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A mediação no âmbito do direito das famílias

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29/01/2018 às 15:00
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Os conflitos no direito de família trazem consigo mágoas que vão muito além das questões patrimoniais. A intenção da mediação é fazer com que essas feridas não interfiram nas importantes decisões que envolvem uma ação de família, em especial, as que envolvam os filhos.

Mediação 

A mediação de conflitos deriva do pensamento segundo o qual um terceiro é necessário para a solução de um determinado conflito entre as pessoas. O envolvimento desse terceiro pode acontecer de formas diferentes, desde uma maneira mais intrusiva, até uma maneira mais simples. Para diferenciação e conhecimento, listamos as vias possíveis de solução de conflitos, compiladas pela advogada especializada em soluções alternativas, Gabriela Assmar (s.d.):

  1. Via judicial: o juiz aplica a lei à lide. Ele decide e impõe sua decisão às partes. Uma vez acionado o poder judiciário, as partes não têm qualquer controle sobre a solução;
  2. Arbitragem: o árbitro decide e impõe sua decisão às partes, dentro do escopo da questão que lhe foi submetida. O processo é mais flexível (adaptável ao caso) que no judiciário, e são as partes que escolhem o árbitro de comum acordo. Uma vez delimitado o escopo da arbitragem e delegada a jurisdição, as partes não têm qualquer controle sobre a decisão;
  3. Conciliação:  o conciliador conduz as partes na análise de seus direitos e deveres legais, buscando um acordo. As partes é que decidem os termos do acordo, mas o conciliador pode fazer sugestões e opinar quanto ao mérito da questão. O objetivo da conciliação é o acordo;
  4. Mediação: o mediador facilita o diálogo entre as partes, em ambiente de confidencialidade. O mediador busca o entendimento das partes, pelas próprias partes. Ele não deverá opinar sobre o mérito da questão, e mesmo quando faça sugestões (a pedido das partes) deverá fazê-lo de forma não tendenciosa. As partes devem perceber-se como coautoras da solução. O objetivo da mediação é a pacificação das partes (tanto para resolver os conflitos atuais quanto para evitar futuros conflitos, buscando preservar as relações e a autoria das soluções); e
  5. Negociação: as partes conversam diretamente, sem a presença de terceiros, buscando um acordo.

O primeiro e maior motivo do descrédito que o cidadão tem com relação à via judicial se deve à morosidade intolerável, que se dá por conta das pilhas de processos que buscam por justiça. 

Mais complicado ainda se olharmos com os olhos de quem perde a demanda, porque um sempre vai ser prejudicado para que o outro saia satisfeito, sem contar as vezes em que nenhum dos dois ficam satisfeitos com a decisão, mas tanto autor, quanto réu são obrigados a aceitar e cumprir o que foi decidido.  

Imaginemos, então, quando se trata de direito de família. Será que depois de uma década de incontáveis recursos é possível se falar em solução?  

Há tempos que vimos acompanhando uma letargia processual, provocada por diversos fatores, difícil afirmar que uma simples reforma da lei processual será capaz de modificar esse cenário. 

Por essa e outras razões que os meios alternativos de solução de conflitos, dentre eles a mediação, instituto que iremos estudar, trazem inúmeras vantagens, não só para o Judiciário que acaba desafogando, quanto para as partes que tomam suas próprias decisões, sempre dentro de um acordo, onde não há perdedor ou vencedor, mas sim duas pessoas satisfeitas e com seus conflitos superados. 

Conceito e aspectos gerais da Mediação:

A melhor forma de entender a importância da mediação é destrinchando o termo. No dicionário, mediação se refere ao ato de servir de intermediário entre pessoas ou grupos e é exatamente esse o papel do mediador. 

