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Aplicação processual da imunidade tributária dos templos e cultos religiosos

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27/11/2012 às 16:45
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Diante do princípio fundamental à liberdade religiosa, criado como garantia constitucional, o instituto da imunidade tributária aos templos de qualquer culto demonstra o quão importante para o Estado Democrático de Direito, garantir a liberdade e a igualdade a todos os cidadãos, independentemente dos valores morais e religiosos de cada um.

“Enquanto as leis forem necessárias, os homens não estarão capacitados para a liberdade”. (PITÁGORAS).

Resumo: A imunidade tributária dos templos religiosos sempre foi objeto de discussão na doutrina, uma vez que sua aplicação no direito processual encontra óbice nos limites de sua atuação. Os meios necessários ao regular desenvolvimento do processo tributário encontram-se respaldos na jurisprudência, que segundo a mesma, os rendimentos obtidos nas diferentes atividades comerciais da entidade religiosa, deverão ser revertidos para as finalidades essenciais da instituição. Para isso, com o escopo em demonstrar a aplicação do referido instituto, necessário se faz apontar as ações em espécie e sua aplicabilidade face ao direito constitucional dos templos de qualquer culto. Ademais será através do judiciário que o contribuinte se resguardará das viciosidades apresentadas pelo fisco.

Palavras-chave: Imunidade Tributária. Templos Religiosos. Processo Tributário. Jurisprudência. Finalidade essencial.

Sumário: 1. INTRODUÇÃO. 2. DEFINIÇÕES. 2.1 Da imunidade tributária. 2.2. Do conceito de templos de qualquer culto. 3. DO PROCESSO JUDICIAL TRIBUTÁRIO. 4. Aplicação processual da imunidade tributária dos templos e cultos religiosos nas diferentes especies de ações. 4.1. Da ação anulatória de Lançamento Tributário. 4.2. Da ação declaratória de inexistência de Relação Jurídico-Tributária. 4.3. Da ação de Repetição de Indébito. 4.4. Da ação de Consignação em Pagamento. 5. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.


1 INTRODUÇÃO

A relação entre a igreja e o Estado remonta à antiguidade, em que a figura do representante do governo, se confundia com a do líder religioso, em que pese todas as decisões dependerem de aprovação recíproca. No Brasil, apenas com a Constituição da República Federativa de 1988 (CF), que se tornou concreto a desvinculação da intervenção religiosa nas decisões políticas, portanto, houve um verdadeira e real separação somente com a referida Carta Magna. E assim, com os novos princípios encartados pela atual Constituição, sobreveio com a mesma, a necessidade de se atender o tratamento igualitário entre as diversas entidades religiosas. Tal necessidade tornou-se explicita, conforme entendimento do artigo 19, I da CF, possível visualizar as referidas ideologias apontadas pela Carta Magna:

É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público.

Portanto, tem-se a partir deste momento o nascimento de um País laico, ou seja, aquele que não possui uma religião dita como oficial, e que repele o envolvimento religioso em seus assuntos governamentais. Nestes termos, o laicismo abraçado pela Constituição Federal possibilitou, por conseguinte, germinar a pluralidade de cultos, esta atrelada a liberdade religiosa compreendida através dos incisos VI a VIII do artigo 5ª da CF.

Questão importante a ser demonstrada ainda neste contexto refere-se que, apesar do Brasil ser um país laico, o mesmo ainda caracteriza-se como teísta, ou seja, aquele que acredita na existência de um ou mais de um Deus. Destarte a invocação da proteção de Deus no preâmbulo Constitucional, em que não caracteriza na proibição de interferência dos grupos religiosos nas decisões políticas, o qual não veda a influência dos mesmos nas decisões do Estado. Portanto cabe ao preâmbulo somente traçar ideologias, políticas e filosofias, não contendo no mesmo, normas constitucionais de valor jurídico.


2 DEFINIÇÕES

2.1 Da imunidade tributária

A princípio qualquer menção direta ao tema, não será eficaz ao ponto de se transmitir o conteúdo proposto, sem que se faça a priori uma delimitação conceitual das palavras-chaves que compõem o assunto. Inicia-se então com o conceito de Imunidade Tributária.

