Atraso na entrega de imóvel na planta e o direito do comprador em solicitar indenizações ou a rescisão do negócio no Poder Judiciário

02/03/2015 às 09:56
Leia nesta página:

Quem nunca ouvi falar em atraso na entrega de imóvel na planta, não é mesmo? Mas você sabe exatamente quais são os direitos do comprador que passa por essa infeliz experiência? Saiba mais sobre o entendimento desse assunto perante o Poder Judiciário.

Provavelmente o leitor deste artigo ou conhece alguém que já comprou um imóvel na planta e passou por algum tipo de dissabor com a incorporadora/construtora ou o próprio leitor possivelmente já passou por alguma experiência desgastante.

Seja porque a obra atrasou além do permitido em contrato, seja por falhas construtivas, por atraso na disponibilização da documentação para o financiamento imobiliário do saldo devedor, dentre outros tantos problemas que pesam e muito na vida do comprador de imóvel na planta.

Embora exista o mito de que somente as vendedoras (incorporadoras/construtoras) tenham direitos e mais direitos sobre o comprador, não deixa de ser verdade absoluta que este também tem direitos a exigir da vendedora e se um acordo amigável não for possível, a alternativa será buscar auxílio perante o Poder Judiciário.

Com o crescimento do mercado imobiliário nos últimos 10 anos, aliado ao interesse do Governo Federal em expandir a concessão de crédito imobiliário às famílias brasileiras, a ganância de algumas empresas tem levado milhares de pessoas ao Judiciário para revisar cláusulas contratuais nitidamente abusivas, ou até mesmo rescindir o negócio e reaver os valores pagos.

Verdade seja dita: se por um lado é comum nos Contratos de Promessa de Compra e Venda de imóveis a famosa cláusula de tolerância de 180 dias em benefício exclusivo da vendedora (incorporadora), por outro não se vê nenhuma cláusula prevendo uma mísera multa sequer para ela pagar ao comprador, caso não entregue o imóvel dentro do prazo previsto em Contrato, o que provoca enorme desequilíbrio na relação, exigindo a intervenção do Judiciário na questão.

O Poder Judiciário há anos pacificou o entendimento no sentido de que a incorporadora que atrasar a entrega do imóvel após o prazo previsto em Contrato, deverá indenizar o comprador e isso independentemente de existir ou não alguma previsão de multa em benefício do comprador no contrato.

O nome dessa indenização é LUCROS CESSANTES ou ALUGUEL PELA RETENÇÃO DO IMÓVEL.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), através do julgamento de alguns Recursos Especiais, datados de 2005, pacificou o entendimento de que: “descumprido o prazo para entrega do imóvel objeto do compromisso de compra e venda, é cabível a condenação por lucros cessantes. Nesse caso, há presunção relativa do prejuízo do promitente-comprador.” (REsp nº 735353, dju: 15/09/2005).

Conforme ponderou a Corte Superior, existe uma presunção relativa de prejuízo para o comprador caso haja atraso na entrega do imóvel.

Existem variações entre os Estados sobre o valor para punir a incorporadora faltosa que não entregou o imóvel dentro do prazo.

No Estado de São Paulo os Juízes e Desembargadores oscilam entre 0,5% a até 1,0%, sendo o mais comum a condenação da incorporadora no pagamento de indenização por lucros cessantes ou aluguel pela retenção do imóvel em 0,8%, sobre o valor de mercado do bem, por casa mês de atraso até o mês da efetiva entrega das chaves ao comprador.

E por EFETIVA ENTREGA das chaves ao comprador, entenda-se isso literalmente, ou seja, o que caracteriza a entrega do imóvel NÃO é a obtenção do auto de conclusão de obra ou “habite-se” pela incorporadora, nem a instalação do Condomínio ou a individualização da matrícula. Esses elementos são de competência da incorporadora que resultam na entrega do imóvel ao comprador.

É também compreendido como perfeitamente cabível em casos de atraso na entrega do imóvel pela incorporadora uma INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.

Porém, a legislação brasileira deixa o valor dessa indenização ao arbítrio do Juiz. Normalmente a indenização por danos morais por conta de atraso na entrega de imóvel é praticada no Judiciário de São Paulo entre R$ 10.000,00 a R$ 30.000,00, mas isso varia de acordo com a peculiaridade e situação de cada caso.

Não são raros os casos onde o comprador de imóvel na planta faz a aquisição almejando a constituição de família por conta de casamento marcado; por conta da vinda do primeiro filho ou do segundo; para sair do aluguel, etc. Ou seja, cada comprador tem uma história por trás da compra.

Evidentemente que quando os planos de vida das pessoas são frustrados por culpa da incorporadora, que não foi capaz de entregar o imóvel dentro do prazo que ela mesma estabeleceu em Contrato, isso afeta de sobremaneira o comprador, sendo nítido o estresse, o sentimento de frustração, de enganação e impotência, sendo tais elementos caracterizadores de indenização por danos morais.

Os julgados espalhados pelo Brasil nesse contexto mostram que não se faz necessária uma prova material para a existência do dano moral, entendendo-o como PRESUMÍVEL.

Também é absolutamente possível ao comprador solicitar numa ação de indenização por atraso a restituição dos valores pagos no início da aquisição e que foram destinados ao pagamento de supostas comissões de corretagem, além da taxa denominada SATI.

O prazo médio de julgamento de uma ação de indenização pode variar entre 10 a 18 meses.

