Armas de pressão e a legislação brasileira atual

17/07/2017 às 08:37
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Este artigo abordará os aspectos da Lei 10.826/03, a sua regulamentação através do decreto 3.665/00 e portarias no que tange às armas de pressão, bem como a impossibilidade de tipificação do crime de contrabando.

RESUMO: Este artigo abordará os aspectos da Lei 10.826/03, a sua regulamentação através do decreto 3.665/00 e portarias no que tange às armas de pressão, bem como a impossibilidade de tipificação do crime de contrabando.

SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO 2. DAS ARMAS DE PRESSÃO E O DECRETO 3.665/00 3. DO DESEMBARAÇO ALFANDEGÁRIO DAS ARMAS E MUNIÇÕES TRAZIDAS COMO BAGAGEM ACOMPANHADA 4. DA IMPORTAÇÃO DE ARMAS DE AR 5. DAS PORTARIAS NÚMEROS 036/1999, 006/2007 E 056/2017 DO MINISTÉRIO DA DEFESA 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS 7. REFERÊNCIAS

PALAVRAS CHAVE: armas de pressão, arma de ar comprimido, decreto 3.665/00, contrabando, descaminho.

1. INTRODUÇÃO

O Estatuto do Desarmamento previsto na Lei 10.826/03, foi um grande avanço para o ordenamento jurídico brasileiro, tendo em vista diminuição significativa da quantidade de armas território brasileiro, o desarmamento a população e o recolhimento e registro de todas as armas de fogo no Brasil.

Outro ponto que deve ser levado em consideração, foi o caráter democrático que essa lei trouxe. Isso porque, o seu art. 35 definiu que seria proibida a comercialização de armas de fogo e munição em todo o território nacional desde que houvesse a aprovação desse artigo por referendo popular (art. 35, §2º). Nesse sentido, após o referendo popular autorizado pelo Congresso Nacional e realizado no dia 25 de outubro de 2005, a população brasileira decidiu pela não proibição das armas de fogo no território brasileiro.

O Estatuto do desarmamento foi regulamentado pelos decretos 3.665/00, as portarias 002, 036 e a recente portaria nº 56 - COLOG, de 5 de junho de 2017 que, no que tange às armas de pressão, determina que as inferiores que 6 mm são de uso permitido e sua compra e importação independem de autorização do Exército.

Desta forma, deve ser entendido que não há que se falar em crime de contrabando ao se importar tais armas de pressão. Ocorre que esse entendimento vai de encontro ao que decidiu a 6ª Turma do STJ no REsp 1.427.796-RS,  da relatoria da Min. Maria Thereza De Assis Moura, julgado em 14/10/2014.

2. DAS ARMAS DE PRESSÃO E O DECRETO 3.665/00

Com relação às armas de pressão, tanto de mola quanto de ar comprimido, essas são regulamentadas pelo decreto 3.665/00 que é relativo à fiscalização de produtos controlados.

Assim, em seu artigo 3º, XV, estabeleceu-se que as armas de pressão são:

XV - arma de pressão: arma cujo princípio de funcionamento implica o emprego de gases comprimidos para impulsão do projétil, os quais podem estar previamente armazenados em um reservatório ou ser produzidos por ação de um mecanismo, tal como um êmbolo solidário a uma mola, no momento do disparo.

Esse decreto também conceitua quais são as armas de pressão proibidas e permitidas, sendo nessa seara considerado o calibre seis milímetros o limite para que sejam elas permitidas e, acima disso, será considerada proibida de acordo com o art. 16, VIII c/c 17, IV do decreto.

Desta forma, de acordo com a regulamentação do decreto, as armas de pressão com calibre inferior a seis milímetros são itens controlados pelo Exército Brasileiro e, ainda, para a liberação na saída da fábrica ou por ocasião do desembaraço alfandegário, é necessário Guia de Tráfego.

Ademais, a importação da arma de pressão só é possível para empresas e pessoas físicas registradas no Exército através de processo de importação completo. Não há a possibilidade de comprar no exterior, em países onde a venda não seja controlada e tentar entrar no território nacional, isso porque, poderá haver sua apreensão e impossibilidade de recuperação.

O proprietário da arma de ar comprimido pode transportá-la em território nacional, de forma que não exposta, conjuntamente com a documentação que faça prova de sua propriedade.

O decreto também dispõe que a remessa por correios também é permitida com restrições, isto é, a arma classificada como permitida deve ser acompanhada da respectiva nota fiscal emitida pelo remetente, e totalmente preenchida em nome do destinatário. Caso haja envio entre pessoas naturais, é necessária uma declaração emitida pelo delegado local do SFPC.