A imunidade tributária está prevista na Constituição Federal do Brasil de 1988 (CF), no capítulo Das Limitações do Poder de Tributar, especificamente no artigo 150. Não haveria, entretanto, senão outro lugar para a localização da mesma, pois é justamente neste espaço reservado, que o Estado vem regulamentar de que forma será realizada a tributação pelos entes federativos.

Em outras palavras, conforme melhor define o doutrinador Ricardo Alexandre (2010: 170) “As imunidades são limitações constitucionais ao poder de tributar consistentes na delimitação da competência tributária constitucionalmente conferida aos entes políticos”.

Trata-se de um instituto jurídico, caracterizado pela não incidência da norma, excepcionando-se a regra, que é o pagamento do tributo. Como principal característica cita-se sua origem constitucional, que repercuti substancialmente nas situações fáticas previstas nas hipóteses de incidência, impedindo o não surgimento da obrigação tributária.

Os entes políticos neste enredo estão impedidos de exercer qualquer atividade que implique na cobrança de determinados tributos, estando proibidos da própria atividade legislativa. Caso em que, cita-se o artigo 150, VI, a, da CF, razão pelo qual evidencia o impedimento que os entes tributantes instituam impostos sobre patrimônio, renda ou serviços, uns do outros. A título de exemplo consoante o citado artigo, o Estado de Minas Gerais não pode legislar acerca da cobrança do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) sobre os veículos licenciados em seu território, pertencentes ao Município de Machado-MG.

A imunidade tributária é uma limitação constitucional ao poder de tributar, vez que está contida de forma expressa pela Constituição Federal. Logo, tal observância, significa dizer que a pessoa ou o bem descrito pela Magna Carta não pode sofrer tributação, pois, ressalta-se novamente que, as imunidades, resguardam o equilíbrio federativo, a liberdade política, religiosa, associativa, intelectual, da expressão, da cultura e do desenvolvimento econômico. (CAEIRO, 2010: 9).

Ainda, fundamental se faz apontar principal diferença que comumente acarreta certa confusão conceitual, quando ao ente federativo lhe é atribuído o exercício de parcela da competência tributária. Estamos a falar das Isenções, que nada mais é a dispensa legal do pagamento do tributo. Veja-se que estar-se a falar de dispensa legal, e não constitucional. “A isenção consiste na dispensa legal do pagamento do tributo. Assim, o ente político tem competência para instituir o tributo e, ao fazê-lo, opta por dispensar o pagamento em determinadas situações”. (ALEXANDRE, 2010: 169).

2.2 Do conceito de templo de qualquer culto

O artigo 150, VI, alínea b da CF, assegura a imunidade tributária aos templos de qualquer culto. Possível vislumbrar no traslado abaixo, que a hipótese apenas se aplica a um tipo de tributo, ou seja, aos impostos. Neste caso, não prevalecerá a imunidade tributária em relação às taxas, as contribuições de melhoria, etc, razão pelo qual poderão ser livremente arrecadados.

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

VI – instituir impostos sobre:

b) templos de qualquer culto. (Grifou-se).

Entende-se por templo religioso o espaço físico onde se realizam as cerimônias religiosas. Templo propriamente dito é a edificação dedicada a realização dos cultos, onde contempla as instalações adequadas a sua finalidade religiosa.

Contudo, verifica-se que a interpretação da norma constitucional não se limitou apenas ao sentido stricto da palavra templo, como sendo meramente uma estrutura, mas alcançou o espírito da norma, de forma a visualizar o todo, o conjunto que integra a instituição religiosa.

Deste modo, está caracterizada a chamada imunidade tributária subjetiva, sendo aquela que compreende as pessoas beneficiadas pela ressalva, diferentemente das imunidades objetivas, em que prevalecem imunes os objetos, cuja tributação também é impedida.

Se a imunidade fosse tão somente do templo, estaria impedida apenas a cobrança dos impostos que incidissem sobre a propriedade do imóvel em que está instalado o templo (IPTU ou ITR). Entretanto, nada impediria a cobrança, por exemplo, do imposto de renda sobre as oferendas ou do imposto sobre serviço relativo à celebração de casamentos. . (ALEXANDRE, 2010:183).

Neste contexto, não se tributa apenas os prédios em que os cultos religiosos se realizam, mas sim toda a estrutura envolvida, desde o imóvel utilizado na realização do culto, bem como veículos, imóveis alugados a terceiros, renda auferida, etc. Por fim, a imunidade protege de forma ampla todo o patrimônio, a renda e os serviços vinculados com as atividades essenciais da instituição religiosa.


