As repercussões das relações fraudulentas de adesão e a incidência do Código de Defesa do Consumidor

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Objetivamos traçar um parâmetro atual para aplicação do CDC, tendo a pretensão de formular um novo conceito de destinatário final, de forma a melhor atender à crises jurídicas corriqueiras, que hodiernamente se mostram extremamente maléficas.

RESUMO

Cuida-se da análise do alcance dos contratos fraudulentos de adesão, tratando-se aqui de acordos de vontades que não foram celebrados efetivamente pelo consumidor, mas que repercutem em sua esfera jurídica. Melhor explicando, o objeto do estudo localiza-se na formação do contrato, no momento do aperfeiçoamento, no qual o falsário se traveste de consumidor, munido das informações pessoais deste, e assume postura negocial de maneira a possibilitar a existência do negócio jurídico; ou quando, de outra forma, em razão da massificação dos negócios jurídicos de adesão, um indivíduo se torna parte de um contrato sem ter sido beneficiário deste. Tal assunto se mostra extremamente relevante, haja vista a enorme repetitividade de ocorrências negativas a pessoas desavisadas, que são, de maneira repentina, surpreendidas com avisos de cobrança e citações do judiciário, sem ao menos ter noção do porquê. Percebe-se que a mínima informação das cientificações mencionadas subtrai do acionado o contraditório, garantia de índole constitucional, seja por conta da minoração da possibilidade de influência na decisão do magistrado, ou pela própria dificuldade de constituir prova em contrário. Fato é que o cidadão desavisado se torna presa fácil dos falsários ou das grandes empresas, pois ambos exercem essa atividade de maneira habitual e entendem dos tramites inerentes à ela, além da grande superioridade econômica, técnica e jurídica das empresas, que nos dois casos prejudicam o aderente. Nesse sentido percebe-se que as providências atuais tomadas pelos juristas, se mostram ineficazes ao saneamento satisfatório da problemática, de extrema ocorrência, principalmente quando se fala do ônus de provar. Nota-se aqui o verdadeiro e maior escopo do trabalho, o aspecto processual, pois dificilmente uma situação de fraude se resolve graciosamente, sendo imprescindível a substituição da vontade dos envolvidos pelo poder judiciário, que resolverá o litígio. Assim, com intuito da aplicação do CDC, visando possibilitar a inversão das cargas probatórias, se mostra também necessária uma nova figura do consumidor, não só o destinatário final do produto ou serviço, não só o terceiro atingido pelo negócio, mas o consumidor do contrato, do crédito ou virtual, não dando apenas uma conceituação fática e finalística de consumo, mas também uma definição jurídica que se amolda à situação, de maneira a promover a solução mais justa. Objetivando cumprir esta finalidade, propusemos um estudo bibliográfico, buscando em fontes doutrinárias e normativas fundamentações pertinentes a solidificação da idéia sugerida.Uma possível solução a curto prazo, se mostra na aplicação do CDC, pois como se sabe o sistema processual brasileiro adota a teoria das cargas estáticas da prova, por muitas vezes introduzindo o lesado numa situação de produção de “prova diabólica”, sendo que através da qualidade de consumidor e a inversão do ônus de provar, haveria uma redução desse problema, demasiadamente injusto

PALAVRAS-CHAVE: Consumidor, Contrato de Adesão, Ônus de Provar.

INTRODUÇÃO

Nos incumbimos da difícil missão de traçar um parâmetro atual para aplicação do Código de Defesa do Consumidor, tendo a pretensão de formular um novo conceito de destinatário final, de forma a melhor atender à crises jurídicas corriqueiras, que hodiernamente se mostram extremamente maléficas.

Tratamos aqui das relações contratuais de adesão advindas de fraude e suas repercussões na órbita jurídica das pessoas atingidas, temos interesse de proteger o cidadão, parte hipossuficiente da relação de consumo, mais frágil ainda nas oriundas de subterfúgios maliciosos. Objetivamos solucionar apenas o conteúdo civil da casuística, sendo, pois, a elucidação da autoria e materialidade penal, situação extremamente dificutosa, por vezes, para autoridade policial, uma circunstância prejudicial para o lesado.

