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A aplicação do Código de Defesa do Consumidor às emissoras de TV aberta

15/03/2014 às 12:22
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O ponto nodal da relação de consumo no caso de emissora de TV aberta, a remuneração, encontra-se pacificado nos tribunais, pois esta aparece de forma camuflada e indireta, abrigando a gratificação extraída dos anúncios publicitários veiculados.

INTRODUÇÃO

Nas próximas linhas pretende-se demonstrar, concisamente, que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) é perfeitamente aplicável às relações entre emissoras de TV aberta e o telespectador, nas suas respectivas qualidades de fornecedor e consumidor, na eventualidade de defeito do serviço (“faute du service”) ou acidente de consumo.


CONCEITOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Em suas disposições gerais, o CDC estatui o que se segue:

“Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.”

Decompondo o conceito de consumidor, é fácil verificar que o telespectador pode ser enquadrado como consumidor, pois usufrui do serviço fornecido pelas emissoras de TV aberta como destinatário final.

Ressalte-se, ainda, que, nos artigos 2º, parágrafo único e 17 e 29, o CDC estabeleceu os "consumidores por equiparação", que são pessoas que embora não sejam adquirentes diretas do produto ou serviço, utilizam-no, em caráter final, ou a ele se vinculem, vindo a sofrer qualquer dano trazido por defeito do serviço ou do produto.  São estes últimos chamados de “bystanders” pela doutrina estrangeira.

Com relação ao conceito de fornecedor, também não há duvida que as emissoras de TV prestam serviços de telecomunicação, nos termos do artigo 6º, alínea “d” do Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei nº 4.117/62), na modalidade de radiodifusão, consoante regulamenta o artigo 4º, item 1º, alínea “b” do Decreto nº 52.795/63, verbis:

Lei nº 4.117/62:

“Art. 6º Quanto aos fins a que se destinam, as telecomunicações assim se classificam:

(...)

d) serviço de radiodifusão, destinado a ser recebido direta e livremente pelo público em geral, compreendendo radiodifusão sonora e televisão;”

Decreto nº 52.795/63:

“Art 4º Os serviços de radiodifusão, para os efeitos dêste Regulamento, assim se classificam:

1º) quanto ao tipo de transmissão:

(...)

b) - de sons e imagens (televisão);”

O elo umbilical que liga o consumidor ao fornecedor é, via de regra, o serviço, embora excepcionalmente não se possa descartar este liame por uma venda de produtos.  Nos termos do § 2º do artigo 3º, para perfectibilização de uma relação de consumo entre telespectador e emissora de TV aberta, exige-se que o serviço seja remunerado.

A pergunta que se faz, então, é: como pode haver uma relação de consumo de um serviço aparentemente não-remunerado, já que o consumidor não paga diretamente para assistir a programas de televisão?

Através de remuneração indireta, o que será desenvolvido no tópico a seguir.


DA PREVALÊNCIA DA REMUNERAÇÃO INDIRETA

A doutrina e a jurisprudência têm entendido que o vocábulo "remuneração" envolve não somente a forma direta (contraprestação propriamente dita pelo serviço prestado) como também a gratificação indireta (o pagamento não advém do serviço efetivamente prestado), de modo que os serviços que são aparentemente gratuitos, apenas guardam essa aparência.

Sobre o tema, adverte Leonardo de Medeiros Garcia:

“O artigo delimita para fins de definição tanto de consumidor, como de fornecedor, o que seja produto e serviço. Produto é definido de modo bem amplo pela lei, sendo qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial (§ 1º). Já o serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração (§ 2º). Segundo o artigo, estariam excluídas da tutela consumerista aquelas atividades desempenhadas a título gratuito, como as feitas de favores ou por parentesco (serviço puramente gratuito). Mas é preciso ter cuidado para verificar se o fornecedor não está tendo uma remuneração indireta na relação (serviço aparentemente gratuito). Assim, alguns serviços, embora sejam gratuitos, estão abrangidos pelo CDC, uma vez que o fornecedor está de alguma forma sendo remunerado pelo serviço[1] [GRIFAMOS]

E, ainda, Cláudia Lima Marques:

“A expressão utilizada pelo art. 3º do CDC para incluir todos os serviços de consumo é ‘mediante remuneração’. [...] Parece-me que a opção pela expressão ‘remunerado’ significa uma importante abertura para incluir os serviços de consumo remunerados indiretamente, isto é, quando não é o consumidor individual que paga, mas a coletividade (facilidade diluída no preço de todos) ou quando ele paga indiretamente o ‘benefício gratuito’ que está recebendo. A expressão ‘remuneração’ permite incluir todos aqueles contratos em que for possível identificar, no sinalagma escondido (contraprestação escondida), uma remuneração indireta do serviço de consumo. [...] Remuneração e gratuidade: Como a oferta e o marketing de atividades de consumo ‘gratuitas’ estão a aumentar no mercado de consumo brasileiro [...], importante frisar que o art. 3º, § 2º, do CDC refere-se à remuneração dos serviços e não a sua gratuidade. ‘Remuneração’ (direta ou indireta) significa um ganho direto ou indireto para o fornecedor. ‘Gratuidade’ significa que o consumidor não ‘paga’, logo, não sofre um minus em seu patrimônio. [...]”[2] [GRIFAMOS]

No mesmo sentido, Rizzatto Nunes:

“Antes de mais nada, consigne-se que praticamente nada é gratuito no mercado de consumo.  Tudo tem, na pior das hipóteses, um custo, e este acaba, direta ou indiretamente, sendo repassado ao consumidor.  Assim, se, por exemplo, um restaurante não cobra pelo cafezinho, por certo seu custo já está embutido no preço cobrado pelos demais produtos.

Logo, quando a lei fala em ‘remuneração’ não está necessariamente se referindo a preço ou preço cobrado.  Deve-se entender o aspecto ‘remuneração’ no sentido estrito de qualquer tipo de cobrança ou repasse, direto ou indireto.”[3]

Com base neste entendimento, o Colendo STJ tem estabelecido que os grandes provedores de internet, como Google e Facebook, por exemplo, oferecem um serviço pautado numa remuneração indireta, consubstanciada em seus anúncios publicitários, senão vejamos:

“Inexiste violação ao art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor, porquanto, para a caracterização da relação de consumo, o serviço pode ser prestado pelo fornecedor mediante remuneração obtida de forma indireta” (STJ, REsp n. 566.468, do Rio de Janeiro, rel. Min. Jorge Scartezzini, j. em 23-11-2004).

“A exploração comercial da internet sujeita às relações de consumo daí advindas à Lei 8.078/1990.  (...) O fato de o serviço prestado pelo provedor de serviço de internet ser gratuito não desvirtua a relação de consumo, pois o termo ‘mediante remuneração’, contido no art. 3º, § 2º, do CDC, deve ser interpretado de forma ampla, de modo a incluir o ganho indireto do fornecedor” (REsp 1186616-MG, j. 23.08.2011, rel. Min. Nancy Andrighi).”

Assim, o mesmo entendimento em relação aos usuários e provedores de internet deve ser aplicado às emissoras de TV aberta, uma vez que “ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio”[4]

A raison d’être da interpretação ampla é o próprio espírito protetivo do Código de Defesa do Consumidor, ensejando, inclusive, a aplicação da referida lei conjugada com o artigo 5º da Lei de Introdução do Código Civil.

Avulta considerar, ainda, a presença do binômio vulnerabilidade/hipossuficiência frente aos poderosos grupos econômicos do ramo de telecomunicações, os quais, inclusive, desempenham atividade de risco aos direitos de outrem (cf. § único do art. 927 do Código Civil).

Os seguintes julgados do Egrégio TJERJ já consolidaram a existência de relação de consumo entre telespectador e emissoras de TV aberta:

“DIREITO PRIVADO. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO A IMAGEM. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO DE RADIOFUSÃO DE SONS E IMAGENS. EMISSORA DE CANAL ABERTO DE TELEVISÃO. RELAÇÃO DE CONSUMO. PRECEDENTES DO STJ. COMPETÊNCIA ABSOLUTA EM RAZÃO DA MATÉRIA DAS CÂMARAS ESPECIALIZADAS EM DIREITO DO CONSUMIDOR. A partir de 02.09.2013, os recursos interpostos nas ações que envolvam relação de consumo são da competência das Câmaras especializadas em direito do consumidor, criadas com a edição da Lei 6.375/2012. No caso, a ação decorre diretamente da relação de consumo, considerando tratar-se de ação proposta por consumidor em face de concessionária de serviço de radiofusão de sons e de imagens para obter indenização pela utilização indevida de sua imagem em programas veiculados pela emissora de canal aberto. Declínio de competência para uma das Câmaras especializadas.”

(0060014-91.2013.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO, DES. ROGERIO DE OLIVEIRA SOUZA - Julgamento: 11/11/2013 - VIGESIMA SEGUNDA CAMARA CIVEL) [GRIFAMOS]

0005595-79.2008.8.19.0006 - APELACAO

1ª Ementa

DES. HELENA CANDIDA LISBOA GAEDE - Julgamento: 29/04/2010 - TERCEIRA CAMARA CIVEL

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. TELESPECTADOR QUE VENCE CONCURSO "MARATONA DE ENIGMAS" EM PROGRAMA DE TELEVISÃO. PRETENSÃO FORMULADA EM FACE DA EMISSORA VISANDO O RECEBIMENTO DO PRÊMIO (COMPUTADOR) E INDENIZAÇÃO A TÍTULO DE DANOS MORAIS. RELAÇÃO DE CONSUMO. EMISSORA QUE PERTENCE À CADEIA DE CONSUMO A TEOR DO ART. 7º, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC. PRECEDENTES DO STJ. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA AFASTADA PELA AUSÊNCIA DE DENUNCIAÇÃO DA LIDE AO PRODUTOR DO PROGRAMA DE PRODUÇÃO INDEPENDENTE. MODALIDADE DE INTERVENÇÃO DE TERCEIRO QUE APESAR DE SER POSSÍVEL EM AÇÃO QUE VERSA SOBRE RELAÇÃO DE CONSUMO FUNDAMENTADA EM FATO DO SERVIÇO (ART 14 E 88, AMBOS DO CDC) NÃO DEVE ENSEJAR A ANULAÇÃO DA SENTENÇA, EIS QUE TAL ATITUDE ATENTARIA CONTRA OS PRINCÍPIOS DA CELERIDADE E ECONOMIA PROCESSUAIS, RESSALTANDO-SE QUE A EMISSORA APELANTE PODERÁ BUSCAR SEU DIREITO DE REGRESSO EM DEMANDA AUTÔNOMA. PRECEDENTES DO STJ. CERCEAMENTO DE DEFESA PELO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE NÃO CONFIGURADO. MAGISTRADO QUE É O DIRIGENTE DO PROCESSO. PROVAS DOCUMENTAIS CARREADAS SUFICIENTES A POSSIBILITAR O JULGAMENTO DA DEMANDA. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 130, 131 E 330, I, DO CPC. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL. MÉRITO QUE SE CONFUNDE COM AS PRELIMINARES JÁ ANALISADAS. INEXISTÊNCIA DE DANO MORAL NA PRESENTE HIPÓTESE. DEMORA NA ENTREGA DE PRÊMIO QUE CONFIGURA MERO ABORRECIMENTO, INCAPAZ DE CAUSAR ABALO PSICOLÓGICO AO INDIVÍDUO. DADO PROVIMENTO AO RECURSO, NA FORMA DO ART. 557, 1º-A, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, PARA EXCLUIR-SE A CONDENAÇÃO IMPOSTA A TÍTULO DE DANOS MORAIS, DEVENDO SER RECÍPROCA E PROPORCIONALMENTE DISTRIBUÍDAS ENTRE OS LITIGANTES AS CUSTAS JUDICIAIS, BEM COMO COMPENSADOS OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS, FACE À OCORRÊNCIA DA SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.”

(0005595-79.2008.8.19.0006 – APELACAO, DES. HELENA CANDIDA LISBOA GAEDE - Julgamento: 29/04/2010 - TERCEIRA CAMARA CIVEL) [GRIFAMOS]

Colham-se, ainda, os seguintes precedentes da Corte Augusta na aplicação das normas consumeristas às emissoras de TV aberta:

"Televisão. “Show do milhão”. Código de Defesa do Consumidor. Prática abusiva. A emissora de televisão presta um serviço e, como tal, se subordina às regras do Código de Defesa do Consumidor. Divulgação de concurso com promessa de recompensa segundo critérios que podem prejudicar o participante. Manutenção da liminar para suspender a prática. Recurso não conhecido.” (STJ. 4ª T. Resp 436.135/SP, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar Jr., j. em 17/06/2003) [GRIFAMOS]

“DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PRETENSÃO DE RECONHECIMENTO DA VIOLAÇÃO, NA VIGÊNCIA DA CONSTITUIÇÃOFEDERAL DE 1988, DE DISPOSITIVOS DA LEI DE IMPRENSA. DESCABIMENTO. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. AÇÃO CAUTELAR EM FACE DA RETRANSMISSORA, BUSCANDO EXIBIÇÃO DE FITAS. VEICULAÇÃO DE NOTÍCIAS DESABONADORASEM TELEJORNAIS DE ÂMBITO LOCAL E NACIONAL. RELAÇÃO JURÍDICA ENTRETELESPECTADOR E RETRANSMISSORA DE TELEVISÃO. CONSUMO. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DA RETRANSMISSORA PARA QUE ESSA APRESENTE AS FITAS DE PROGRAMAS PRODUZIDOS PELA EMISSORA.INVIABILIDADE. 1. O STF declarou, no julgamento da ADPF 130, relatada pelo Ministro Carlos Britto, que a Constituição Federal de 1988 não recepcionou a Lei de Imprensa, por isso não há falar em violação de dispositivos desse Diploma. 2. A retransmissora, tal qual a emissora, se enquadram ao conceito de fornecedor de serviços, nos moldes do disposto no artigo 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor. 3. Como a relação jurídica é de consumo, o artigo 101, I, do Código de Defesa do Consumidor permite ao consumidor ajuizar, em seu domicílio, ação em face da emissora e da retransmissora, buscando a exibição de fitas com as gravações dos programas produzidos e veiculados por cada uma delas para instruir a futura ação de responsabilidade civil. Com efeito, a tese de ser possível, com base no artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor, a desconsideração da personalidade jurídica da retransmissora para que essa exiba as fitas com as cópias dos telejornais de âmbito nacional, é manifestamente descabida, incidindo a Súmula 284/STF. 4. Recurso especial a que se nega provimento.” (STJ, Nº 946.851-PR, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 17/04/2012, T4 - QUARTA TURMA)

