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As recentes alterações do recurso de agravo e o dia-a-dia do advogado

16/12/2006 às 00:00
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A "nova" realidade do recurso de agravo, promovida pela Lei 11.187/2005, afeta substancialmente o dia a dia do advogado.

Acabou a regra da livre opção, segundo a qual cabia à parte a escolha entre o agravo na forma retida ou de instrumento. Agora, vige a regra da impugnabilidade das decisões interlocutórias (CPC 162 § 2º) mediante agravo retido, aceitando-se o agravo de instrumento apenas nas três hipóteses previstas no art. 522 do CPC: a) quando a decisão agravada causar à parte lesão grave e de difícil reparação; b) nos casos de inadmissão de apelação; c) contra a decisão que recebe o recurso de apelação.

. Lesão grave e de difícil reparação: trata-se de cláusula aberta, passível de interpretações subjetivas. Porém, há casos em que a lesão grave e de difícil reparação salta aos olhos, permitindo, assim, a imediata interposição do agravo de instrumento. Exemplos: (in)deferimento de liminares; concessão ou negativa de tutelas antecipadas; decisões proferidas em processo de execução etc.

. Casos de inadmissão de apelação: dizem respeito ao juízo de admissibilidade recursal negativo realizado pelo juízo a quo (juízo de admissibilidade diferido). Vale lembrar que, entre todos os recursos previstos no CPC, apenas o agravo de instrumento é interposto diretamente no tribunal. Os demais são interpostos perante o juízo prolator da decisão. Assim é com a apelação. Uma vez interposta, o juízo recorrido, ao exercer o juízo de admissibilidade recursal, verifica a presença dos pressupostos recursais da apelação. Se constata a ausência de qualquer deles, deixa de receber o recurso. Contra essa decisão de inadmissão da apelação, cabe agravo de instrumento por expressa disposição legal, viabilizando o exame, pelo tribunal, da correção da decisão do juiz que não recebeu a apelação. A se pensar na interposição do agravo retido, a pretensão recursal jamais seria analisada pelo órgão ad quem, pois o agravo na modalidade retida exige, para conhecimento do tribunal, reiteração em sede de razões de apelação. Como a apelação não foi recebida, o veículo de eventual agravo retido sequer chegaria ao tribunal.

Nesse passo, deve-se interpor agravo de instrumento contra a decisão do juiz que não recebe o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal (CPC 518 § 1º). A esse novo poder conferido aos juízes pela Lei 11.276/06, a doutrina denominou súmula impeditiva de recurso. Melhor seria alcunha-la de súmula impeditiva de apelação, uma vez que a norma faz menção expressa apenas ao recurso de apelação.

. Efeitos em que a apelação é recebida: sendo a apelação interposta perante o juízo prolator da sentença atacada, cabe a ele declarar os efeitos em que recebe o recuso (CPC 518 caput). A regra é o duplo efeito (devolutivo e suspensivo). Excepcionalmente, ou seja, nos casos descritos taxativamente no art. 520 do CPC, a apelação é recebida somente no efeito devolutivo. Sem efeito suspensivo, a eficácia da decisão não fica suspensa, viabilizando a execução provisória. Assim, se o juiz, ao receber a apelação, confere efeito suspensivo fora das hipóteses do art 520 ou, ainda, deixa de atribuir efeito suspensivo à hipótese onde devia faze-lo, o recurso cabível contra essa decisão errada é o agravo de instrumento.

Ainda no contexto das recentes alterações do recurso de agravo, o art. 523, § 3º, do CPC, estabeleceu a regra da interposição do agravo retido oral e imediatamente contra as decisões interlocutórias proferidas em audiência de instrução e julgamento. Daí a atenção do advogado. Se o juiz, por exemplo, rejeita contradita de testemunha, cabe agravo retido. Não no prazo de dez dias, mas oral e imediatamente, sob pena de preclusão. Se o juiz, nessa audiência, indefere expedição de ofício, o recurso cabível será o agravo retido, também oral e imediatamente. É importante registrar o seguinte: não satisfaz o requisito da regularidade formal do recurso a manifestação genérica de inconformismo, como o famigerado "protesto". O agravante deverá expor as razões do recurso bem como formular pedido de nova decisão (reforma ou anulação da decisão), sob pena de o tribunal (ou melhor: o relator) não receber o recurso por ausência de pressuposto recursal, qual seja, regularidade formal, nos termos do art. 557, caput, do CPC.

E se a decisão do juiz, proferida em audiência de instrução e julgamento, causar à parte lesão grave e difícil reparação ? Nesse caso, abre-se a via do agravo de instrumento, fundado naquela cláusula geral prevista no art. 522 do CPC. Ex: durante a audiência de instrução, forma-se um juízo sumário capaz de viabilizar a tutela antecipada (CPC 273). A parte pede a tutela antecipada, mas o juiz a rejeita. A despeito de a decisão ter sido proferida em audiência de instrução e julgamento, existe terreno fértil à interposição do agravo de instrumento, presente a hipótese de lesão grave e difícil reparação.