Um instrumento extremamente valioso e útil nesta proteção é o CDC, juntamente com seu conjunto principiológico, o que infelizmente não vem acontecendo nas relações fraudulentas, aparentemente por uma falsa percepção de assunção de culpa. Tal conduta dos operadores do direito se mostra tão insatisfatória quanto a própria conduta ilícita, porque, não raramente, alguém que não se beneficiou do contrato, foi vítima dele, paga para que outro, o infrator, tome partido do objeto do negócio jurídico, tendo por conseguinte seu patrimônio lesado irreversivelmente, algo inadmissível.

Nesse sentido, as repercussões que propomos a detalhar, são refletidas no novo conceito de consumidor, no plano jurídico em que se encontra o contrato, bem como as implicações processuais que resultarão desta relação originada de fraude.

Para tanto foi utilizada um método bibliográfico de pesquisa, buscando em fontes doutrinárias e positivas, fundamentação e opiniões dos respectivos autores, acerca dos temas abordados, desenvolvendo uma matéria única, de fácil entendimento para o leitor, possibilitando sua integração com o objetivo proposto.

1 DISPOSIÇÕES GERAIS

Objetivando tratar do tema que intitula o estudo, precisamos primeiramente explicitar como se da a relação fraudulenta de adesão.

A internet no Brasil tem um viés democrático, ou seja não possui qualquer limitação ao acesso de dados, que não os sigilosos, logicamente nos ambientes protegidos por codificação, assim dados não sigilosos são livremente observados. Associe isso a massificação dos meios de informática e temos a faculdade de produzir tantos contratos quanto possíveis, em nome de qualquer um, porque é igualmente massificada a necessidade de contratos de adesão.

Conseguir dados pessoais de qualquer pessoa é incrivelmente simples, basta que se coloque o nome da pessoa em redes sociais, sites de busca, cadastros governamentais, em fim, a internet é capaz de expor um retrato pessoal e profissional de qualquer individuo que a acesse ou tenha acessado e transmitido seus dados.

Munidos de informações como número de registro geral (RG) e cadastro de pessoa física (CPF), uma pessoa mal intencionada pode travestir-se da pessoa, da qual capturou os dados, e participar de qualquer negócio jurídico de adesão se passando por ela, nasce assim a relação fraudulenta de adesão.

Importante destacar também, até mesmo o próprio fornecedor, por equívoco ou deliberadamente, pode introduzir alguém em relação de negócio, sem que esta, todavia, perca sua natureza danosa.

Assim, para efeito desta explanação, relação fraudulenta de adesão é a gerada por outrém sem o assentimento daquele que tem nome constante no contrato.

Perceba que esta uma situação potencialmente danosa e incrivelmente simples de acontecer, e de fato vem vitimando cada vez pessoas através de negativação nas instituições de proteção ao crédito, em ações de cobrança e declarações de inexistência de débito, lesando permanentemente seu patrimônio. Dessa forma cidadãos completamente inocentes são punidos por um inadimplemento de obrigação que não deram causa e tão pouco tomaram proveito.

Isso ocorre em função de haver uma imensa dificuldade de constituir prova e convencer o magistrado daquilo que propõe, não por culpa deste, o judiciário também se vê atado, impossibilitado de resolver a situação da maneira mais justa. Pensando nisso a idéia de consumidor, ainda que não presente fisicamente no negócio, parece atender ao caso em questão de maneiramais proveitosa.

2 DO CONCEITO DE CONSUMIDOR

Atualmente o conceito de consumidor encontra-se explicitado na lei 8078/90 o Código de Defesa do Consumidor que, em seu artigo 2° trás a seguinte redação:Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

Com base no referido dispositivo percebemos que a aplicação do CDC independe da pessoa ser natural ou ficta, o importante é que ela seja destinatária final de produto ou serviço.

Discussões acaloradas existem no tocante ao que seria destinatário final, para tanto, foram elaboradas três teorias:

Teoria Maximalista – por meio desta, todo aquele que consome é consumidor. Com efeito, percebe-se com muita clareza a deficiência de tal conceito, na medida em que muito amplia a aplicação, visando a todos proteger, acaba a ninguém protegendo especificamente, por colocar todos em um mesmo patamar.

Com isso tal teoria perde completamente o sentido em razão de transformar todas as pessoas indistintamente, desde que sejam adquirentes de produtos, em consumidores, sem levar em conta a fragilidade que em primeiro lugar, legitimou a existência da própria legislação consumerista.