3 do processo judicial tributário

O processo judicial tributário é empregado na medida em que há desacordo na apuração do tributo, podendo ser impulsionado tanto pelo contribuinte, que se mostre contrariado com o lançamento da prestação fiscal em seu desfavor, bem como pelo Fisco, em ato de cobrança para assegurar o pagamento da exação.

Em sede de procedimento tributário, via administrativa de atuação exclusiva, compete ao fisco apurar a obrigação tributária, bem como a sua exigência, dispensa, consultas, e até mesmo por cominar imposição de penalidades. Havendo discordância com os lançamentos efetuados nesta seara, poderá o contribuinte através das ações de conhecimento, buscar no judiciário a aplicação do seu direito.

Dentre as medidas judiciais cabíveis, destacamos em meio às ações ordinárias, a ação anulatória de lançamento tributário; ação declaratória de inexistência de relação jurídico-tributária; ação de consignação em pagamento; e a ação de repetição de indébito tributário, ambas utilizadas exclusivamente pelo contribuinte quando entende pela divergência do que fora apresentado em processo administrativo fiscal.

A fazenda pública, por sua vez, busca a tutela do judiciário apenas para assegurar o pagamento do tributo, utilizando-se dos processos de execução fiscal ou do processo cautelar, tendo em vista que compete a mesma em processo administrativo, constituir o título executivo unilateralmente em seu favor, sendo desnecessário ajuizar ação de conhecimento para se apurar a legalidade das referidas decisões.

No entanto o presente trabalho apenas versará a respeito das ações, cuja iniciativa será exclusiva do contribuinte, tendo em vista o propósito em estabelecer a aplicação processual, do instituto da imunidade tributária aos templos e cultos religiosos.


4 aplicação processual da imunidade tributária dos templos e cultos religiosos nas diferentes especies de ações

4.1 Da ação anulatória de lançamento tributário

A ação anulatória, então positivada no artigo 38 da lei de execução fiscal (LEF) n. 6.830/80 possui como principal característica precisamente desconstituir, anular o lançamento fiscal que constituiu o crédito tributário, conforme se depreende no traslado abaixo:

Art. 38 - A discussão judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública só é admissível em execução, na forma desta Lei, salvo as hipóteses de mandado de segurança, ação de repetição do indébito ou ação anulatória do ato declarativo da dívida, esta precedida do depósito preparatório do valor do débito, monetariamente corrigido e acrescido dos juros e multa de mora e demais encargos.

Parágrafo Único - A propositura, pelo contribuinte, da ação prevista neste artigo importa em renúncia ao poder de recorrer na esfera administrativa e desistência do recurso acaso interposto. (Grifou-se).

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Neste diapasão, pertinente se faz apontar que com a edição da súmula nº. 247 do antigo Tribunal Federal de Recursos (TFR), dispondo que “não constitui pressuposto da ação anulatória de débito fiscal o depósito de que cuida o art. 38 da Lei n. 6.830/80”, porém a suspensão da exigibilidade do crédito tributário somente será deferida com a realização do mesmo.

Igualmente, tendo em vista o aperto da medida, poderá o contribuinte requerer na ação anulatória, a tutela antecipada a fim de suspender o crédito tributário, e ainda impedir a instauração de execução fiscal, desde que demonstre os requisitos intrínsecos para o deferimento daquela.

Em termos práticos, a ação anulatória será demandada sempre que haja, portanto um lançamento fiscal contrário ao imperativo constitucional de não tributação às entidades religiosas, entrementes estarem acobertadas pelo instituto da imunidade tributária, coadunado ainda com o declinado no §4º. alínea b, VI, do artigo 150 da CF qual seja:

Art. 150, VI, b, § 4º. - As vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c", compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas. (Grifou-se).

