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Estabilidade, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e crise contemporânea

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01/11/2001 às 01:00
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            I – INTRODUÇÃO

A história do trabalho começa com a narração contida na Bíblia, quando Deus diz a Adão: "comerás o teu pão com o suor do teu rosto", logo após ele e Eva terem desobedecido às suas ordens e provado da árvore do bem e do mal.

Assim, o trabalho ficou sendo considerado com uma punição, um castigo.  Durante séculos, ele era considerado tarefa apropriada aos escravos e servos. Os ricos preocupavam-se, tão somente, em filosofar ou guerrear. Foi preciso que se passasse muito tempo, para que o trabalho, especialmente o manual, fosse considerado dignificante.


II - DESENVOLVIMENTO

1 - HISTÓRICO

No Brasil, o trabalho vem sido protegido, de certa forma, desde a Constituição de l824, em que era conferida estabilidade aos oficiais do exército e da marinha e se reconhecia a vitaliciedade dos magistrados. A Constituição de l891 só permitia a demissão de funcionários concursados, por sentença judicial. Para os empregados em geral, porém, a estabilidade foi concedida pela primeira vez aos ferroviários, em l923 (Lei Elói Chaves). A Lei das Convenções Collectivas (Decreto nº 21.761/31), embora não cuidasse da estabilidade foi importante diploma legal em favor dos trabalhadores. A Constituição de l934, em seus arts. 121 e 122, também cuidou dos interesses dos empregados. Pela Carta de l937, foi garantida a estabilidade dos rurículas.

Em 1º de maio de l943, foi aprovada, pelo Presidente Getúlio Vargas, através do Decreto-lei nº 5.452, a Consolidação das Leis do Trabalho, cuja vigência se deu a partir de 10 de novembro do mesmo ano. A CLT, vigente até hoje, estatui as normas que regulam as relações individuais e coletivas do trabalho, ao lado de um sem-número de leis extravagantes.

Do art. 492 a de nº 500 (revogado pelo art. 5º da Lei 5.562/68) a CLT cuidava da ESTABILIDADE dos trabalhadores.

O art. 492 dizia textualmente:

"Art. 492 - O empregado que contar mais de dez anos de serviço na mesma empresa não poderá ser despedido senão por motivo de falta grave ou circunstância de força maior, devidamente comprovado".

O original art. 500, que foi revogado, foi substituído pelo seguinte:

"Art. 500 - O pedido de demissão de empregado estável só será válido quando feito com a assistência do respectivo Sindicato e, se não houver, perante autoridade local competente do Ministério do Trabalho, ou da Justiça do Trabalho".

2 - SITUAÇÃO PROBLEMA

A estabilidade, conforme ensinava José Martins Catharino, "é meio de valorização do trabalho como condição da dignidade humana. É forma de repressão ao abuso do poder econômico e instrumento para que a propriedade tenha função social, sendo que a mesma justifica a desapropriação por utilidade pública ou social e também justifica a subtração do direito de despedir" (in "Estabilidade e Fundo de Garantia"- Simpósio promovido pelo Instituto de Direito Social - p. 161)

A estabilidade é uma limitação ao direito potestativo dos empregadores de dispensarem os seus empregados. Hoje em dia, ainda há alguns tipos de estabilidade PROVISÓRIA. São, dentre outras, as dos dirigentes sindicais, prevista na própria CLT, no seu art. 543, do dirigente das Comissões de Prevenção de Acidentes (CIPA), ainda que suplentes (Súmula 339-TST), e da gestante (art. 10 do ADCT/88 art. 10, II, letras "a" e "b").

Sobre o assunto, discutiu-se muito sobre a possibilidade da empregada doméstica ser portadora dessa estabilidade provisória. A Jurisprudência dominante, entretanto, tem se inclinado no sentido de negar essa estabilidade provisória à doméstica, vez que o caput do art. l0 supracitado fazer menção expressa ao inciso I, do art. 7º, da CF/88, que não se encontra elencado no parágrafo único desse artigo, que fala dos direitos que foram estendidos aos empregados domésticos.

Outra estabilidade provisória que tem provocado grandes debates foi a criada pelo art. 118, da Lei nº 8213/91, para aqueles que sofreram acidente de trabalho. Tal estabilidade deve ser interpretada à luz do art. 19 do mesmo dispositivo legal.

Assim, a Jurisprudência, também, vem se inclinando no sentido de só conceder a estabilidade, quando a licença dada pela Previdência Social, exceder a 15 dias e quando o acidente deixar seqüelas.

