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A intimação do advogado constituído do réu nas decisões no processo penal

08/09/2015 às 09:22
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O artigo põe em discussão a intimação do advogado no processo penal. Como deve ser realizada para melhor atender aos interesses do réu?

I – A INTIMAÇÃO DA SENTENÇA AO RÉU NO PROCESSO PENAL. DISSONÂNCIA DA DOUTRINA

A intimação é a ciência dada à parte, no processo, da prática de um ato, despacho ou sentença.

Por sua vez, a notificação é a comunicação à parte ou a outra pessoa, do lugar, dia e hora de um ato processual a que deve comparecer.

O Supremo Tribunal Federal, ao editar a Súmula 710, deixou patente o entendimento de que, no processo penal, contam-se os prazos da intimação e não da juntada do mandado de intimação.

Voltemo-nos à intimação da sentença.

 A intimação da sentença ao  réu é regulamentada no artigo 392 do Código de Processo Penal, onde se prevê as hipóteses várias de ele estar preso, solto ou foragido, de ter advogado constituído ou dativo, de ser a infração afiançável ou não.

De toda sorte, há necessidade de intimação da sentença tanto ao réu preso como a seu defensor. Quando estiver o réu detido, o oficial de justiça deve levar o termo de recurso e o apresenta ao acusado, juntamente com a cópia da decisão. Exige-se que também o defensor seja intimado, para assegurar a ampla defesa.

No inciso I, há prescrição no sentido de que a intimação será feita ao réu, pessoalmente, se estiver preso. Aqui será feita, de forma inexorável, a intimação pessoal do réu, na comarca, por mandado, e, se estiver preso em local sujeito à jurisdição de outro juiz, por precatória.

O mesmo artigo 392 do Código de Processo Penal dispõe que a intimação da sentença será feita: "ao réu pessoalmente, ou ao defensor por ele constituído, quando se livrar solto, ou, sendo afiançável a infração, tiver prestado fiança" (inciso II). Ainda se dispõe que a intimação será feita ao defensor constituído pelo réu, se este, afiançável ou não a infração, expedido o mandado, não tiver sido encontrado, e assim certificar o oficial de justiça ( inciso III). Não sendo encontrado o defensor, a intimação é feita mediante edital (inciso V). Ainda é feita a intimação mediante edital, "se o réu, não tendo constituído defensor, não for encontrado, e assim o certificar o oficial de justiça" (inciso VI).

Seja como for, é indispensável a intimação do réu condenado e de seu defensor, sendo indiferente a ordem, em que são feitas as intimações, fluindo, porém, o prazo recursal da última realizada, como, de há muito, entendeu o Supremo Tribunal Federal.

Há entendimento de que, na intimação por carta precatória, o prazo do recurso conta-se da juntada aos autos da carta, devidamente cumprida. No entanto, advertem TÁVORA e ALENCAR que, caso feita tal intimação por carta precatória, considera-se efetuado o ato de comunicação com a efetiva intimação no juízo deprecado.

Tem-se que a intimação pessoal  do réu é providência indispensável que decorre da garantia constitucional da ampla defesa. Aliás, já decidiu o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (RJTJERGS 170/111) que há, na matéria, inaplicabilidade do parágrafo segundo do artigo 370 do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei 8.701, de 12 de setembro de 1993, uma vez que a intimação da sentença tem regramento próprio, do que se lê dos artigos 390 a 392 do Código de Processo Penal.

O que diz o parágrafo segundo do artigo 370 do Código de Processo Penal, que determina regras com relação a  intimações dos acusados, das testemunhas e demais pessoas que devam tomar conhecimento de qualquer ato, é o que segue:

"Caso não haja órgão de publicação dos atos judiciais na comarca, a intimação far-se-á diretamente pelo escrivão, por mandado, ou por via postal com comprovante de recebimento, ou por qualquer outro meio idôneo.".

 Em síntese na matéria, MIRABETE  diz que "não é admissível no processo penal a intimação da sentença por via postal com AR". Disse ainda ele que também desconhece a lei processual penal a intimação do defensor por publicação da imprensa quando se trata de julgamento de Primeiro Grau. No entanto, tratando-se de julgamento do Segundo Grau, a intimação do defensor será feita por Diário Oficial.