Evidente citada situação, quando em recurso de apelação interposto contra decisão em ação anulatória de débito fiscal ajuizada por entidade religiosa, pretender o fisco municipal a reforma, tendo em vista o desempenho de atividades econômicas com fins lucrativos, tais como bazar, cantina e livraria, sem considerar ademais a destinação das receitas auferidas com a finalidade da instituição, postulando consequentemente pela incidência do imposto predial e territorial urbano (IPTU):

Apelação Cível Ação anulatória de débito fiscal IPTU - Sociedade civil e religiosa, sem fins lucrativos, de caráter educacional, beneficente, filantrópica e de assistência social Imunidade incide sobre todos os imóveis da entidade Captação de recursos para a atividade fim pode se dar de diversas formas - Ônus da Municipalidade de comprovar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da entidade, a fim de descaracterizar a imunidade à ela atribuída - Recurso não provido. (TJSP, Recurso de Apelação 9069970-61.2005.8.26.0000, Rel. Des. Arthur Del Guércio, julgado em 11 de ago. 2011).

Nesse sentido ainda, ainda completa a R. decisão no tribunal:

Por restar incontroverso que os imóveis são de propriedade da Apelada e, por ser esta imune em relação à todos os seus imóveis, onde presume-se que, os valores arrecadados por atividades neles exercidas, serão revertidos à concretização do objeto social da entidade, a cobrança dos créditos em questão resta ilegítima. Há de ser considerada indevida a execução fiscal por ela movida para cobrança do imposto. Espécie de acúmulo de recursos não revertidos na consecução das atividades da entidade, o que não restou comprovado pela Municipalidade. (TJSP, Recurso de Apelação 9069970-61.2005.8.26.0000, Rel. Des. Arthur Del Guércio, julgado em 11 de ago. 2011).

Ademais, nas palavras de Ricardo Alexandre (2010:184), explica o doutrinador que cabe a instituição religiosa fazer a prova da destinação da receita:

Ressalte-se, porém, que é do ente imune, e não do fisco, o ônus da prova da relação existente entre o patrimônio, a renda e os serviços e as finalidades essências da entidade. Dessa forma, se a entidade não conseguir comprovar a vinculação, passa a se sujeitar à tributação como os demais contribuintes.

Por fim, ainda verifica-se que o atual entendimento na corte superior aduz que todo patrimônio, renda e serviços estarão amparados pela não incidência constitucional, desde que toda provisão seja revertida ao objeto social da instituição, nos termos do já citado §4º, alínea b, VI, do artigo 150 da CF:

Recurso extraordinário. 2. Imunidade tributária de templos de qualquer culto. Vedação de instituição de impostos sobre o patrimônio, renda e serviços relacionados com as finalidades essenciais das entidades. Artigo 150, VI, "b" e § 4º, da Constituição. 3. Instituição religiosa. IPTU sobre imóveis de sua propriedade que se encontram alugados. 4. A imunidade prevista no art. 150, VI, "b", CF, deve abranger não somente os prédios destinados ao culto, mas, também, o patrimônio, a renda e os serviços "relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas". 5. O § 4º do dispositivo constitucional serve de vetor interpretativo das alíneas "b" e "c" do inciso VI do art. 150 da Constituição Federal. Equiparação entre as hipóteses das alíneas referidas. 6. Recurso extraordinário provido. (STF, Recurso Extraordinário 325822, Rel. Min. Ilmar Galvão, julgado em 17 de dez. 2002).

4.2 Da ação declaratória de inexistência de relação jurídico-tributária

A ação declaratória, mormente utilizada em caráter preventivo, será empregada quando houver premente receio de que o fisco constituirá o crédito tributário em favor da entidade religiosa. Também será adotada cumulativamente com outras ações, quando além da imprescindível declaração para a posteridade, seja necessário, por exemplo, demandar pela desconstituição do procedimento administrativo de lançamento, requerer a repetição de indébito, ou ainda consignar em juízo valor do tributo devido, etc.

O embasamento desta ação está disposto no artigo 4º. I, do Código de Processo Civil:

Art. 4°. O interesse do autor pode limitar-se a declaração:

I – da existência ou da inexistência de relação jurídica; (...)

Nas palavras de Eduardo Sabbag (2009:1096)

A ação declaratória objetiva a obtenção de “certeza jurídica” da existência ou inexistência do fato e das consequências jurídicas a este relacionadas. Assim mostra-se adequada nos caso em que há “divergência de interpretação que produza a incerteza objetiva quanto à vontade concreta da lei”. (RE 90.875-7/SP-1979).

O ajuizamento da ação declaratória de inexistência de relação jurídico-tributária, somente será pertinente, quando verificar-se ato concreto de que a fazenda pública se comportará pela tributação, ou seja, quando estiver em vias de promovê-la. Não basta a simples declaração de mero receio particular, daquele que se sente temeroso para o cabimento desta espécie de ação.