Veja-se o seguinte quadro exemplificativo do que é possível solicitar em uma ação de indenização por atraso na entrega de imóvel na planta:

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Ação de Indenização por Danos Materiais e Morais

- Lucros cessantes em 0,8% sobre o valor de mercado do imóvel por cada mês de atraso

- Indenização por danos morais

- Restituição de aluguéis efetivamente pagos pelo comprador durante o período de atraso

- Restituição das comissões de corretagem

- Restituição da taxa SATI

- Restituição de taxa condominial (se o caso assim permitir)

Rescisão do Contrato:

Agora, para aquele comprador que não tem mais interesse na manutenção do negócio porque a vendedora atrasou a entrega além do permitido no Contrato, esse comprador também tem a possibilidade de buscar no Judiciário a rescisão do negócio e obter a restituição integral de todos os valores pagos.

Um dos maiores inconvenientes enfrentados pelo comprador de imóvel na planta diz respeito à rescisão ou distrato do Contrato de Promessa de Compra e Venda.

Normalmente o comprador entrou em contato com a incorporadora para expor sua situação e solicitar o distrato e a vendedora simplesmente afirma que de tudo o que ele pagou não devolve nada ou restitui apenas um percentual incompatível com a realidade, o que é ILEGAL, pois configura nítida tentativa de confisco de valores, expressamente proibido pelo Código de Defesa do Consumidor e demais dispositivos legais aplicáveis.

Quando a obra está atrasada por culpa exclusiva da vendedora (incorporadora/construtora), a restituição ao comprador deve ser integral: 100% de tudo o que foi pago, igualmente corrigido desde cada desembolso das parcelas e acrescido de juros legais de 1% ao mês, a partir da citação da incorporadora para responder a ação no Fórum.

Enquanto no Contrato o índice previsto para a correção monetária é o INCC, na ação judicial rescisão o índice de correção monetária é o do Tribunal de Justiça.

Rescisão judicial por vontade do comprador:

Quem adquire um imóvel não pretende desistir do negócio, porém, às vezes isso pode acontecer e por motivos diversos, sendo os mais comuns:

a) o aumento expressivo das parcelas a vencer, especialmente a parcela do saldo devedor que será objeto de futuro financiamento bancário, dando a impressão de que os valores já pagos em Contrato simplesmente não amortizaram absolutamente nada do preço do imóvel e o comprador, passados às vezes dois, três anos ou mais, deve à incorporadora mais do que quando comprou;

b) perda de emprego, motivo pelo qual o comprador não mais possui uma fonte de renda necessária à continuidade dos pagamentos perante a incorporadora; e

c) perda do interesse na continuidade da aquisição, pois a incorporadora vende a mesma unidade por preço idêntico ou menor do que aquele praticado para o comprador.

Esses são apenas alguns exemplos, ressaltando que a legislação brasileira não exige um motivo para que o comprador solicite o distrato ou rescisão do contrato pela via judicial.

Quando o ato de rescindir um contrato é do comprador, a incorporadora tem o direito assegurado pelo Judiciário em reter 10% dos valores pagos. Essa é a regra que há anos têm prevalecido na jurisprudência do Estado de São Paulo, acompanhada por outros Estados.

Em São Paulo, o Tribunal de Justiça emitiu a súmula nº 1 em Direito Imobiliário no ano de 2010, a qual determina que o comprador, mesmo inadimplente, tem o direito de pedir a rescisão do Contrato e reaver os valores pagos, sendo entendido pelos Juízes que o valor a ser restituído pela incorporadora deve corresponder a 90% das quantias pagas, com correção monetária desde cada um dos pagamentos (ou seja, a correção monetária é retroativa), através de índice próprio do Tribunal de Justiça de São Paulo e acrescido de juros legais de 1% ao mês, a partir da citação da incorporadora para responder a ação até a data do efetivo pagamento, seja ele através de eventual acordo ou pelo cumprimento da decisão judicial.

E em ambos os casos, isto é, seja a rescisão do contrato por ato do comprador ou por culpa exclusiva da incorporadora em caso de atraso na entrega, a restituição é à vista, não se sujeitando a parcelamento, ainda que isso possa estar especificado no Contrato.

Esse tipo de ação em REGRA não tem audiência.

O processo é totalmente digital e normalmente leva-se entre 06 a 12 meses para o julgamento.

E vale a dica: caso o comprador opte pelo distrato do contrato perante a incorporadora, é importante saber que não deve aceitar o valor oferecido, caso a proposta seja inferior a 90%, pois isso pode caracterizar um acordo extrajudicial e nesse cenário, o comprador não só fez um péssimo negócio, como também abriu mão do seu direito de recorrer ao Judiciário, a fim de reaver grande parte dos valores pagos, dependendo da situação em que esse distrato vier a ocorrer.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Ivan Mercadante Boscardin

OAB/SP 228.082Advogado especialista em Direito Imobiliário e Consumidor • São Paulo (SP). Advogado atuante há mais de dez anos no Estado de São Paulo Formado pela Universidade São Judas Tadeu Especialista em: Direito Civil com ênfase em Direito Empresarial (IASP) Direito Processual Civil (PUC SP) Direito Imobiliário e Registral (EPD) Arbitragem nacional e estrangeira (USA/UK) Autor do livro: Aspectos Gerais da Lei de Arbitragem no Brasil Idiomas: Português e Inglês. E-mail: [email protected]: www.mercadanteadvocacia.com - Telefones: 11-4123-0337 e 11-9.4190-3774 (cel. Vivo) - perfil também visualizado em: ivanmercadante.jusbrasil.com.br

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos