Capa da publicação Adicional de insalubridade em grau máximo ao servidor público lotado em UTI
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Do direito ao adicional de insalubridade em grau máximo pelos servidores públicos lotados em UTIs

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O profissional lotado em UTI que acolhe pacientes com doenças infectocontagiosas possui contato habitual, rotineiro, frequente e permanente com agentes biológicos causadores de tais doenças infectocontagiosas – o que justifica a percepção do adicional de insalubridade em grau máximo.

O adicional de insalubridade tem por objetivo compensar o trabalho realizado habitualmente em situação de potencial prejuízo à saúde, mediante pagamento de verba suplementar.  Possui previsão constitucional e fundamento no princípio da dignidade humana (arts. 7º, XXIII[1], e 1º, III[2], da CF).

Os servidores submetidos a ambientes de trabalho insalubres fazem jus ao adicional de insalubridade (arts. 68 a 70 da Lei nº 8.112/90), cujo percentual dependerá do grau de exposição. O servidor público federal que desenvolve suas atividades em UTI’s-Gerais que recebem pacientes com doenças infectocontagiosas pode ter direito ao adicional de insalubridade em grau máximo. Tais profissionais de saúde se expõem, com habitualidade, a condições de trabalho gravemente adversas à saúde, justificando a majoração do adicional de insalubridade quando pago em patamar inferior. 

O adicional é devido enquanto houver riscos de vida ao servidor em atividade, pois “é retribuição paga em decorrência das condições anormais em que o serviço é prestado[3]. Se o servidor deixar de trabalhar em local considerado insalubre, passando para outro em condições que não justifiquem a percepção do adicional, este deixa de ser merecido.  Isso “por serem vantagens econômicas intimimamente relacionadas às condições especiais de trabalho, os adicionais em comento cessam imediatamente com o desaparecimento da respectiva situação fática que gerou o seu pagamento ao servidor”.[4]   

Nos casos de lactação e gestação, a servidora deve ser afastada das condições insalubres (assim como das penosas e perigosas)[5] para proteger a vida e saúde da criança (art. 69 da Lei nº 8.112/90), quando o respectivo adicional não será devido[6].   

As atividades consideradas insalubres constam do rol dos Anexos da Norma Regulamentadora nº 15 (NR 15) da Portaria do Ministério do Trabalho e Emprego nº 3.214/78, também aplicável aos servidores públicos.  Por sua vez, os anexos da Norma Regulamentadora nº 12 (NR 12) da Portaria MTE n.º 485/2005 trazem a probabilidade da exposição ocupacional a agentes biológicos (risco biológico) com as diretrizes para segurança e saúde dos trabalhadores dos serviços de saúde.            Agentes biológicos são os microorganimos (geneticamente modificados ou não), as culturas de células, os parasitas, as toxinas e os príons (item 32.2.1.1 da NR nº 12).

Por Unidade de Terapia Intensiva (UTI) entende-se a “unidade destinada à internação de pacientes graves, que requerem atenção profissional especializada contínua, materiais específicos e tecnologias necessárias ao diagnóstico, monitorização e terapia”[7]. A UTI-Adulto recebe pacientes a partir dos 14 ou 18 anos, conforme normas do hospital.  

Na unidade hospitalar, pode haver uma UTI exclusiva para pacientes a depender da enfermidade (v.g., as UTI Coronarianas, UTI Neurológica e de Doenças Infectocontagiosas). A UTI Geral (não especializada) volta-se aos demais casos. Contudo, há hospitais federais sem UTI Específica para pacientes portadores de doenças infectocontagiosas, nos quais pacientes internados com doenças infectocontagiosas em estado mais grave são encaminhados para a UTI-Geral, sobretudo na piora do quadro clínico. Ante a ausência de UTI específica para pacientes com doenças infectocontagiosas, os profissionais da UTI-Geral se responsabilizam pelo acompanhamento médico na fase crítica de internação.