Igualmente, deverá ser constatado que o fisco de modo amplo, por último está adotando o lançamento fiscal, referente ao ponto questionado pelo contribuinte, quando também seja matéria afeta a uma pluralidade, casos semelhantes que convergiram pela exigibilidade do crédito tributário.

Ademais quando necessário, a relação jurídica tributária entre a igreja e o fisco, será apurada desde que demonstrado que os bens, rendas ou serviços estejam vinculados às finalidades essenciais da instituição religiosa, sendo inexigíveis quaisquer valores a título de imposto, razão pelo qual, acobertada estar-se-ia pelo instituto da imunidade tributária.

Entrementes estarem atendidos os aspectos relevantes à propositura da demanda em destaque, inevitável o deferimento dos pedidos. Nesse sentido, tem sido o posicionamento dos julgados:

Ação declaratória de inexistência de relação jurídica. Sentença de improcedência. Alegada nulidade por falta de intimação/intervenção do Ministério Público. Ausência de interesse público. Art. 82, III, CPC. IPTU. Imunidade. Decisão administrativa. Entidade de caráter religioso. Reconhecimento da imunidade, com desoneração do IPTU/2009. O imposto predial do exercício anterior (2008), no entanto, continuou a ser cobrado pela Municipalidade, por considerar estarem vagos os lotes na época do fato gerador (janeiro/2008). Comprovação da destinação dos imóveis para os fins essenciais da Igreja - construção de seu primeiro templo. Inteligência do art. 150, VI e § 4o, CF. Dá-se provimento ao recurso. (TJSP, Apelação 994081724118, Rel. Des. Beatriz Braga, julgado em 29 abr. 2011).

Agravo de Instrumento. Ação declaratória de inexigibilidade de crédito tributário. Decisão que, a um tempo, indefere a gratuidade de Justiça e denega a antecipação de tutela postulada na inicial. Ação proposta por entidade religiosa buscando a declaração de inexigibilidade de valores exigidos Data a titulo de IPVA, bem como se impeça a inscrição do débito na Divida Ativa. Aplicação do disposto no artigo 150, inciso VI, alínea “b”, c.c. seu § 4º, da Constituição Federal. Viabilidade. Inexistência de comprovação de que os veículos “a priori” não estejam vinculados as finalidades essenciais da entidade religiosa. Recurso provido para o deferimento da tutela antecipada, obstando-se a inscrição do débito na dívida ativa. Recurso provido. (TJSP, Agravo de Instrumento 0165079-51.2011.8.26.0000, Rel. Des. Aroldo Viotti. Julgado em 21 nov.2011).

Concluindo, não haverá pretensão a ser anulada ou desconstituída, e sim a mera declaração da inexigibilidade de crédito tributário, a fim de viabilizar o fim social para o qual a entidade foi criada, bem como a liberdade de crença e prática religiosa.

4.3 Da ação de repetição de indébito

Trata-se de ação declaratória de natureza condenatória, interposta com o fito de reaver o montante pago indevidamente ou pago a maior que o devido a título de suposta exação tributária. Cabível no âmbito de quaisquer tributos, o direito de ajuizar ação de repetição de indébito extingue-se com o lapso de 5 (cinco) anos, contados da extinção do crédito tributário (art. 168 CTN). Em se tratando de tributo pago indevidamente em face da vedação constitucional do poder de tributar, a repetição de indébito quando requerida pelas instituições religiosas somente será cabível quanto aos impostos. Quanto aos demais tributos, os templos de qualquer culto poderão repetir o indébito sempre que houver vício no recolhimento.

Então prevista no artigo 165 do Código Tributário Nacional (CTN) e incisos, a ação de repetição de indébito tem como base o princípio geral de direito que veda o enriquecimento sem causa. A fim de se especificar as peculiaridades da indigitada ação, necessário se faz o traslado do referido artigo, in verbis:

Art. 165 - O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do artigo 162, nos seguintes casos:

I - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido;

II - erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento;

III - reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória.

Primeiramente destaca-se que o caput do artigo 165 do CTN, faz referência ao sujeito passivo, estando compreendido neste o contribuinte, assim como a figura do responsável (art. 121, § único, I e II do CTN). Atinente ao conteúdo do presente trabalho, o sujeito passivo será quaisquer entidades religiosas, que efetivamente demonstrarem a vinculação das receitas obtidas com a finalidade essencial da instituição.

A entidade religiosa valerá desta demanda, a exemplo, quando por desconhecimento das benesses garantidas pela Constituição Federal, ou até mesmo por erro da fazenda pública no cálculo do montante devido, efetivar o pagamento de determinado imposto, e assim que constatado a irregularidade pela mesma, poderá pleitear seguramente a restituição dos valores pagos independentemente de prévio protesto, tendo em vista o aclamado instituto da imunidade tributária.

Caso haja a constatação do adimplemento da exação tributária, a demanda sempre deverá ser instruída com a prova escrita, bastando neste caso anexar o comprovante de pagamento. Assim como ocorre nas demais ações de iniciativa exclusiva do contribuinte, o mesmo também poderá pleitear cumulativamente com a ação de repetição de indébito, a ação declaratória de inexistência de relação jurídico-tributária, evitando desta forma lançamentos futuros em seu desfavor.

Importante destacar particularidade prevista no art. 166 do CTN, quanto à regulamentação da restituição nos tributos indiretos, que “são aqueles que, considerando o aspecto econômico de quem realmente sofre o encargo tributário, são devidos ‘de direito’ por uma pessoa e suportados por outra, a quem a doutrina chama de ‘contribuinte de fato’”. (SOUZA, 2005: 74). Neste caso a restituição somente será efetivada, a quem provar por qualquer meio ter assumido o referido encargo, ou no caso de haver transferido a exação a terceiros, estiver expressamente autorizado por este.

Ainda pertinente ressaltar que o pedido de restituição do montante pago indevidamente, poderá ser apresentado junto ao órgão administrativo da fazenda pública. Caso em que haja recusa do referido órgão, o contribuinte poderá socorre-se do Poder Judiciário, nos termos do artigo 169 CTN, porém aponta-se que o prazo neste caso é de 2 (dois) anos, para pleitear a repetição de indébito via judicial:

Art. 169 - Prescreve em dois anos a ação anulatória da decisão administrativa que denegar a restituição.

Parágrafo único. O prazo de prescrição é interrompido pelo início da ação judicial, recomeçando o seu curso, por metade, a partir da data da intimação validamente feita ao representante judicial da Fazenda Pública interessada.

Enfim, ao passo que as instituições religiosas estão acobertadas pelo princípio da imunidade tributária, as mesmas poderão se valer da ação de repetição de indébito, desde que sempre demonstrarem efetivamente a vinculação das receitas obtidas com as finalidades essenciais da entidade. Nesse sentido tem sido os reiterados julgados, que ora se colaciona:

Tributário e Constitucional – Reexame Necessário – Templos Religiosos – Imunidade Tributária reconhecida na esfera administrativa sobre os bens imóveis destinados aos objetivos eclesiástico-sociais da entidade religiosa – repetição de indébito – Consequência lógica – Pedido Procedente – Manutenção em grau de reexame necessário – Sentença omissa quanto aos ônus da sucumbência – possibilidade de complementação pelo tribunal em reexame necessário - matérias abrangidas pela devolutividade – reformatio in pejus não caracterizada. (Grifou-se). (STF, Recurso Extraordinário 6551002, Rel. Min. Espedito Reis do Amaral, julgado em 13 de jul. 2010).

Ação de repetição de indébito relativa à cobrança do ITBI - A embargante é uma fundação Religiosa que se dedica, entre outras coisas, à assistência e educação gratuita de crianças e adolescentes carentes -Documentação juntada aos autos demonstra que ela cumpriu o disposto no artigo [14] do CTN. Há presunção "júris tantum" de que a embargante usaria o terreno para construção de templo - Outrossim, mesmo que o imóvel estivesse alugado a terceiro (v.g.estacionamento) ela faria jus à imunidade tributária a teor da Súmula 724 do STF. (TJSP, Apelação 990100578979, Rel. Des. Osvaldo Capraro, julgado em 08 abr. 2010).

4.4 Da ação de consignação em pagamento

De acordo com o tema proposto, a ação de consignação em pagamento, também conhecida como ação consignatória, será demandada pela instituição religiosa quando, dentre outros casos, seja condicionado ao pagamento de tributo específico com o adimplemento de determinado imposto, este acobertado pelo princípio da imunidade tributária disposta no art. 150, VI, b da CF, conforme anteriormente colacionado.