Ninguém melhor que o Conselho Nacional de Justiça[1] (CNJ), grande incentivador da mediação para dizer o que é e para que serve: 

A Mediação é uma forma de solução de conflitos na qual uma terceira pessoa, neutra e imparcial, facilita o diálogo entre as partes, para que elas construam, com autonomia e solidariedade, a melhor solução para o problema. Em regra, é utilizada em conflitos multidimensionais, ou complexos. A Mediação é um procedimento estruturado, não tem um prazo definido, e pode terminar ou não em acordo, pois as partes têm autonomia para buscar soluções que compatibilizem seus interesses e necessidades. (CNJ, 2015)

Com a colocação do CNJ, vamos analisar primeiramente quem é a terceira pessoa. O mediador é a pessoa selecionada para exercer a função com o objetivo de auxiliar as partes a compor o conflito. No exercício da função, o mediador deve agir com imparcialidade e ressaltar às partes que ele não defenderá nenhuma delas em detrimento da outra – pois não está ali para julgá-las e sim para auxiliá-las a melhor entender suas perspectivas, interesses e necessidades.

O mediador deverá enfatizar que tudo que for dito a ele não será compartilhado com mais ninguém, isso porque o mediador deve ser uma pessoa com quem as partes possam falar abertamente sem se preocuparem com eventuais prejuízos futuros decorrentes de uma participação de boa fé na mediação (CNJ, 2015). 

Para atuar como mediador judicial, é preciso que o interessado faça um curso de formação de mediadores que seja reconhecido pelos tribunais. Os cursos são oferecidos pelos próprios tribunais ou por instituições credenciadas pelos NUPEMEC - Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Soluções de Conflitos e devem observar os parâmetros curriculares estabelecidos pelo CNJ nos termos do art. 167 §1º do Novo CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CNJ, 2015).

No que diz respeito ao mediador extrajudicial, deverá ser qualquer pessoa capaz que tenha a confiança das partes e seja capacitada para fazer mediação, independentemente de integrar qualquer tipo de conselho, entidade de classe ou associação. 

Importantíssimo ressaltar a neutralidade e imparcialidade do mediador, quando se fala de conflitos complexos ou multidimensionais, estamos falando de anos ou décadas de relacionamento, a mediação demanda um conhecimento aprofundado no que diz respeito as relações interpessoais. Uma sessão de mediação não há que se falar em tempo ou rapidez, tem de ser tranquila e com espaço temporal suficiente para que o mediador entenda o que está acontecendo, mas que acima de tudo, consiga fazer com que os mediandos percebam onde está o problema central do conflito, pois com a mediação são eles quem vão acordar, não há sugestões ou opiniões por parte do mediador, o acordo irá partir deles. É uma forma de empoderamento das partes em litígio, devolvendo-lhes a capacidade de resolver as próprias pendências com a participação de um facilitador imparcial (ALMEIDA, 2015, p.205). 

Importante trazer uma visão mais filosófica, como a da Ministra Fátima Nancy Andrighy (2009, p.10) que diz:          

Por isso, a principal virtude do mediador é a paciência. Ele deve ensinar as partes a pensar e resolver, por si mesmas, seus problemas. Quanto melhor qualificado for o mediador, menos opiniões ele emitirá, pois deve propiciar a manifestação mais pura da pessoa, que indicará sua própria solução, sem a intervenção do profissional.

A mediação é um instrumento de pacificação, cuja intenção é levar os mediandos a encontrar a solução para seus conflitos. É uma forma eficiente de resolução de conflitos nos quais a necessidade de estabelecimento de ajustes sobre pontos conflitivos seja prioritária para a manutenção de um relacionamento futuro, ou seja, os envolvidos precisam estar em harmonia, pois não há como romper o vínculo para sempre, mesmo que cheguem a um acordo, não significa que vão deixar de se falar, casos muito emblemáticos sobre isso são os conflitos familiares, como os casos em estudo no presente trabalho.  

Para Diogo A. R. de Almeida (2014, p.205), é nos conflitos de família que a mediação está mais indicada, seja de ordem parental com consequências para a prole, nos casos de separação e divórcio, quanto nas questões empresariais, quando se tratar de empresas familiares, pois “em ambas há relações de afeto que deverão ser mantidas”.  

Sendo assim, podemos dizer que a mediação é muito mais que uma forma de resolução de conflitos, é a melhor forma de promover a paz. 


A mediação na legislação brasileira 

A Resolução n. 125, de 29 de novembro de 2010 do CNJ, que instituiu Política Judiciária Nacional de tratamento adequado de conflitos, regulamenta a conciliação e a mediação em todo país e estabelece diretrizes aos Tribunais, tendo como principais objetivos: 

  1. A utilização dos meios alternativos de solução de conflitos, principalmente da conciliação e da mediação, no âmbito do Poder Judiciário e sob a fiscalização deste;
  2. A mudança de mentalidade dos operadores de Direito e das próprias partes, diminuindo a resistência de todos em relação aos métodos consensuais de solução de conflitos; e
  3. A qualidade do serviço prestado por conciliadores e mediadores, que envolve sua capacitação; tudo visando a pacificação social (escopo magno da jurisdição), a fim de tornar efetivo o acesso à justiça qualificado, ou nas palavras de Kazuo Watanabe, “acesso à ordem jurídica justa”. (apud LUCHIARI, 2009 p.113)

Um dos grandes méritos da Resolução n. 125 foi a ideia de instalar os núcleos de conciliação e abrir as portas para os centros, que somente foi possível com a mudança de mentalidade. 

Antes a Resolução n. 125 procurava criar um programa de resolução de conflitos, mas desde dezembro de 2015 o cidadão pode procurar o fórum de sua cidade e pedir ao juiz que remeta sua demanda para a conciliação ou a mediação.  

Em 29 de junho de 2015, a Lei 13.140 de 26 de junho de 2015 foi sancionada, ela dispõe sobre a mediação como meio de solução de controvérsias entre particulares e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública. As mudanças trazidas pela Lei de Mediação e pelo Novo CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, fazem com que as universidades e faculdades de Direito espalhadas pelo país devam dar uma atenção maior ao conteúdo programático porque, se ainda em 2015 o tema conciliação era um mero programa institucional, agora passará a ser uma diretriz processual. Os cursos terão de se adequar porque a conciliação e a mediação não receberão mais tratamento de meios alternativos e sim de mecanismos prioritários de resolução de disputas (CNJ, s.d.). 

Várias faculdades têm implementado modificações, assim como os tribunais, onde se tem os núcleos responsáveis pela gerência. Cada tribunal deve ter um núcleo para gestão da política pública local. Esse Núcleo é composto por magistrados, funcionários experientes, colaboradores, nos termos do art. 8º da Resolução n. 125/10 do CNJ. 

Segundo o parágrafo único do art. 1º da Lei 13.140/2015, é considerada mediação a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder de decisão, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia, conforme Gabriela Assmar (s.d.) “Sendo o mediador neutro (além de imparcial, não decide) e o processo voluntário, a Mediação é nada mais que uma negociação assistida, assim, onde se pode negociar, se pode mediar”. 

Para que a mediação seja imparcial, eficaz e para que tenha credibilidade, alguns princípios, previstos no artigo 2º e incisos da Lei 13.140/2015 e no Código de Ética dos Mediadores, precisam ser observados, são eles: 

Imparcialidade do mediador - condição fundamental ao Mediador, não pode existir qualquer conflito de interesses ou relacionamento capaz de afetar sua imparcialidade, deve procurar compreender a realidade dos mediandos, sem que nenhum preconceito ou valores pessoais venham a interferir no seu trabalho.

Isonomia entre as partes - A igualdade é um desdobramento do princípio da isonomia ou da igualdade, previsto no art. 5°, caput, da CONSTITUIÇÃO FEDERAL, reconhecida como verdadeira medula do devido processo legal.

Oralidade e Informalidade – em relação ao processo judicial, a mediação possui um procedimento informal, simples, no qual a oralidade é valorizada, ou seja, a grande maioria das intervenções é feita através do diálogo. 

Autonomia da Vontade das partes – a mediação é voluntária e as pessoas devem ter a liberdade de escolher esse método como forma de lidar com seu conflito. Também devem tomar as decisões que melhor lhe convierem no decorrer do processo de mediação. Ainda que sejam encaminhadas obrigatoriamente para a mediação, como ocorre em alguns países, as pessoas envolvidas devem ter a liberdade de optar pela continuidade ou não do processo. 

Busca do consenso – as partes é que decidirão todos os aspectos do conflito, o mediador deverá estimular as partes a terem um espírito colaborador, não deixar que o sentimento de perdedor e ganhador prevaleça, tem de ter a clareza que ambas as partes cedem para que ambas ganhem de alguma forma, com isso os sentimentos negativos e de animosidade são amenizados. 

Confidencialidade – o processo de mediação é realizado em um ambiente privado. As pessoas em conflito e o mediador devem trazer um acordo de confidencialidade entre si, oportunizando um clima de confiança e respeito, necessário a um diálogo franco para embasar as negociações. Se eventualmente, algum dos mediandos forem acompanhados por advogados, estes também deverão ser parte no pacto de confidencialidade. 

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Boa-fé - Enquanto meios para solução de litígios, o processo de mediação deve observar o princípio da boa-fé em todas as suas fases, desde a escolha do processo e mediador até o final cumprimento do acordo.

O princípio da boa-fé deve reger todos os atos daqueles que participam do processo, nomeadamente as partes e o terceiro conciliador ou mediador. Estes se obrigam a agir com lealdade e probidade, tanto na exposição dos fatos com observância da verdade, quanto no comportamento tendente à efetiva solução do litígio, com observância do respeito mútuo e da retidão de comportamento. Não se admitem comportamentos meramente dilatórios. Percebe-se mesmo que este princípio está relacionado com a colaboração das partes. (MORI[2], s.d.)

Na Lei 13.140/2015, em seu artigo 3º, o legislador traz que serão objetos da mediação direitos disponíveis ou mesmo direitos indisponíveis, desde que estes sejam transigíveis, porém é exigida a oitiva do Ministério Público para a homologação que deverá ser feita em juízo. Além disso, a mediação não precisa ser sobre todo o conflito, mas apenas parte dele, se necessário for e os mediando assim desejarem. 

Como regra geral aplicável, o mediador será designado pelo tribunal ou escolhido pelas partes, ainda é importante pontuar que se aplicam ao mediador as mesmas hipóteses legais de impedimento e suspeição do juiz, além das elencadas nos artigos 6º e 7º da Lei: impedimento pelo prazo de um ano, contado do término da última audiência em que atuou, de assessorar, representar ou patrocinar qualquer das partes e não atuar como árbitro nem funcionar como testemunha em processos judiciais ou arbitrais pertinentes a conflito em que tenha atuado como mediador (MARTINS, 2016). 

Mesmo que já exista processo judicial em curso, as partes poderão utilizar a mediação, devendo requerer ao juiz ou árbitro a suspensão do processo por prazo suficiente para a solução consensual do litígio, sendo que tal suspensão do processo não impede a concessão de medidas de urgência pelo juiz ou pelo árbitro e a decisão que o suspende não será recorrível, ficando suspenso o prazo prescricional, e a data que irá marcar o início da mediação será o dia da primeira reunião (CNJ, s.d.). 

Visto os principais dispositivos legais da mediação, vamos passar a verificar como funciona na prática esse importante instituto. 

Breve relato de como acontece uma sessão de mediação 

A sessão de mediação deve ser cuidada desde o aspecto físico da sala, como mesa redonda, simbolizando harmonia, sem arestas. O mediador deverá se sentar entre os mediandos, mas de maneira equidistante, evitar que os mediandos fiquem de lado um para o outro, embora isso vá ocorrer em muitos casos por força da animosidade entre eles, referente ao conflito. Muito importante que os mediandos se sintam acolhidos e percebam que os profissionais ali envolvidos estão se importando com eles e prontos para auxilia-los.           

Psicologicamente o mediador deve tomar cuidado para não se contaminar com os problemas dos mediandos. O Manual de Mediação Judicial do Ministério da Justiça (2012, p.101) traz uma abordagem da psicóloga Elaine Hatfield sobre esse contágio emocional:

[...]o fato de sermos capazes de provocar qualquer emoção em outra pessoa – e ela em nós – testemunha o poderoso mecanismo por meio do qual os sentimentos de uma pessoa são transmitidos às outras. Tais contágios são a principal transação da economia emocional, a sensação de toma lá dá cá que acompanha todo e qualquer encontro humano, independente do assunto em questão.

Nesse contexto, deve o mediador estar preparado para encontrar as partes que poderão estar aborrecidas, frustradas ou irritadas, sempre ciente de que deverá permanecer sereno e administrando as controvérsias. 

Depois de tudo preparado para a mediação, o mediador irá convidar os envolvidos para adentrar a sala, sempre perguntando o nome e como preferem ser chamados, lembrando sempre que os mediandos devem sentir-se acolhidos e acarinhados, mas sempre igualmente, nunca demonstrando mais empatia para com uma parte do que com a outra, segundo o  Manual de Mediação Judicial (MMJ), se uma das partes perceber qualquer parcialidade por parte do mediador, não mais colaborará para que a sessão prossiga (2012, p.102).  

Deverá o mediador deixar muito claro quais são as regras da mediação e verificar se há alguma questão incomodando os mediandos quanto a isso, quando ambos se colocam favoráveis a sessão o mediador poderá então dar seu início.  

Sobre os relatos dos fatos e os motivos pelos quais eles estão ali, existe a preocupação sobre quem irá falar primeiro. Sobre isso existe um critério objetivo que ajuda a resolver esse problema, que é o de quem entrou com o processo ou melhor, quem convidou para a sessão é que deverá iniciar, mas nada impede que o mediador pergunte quem quer começar e se de comum acordo for diferente, não há problema (MMJ, 2012, p.117). 

A partir daí os cuidados básicos do mediador são: proteger o tempo de ambos para falar; o cuidado ao fazer as perguntas, perguntando apenas o necessário; não permitir que um mediando interrompa o outro; permitir a expressão de sentimentos; identificar os interesses; antes de buscar a solução, esclarecer todos os pontos principais de controvérsias; estimular as mudanças de percepções e atitudes; e ao final resumir tudo o que foi dito e repetir para ambos, conduzindo a partir desse momento uma linha que leve a construção do acordo.  

Para finalizar, o processo o mediador deve estar atento para que a pacificação esteja ocorrendo por meio de critérios justos (MMJ, 2012, p. 142):

Por isso, uma boa mediação é aquela que alcançou essas finalidades: o acordo propriamente dito, em todas as suas nuances, o empoderamento e a compreensão harmônica e conjunta da controvérsia, além de benefícios na comunicação e relacionamento. 

  Mediação e as ações de família no Código de Processo Civil:

A família é a célula-mãe da sociedade, protegida pela Lei Maior, se sua estrutura estiver doente, se as relações familiares não estiverem em paz, todo o organismo social sairá prejudicado.  

Não há como deixar de olhar com cuidado para as disputas familiares, independente se um divórcio está ocorrendo, não pode se deixar de lado a figura dos filhos, pois bem sabemos que o casal pode se desfazer, mas o vínculo com os filhos não, esses deverão ter toda atenção para que, mesmo com os pais separados seja respeitado o seu direito fundamental à convivência familiar e ao seu melhor interesse.  

Sensível a essa realidade, o legislativo deu atenção especial às ações de família no Novo Código de Processo Civil, trazendo um capítulo especial a essas demandas, com ênfase na importância das soluções de conflito por meio da mediação e conciliação, o art. 694 do Código de Processo Civil diz “Nas ações de família, todos os esforços serão empreendidos para a solução consensual da controvérsia, devendo o juiz dispor do auxílio de profissionais de outras áreas de conhecimento para a mediação e conciliação”

Conteúdos familiares são sempre muito subjetivos, na qualidade das relações sempre são atribuídas de acordo com o que cada um fez ou deixou de fazer durante a convivência comum. Dependendo dessas ações e omissões, reações desproporcionais, atitudes mal compreendidas acabam alimentando uma hostilidade recíproca. Essa hostilidade acaba em uma competitividade quando chega ao judiciário, uma verdadeira quebra de braços começa a acontecer, seja pela disputa material ou até pela “posse” dos filhos, gerando assim toda essa complexidade das controvérsias familiares.  