Em outra obra, MIRABETE repete tal ilação entendo que não é possível a intimação da sentença ao defensor por publicação da imprensa quando se trata de julgamento de primeira instância, não se aplicando o disposto no artigo 370, § 2º, do Código de Processo Penal, acrescido pela Lei 8.701, de 1º de setembro de 1993, que prevê a intimação pela imprensa, uma vez que a intimação da sentença é prevista em dispositivos especiais do Código de Processo Penal.

Na mesma linha tem-se OLIVEIRA, quando diz que o princípio constitucional da ampla defesa exige a intimação pessoal do acusado em qualquer hipótese, com que estaria revogado o disposto no inciso II do artigo 392 do Código de Processo Penal, que permite a intimação por intermédio do defensor.

Entende ainda OLIVEIRA que, pelas mesmas razões, a intimação deverá ser feita pessoalmente ao réu, ainda no caso do inciso III do artigo 386 do Código de Processo Penal, pelo que restaria inaplicável a restrição contida. Por fim, na hipótese de não ser encontrado o acusado, independentemente da natureza da infração e de se tratar, ou não, de defensor constituído, a intimação do réu deverá ser feita por meio de edital.

Na linha pensada, tem-se decisões do Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial 545.687/MG, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJU de 9 de dezembro de 2003, pág. 334, quando se disse da necessidade da intimação pessoal do réu e do defensor constituído em respeito ao disposto no artigo 392 do Código de Processo Penal. No mesmo sentido, entendendo haver nulidade, a nosso entender, absoluta, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do HC 17.255/SP, Relator Ministro Jorge Scartezzini, DJU de 18 de novembro de 2002, pág. 244, ao concluir que é fundamental a intimação pessoal do réu e de seu defensor da decisão condenatória de primeiro grau.

Diverge NUCCI, ao comentar o artigo 370 do Código de Processo Penal. Disse ele que "quando o advogado é contratado por parte interessada, seja esta o acusado, o querelante ou a vítima, funcionando como assistente, é natural que tenha a estrutura necessária para acompanhar as intimações por Diário Oficial.".

É certo que o nome do advogado deve constar de forma necessária da publicação, sob pena de nulidade.

NUCCI , ainda a comentar o artigo 392 do Código de Processo Penal, no que concerne a parte da intimação pessoal do  réu preso e seu defensor, conclui que é consequência natural do direito de autodefesa e da possibilidade que tem de recorrer diretamente, sem que seja por meio de sua defesa técnica. Aduz que exige-se que o defensor seja intimado, para assegurar a ampla defesa e que, conforme o caso, será intimado pela imprensa, se constituído, ou pessoalmente, se nomeado.

Não foi de outra forma, que NUCCI , ao examinar o artigo 421 do Código de Processo Penal, disse que a intimação da decisão de pronúncia, quanto ao defensor constituído (contratado pelo réu), ao querelante (por seu advogado) e ao assistente do Ministério Público (o advogado contratado pelo ofendido), pode-se fazer pela imprensa.

Por sua vez, BETANHO registrou que a intimação dos advogados constituídos vem sendo feita por publicação no órgão oficial, mas ainda em outro jornal incumbido da publicidade dos atos judiciais na Comarca.A matéria exige maiores divagações.

De um lado, há os que entendem que, em conformidade com o artigo 392 do Código de Processo Penal, deve o réu e seu defensor serem pessoalmente intimados da sentença condenatória, não se mostrando possível a intimação do advogado, seja ele constituído, público ou dativo, por publicação no Diário Oficial, pois não se aplicaria a regra do artigo 370 do mesmo diploma legal, que prevê a intimação pela imprensa, já que a intimação da sentença, em primeira instância, é regida por dispositivos especiais do Código de Processo Penal, sendo indispensável que conste de mandado o inteiro teor da sentença, não bastando a notícia da condenação.

De outra parte, na linha do disposto em decisão do Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial 249.687, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU de 1º de julho de 2002, pág. 411, diz-se que toda comunicação processual, quando destinada ao advogado constituído pela defesa, seja feita, salvo disposição expressa em contrário, pela publicação no Diário de Justiça.

Passo a colher a posição da jurisprudência.


II – O ENTENDIMENTO DA JURISPRUDÊNCIA COM RELAÇÃO A INTIMAÇÃO DO ADVOGADO DO RÉU PELA IMPRENSA

Em bem traçada síntese, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do HC 27.923, Relator Ministro Paulo Medina, DJU de 8 de setembro de 2003, pág. 370, deixou consignado que, nos termos do artigo 370 do Código de Processo Penal, apenas o defensor nomeado (o defensor público ou defensor dativo) tem a prerrogativa de intimação pessoal, enquanto os advogados constituídos devem ser intimados via imprensa oficial.