Anteriormente, no regime da estabilidade, se a empresa quisesse dispensar um empregado estável, em razão de sua extinção, ou quando não houvesse motivo de força maior para isso, ela seria obrigada ao pagamento de uma indenização de um mês de serviço, por ano trabalhado ( art. 478, da CLT), em dobro (arts 497 e 498, do mesmo diploma legal). Nessa indenização, era computado, também, em cada ano, a parcela referente a 1/12 da gratificação natalina, conforme Súmula 148, do TST.

A estabilidade consagrada na CLT, entretanto, acabou por ser prejudicial aos trabalhadores, pois as empresas, passaram a dispensar seus empregados, quando os mesmos estavam prestes a completar, na mesma, os dez anos de trabalho.

Atenta ao fato, a Justiça do Trabalho, através do Tribunal Superior do Trabalho, editou a Súmula nº 26, do teor seguinte:

"26 - Presume-se obstativa à estabilidade a despedida, sem justo motivo, do empregado que alcançar nove anos de serviço na empresa".

Dessa forma, a indenização passava a ser, igualmente, em dobro, conforme o § 3º do art. 499, da CLT.


3 - FINALIDADE

A finalidade deste trabalho é estudar a estabilidade do empregado, a sua substituição progressiva pelo regime do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, os problemas ligados ao Fundo e a profunda crise que o atinge hoje.

DESENVOLVIMENTO

Já vimos alguma coisa sobre a ESTABILIDADE. Agora, veremos as principais características do FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO.

Causa da edição da Súmula supramencionada (nº 26), havia sido a edição da Lei nº 5.107, de 13 de setembro de 1966, que criou o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. Essa Lei, além de manter a estabilidade prevista na CLT, permitia que os empregados optassem pelo novo regime, ali instituído. Esse diploma legal entrou em vigor em 1º de janeiro de l967.

Esse Fundo era mantido pelas empresas, que ali depositavam, mensalmente, 8% de tudo o que fosse pago ao empregado, excluindo as verbas de natureza indenizatória. Quando dispensado, sem justa causa, o trabalhador tinha o direito de movimentar essa conta vinculada, isto é, de retirar o valor ali existente. Receberiam, ainda, do patrão, um percentual de 10% incidente. sobre tudo o que estivesse depositado, na data da dispensa. Sobre o valor depositado pela empresa, incidiam juros capitalizados, que aumentavam conforme os anos em que o trabalhador permanecesse na firma (art. 3º da Lei 5107/66). Esses benefícios tornavam bem maior a importância "histórica", que fora depositada, no correr dos anos.

Entretanto, quem optasse pelo Fundo e ainda não contasse com 10 anos de serviço, (que, na verdade, correspondiam a nove, conforme a supracitada Súmula 26), perdia o direito à estabilidade e poderia ser dispensado, quando bem conviesse ao empregador, recebendo o que estava o Fundo, além do pagamento dos 10%. Nunca houve uma definição quanto à natureza desse pagamento. A maioria da Doutrina a considera, porém, uma multa.

Enquanto o obreiro continuava trabalhando, os recursos do Fundo eram utilizados a fim de conceder empréstimos, com vistas à construção de moradias e realização de saneamento básico. Diga-se de passagem, que os juros cobrados dos mutuários do haviam recebido valores para realização de obras de saneamento, eram sempre maiores do que aqueles pagos aos titulares das contas vinculadas. Logo, o governo obtinha lucros com o novo regime.

A opção pelo regime do FGTS deveria ser feita no prazo de 365 (trezentos e sessenta e cinco) dias, a contar da vigência da Lei 5l07/66, para os que já estavam contratados e a partir da admissão para os novos empregados. Para os que já estavam admitidos em 01-01-67, caso deixassem de realizar a opção no prazo legal, essa só poderia ser realizada na Justiça do Trabalho, perante o Juiz-Distribuidor. Para aqueles que eram empregados "celetistas" da União a opção pelo FGTS seria feita perante um Juiz Federal, conforme a Súmula 17, do extinto TFR.

Essa Lei foi regulamentada pelo Decreto nº 59.820 de 20-12-66, que em seu famoso "art. 22" e seus dois parágrafos, regulamentavam, especificamente, o art. 6º da Lei 5l07/66, e estabeleciam, como já foi visto, que, além do direito de retirar o que estava depositado no Fundo, o trabalhador faria jus, ainda, ao recebimento de um pagamento a ser feito pelo empregador e equivalente a 10% de tudo o que estava depositado na conta vinculada, na data da dispensa, com juros capitalizados e correção monetária.