Portanto, o profissional lotado em UTI que acolhe pacientes com doenças infectocontagiosas possui contato habitual, rotineiro, frequente e permanente com agentes biológicos causadores de tais doenças infectocontagiosas – o que justifica a percepção do adicional de insalubridade em grau máximo.  Para concessão de adicional de insalubridade em grau máximo, cabe ser constatado o contato habitual e permanente em UTI com agentes insalubres, acrescido de uma rotina de procedimentos invasivos nos cuidados com pacientes internados com doenças infectocontagiosas.

A flora bacteriana do ambiente da UTI é diferenciada, pois se administra antibióticos potentes em pacientes graves, selecionando-se cepas mais resistentes. Em consequência, tais superbactérias com frequência colonizam a pele e narinas dos profissionais de saúde. Ademais, os pacientes com doenças infectocontagiosas internados na UTI-Geral passam rotineiramente por procedimentos invasivos com alto risco de contaminação (como entubação orotraqueal, punções de vasos profundos para acesso vascular e manobras de reanimação cardiorespiratória), colocando a equipe médica em elevado risco, especialmente na ausência de Equipamentos de Proteção Individual (EPI), o que torna ainda mais grave a exposição direta às patologias infectocontagiosas dos pacientes internados na UTI.

Destaque-se que o recebimento do adicional de insalubridade em grau máximo pelos profissionais da UTI-Geral revela-se merecido, por equiparação, se tal patamar já for percebido pelos profissionais que atuam em Setor específico de Doenças InfectoParasitárias, vez que os doentes mais graves acometidos de patologias infectocontagiosas são internados na UTI-Geral (se inexistente UTI específica para tais casos).

A NR -15, aprovada pela Portaria MTB nº 3.214/78, em seu Anexo 14, sobre os graus de insalubridade envolvendo agentes biológicos, prescreve a concessão do adicional em grau máximo (20%) no trabalho com pacientes em isolamento por doenças infectocontagiosas, bem como com objetos de seu uso, não previamente esterilizados – caso do trabalho exercido pelos profissionais de saúde que atuam nas UTI’s Gerais que recebem rotineiramente pacientes com doenças infectocontagiosas, demonstrando a habitualidade desse contato.

Julgados recentes do Tribunal Regional Federal da 5ª Região são nesse sentido:

(...)LOTAÇÃO NA UTI DE HOSPITAL UNIVERSITÁRIO. CONTATO COM PORTADORES DE DOENÇAS INFECTOCONTAGIOSAS. GRAU DE INSALUBRIDADE MÁXIMO. DIREITO.

1 - Apelação em face da sentença que julgou improcedente o pedido de profissional de saúde que visa provimento jurisdicional para assegurar seu direito à percepção do adicional de insalubridade em grau máximo (20%).

2 - O servidor público tem direito à percepção do Adicional de Insalubridade, nos percentuais de cinco, dez ou vinte por cento, de acordo com o grau mínimo, médio ou máximo, desde que trabalhem com habitualidade em locais insalubres ou em contato permanente com substâncias perigosas e nocivas à saúde (arts. 68 a 70 da Lei nº 8.112/90).

3 - Não se nega que os profissionais de hospitais estão diariamente expostos ao risco de contágio, haja vista o frequente manuseio de instrumentos e materiais potencialmente infectados e o convívio com pessoas enfermas, entretanto, inequívoco que o risco de contaminação é infinitamente maior para aqueles que se expõem a contato permanente com pacientes em isolamento por doenças infectocontagiosas, bem como a objetos de seu uso.

4 - A NR -15, aprovada pela Portaria MTB nº 3.214/78, em seu Anexo 14, que dispõe sobre os graus de insalubridade envolvendo agentes biológicos, prevê o grau máximo para o trabalho com pacientes em isolamento por doenças infectocontagiosas, bem como com objetos de seu uso, não previamente esterilizados.