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No julgamento do HC 26.759 – SP, Relator Ministro Felix Fischer, concluiu o Superior Tribunal de Justiça que não há que se falar em falta de intimação da defesa com relação a sentença proferida, sendo certo que o defensor constituído não goza da prerrogativa da intimação pessoal, peculiar aos defensores públicos ou dativos, mas apenas deve ser intimado pela imprensa, como se lê do artigo 370, § 1º, do Código de Processo Penal.

No entanto, data vênia, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do HC 13.026/SC, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJU de 6 de novembro de 2000, dá a orientação de que o artigo 392, II, do Código de Processo Penal, que determina a intimação da sentença será feita pessoalmente ao réu ou ao seu defensor constituído, somente é aplicável em primeiro grau de jurisdição. Em se tratando de acórdão proferido pelo órgão de segundo grau, no exercício da competência recursal, basta a publicação de sua conclusão no órgão oficial.

A ausência de intimação pessoal do defensor dativo para a sessão de julgamento de recurso de apelação é causa de nulidade absoluta, por cerceamento de defesa, como se lê do HC 72.531/SP, Relator Ministro Arnaldo Esteves, julgado em 28 de maio de 2007. Há, com a falta de intimação do advogado, um cerceamento ao contraditório, razão pela qual há a nulidade.

Aliás, recentemente, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) anulou, na sessão do dia 25 de agosto de 2015, o julgamento da Extradição (EXT) 1388, ocorrido em 23 de junho passado, quando o colegiado deferiu a extradição do cidadão Kelly Freese para os Estados Unidos, onde é procurado para ir a julgamento perante o Tribunal Distrital dos Estados Unidos para o Distrito Norte de Iowa, por fraude bancária e por declaração falsa a banco.

De acordo com a relatora do processo, ministra Cármen Lúcia, a defesa de Kelly Freese apresentou embargos de declaração argumentando que houve uma modificação da representação do acusado, devidamente informada, mas que não foi incluída no processo, frustrando a intimação do novo advogado constituído, que pretendia fazer sustentação oral no dia do julgamento.

  É cediça a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, confirmada no julgamento do HC 216.993/PI, 8 de novembro de 2011, onde se conclui que ao réu que se livra solto, não é necessária a intimação pessoal da sentença condenatória, bastando que seu defensor constituído seja intimado pessoalmente.

A Desembargadora Jane Silva, no julgamento da Apelação Criminal n. 1.0686.03.086820-8/001, pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, julgada em 31 de agosto de 2004, publicada no Diário do Judiciário de 5 de novembro daquele ano, apresenta conclusão que sedimenta o pensamento pela intimação do advogado pela imprensa:

"Hoje se considera que a intimação deva ser feita pessoalmente ao réu e ao seu advogado (podendo o último ser intimado pela imprensa oficial se houver), contando-se o quinqüídio legal a partir da última intimação, quer ela tenha sido feita a um ou outro."

Quanto ao defensor dativo equipara-se ele ao defensor público, devendo ser intimado pessoalmente dos atos processuais sob pena de nulidade absoluta, em agressão ao princípio da plenitude da defesa.

A matéria, portanto, é polêmica, seja em sede doutrinária ou jurisprudencial. No entanto, há largos argumentos para o entendimento de que a intimação por sentença ao advogado constituído é razoável e proporcional, numa devida adequação de meios e fins, desde que realizada com a devida publicidade e nos limites de meios e fins exigidos. A razoabilidade como dever de harmonização do geral com o individual atua como instrumento para determinar que as circunstâncias de fato devem ser consideradas com a presunção de estarem dentro de um patamar de normalidade. Ao determinar um certo suporte empírico serve como relação congruente das normas com suas condições externas de aplicação, levando em conta  critério de diferenciação (réu/advogado; advogado/defensor constituído ou defensor público), havendo lógica na adoção dessa solução da intimação pela imprensa como forma de dar ciência ao advogado privado na defesa dos interesses dos réus, reconhecendo que ele deve ter a necessária estrutura para acompanhar, diariamente, pela imprensa oficial, o seguimento de seus processos. 

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. A intimação do advogado constituído do réu nas decisões no processo penal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4451, 8 set. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/42234. Acesso em: 28 mar. 2024.

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