Houve controvérsias, pois trabalhadores se acharam prejudicados, com o novo regime, uma vez que entendiam que 8% x 12 = 96%, não era o mesmo que o 100%, isto é, o que recebiam por ano de serviço, no regime da estabilidade da CLT, como indenização em caso de dispensa sem justa causa. O TST editou, então, a Súmula nº 98, que dizia:

"Súmula 98 - A equivalência entre os regimes do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e da estabilidade da Consolidação das Leis do Trabalho é meramente jurídica e não econômica, sendo indevidos quaisquer valores a título de reposição de diferença".

Os dois regimes conviveram "na teoria" durante vários anos.

Na verdade, "na prática", o empregado ao ser admitido, já era obrigado a assinar a sua "opção pelo FGTS".

Essa situação perdurou até a Constituição Federal de 1988, quando o regime do FGTS se tornou o único existente (inciso III, do art. 7º), tendo acabado a estabilidade prevista na CLT que, entretanto, restou respeitada para os que já a possuíam.

O art. 10, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, de 1988, em seu inciso I, determinava, igualmente:

"I - fica limitada a proteção nele referida ao aumento, para quatro vezes, da percentagem prevista no art. 6º, caput e § 1º da Lei nº 5107, de 13 de setembro de 1966;"

Há um erro neste dispositivo, posto que, na realidade, o legislador constituinte estava se referindo ao art. 22 do Decreto 59.820/66. O supracitado art. 6º, da Lei 5107/66 sequer possuía algum parágrafo.

Após a Constituição Federal de l988, houve a edição da Lei nº 7.839, de 12-10-89, que vigeu até 14 de maio de 1990, data da publicação da Lei nº 8.036, que a revogou expressamente.

A Lei 8036/90 foi regulamentada pelo Decreto nº 99.684, de 8, publicado em 12 de novembro de 1990. Esse decreto entrou em vigor na data de sua publicação e revogou, de modo expresso, os seguintes Decretos:

  • 59.820, de 20-12-1966;
  • 61.405, de 28-09-1967;
  • 66.619, de 21-05-1970;
  • 66.619, de 1º-07-1970;
  • 66.867, de 13-07-1970;
  • 66.939, de 22-07-1970;
  • 66.265, de 22-09-1971;
  • 71.636, de 29-12-1972;
  • 72.141, de 26-04-1973;
  • 73.423, de 07-01-1974;
  • 76.218, de 09-09-1975;
  • 76.750, de 05-12-1975;
  • 77.357, de 01-04-1976;
  • 79.891, de 29-06-1977;
  • 84.509, de 25-02-1980;
  • 87.567, de 16-09-1982;
  • 90.408, de 07-11-1984;
  • 92.366, de 04-02-1986;
  • 97.848, de 20-06-1989;
  • 98.813, de 10-01-1990.

A Lei nº 8.036/90 e o Decreto nº 99.684/90 ainda são a legislação básica do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.

O art. 20, VIII, da citada lei foi modificado pela Lei nº 8.678, de 13-07-l993, no que tange à data da movimentação das contas vinculadas, que ficaram inativas por mais de três anos. Esta lei também modificou o art. 21, da Lei 8036/90, no que concerne ao recolhimento de valores de contas que, após 5 anos de inatividade, passam a fazer parte do Fundo, quando deixam de render juros e de ser atualizadas monetariamente. Apesar, desse prejuízo, após o prazo da inatividade da conta, os valores ali constantes podem ser retirados, a qualquer tempo, do ex-empregado.

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Diga-se de passagem, que havia dois tipos de contas. Uma chamada "individualizada", que era da empresa. Esta tinha a faculdade de depositar os valores concernentes aos empregados não-optantes, que eram individualizados. Caso esses empregados passassem a ser optantes, o valor que estava em seus nomes passava para uma nova conta, agora chamada "vinculada". Se o empregado não optasse pelo FGTS, dois anos após o encerramento do contrato de trabalho, o valor depositado na conta individualizada a ele correspondente, poderia ser retirado pelo patrão (sob o código 26), uma vez que pertencente à empresa. O empregado não-optante já havia recebido a "indenização", de que trata a CLT em seu art. 478.