5 - Na hipótese, a autora/servidora ocupa o cargo de Técnica de Enfermagem, em Unidade de Terapia Intensiva - UTI - do Hospital Universitário Lauro Wanderley, e,  conforme informação da Chefia do Serviço de Enfermagem de Terapia Intensiva e Chefia do Serviço Médico de Terapia Intensiva da UFPB os servidores daquele Setor estão em contato permanente com pacientes portadores de doenças infectocontagiosas, a saber: meningite, dengue hemorrágica, hepatite, leptospirose, HIV, tuberculose, tétano, encefalomielite, varicela, leishmaniose, gripe A e pneumocitose.

6 - Constatando-se que os elementos constantes dos autos demonstram, com clareza, que a insalubridade a que a demandante está exposta enquadra-se no grau máximo, é de reconhecer o seu direito à majoração/diferença do adicional de insalubridade de 10% (dez por cento) para 20% (vinte por cento) do vencimento básico, a partir de sua lotação na Unidade de Terapia Intensiva - UTI, com as repercussões dai advindas, respeitada à prescrição quinquenal.  7 - Apelação provida. (Proc. 08016774020134058200, AC/PB, Desemb. Fed. Rubens de Mendonça Canuto, 4ª Turma, j. 28/04/2017)

(...) UFPB. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. GRAU MÁXIMO. CONTATO COM DOENÇAS INFECTOCONTAGIOSAS. CABIMENTO. (...)

(...) 4. A Autora ocupa o cargo de Técnico em Enfermagem da UFPB, está lotada na UTI do Hospital Universitário Lauro Wanderley e percebe Adicional de Insalubridade em grau médio correspondente a 10% do Vencimento Básico.

(...)7. O Ofício nº 04/2009 da Chefia do Serviço de Enfermagem de Terapia Intensiva e Chefia do Serviço Médico de Terapia Intensiva da UFPB informa que os Servidores que trabalham na UTI do Hospital Universitário Lauro Wanderley estão em contato permanente com pacientes portadores de doenças infectocontagiosas.  O Oficio está instruído com relação exemplificativa de pacientes da UTI, que são portadores de meningite, dengue hemorrágica, hepatite, leptospirose, HIV, tuberculose, tétano, encefalomielite, varicela, leishimaniose, gripe A e pneumositose.

8. O contato permanente com pacientes portadores de doenças infecto-contagiosas enseja o direito à vantagem no grau máximo de 20%.  9. Desse modo, a Autora faz jus à percepção do Adicional de Insalubridade no grau máximo correspondente a 20% do Vencimento Básico. (...) (Proc. 08013811820134058200, APELREEX/PB, Desemb. Fed. José Maria Lucena, 1ª Turma, j.09/04/2015)

(...) LOTAÇÃO NA UTI DE HOSPITAL UNIVERSITÁRIO. CONTATO COM PORTADORES DE DOENÇAS INFECTOCONTAGIOSAS. GRAU DE INSALUBRIDADE MÁXIMO. DIREITO.

1. Nos termos do art. 12, caput e inciso I, da Lei nº 8.270/91, em sua redação original, o servidor público tem direito à percepção do adicional de insalubridade, nos percentuais de cinco, dez ou vinte por cento, de acordo com o grau mínimo, médio ou máximo, nos moldes das normas legais e regulamentares pertinentes aos trabalhadores em geral.

2. A NR - 15, aprovada pela Portaria MTB nº 3.214/78, em seu Anexo 14, que dispõe sobre os graus de insalubridade envolvendo agentes biológicos, prevê o grau máximo para o trabalho com pacientes em isolamento por doenças infectocontagiosas, bem como com objetos de seu uso, não previamente esterilizados.