Por essa razão, o legislador, pensando numa solução mais pacífica, entendeu necessário que os problemas levados ao conflito sejam discutidos e todas as arestas aparadas. Na medida do possível, os conflitos de família devem primeiro passar por identificação dos parâmetros de justiça dos envolvidos e qual a coerência deles, para que a relação seja individualmente considerada, isso é importante para que os envolvidos sintam a responsabilidades pelos seus atos passados e futuras decisões, vejamos que diz Diogo Assumpção Rezende de Almeida (Coord. 2015, p. 226): 

O Estado deve promover o efetivo exercício da cidadania pelos indivíduos, tornando-os plenamente responsáveis por suas escolhas e pelos resultados delas decorrentes. Contudo, a cultura de busca automática pelo Poder Judiciário como instância única ou exclusiva capaz de solucionar os conflitos de interesse parece roborar a desoneração dessa responsabilidade. É necessário incrementar o movimento de estimulo à autossuficiência, à autodeterminação individual, como forma de exercício pleno de cidadania. 

Do ponto de vista jurídico e técnico, o Direito de Família tem como característica um conjunto de normas de ordem pública, que regram as relações familiares, sendo, assim, a mediação de muito proveito nessa área. Como a mediação facilita o diálogo, em vez dos mediandos direcionarem seu foco para desqualificar o outro com a intenção de uma falsa vitória, com as sessões eles irão desatar os nós geradores dos conflitos. Falamos em sessões, no plural, pois, o artigo 696 do código de processo civil diz que “a audiência de mediação e conciliação poderá dividir-se em tantas sessões quantas sejam necessárias para viabilizar a solução consensual”, desde que resguardadas a possibilidade de prescrição de direitos.  

Quando se trata de família, raramente ou muito difícil é possível imaginar que apenas uma sessão seja suficiente para se obter êxito. Por mais rápido que seja o processo de mediação, vários são os diálogos necessários para o sucesso.

Ressaltar o § 1º do artigo 695 do código de processo civil é salutar, a citação não trará informações sobre as questões levantadas, somente os dados necessários para designação da mediação, essa atitude evita que as partes cheguem armadas à sessão, somente será mencionado o endereço, as partes e mediadores, nem o nome da ação será mencionada.  A citação não conterá cópia da Petição Inicial, evitando que os envolvidos se aproximem dos argumentos jurídicos apresentados na demanda, “comumente tais petições são redigidas em termos técnicos, e muitas vezes bastante agressivos” (ALMEIDA Coord.2015, p.238), provocando ainda mais mágoa e ressentimento.  

O legislador foi muito sábio ao colocar a mediação logo na fase inicial do processo, evitando a exaustão emocional de toda demanda.  

Diogo A. R. Almeida (Coord. 2015, p.235) conclui o mencionado acima:

Conclui-se, portanto, que o legislador processual foi muito sensível ao prever a mediação como fase inicial e obrigatória do procedimento das ações de família, pois, assim, passou a proporcionar às entidades familiares as melhores condições de resgatar a harmonia e proporcionar a seus filhos menores e demais integrantes um ambiente fértil ao pleno desenvolvimento de duas potencialidades, realizando simultaneamente importantes objetivos da família, da sociedade e do Estado. 

Nem mesmo ao mediador é recomendada a leitura da Petição Inicial, para que não se contamine com as ideias e não tenha a tendência de pender para um dos lados.

O parágrafo 2º do artigo 695 do código de processo civil reza que “a citação ocorrerá com antecedência mínima de 15 dias da data designada para a audiência”, diferente da regra geral que são 20 dias de antecedência (artigo 334, caput, código de processo civil), essa diferença se dá pela necessidade de que os conflitos familiares se resolvam o quanto antes, especialmente quando há filhos menores envolvidos, pois, não é a separação que prejudica a criança, mas o prolongamento do conflito.  

O artigo 698 do código de processo civil vem tratar exatamente dos interesses das crianças envolvidas, refere-se à necessidade do Ministério Público ser ouvido antes da homologação do acordo, quando tiver incapazes no processo. 

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Sobre a autora
Fabiana Ramalho

Bacharel em Direito pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul - SP, amante do Direito das Famílias, tem como objetivo pesquisas para palestras e publicações de artigos jurídicos, com o intuito de auxiliar a comunidade jurídica a se atualizar quanto às mudanças que ocorrem a cada instante no Direito das Famílias. Uma de suas vertentes principais são os direitos dentro do divórcio, como a regulamentação de guarda e visitas e os Direitos LGBT.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAMALHO, Fabiana. A mediação no âmbito do direito das famílias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5325, 29 jan. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60291. Acesso em: 28 mar. 2024.

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