A legislação fundiária permitia aos trabalhadores a movimentação da conta vinculada, antes da extinção do contrato de trabalho, mas em casos especiais, como a compra da casa própria, a ocorrência de doenças como câncer e aids, etc. O percentual do pagamento previsto no art. 6º da Lei 5107/66 e no § 1º do art. 18, da Lei nº 8036/90, entretanto, incidia sobre o total que deveria estar depositado no dia da dispensa, independentemente de que tivesse havido, ou não, algum saque, por aqueles motivos.

Anteriormente, para movimentar a conta vinculada, o empregado se utilizava de um documento denominado AM (Autorização de Movimentação). Atualmente, no próprio Termo de Rescisão do Contrato de Trabalho (TRCT) há um campo, cujo preenchimento demonstra a possibilidade, ou não, dessa movimentação. Assim, o preenchimento do campo nº 24, com o código 01, demonstra que o empregado foi dispensado sem justa causa e, com isso, pode ocorrer o saque. O código 05, indica aposentadoria e também permite a movimentação. Isso não acontece, porém, quando o código é o 18, que indica um pedido de demissão. Esses códigos estão contidos na Circular CEF nº 5/90.

Existe, ainda, uma longa série de Resoluções, Portarias, Circulares e Instruções Normativas, que dizem respeito ao FGTS, mas são de natureza mais administrativa e fiscal, interessando menos aos trabalhadores.

A legislação em vigor permite que o trabalhador não optante, que começou a trabalhar antes da CF/88, a qualquer tempo, opte retroativamente pelo FGTS, à data de sua admissão ou até 1º-01-67 (vigência do regime). Todavia, a não revogada Lei 5958/73, condicionava essa retroação ao fato de ser respeitado o decênio da estabilidade e à anuência do empregador.

Esses condicionantes não foram reproduzidos na legislação vigente, o que tem causado inúmeros problemas, posto que o empregador tem sido surpreendido com algumas opções retroativas, homologadas na Justiça do Trabalho, sem o seu conhecimento, como acontece, com muita freqüência, no caso das entidades filantrópicas. Alguns juizes entendem, contudo, que, se a legislação atual não toca no assunto (concordância do empregador) e não revogou expressamente a Lei nº 5958/73, ela não poderia revogar a anterior nesse particular e exigem para a homologação a presença do patrão. Essa também é a opinião do renomado mestre Valentin Carrion (in Comentários à CLT - 22ª ed. Saraiva, l997, p. 354).

Outro problema que tem ocorrido em relação ao pagamento a que se refere o § 1º, do art. 18, da Lei 8036/90 (os mesmos 40%, previstos no art. 10, do ADCT/88), é aquele acontecido quando o empregado se aposenta espontaneamente pela Previdência Social e continua trabalhando, ainda por um certo tempo, para o mesmo empregador. Esse problema surgiu após a edição da Lei nº 8213/91, em seu art. 49, que excluiu a obrigação do empregado de se desligar da empresa ao se aposentar espontaneamente.

Alguns autores virem nessa lei previdenciária, a afirmativa de que esse tipo de aposentadoria não encerrava o contrato de trabalho. Nessa hipótese, quando houvesse a dispensa do empregado, ele teria de receber os 40% sobre tudo o que estava depositado, desde a admissão até a data da dispensa imotivada, incluindo aí, tanto o período anterior, quanto o posterior à aposentadoria.

A doutrina se dividiu durante vários anos. Defendiam a continuidade do vínculo autores como Arion Sayão Romita e José Serson. A maioria, entretanto, dos doutrinadores, considerou que a aposentadoria encerrava o contrato e que, embora o empregado continuasse trabalhando normalmente, o que acontecia, a partir da inativação, era um segundo contrato. Então, só seriam devidos os 40% sobre o que havia sido depositado a partir da data da aposentadoria até a da dispensa por iniciativa do empregador. Sobre o que fora depositado antes da aposentadoria nada seria devido, pois a Lei 5107/66 e também a legislação posterior só prevêem algum pagamento, em caso de dispensa imotivada, o que não é o caso de aposentadoria espontânea.

Argumentou-se, com muita razão, que a continuidade na empresa era apenas fática e não jurídica. É exatamente o que acontece quando o proprietário de uma casa em que nela habita, vende o imóvel e continua residindo no mesmo, como locatário. Na aparência, nada mudou, mas a situação jurídica do ex-proprietário já não é a mesma. Após a venda, ele passou de proprietário a locatário. Igualmente sucede esta mudança de situação jurídica, sem que haja mudança aparente, quando o locatário, deixa de sê-lo, para se tornar comodatário.