Teoria Finalista – através desta doutrina depreendemos a idéia de que consumidor é o que encerra em si próprio a função essencial do produto ou serviço, por exemplo, no automóvel, a locomoção, na roupa, a possibilidade de vestir. Assim tentando diferir o destinatário final do chamado consumidor intermediário, que não é resguardado pelo CDC.

Consumidor intermediário seria aquele que adquire o produto ou serviço, todavia com o escopo de circulação mercantil, ou seja, trata-se de empresa locadora de veículos que adquire automóveis para aluguel, ou loja de roupas adquirente de vestimentas para revenda.

É destaque nessa teoria, como é perceptível, a especialidade técnica, habitualidade e potencial econômico, presumido, de quem exerce circulação de produtos e serviços direcionado ao público.

Note que tal teoria também não pode estar livre de críticas, pois tal conceito de destinatário final é muito rígido, e, nem de longe, consegue satisfazer aquilo que propõe o Código de Defesa do Consumidor e muitas vezes conduzia a soluções injustas do caso concreto. Todavia é a mais aplicada no âmbito jurídico nacional.

Teoria Finalista Aprofundada -com base na aplicação do conceito anterior foram percebidas pela doutrina certas situações que tinham desfecho injusto no caso concreto, algumas relações, muito embora o consumidor adquirisse serviços, mas principalmente produtos, para extrair deles potencial econômico, ainda apresentavam a inexperiência característica do consumidor.

Dessa forma através do finalismo aprofundado, consumidor não é só quem encerra em si a finalidade do bem, mas aquele que no caso concreto se mostra fragilidade e carência de defesa especializada, visando a equalização dos pólos processuais.

Exemplo mais recorrente da aplicação desta teoria é a pequena costureira que faz roupas para as pessoas do bairro adquirindo máquina de costura de grande loja de eletrodomésticos.

 Compactua com este entendimento o STJ dando aplicação a esta doutrina quando se tratam de pessoas físicas economicamente frágeis, e pessoas jurídicas como microempresas e empresas de pequeno porte.

É cabível destacar por hora que o cerne desta teoria é a justiça e equalização dos pólos processuais quando da aplicação do Código de Defesa do Consumidor que só poderá ser avaliada no caso concreto e, por sua flexibilidade, depende sempre de uma maior sensibilidade do magistrado.

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Coadunando com o objetivo do estudo, usaremos esta teoria para definir o que é destinatário final e, por conseguinte, consumidor.

Vale também ser destacada a proteção dada pelo código no parágrafo único ao terceiro vítima da relação de consumo, traduzindo a tutela externa do crédito, aflorando a figura do terceiro bystander.

3 DO CONTRATO DE CONSUMO

O contrato de consumo é um negócio jurídico bilateral, qual seja um contrato, este também de natureza bilateral sinalagmático, oneroso e de adesão.

Relevante apenas destacar a última característica, a natureza de adesão, ou seja, as cláusulas contratuais não são livremente discutidas entre as partes. Uma das partes propõe o negócio jurídico e outra limita-se simplesmente em dar aceite ou se recusar. Tal tipo de contrato apresenta extrema importancia no mundo globalizado que necessita de acordos rápidos e massificados, os quais são propiciados pelos contratos de adesão.

 Denota-se uma necessidade de apressar a formalização e aperfeiçoamento dos negócios jurídicos de adesão, facilmente explicada pelo ritmo frenético de trabalho e o consumismo desenfreado característico da sociedade do século XXI, que recusa-se a perder tempo com trâmites negociais morosos, preocupada apenas no objetivo, não no meio.

O direito, como regulador do Estado deve se preocupar com a conduta da maioria das pessoas regulando-as se for necessário. Como, no caso das relações de consumo, a maioria das pessoas se comportam da mesma maneira, os juristas perceberam que havia no aperfeiçoamento do contrato de adesão uma conduta negocial típica, e esta por sua vez merecia tutela.

Conduta negocial típica, a partir dessa premissa, é o modo regular de comportamento do oblato em face à propositura de adesão, definido pela análise da conduta do homem médio. O efeito desta conduta negocial é a produção de uma vontade presumida de aceitação do contrato, presunção esta juris tantum, aperfeiçoando-o a partir da mera conduta.

Desse modo um incapaz poderia celebrar negócio jurídico, uma pessoa sem procuração e até mesmo um falsário teria aptidão a levar o contrato ao plano de existência.

Nesse sentido explica Paulo Lôbo( 2011, p.87):

Para os contratos massificados, ou para os contratos de consumo,ou para os contratos de adesão em condições gerais, o direito deve substituir a manifestação de vontade de aceitar pela conduta das  pessoas orientadas à aquisição ou utilização de bens e serviços, que desejam ou necessitam. A conduta é negocial porque tem por finalidade a inserção em relação negocial,consistente ou não. A conduta é típica porque o direito capta o comportamento padrão das pessoas, em idênticas circunstâncias, e não a da pessoa determinada, que deu causa a conclusão do contrato; nesse sentido é objetiva. Nessas hipóteses não é a manifestação de vontade, mas sim a conduta negocial típica que faz nascer a relação contratual.

A partir desta observação percebemos que um contrato de adesão jamais poderá ser inexistente, mesmo em caso de celebração fraudulenta, pois é impossível afirmar aprioristicamente que ele não possui declaração de vontade, nele a vontade é dispensável, relevante apenas se o instrumento não atingiu o fim devido.

Temos aqui um contrato não mais ancorado no consenso de vontade livre, como é mencionado também por Paulo Lôbo (2011, p.87) que afirma inequivocamente uma revisão, já operada, da maneira de pensar os contratos.

4 DO CONSUMIDOR VIRTUAL

Diante do exposto percebemos a facilidade de fazer existir uma relação de consumo, basta que alguém haja de maneira típica frente a uma propositura negocial, que teremos a formação da obrigação e a responsabilidade de arcar por ela.

Isso de fato é um grande salto para a economia, para o meio jurídico e para os interesses sociais, todavia merece o devido respeito e cuidado.

Pensando nesta facilitação contratual, não é incomum nos depararmos com cobranças surpresa à nossa porta, pegando-nos desprevenidos e completamente desinformados, principalmente com o advento dos meios informáticos, que cada vez mais são utilizados para esta finalidade, quase ao ponto de substituir totalmente o papel.

Tais notificações, sejam judiciais ou extrajudiciais, sempre causam enormes transtornos a quem as recebe e não raramente proporcionam um amargo prejuízo no seu patrimônio.

De onde veio e por quê? Quem celebrou o contrato? Como provar que o “eu” do contrato não sou “eu” de verdade? Essas devem ser as perguntas que passam na cabeça de um cidadão que, devido a facilidade de celebrar contratos de adesão, foi colocado numa relação contratual por um falsário ou deliberadamente por uma grande empresa, sem a obtenção de quaisquer tipo de vantagem.

Diante dessa situação os juristas têm se omitido de vislumbrar a situação como é devido e tendem a tratá-la de maneira gestaltica suprimindo os sintomas, sem se preocupar com a doença. Resolvem desse modo, algumas situações com justiça, todavia deixam tantos outros passarem despercebidos, conduzindo, possivelmente, à uma média preocupante de casos encerrados de forma equivocada.

Em razão desta conduta visualizamos uma situação processual que já era desigual pela superioridade econômica, técnica e jurídica do fornecedor, se tornando ainda mais, pela falta de conhecimento do próprio ato e, principalmente, pela dificuldade de produzir provas por parte do lesado, quando ele poderia ser facilmente identificado como não sendo o signatário do contrato pelo autor da cobrança.

Obviamente que essa hipótese de reconhecimento do pedido, embora resguardada pelo princípio da boa-fé e lealdade processual, dificilmente ocorre na prática, pois o interesse privado é o mais forte, antes alguém pague injustamente, que se perca do meu próprio patrimônio.

O lesado sempre acaba numa produção probatória extremamente dificultosa, de fato deverá produzir uma “prova diabólica”, porque o sistema processual brasileiro adota o princípio das cargas estáticas da prova, por conseguinte o fato extintivo da obrigação, existente, como argumentamos, deve ser provado por quem alega, prelecionado no artigo 333 do CPC.

Art. 333. O ônus da prova incumbe:

I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;

II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

Seja ele autor da ação de declaração de inexistência de débito ou réu da ação de cobrança, aquele que teve seu patrimônio ferido com certeza estará em uma situação processual extremamente problemática. Visando sanar este problema, percebemos que se faz necessária a inversão do ônus de provar, justificada na possibilidade de tornar o mais equânime possível a relação jurídica.

Por isso propusemos um novo enfoque no conceito de consumidor, fazendo com que a litispendência do procedimento siga em favor do lesado e não contra ele, o que pode ser conseguido através da inversão da carga probatória autorizada pelo CDC no artigo 6°,VIII:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

(...)

