, não o será naqueles regidos pelo princípio da especificidade conceitual.

Como corolário, vigora em tais ramos do Direito também o princípio da verdade real (verdade esta que nem sempre é retratada fielmente pela confissão). Daí que a mesma lógica (em derredor do instituto da confissão em matéria penal) deve vigorar, igualmente, para o Direito Tributário.

Ensina Fernando da Costa TOURINHO FILHO: "A função punitiva do Estado, preleciona Fenech, só pode fazer-se valer em frente àquele que, realmente, tenha cometido uma infração; portanto o Processo Penal deve tender à averiguação e descobrimento da verdade real, da verdade material, como fundamento da sentença" [12].

E José Frederico MARQUES foi claro ao sustentar que está superada a idéia de que à confissão se deva atribuir valor probante absoluto:

Atualmente, porém, não mais se atribui "primária importância à confissão, como meio de prova, nem é de se promovê-la sempre que possível". Sem embargo disso, quando feita livremente, pode constituir elemento de prova de real valia.

Outrora, considerava-se a confissão "la reine des preuves" ou "probatio probatissima". No procedimento inquisitivo das monarquias absolutistas do continente europeu, nela se assentava toda a investigação probatória. Os juízes sentiam-se com a consciência apaziguada, e com sua tarefa pronta e perfeita, quando podiam proclamar o "habemus confitenten reum".

A confissão do acusado chegou a equipar-se, por isso, à própria coisa julgada: "confessio habet vim rei judicate" [13].


3. Confissão no Direito Processual Tributário Administrativo

Em processo administrativo tributário, o estudo do instituto da confissão ocorreria em duas vertentes:

a)confissão pelo agente público;

b)confissão pelo contribuinte.

A propósito da possibilidade (ou não) de confissão das autoridades administrativas, Paulo Celso Bergstrom BONILHA (fazendo referência a Mario PUGLIESE e Giuliani FONROUGE) comenta: "O crédito tributário é indisponível e, por isso mesmo, não está nas atribuições dos funcionários, salvo a hipótese de expressa disposição legal, competência ou poder de renúncia ou de reconhecimento, por via de confissão, dos fatos alegados pelo impugnante" [14].

Já no que tange à confissão do contribuinte, diz BONILHA:

Esta situação sói acontecer no processo administrativo tributário quando, no seu decurso, o impugnante venha a reconhecer, expressamente, a procedência dos fatos alegados pela Fazenda. Este elemento probatório, todavia, deve ser sopesado no conjunto das provas do processo e seu efeito cuidadosamente avaliado no momento da apreciação e do convencimento da autoridade julgadora. Isto porque a confissão deixou de ser considerada a "rainha das provas", concepção superada e que não mais se coaduna com o avanço da ciência processual [15].

Tem sido exigido, especialmente para fins de adesão a programas de parcelamento, o chamado instrumento particular de "confissão irrevogável e irretratável de débitos tributários". Outrossim, diz-se que a declaração de compensação implicaria confissão de dívida e instrumento hábil a dar início à execução [16]. Qual a verdadeira natureza jurídica de tais instrumentos? Teriam eles o condão de impedir qualquer discussão futura? Haveria, nesse campo, flexibilização do princípio da legalidade?

A jurisprudência tem se pronunciado intensamente nessa matéria. Enquanto alguns acórdãos reconhecem a existência da confissão, negando-lhe, porém, o condão de vedar rediscussão futura, outros, por seu turno, nem sequer admitem a possibilidade da confissão em processo tributário [17].

Na doutrina, Fabiana Del Padre TOMÉ admite a figura da confissão por declaração do contribuinte. Deixa claro, porém, que ela não afasta a possibilidade de discussão futura [18]. Sendo assim, verdadeiramente inconcebível não é, no Direito Tributário, a confissão em si, mas os pretensos atributos da irrevogabilidade e irretratabilidade. Isso porque a revogabilidade é traço inerente à confissão. O raciocínio é claro: se confissão é declaração de vontade, e se essa vontade é viciada, a confissão não tem objeto. E declaração sem objeto é o mesmo que declaração inexistente. Essa assertiva ainda mais se avulta em Direito Tributário: se a obrigação tributária decorre da concretização, no mundo fenomênico, daquele fato abstratamente previsto na norma jurídica (hipótese de incidência), a confissão somente tem validade na medida em que efetivamente corresponder ao fato. Em não havendo essa correlação, a declaração viciada de vontade em nada interessa ao Direito Tributário.

Nessa ordem de idéias, a rigor, nem sequer seria necessária a revogação. O próprio Estado, percebendo a falta de correspondência entre o fato efetivamente ocorrido e a declaração, deveria invalidar a confissão – pois sua atuação não é pautada pelo princípio da moralidade (art. 37 da Constituição da República)? Caso contrário, comportar-se-ia o Estado como aquele freqüentador de bar que, percebendo erro na conta, e imbuído de má-fé, deixa de alertar o garçom – já que o equívoco fora-lhe favorável. Ora, não é do Estado que esperamos exemplos de conduta?


4. Revogabilidade da confissão

Ensinou Moacyr Amaral SANTOS, como regra geral, que a confissão, em princípio, é irretratável. E, citando FRAGA, disse: "A unanimidade dos sufrágios em torno de tal princípio justifica-se pela consideração de não ser conforme a razão, nem lícito ao confitente destruir, com o seu próprio fato, a prova que ele mesmo, impelido pelos brados da consciência, constituiu em favor do seu adversário".

E acrescentou: "Além do mais, a confissão, uma vez feita, passa a constituir uma prova pertencente por direito à parte a quem beneficia, ou pelo menos a ser, segundo MANCINI, um elemento adquirido pela causa; portanto é justo que a sua irrevogabilidade seja erigida em regra geral de direito, tanto mais como ato unilateral livre e consciente tem ligado intimamente a si a presunção e a força da verdade" [19].

No entanto, o art. 352 do CPC contempla a revogabilidade da confissão, em casos de erro, dolo ou coação [20]. São essas as exceções justificáveis. O raciocínio é claro: a confissão é, em princípio, irrevogável, desde que emane da vontade pura do declarante – livre de tais vícios. Confissão não é instituto que se coadune com vontade maculada. Ao revés, quando procuramos seu sentido filosófico (como em SANTO AGOSTINHO – Confissões [21]), sempre o encontramos associado ao animus do homem de se ver livre do peso que lhe atormenta a alma. Por conseguinte, nenhum valor terá a confissão se o declarante não teve, efetivamente, a intenção sincera de dizer o que foi dito.

Nesse mesmo sentido argumentou SANTOS: "A vontade de declarar a verdade, quando gerada no erro, dolo ou coação, não é capaz de produzir efeitos jurídicos quais os produz a confissão. Assim, em contrapartida àquele princípio, este outro, acolhido pelo Código e na consonância da melhor doutrina, de que a confissão pode ser revogada, quando decorrente de erro, dolo ou coação" [22].

Entre as hipóteses do art. 352 do CPC, o erro é a que mais de perto interessa ao Direito Tributário. Não está afastada a possibilidade de ocorrência do dolo ou coação. Porém, o erro, indubitavelmente, é o vício mais comum. SANTOS se reporta ao conceito de CUNHA GONÇALVES, para dizer que o erro consiste "no juízo incorreto acerca de uma cousa, de um fato, de uma pessoa, derivado da ignorância ou do imperfeito conhecimento da realidade das circunstâncias concretas ou dos princípios jurídicos aplicáveis".

Esclarece, em seguida que, na hipótese de erro, a confissão não tem objeto [23]. Demonstra que, havendo erro, a confissão não tem o condão de tornar verdadeiro o fato que, em verdade, não ocorreu [24]. Transplantando a lição para o Direito Tributário, tem-se que não se pode conceber o fato imponível decorrendo tão-somente da declaração do sujeito passivo se, no mundo concreto, tal fato não ocorreu. Tributa-se o fato efetivamente ocorrido (e não o fato erroneamente declarado pelo contribuinte).

Finalmente, SANTOS confirmou a orientação, já anunciada por Américo Masset LACOMBE (item 6.1 – linhas atrás) de que aquele que pleiteia a revogação da confissão tem o ônus de comprovar o erro sobre o qual se funda o pedido [25]. O contribuinte terá o onus probandi no seu duplo aspecto: deverá comprovar a inocorrência do fato imponível, bem como o equivocado juízo que sobre ele formou.

Fabiana Del Padre TOMÉ está em consonância com essa orientação: "o traço da revogabilidade também está presente na confissão tributária, sendo esta susceptível de anulação nas hipóteses de o ato de confessar ter se operado em decorrência de erro, dolo e coação". E faz importante ressalva, demonstrando que tanto o erro de direito como o erro de fato ensejam a revogabilidade [26].

A propósito, o art. 214 do vigente Código Civil dispõe: "A confissão é irrevogável, mas pode ser anulada se decorreu de erro de fato ou de coação". Teria esse preceito, mais recente que o art. 352/CPC, operado restrição no que tange às hipóteses de revogabilidade? A doutrina do Direito Civil sustenta que não:

Uma vez pronunciada a declaração de vontade que a exprime, adquire eficácia plena. Não pode o confitente desfazê-la ou recusar-lhe efeito mediante emissão de vontade contrária. Mas como declaração de vontade que é, pode padecer de defeitos que a maculem. O Código menciona apenas o erro de fato e a coação (art. 214). Apurada a existência de outro vício que possa inquiná-la, é por tal fundamento atacável" [27].

A lição é útil, pois mostra que, nem mesmo no Direito Civil (campo no qual impera a autonomia da vontade) a confissão é irretratável.

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Sobre o autor
Paulo Adyr Dias do Amaral

Doutor em Direito Público - UFMG. Mestre em Direito Tributário - UFMG. Diretor da Associação Brasileira de Direito Tributário - ABRADT. Membro do Grupo de Estudos da Associação Brasileira de Direito Financeiro - ABDF/Minas. Membro da Associação Latino-Americana de Direito Comparado. Professor nos Cursos de Pós-graduação em Direito Tributário da PUC/Minas, das Faculdades Milton Campos, do Centro de Estudos na Área Jurídica Federal - CEAJUFE, do Centro de Atualização em Direito - CAD (em convênio com a Universidade Gama Filho).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AMARAL, Paulo Adyr Dias. Confissão em matéria tributária.: Seu verdadeiro significado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2402, 28 jan. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14227. Acesso em: 28 mar. 2024.

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