Pesou muito na opinião da Doutrina majoritária, o texto do Enunciado 295, do TST, que diz:

"A cessação do contrato de trabalho em razão da aposentadoria espontânea do empregado exclui o direito ao recebimento de indenização relativa ao período anterior à opção. A realização de depósito na conta do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, de que trata o § 3º do art. 14, da Lei 8036/90, é faculdade atribuída ao empregador." (g.n.)

A mencionada lei previdenciária, a de nº 8.213/91, adentrando no direito material do trabalho, trouxe inúmeros problemas, especialmente para as empresas públicas e as sociedades de economia mista, que não poderiam ter empregados com novos contratos de trabalho, sem que houvessem sido submetidos a concurso público. Muitos empregados se aposentaram e esconderam essa situação às empresas, continuando a trabalhar normalmente. Quando a situação foi descoberta, foram dispensados, mas não se conformaram e houve levas de Reclamações Trabalhistas, objetivando os 40% do FGTS sobre todo um único contrato. Hoje, a Jurisprudência já está pacificada e o 2º contrato vem sendo considerado nulo pela maioria de nossos Tribunais, visto que encontram óbice no art. 37, II e § 2º da CB/88, que exige a aprovação de concurso público para ingresso no serviço público (lato-sensu). Assim, até os depósitos, efetuados após a aposentadoria, vinham sendo levantados pelas empresas públicas, sociedades de economia mista e até pela Administração Pública Direta. Entretanto, a Resolução 121, de 28-10-2003 do TST, deu nova redação ao Enunciado nº 363, do TST, que passou a ser a seguinte:

"363. A contratação de servidor público, após a CF/1988, sem prévia aprovação em concurso público, encontra óbice no respectivo art. 37, II e § 2º, somente lhe conferindo direito ao pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salário mínimo, e dos valores referentes aos depósitos do FGTS".

Assim, mesmo no caso do contrato nulo, o servidor poderá levantar os depósitos do FGTS, sem, entretanto, ter direito aos 40%.

Roberto Campos, que foi um dos principais idealizadores do sistema do FGTS, declarou que:

"a redução da importância da estabilidade, dentro da legislação trabalhista nacional, está sendo encarada como meio de atrair capitais privados estrangeiros, que encontram, em nossa legislação trabalhista, freio aos seus desejos de expansão e inversão (apud Deputado João Cunha, Diário do Congresso, Seção I, 14-4-76, p. 7360)."

Apesar da respeitável opinião acima transcrita, a extinção da estabilidade definitiva ou absoluta não trouxe nenhum aumento nos postos de trabalho no Brasil. Convém esclarecer que, ao contrário, o desemprego passou a aumentar, dia a dia. Diga-se de passagem, que isso não é decorrente da adoção do sistema do FGTS, mas em decorrência da política neoliberal e da globalização que acontece em todo o mundo.

Não havendo aumento de empregos, não pode existir majoração da arrecadação para o FGTS.

No Brasil, procurando contornar o problema, foram tentados vários expedientes para aumentar a essa arrecadação, como torná-lo opcional para os patrões de empregados domésticos. Pouquíssimos, porém, foram aqueles que aderiram a esta opção. Pretendeu-se, também, que os empregados se utilizassem dos valores depositados em suas contas vinculadas para comprar ações de empresas estatais, mas isso também não encontrou grande repercussão entre os trabalhadores.

Por outro lado, para facilitar a criação de novos postos de emprego, foi criado o Contrato por Tempo Determinado ( Lei nº 9.601, de 21.01.1998, art. 2º, inciso II ), no qual as contribuições dos patrões reduziu-se a 2%. Esses contratos deveriam contar com a interveniência do respectivo Sindicato de Classe. Poucos, porém, foram os contrato realizados nessa modalidade, não gerando aumento de contribuição para o Fundo. Como o encerramento do contrato de trabalho se dá por decurso de prazo e não por dispensa imotivada, não se há de falar em outro pagamento que não seja o efetuado mês a mês, isto é, não há pagamento dos 40% para os trabalhadores, mais uma vez prejudicados pela tendência à flexibilização, que atinge o Direito do Trabalho.

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Sobre a autora
Gilza Maria Rocha Nobre

juíza do Trabalho da 1ª Região, professora da UNIPLI e UNIVERSO/RJ

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NOBRE, Gilza Maria Rocha. Estabilidade, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e crise contemporânea. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2471. Acesso em: 28 mar. 2024.

Mais informações

Texto atualizado pela autora, conforme a Lei Complementar nº 110 e a Resolução nº 121/2003 do TST.

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