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; (grifo nosso)

No Novo CPC tal discussão se mostra menor, pois adotará a forma dinâmica de distribuição do ônus de provar, como mostra Daniel Assumpção (2013, p.422), todavia por hora é extremamente relevante.

... Apesar de o art. 357 do PLNCPC repetir as regras atualmente contidas no art.333 do CPC, o art. 358 permite que, levando em conta as circunstâncias da causa e as peculiaridades do fato a ser provado, o juiz possa, em decisão fundamentada e respeitado o contraditório, inverter a regra de forma a atribuir o ônus probatório à parte que tenha maior facilidade em sua produção.

Assim quem não participou efetivamente da relação contratual baseada em fraude, também é consumidor, se não é faticamente ou materialmente, ao menos de maneira virtual, a título de tutela, pois se trata de uma situação carecedora.

A fundamentação deste conceito partiria de duas premissas, uma fática e uma jurídica.

Faticamente o lesado é parte hipossuficiente da relação, a não concessão da qualidade de consumidor implicaria na redução da capacidade de interferência na decisão do magistrado, pela dificuldade de provar, e a redução na informação relativo ao processo (só dentro do procedimento teria informações detalhadas do fato), cerceando, por conseguinte seu direito constitucional ao contraditório trazido pelo artigo 5, LV da CF.

Ainda sobre esse aspecto afirmamos que é inadmissível em direito, qualquer que seja o ramo, que se arque pela atividade econômica habitual de outrem, assim, visto que a lesão advém da habitualidade da prestação do serviço ou da circulação do bem, o fornecedor deve arcar com seus riscos, não deve existir perda de patrimônio, o autor do ilícito deve arcar por ele, todavia se existir, que seja de quem lucra com o ato habitualmente.

Sobre a ótica jurídica deduzimos que esta não se trata de tutela externa do crédito, para excluir de plano a possibilidade de aplicação do conceito pelo parágrafo único do artigo 3° CDC, é pois uma tutela interna do crédito.

Crédito é traduzido pelo binômio Confiança + Tempo, o tempo é absolutamente perceptível no contrato, que na maioria das vezes é de prestações sucessivas, e a confiança é em razão do nome constante no documento. Esta tanto em seu aspecto subjetivo, pois o nome e boa fama do consumidor impulsionam o aperfeiçoamento do contrato; quanto no aspecto objetivo que é caracterizado pelos bens livres e desimpedidos do consumidor à solver a obrigação.Portando a tutela de crédito só pode ser interna, o que já motiva a aplicação do conceito.

Por fim a aplicação da teoria finalista aprofundada, adotada pelo STJ, diz respeito apercepção de justiça no conceito de consumidor, nada mais justo que valorar a aquisição do crédito e não a posse direta do bem ou serviço, ou seja, o destinatário final do crédito, sobre pesar de não estar diretamente em contato e encerrando as funções naturais do objeto do contrato, com o escopo de atingir o resultado mais verossimilhante possível à verdade real.

Ante o exposto diz-se Consumidor Virtual aquele que, ainda que não encerre em si o destino final do produto e não participe efetivamente da celebração do contrato, é representado por outrem, por conduta negocial típica em situação de fraude, gerando crédito em seu nome, e, sendo parte hipossuficiente da relação perante o fornecedor, investe-se deste atributo visando à tutela mais efetiva.

5 DA AÇÃO ANULATÓRIA DE CONTRATO

O contrato de adesão, pelo ja exposto, existe e é,em um primeiro momento, válido, inclusive produzindo efeitos como a negativação do nome do consumidor nas instituições de proteção ao crédito e dando causa à legitimidade de propor ação de cobrança.

A solução jurídica para essa situação é portanto ação anulatória de contrato e não de inexistência de débito, pois o fato de o contrato existir é muito mais benéfico ao lesado do que se inexistente fosse, em razão de na primeira hipótese ser plenamente possível a aplicação do CDC, levando o processo a submeter o fornecedor à produção de provas e a fazê-lo no domicílio do consumidor, enquanto na segunda, haja vista que parte-se da premissa da inexistência de qualquer relação, é incabível.

Na ação de cobrança, quando o lesado é réu, o mesmo efeito é cabível, inclusive para aforamento do procedimento no domicílio do consumidor e consequente interposição de exceção de incompetência perante o juízo acionado.