3. Hipótese em que um levantamento estatístico demonstrou que a UTI do Hospital Universitário Lauro Wanderley (UFPB) recebe mensalmente vários pacientes graves acometidos por doenças infectocontagiosas, de modo que resta demonstrado o contato habitual da autora com os portadores de tais patologias, o que foi corroborado por parecer da Coordenadora do CCIH da UFPB, fazendo jus, portanto, a demandante, ao adicional de insalubridade no grau máximo de 20%. Precedente desta Turma: PJE: 08013266720134058200, AC/PB, Des. Fed. Geraldo Apoliano, 3ª Turma, j. 23/10/2014.  4. Apelação e remessa oficial não providas. (Proc. 08011249020134058200, APELREEX/PB, Desemb. Fed. Gustavo De Paiva Gadelha (CONVOCADO), 3ª Turma, j 05/02/2015)

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Pelo exposto, mostra-se devido o adicional de insalubridade em grau máximo ao servidor que trabalhe em UTI-Geral, na ausência de UTI específica para recebimento de pacientes com doenças infectocontagiosas. Isso porque são encaminhados às UTI’s Gerais os pacientes em situação mais crítica rotineiramente submetidos a procedimentos invasivos com alto risco de contaminação aos profissionais de saúde envolvidos, tornando o contato com as condições insalubres efetivamente habitual.  Esse direito se apresenta ainda mais evidente, por equiparação, se houver setor especifico no hospital que trate de doenças infectocontagiosas recebendo o adicional em grau máximo, mas sem UTI específica para tais casos.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAVALCANTE FILHO, João Trindade. Servidor Público: Regime Jurídico dos Servidores Públicos Federais - Lei nº 8.112/1990. 2ª Ed., Editora JusPodivm, 2010.

CÉSAR, Leandro Castella. Adicional de insalubridade. A base de cálculo do adicional de insalubridade e suas controvérsias dentro do ordenamento jurídico brasileiro. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/49750/adicional-de-insalubridade>. Acesso em 07 de junho de 2017.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 25ª Ed., São Paulo, Editora Atlas, 2012.

DO NASCIMENTO, Elysley Silva. Lei nº 8.112/1990: Estatuto dos Servidores Públicos Federais, 3ª Ed., Editora Impetus, 2014.

RECOMENDAÇÕES OMS RELATIVAS À AMAMENTAÇÃO.  <http://www.leitematerno.org/oms.htm>. Acesso em 07 de julho de 2017.

REGULAMENTO TÉCNICO PARA FUNCIONAMENTO DE UNIDADES DE TERAPIA INTENSIVA - AMIB - Associação de Medicina Intensiva Brasileira. Disponível em <http://www.amib.org.br/fileadmin/RecomendacoesAMIB.pdf> . Acesso em 07 de julho de 2017.


[1]Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:  XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei;

[2] Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III - a dignidade da pessoa humana;

[3]DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 25ª Ed., São Paulo, Editora Atlas, 2012, p. 664.

[4] DO NASCIMENTO, Elysley Silva. Lei nº 8.112/1990: Estatuto dos Servidores Públicos Federais, 3ª Ed., Editora Impetus, 2014,p. 149.

[5] Art 69, parágrafo único.  A servidora gestante ou lactante será afastada, enquanto durar a gestação e a lactação, das operações e locais previstos neste artigo, exercendo suas atividades em local salubre e em serviço não penoso e não perigoso.

[6] O tempo de amamentação não impõe ser limitado pelo empregador. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), “As crianças devem continuar a ser amamentadas, pelo menos, até completarem os 2 anos de idade”. Dessarte, não existe um tempo máximo para a continuidade da lactação, mas sim uma estimativa mínima. Recomendações OMS Relativas à Amamentação.  <http://www.leitematerno.org/oms.htm>. Acesso em 07 de julho de 2017.

[7] REGULAMENTO TÉCNICO PARA FUNCIONAMENTO DE UNIDADES DE TERAPIA INTENSIVA - AMIB - Associação de Medicina Intensiva Brasileira. Disponível em <http://www.amib.org.br/fileadmin/RecomendacoesAMIB.pdf> . Acesso em 07 de julho de 2017.

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Sobre a autora
Ana Carolina de Araújo Dantas Loureiro

Advogada - Pós-Graduada em Direito Público

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOUREIRO, Ana Carolina Araújo Dantas. Do direito ao adicional de insalubridade em grau máximo pelos servidores públicos lotados em UTIs. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5186, 12 set. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/59817. Acesso em: 28 mar. 2024.

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