3. DO DESEMBARAÇO ALFANDEGÁRIO DAS ARMAS E MUNIÇÕES TRAZIDAS COMO BAGAGEM ACOMPANHADA

De acordo com o art. 218, §1º do Decreto 3.665/00, os viajantes, brasileiros ou não, que chegarem no país trazendo armas e munições, inclusive armas de pressão a gás, são obrigados a apresentá-las às autoridades alfandegárias, ficando retidas nas repartições fiscais, mediante a lavratura do termo competente. No entanto, o §1º do mesmo artigo, exige-se o requerimento do respectivo CII, excepcionando tal necessidade para o caso de armas de pressão de uso permitido, assim lhe dispensando a apresentação do CII, como determina literalmente:

Art. 218. Os viajantes brasileiros ou estrangeiros que chegarem ao país trazendo armas e munições, inclusive armas de porte e armas de pressão a gás ou por ação de mola, são obrigados a apresentá-las às autoridades alfandegárias, ficando retidas nas repartições fiscais, mediante lavratura do competente termo, sem prejuízo do desembaraço do restante da bagagem.

 § 1º Os interessados devem, a seguir, dirigir requerimento, Anexo XXXVII, em duas vias, ao Comandante da RM, solicitando o desembaraço alfandegário das armas e munições, apresentando o passaporte no ato, como comprovante da viagem efetuada, e o respectivo CII, obtido previamente, exceto para armas de pressão de uso permitido, adotando-se, para os viajantes estrangeiros, o mesmo procedimento, dispensando-se a apresentação do CII. (grifo nosso)

4. DA IMPORTAÇÃO DE ARMAS DE AR

A importação das armas de pressão é tratada diferentemente dos casos em que as mesmas seriam importadas através de bagagem acompanhada. 

Assim, no casos de importação, definidos pelo art. 183 do decreto 3.665/00 há a entrada tão somente da arma de pressão sem o acompanhamento do proprietário, já os casos descritos no art. 218 do mesmo decreto, são hipóteses em que o proprietário entra no território nacional juntamente com a mercadoria. Portanto, a diferença entre as duas hipóteses é tão somente a entrada em território nacional do proprietário juntamente com a arma de pressão ou não.

Além disso, o decreto 3.665/00 dispõe no seu art. 183 que nos casos de importação de armas de pressão, diferentemente do que ocorre nos casos de entrada da mercadorias trazidas por bagagem acompanhada, exige-se a licença previa do Exército, após julgar sua conveniência, dessa forma:

Art. 183. As importações de produtos controlados estão sujeitas à licença prévia do Exército, após julgar sua conveniência.

5. DAS PORTARIAS NÚMEROS 036/1999, 006/2007 E 056/2017 DO MINISTÉRIO DA DEFESA

Originariamente a portaria nº 036/1999 do Ministério da Defesa definiu o que seriam as armas de pressão e estabeleceu que diferenciação de idade para a compra de armas de pressão por mola ou gás comprimido. Tinha-se como idade mínima para a as armas de pressão por mola, 18 anos e, para as de gás comprimido, 21 anos, desde que fossem de calibre menor ou igual a 6 mm, podendo nesses casos ser vendidas em comércio não especializado, nesta forma:

Art. 16. As armas de pressão, por ação de mola ou gás comprimido, não são armas de fogo, atiram setas metálicas, balins ou grãos de chumbo, com energia muito menor do que uma arma de fogo.

Art. 17. As armas de pressão por ação de mola, com calibre menor ou igual a 6 (seis) mm, podem ser vendidas pelo comércio não especializado, sem limites de quantidade, para maiores de 18 (dezoito) anos, cabendo ao comerciante a responsabilidade de comprovar a idade do comprador e manter registro da venda.

Art. 18. As armas de pressão por ação de gás comprimido, com calibre menor ou igual a 6 (seis) mm, só podem ser vendidas em lojas de armas e munições, sem limites de quantidade, para maiores de 21 (vinte e um) anos, cabendo ao comerciante a responsabilidade de comprovar a idade do comprador e manter registro da venda.

No entanto, posteriormente foi editada a portaria nº 006/2007 do Ministério da Defesa que revogou os artigos 17 e 18 da portaria anterior, bem como estabeleceu critérios mais rigorosos na regulamentação da fabricação, comercialização e importação de armas de pressão. 

Assim, definiu-se no art. 9º que a fabricação de armas de pressão por ação de gás comprimido ou por ação de mola ficaria condicionada a autorização do Comando do Exercito.

Art. 9°. A fabricação de armas de pressão por ação de gás comprimido ou por ação de mola fica condicionada a autorização do Comando do Exercito, nos termos do art. 42 do R-105.

Já no seu art. 11, §§ 2º e 3º, definiu-se a aquisição de armas de pressão diretamente do fabricante nacional ou por importação estaria sujeita a autorização prévia, bem como, seria deferida apenas para colecionadores, atiradores e caçadores registrados no Exército.

Art. 11, § 2° A aquisição de armas de pressão diretamente do fabricante nacional ou por importação está sujeita a autorização previa da DFPC.