Temos ainda, o ônus da prova objetivo, ou seja a regra de julgamento, quando o juiz não tiver totalmente convencido, ou não forem suficientes as provas, através da vedação do non linquet, deverá julgar em favor do consumidor.

6 INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA E INVERSÃO DO ADIANTAMENTO DE CUSTAS PROCESSUAIS

Na temática que pontuamos ao longo de todo o trabalho percebemos que a forma de solver a demanda é provar que a vontade que foi presumida e dispensada no início, é invalida, acarretando a nulidade contratual.

O grande problema é que esta vontade é transmitida através de assinatura ou meio digital, em ambos os casos, é necessário, principalmente, profissional especifico à produção de perícia para comprovar a negativa de autoria da assinatura, o técnico em informática para comprovar a invasão digital.

Em qualquer dos casos se for requisitada perícia, existe grandes divergências na doutrina sobre quem deverá arcar com as custas existindo duas correntes bem distintas, como explica ,compactuando com a segunda ,Daniel Assumpção (2013, p.425).

... entendendo parcela dos operadores e estudiosos que a inversão do ônus da prova acarreta inexoravelmente a inversão do pagamento das despesas que derivam da produção de tal prova, enquanto outros entendem que a antecipação de pagamento de despesas relacionadas com a produção de provas encontra-se regida no art.33 do CPC, não sofrendo qualquer influência de eventual inversão do ônus da prova...

Compactua com o ilustre autor também o STJ, todavia entendemos não ser a compreensão mais acertada pois, como jáasseveramos, existe uma desigualdade marcante nesta relação jurídica processual, o adiantamento de custas muitas vezes poderá incapacitar a defesa do consumidor, até porque se ele não adianta, o processo ainda irá contra o fornecedor, e não sendo a prova produzida deverá ser o julgamento contra este.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Traduzimos assim, no decorrer de todo o disposto, o escopo maior do estudo, gerar, em tese, uma situação processual mais equilibrada para a vítima de relação de adesão baseada em fraude. Através da adequação desta situação como relação de consumo e a consequente aplicação do arcabouço normativo do CDC.

Para tanto identificamos como se da esta relação fraudulenta e o porquê da vítima dela merecer tutela diferenciada, notadamente pelo enfoque neoconsumerista de consumidor virtual.

Afirmamos inequivocamente que quando um falsário se passa por outra pessoa, e no momento do acordo de vontades com o fornecedor, fornece os dados pessoais desta e efetivamente faz crê que é esta pessoa, existe aí uma relação de consumo não em razão do infrator, mas em relação da pessoa virtualmente presente na celebração.

Ademais, suscitamos a propositura de ação anulatória de contrato muito mais benéfica a vítima que qualquer outro remédio jurídico, pois a colocará em situação processual mais vantajosa com a aderência ao conceito de consumidor virtual, sem prejuízo das sanções penais cabíveis ao infrator.

Essa figura consiste no indivíduo que lesado por um contrato de adesão, oriundo de postura negocial típica, se propõe consumidor em função de crédito concedido em razão dele, para efeito de equilíbrio processual baseado em hipossuficiência preexistente, objetivando decisão jurídica mais justa.

Nesse tocante percebemos um avanço na figura do consumidor, tentando acompanhar proporcionalmente a necessidade de novos meios negociais cada vez mais céleres e massivos, que, não obstante tenham altíssima importância, geram danos na mesma proporção desta importância, pela única razão de não ter se dado o olhar requerido por tal crise jurídica, o que acreditamos ter sido solvido.

REFERÊNCIAS

LÔBO, PAULO. Direito Civil: Contratos. Editora Saraiva, 2011.

AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES, DANIEL.Manual de Direito Processual Civil. 5.ed. Volume Único. São Paulo: Editora Método, 2013.

NUNES, RIZZATTO. Curso de Direito do Consumidor. 7.ed. Editora Saraiva, 2012.

DE MIRANDA, PONTES apudLÔBO, PAULO. Direito Civil: Contratos. Editora Saraiva, 2011.

ROBERTO GONÇALVES, CARLOS.Direito Civil Brasileiro: Parte Geral. 5.ed. Editora Saraiva, 2010.

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Sobre o autor
Cícero Dâmocles Ribeiro Furtado

Acadêmico do IX Semestre do curso de Direito da Faculdade Paraíso- FAP<br><br>Estagiário da PRM de Juazeiro do Norte/CE

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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