No RESp 436.135/SP, o Ministro Ruy Rosado de Aguiar entendeu que:

O relacionamento entre o canal de televisão e seu público caracteriza uma relação de consumo, na qual a emissora presta um serviço ao espectador e se beneficia com aquela audiência, em razão da qual aufere renda. Portanto, nessa atividade deve manter obediência aos princípios da moralidade e transparência, exigida de qualquer entidade que atua junto ao público.” [GRIFAMOS]

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Com relação ao RESp 946851/PR, o Min. Luis Felipe Salomão firmou entendimento de haver relação de consumo entre telespectador e emissora.  Eis excerto do seu voto:

É inequívoco que há relação de consumo, sendo notório que a programação é realizada tendo em mira o telespectador e que a emissora presta um serviço ao consumidor e, em contrapartida, por decorrência direta da audiência daquele, é que são veiculados anúncios publicitários”. [GRIFAMOS]

Todavia, passível de crítica é a decisão do STJ nos autos do RESp 1.157.228/RS, no sentido de excluir a responsabilidade das emissoras de TV em relação às ofertas de seus anunciantes na chamada “publicidade de palco”, posto que haja claramente, neste caso, uma responsabilidade em cadeia:

“A responsabilidade pelo produto ou serviço anunciado é daquele que o confecciona ou presta, e não se estende à televisão, jornal ou rádio que o divulga. A participação do apresentador, ainda que este assegure a qualidade e confiabilidade do que é objeto da propaganda, não o torna garantidor do cumprimento das obrigações pelo anunciante.

(...)

Destarte, a denominada ‘publicidade de palco’ não implica a corresponsabilidade da empresa de televisão pelo anúncio divulgado. E o apresentador está, ali, como se dizia no passado, atuando como ‘garoto-propaganda’, e não na qualidade de avalista formal, por si ou pela empresa de comunicação, do êxito do produto ou serviço para o telespectador que vier no futuro a adquiri-los.”


CONCLUSÃO

Havendo relação de consumo entre telespectador e emissora de TV, o que é verificável no caso de defeito de serviço ou acidente de consumo, é perfeitamente possível a aplicação de institutos consumeristas, como a inversão do ônus da prova (artigo 6º, inciso VIII do CDC), o prazo prescricional quinquenal para reparação de danos (artigo 27), a responsabilidade objetiva (artigos 12 e 14), a possibilidade de o autor ajuizar a ação no seu domicílio (artigo 101, inciso I), entre outros.

O ponto nodal da relação de consumo no caso de emissora de TV aberta, a remuneração, encontra-se pacificado nos tribunais, pois, como consigna a boa doutrina, esta aparece de forma camuflada e indireta, abrigando a gratificação extraída dos anúncios publicitários veiculados, da mesma forma como é entendido a respeito dos grandes provedores de internet.

Desta forma, não há como excluir as emissoras de TV aberta da órbita do CDC, pois: (1) há precisa adequação dos sujeitos ativo e passivo da relação de consumo; (2) a atividade desempenhada por estas emissoras visa o lucro, sendo remuneradas de forma indireta; (3) exsurge, via de regra, o binômio vulnerabilidade/hipossuficiência na relação jurídica; (4) a interpretação teleológica desta coincide com o escopo protetivo do Código.


Notas

[1] GARCIA, Leonardo de Medeiros. Direito do consumidor: código comentado e jurisprudência. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008. p. 26

[2] MARQUES, Cláudia Lima, Comentários ao código de defesa do consumidor, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 94

[3] NUNES, Rizzatto, Curso de Direito do Consumidor, Ed. Saraiva, 8ª Ed., São Paulo, 2013, pp. 150-151

[4] Onde existe a mesma razão, aí se aplica o mesmo dispositivo legal.

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Sobre o autor
Roberto Flávio Cavalcanti

Advogado e jornalista

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAVALCANTI, Roberto Flávio. A aplicação do Código de Defesa do Consumidor às emissoras de TV aberta. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3909, 15 mar. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26926. Acesso em: 28 mar. 2024.

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