No presente ano de 2017, foi editada a portaria, de número 056, também do Ministério da Defesa em que exigiu no art. 2º o requisito de registro no exercício de qualquer atividade com o produto controlado pelo Exército (PCE) e no art. 3º, definiu quais seriam as atividades com PCE:

Art. 2º Para o exercício de qualquer atividade com Produto Controlado pelo Exército (PCE), própria ou terceirizada, as pessoas físicas ou jurídicas devem ser registradas no Exército.

Art. 3º As atividades com PCE são a fabricação, o comércio, a importação, a exportação, a utilização e a prestação de serviços, o colecionamento, o tiro desportivo e a caça.

No entanto, o §2º do art. 2, excepcionou o registro para as armas de pressão, como se demonstra:

Art. 2º, §2º Ficam dispensadas, ainda, do registro de que trata o caput as pessoas físicas, quando a atividade for utilização de armas de pressão ou fogos de artifício. (grifo nosso)

Desta forma, atualmente, diante dessa inovação ocasionada pela portaria 056/2017, não há mais que se falar em exigência de registro para a utilização de armas de pressão.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto no presente artigo, conclui-se que atualmente mostra-se dispensável qualquer registro no Exército para as atividades de fabricação, comércio, importação, exportação, utilização e prestação de serviços, colecionamento, tiro desportivo e caça quando se tratar de armas de pressão de acordo com a portaria 056/2017 do Ministério da Defesa.

Desta forma, diferentemente do que entendeu o Superior Tribunal de Justiça na decisão da 6ª Turma que se colaciona abaixo. Isso porque tal decisão se baseou na portaria 002/2010 que exigia a autorização prévia para fins de importação de armas de ar. No entanto, com o advento da portaria 056/2017, tal exigência foi suprimida e, assim não há que se falar em contrabando tendo em vista a desnecessidade de autorização prévia do Exército para a importação de armas de pressão e, portanto, não se trata de produto ilegal ou ilícito:

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Configura contrabando (e não descaminho) a conduta de importar, à margem da disciplina legal, arma de pressão por ação de gás comprimido ou por ação de mola, ainda que se trate de artefato de calibre inferior a 6 mm. A importação de arma de pressão está sujeita à autorização prévia da Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército Brasileiro, e só pode ser feita por colecionadores, atiradores e caçadores registrados no Exército. Além disso, devem se submeter às normas de desembaraço alfandegário previstas no Regulamento para a Fiscalização de Produtos Controlados. Logo, trata-se de mercadoria de proibição relativa, sendo a sua importação fiscalizada não apenas por questões de ordem tributária, mas outros interesses ligados à segurança pública. STJ. 6ª Turma. REsp 1.427.796-RS, Rel. Min. Maria Thereza De Assis Moura, julgado em 14/10/2014

Houve, portanto, diante a edição da portaria 056/2017, verdadeiro abolitio criminis nos casos de condenação pelo crime de contrabando por importação de armas de pressão.

7. REFERÊNCIAS:

BRASIL. Decreto nº 3.665, de 20 de novembro de 2000. Dá nova redação ao Regulamento para a Fiscalização de Produtos Controlados (R-105). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3665.htm. Acessado em: 10 de junho de 2017. 

BRASIL. Lei n°10.826, de 22 de dezembro de 2013. Dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição, sobre o Sistema Nacional de Armas – Sinarm, define crimes e dá outras providências. Brasília, 2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.826.htm. Acessado em: 10 de julho de 2017.

BRASIL. Portaria n°02 – COLOG, de 26 de fevereiro de 2010. Regulamenta o art. 26 da Lei n° 10.826/03 e o art.50, IV, do Decreto n° 5.123/04 sobre réplicas e simulacros de arma de fogo e armas de pressão, e dá outras providências. Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/59174583/Port-N%C2%BA-02-COLOG-de-26-fevereiro-de-2010#scribd. Acessado em: 10 de julho de 2017.

BRASIL. PORTARIA No 036-DMB, DE 09 DE DEZEMBRO DE 1999. Aprova as normas que regulam o comércio de armas e munições. Disponível em: http://www.mariz.eti.br/portaria_36_DMB.htm. Acessado em: 10 de julho de 2017.

BRASIL. PORTARIA Nº 56 - COLOG, DE 5 DE JUNHO DE 2017. Dispõe sobre procedimentos administrativos para a concessão, a revalidação, o apostilamento e o cancelamento de registro no Exército para o exercício de atividades com produtos controlados e dá outras providências.Disponível em: http://www.dfpc.eb.mil.br/index.php/publicacoes/category/89-comando-logisgico-colog?download=598:portaria-n-56-colog-de-05-de-junho-de-2017&start=120. Acessado em: 10 de julho de 2017.

BRASIL. PORTARIA N° 006 - D LOG, DE -29 DE NOVEMBRO DE 2007. Regulamenta o art. 26 da Lei n° 10.826/03, sobre réplicas e simulacros de arma de logo e armas de pressão, e dá outras providências. Disponível em: http://www.mariz.eti.br/Port_06_07_DLog%20_%20pressao.pdf. Acessado em: 10 de julho de 2015.

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