Neste caso, em vista de todo exposto, os templos religiosos estão imunes ao pagamento dos impostos, quando estes incidirem sobre patrimônio, renda e serviços vinculados com as atividades essenciais da instituição religiosa, diferentemente quanto aos demais tributos, que poderão ser livremente onerados.

Nestes termos, a fazenda pública não poderá condicionar o pagamento conjunto de duas ou mais exações quando, por exemplo, uma delas não seja devida, por motivo de não incidência, ou até mesmo por erro no cálculo do montante. Em virtude de tais acontecimentos, dispõe o contribuinte da ação de consignação em pagamento, evitando que se faça pagamento inadequado.

O fundamento legal da presente ação está disposta no artigo 164 do CTN, assim como artigos do código civil e processo civil, respectivamente art. 335 e art. 890 e seguintes. Conforme preceitua Eduardo Sabbag (2009: 1114):

[...] a consignatória assegura o direito de bem pagar o tributo, em decorrência de uma resistência oferecida pelo credor ou em virtude da existência de uma pretensão de mais de um credor em perceber a indigitada exação a ser quitada.

As hipóteses de cabimento da consignatória (art. 164 CTN) versam apenas sobre o pagamento da obrigação tributária ao devedor. Efetivada através do depósito com força de pagamento, o contribuinte “[...] libera-se da obrigação e de obter a quitação. Trata-se de ação eminentemente declaratória: declara-se que o depósito oferecido liberou o autor da respectiva obrigação”. (PAULSEN, 2012:1099).

Nos termos do artigo 164 do CTN a demanda em comento somente poderá ser ajuizada quando: I - de recusa de recebimento, ou subordinação deste ao pagamento de outro tributo ou de penalidade, ou ao cumprimento de obrigação acessória; II - de subordinação do recebimento ao cumprimento de exigências administrativas sem fundamento legal; III - de exigência, por mais de uma pessoa jurídica de direito público, de tributo idêntico sobre um mesmo fato gerador.

Em termos explicativos, o inciso I do artigo 164, melhor será vislumbrado quando o fisco alegar não ser a autoridade responsável pelo recebimento, ou ao submeter à instituição religiosa, ao pagamento de dois ou mais tributos, mesmo que deva apenas um deles. Não poderá compelir a entidade a pagar todos, sob pena de não receber nenhum. O inciso II já remete a questões administrativas, tais como subordinar a forma de pagamento, por cheque, selo, etc. Consoante disposto no inciso III será o caso quando ocorrer conflito de competências tributárias, em que mais de uma pessoa jurídica de direito público, exige o pagamento de tributo sobre o mesmo fato gerador.

Os efeitos da consignação em pagamento estão claramente apontados no §2º do artigo 164 do CTN, quais sejam se julgada procedente a demanda, a importância depositada será convertida em renda, por outro lado, havendo insucesso, o crédito tributário será cobrado acrescido de juros de mora, sem prejuízo das penalidades cabíveis, devolvendo ao fisco o direito de cobrar judicialmente o crédito, conforme se verifica abaixo:

Art. 164, § 2º Julgada procedente a consignação, o pagamento se reputa efetuado e a importância consignada é convertida em renda; julgada improcedente a consignação no todo ou em parte, cobra-se o crédito acrescido de juros de mora, sem prejuízo das penalidades cabíveis.

Ademais, também importante esclarecer, utilizando-se das citações de Eduardo Sabbag (2009: 1119) que a ação:

[...] consignatória não é via adequada para discutir a existência ou validade da exigência tributária, para afastar as parcelas de multa ou obter parcelamento de tributo ou moratória, ou para afastar a configuração da fraude fiscal.

Neste diapasão, a ação de consignação em pagamento, traduz meio oportuno para que as igrejas de modo geral, possam se resguardar ao adimplirem seus débitos, sem que haja receio ao proceder com seus pagamentos, evitando desta forma incidir na máxima de “quem paga mal, paga duas vezes”.

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Sobre a autora
Natalia Gonçalves Siqueira

Advogada cível em Ribeirão Preto (SP).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SIQUEIRA, Natalia Gonçalves. Aplicação processual da imunidade tributária dos templos e cultos religiosos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3436, 27 nov. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23106. Acesso em: 28 mar. 2024.

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