E as decisões proferidas em audiência preliminar (CPC 331)? Desafiam agravo retido, desde que não cause lesão grave e de difícil reparação, hipótese em que viabiliza-se o agravo de instrumento. A diferença do agravo retido contra as decisões emanadas em audiência preliminar é que o recurso poderá ser manejado no prazo de dez dias, vale dizer, não se exige a interposição oral e imediata, pois apenas as decisões proferidas em audiência de instrução e julgamento exigem a interposição oral e imediata; às decisões proferidas em audiência de conciliação (CPC 125), aplica-se o mesmo raciocínio.

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O art. 527 do CPC também sofreu alterações. A modificação que avulta em importância para o causídico é a prevista no parágrafo único. Como se sabe, o art. 557 traz uma espécie de roteiro a ser seguido pelo relator do recurso ao recebê-lo. Os incisos I a VI são as etapas pelas quais o relator deve passar, em regime de exclusão. De tal arte, quando o parágrafo único fez dispor que "a decisão liminar, proferida nos casos dos inciso II e III do caput deste artigo, somente é passível de reforma no momento do julgamento do agravo, salvo se o próprio relator a reconsiderar, instituiram-se as seguintes regras:

a) A decisão do relator que converte o agravo de instrumento em retido, porque ele não vislumbrou uma das três hipóteses que permitem a interposição do agravo de instrumento (CPC 522), e a decisão do relator que confere efeito suspensivo ao recurso ou antecipa os efeitos da tutela recursal são irrecorríveis. Não mais cabe contra elas o agravo interno, previsto no § 1º do art. 557.

b) A lei previu a possibilidade de o relator reconsiderar tais decisões. Assim sendo, a parte pode dirigir ao relator pedido de reconsideração da decisão, em petição avulsa. Essa medida não se qualifica como recurso, pois não prevista no rol do art. 496 do CPC (princípio da taxatividade dos recursos).

c) Se o relator não reconsidera-las, as decisões somente seriam passíveis de reforma por ocasião do julgamento do mérito do agravo. Todavia, a realidade instituída pela Lei 11.187/05, ao alterar a redação do parágrafo único do art. 527, não foi outra senão o renascimento do mandado de segurança contra atos judiciais. De fato, prevê o art. 5º, II, da Lei 1.533/51 (Lei do Mandado de Segurança) que "não se dará mandado de segurança, quando se tratar de despacho ou decisão judicial, quando haja recurso previsto nas leis processuais ou possa ser modificado por via de correição. A contrario sensu, dar-se-á mandado de segurança quando se tratar de decisão judicial quando não haja recurso previsto nas leis processuais. Ora, o parágrafo único do art. 527 vedou expressamente a possibilidade de recurso contra as duas decisões monocrática do relator, já mencionadas. Além disso, o pedido de reconsideração não tem natureza de recurso. Daí ser cabível o mandado de segurança, com arrimo no art. 5, II, da Lei 1.533/51.

Por derradeiro, a Lei 11.232/05, que alterou o panorama das execuções por quantia de títulos judiciais, instituiu – de forma expressa para que não pairassem dúvidas sobre o recurso a ser interposto - mais duas hipóteses de decisões que desafiam o agravo na modalidade de instrumento. A primeira delas, prevista no art. 475-H, faz dispor: "Da decisão de liquidação caberá agravo de instrumento." A liquidação de sentença, de acordo com o novo contexto das execuções por quantia de títulos judiciais, passou a ser mera fase de um único processo, denominado pela doutrina de processo sincrético. Sincrético porque esse único processo "mistura" as fases de conhecimento, liquidação e execução. Tem-se uma única relação jurídica processual e, conseqüentemente, uma citação, sendo certo que o advogado da parte contrária é intimado para dar prosseguimento às fases subseqüentes, dispensando-se, pois, a citação pessoal do réu. O objetivo colimado não é outro senão coadunar o CPC com a garantia fundamental da prestação jurisdicional em tempo razoável, prevista no art. 5 da CF/1988.

A segunda hipótese expressa de cabimento do agravo de instrumento, no contexto das execuções por quantia de títulos judiciais, vem insculpida no art. 475-M, § 3º, do CPC, segundo o qual: "A decisão que resolver a impugnação é recorrível mediante agravo de instrumento, salvo quando importar extinção da execução, caso em que caberá apelação." Impugnação é o nome dado à defesa do executado pela Lei 11.232/05, no bojo da execução por quantia de título judicial. Desapareceram os embargos do devedor nas execuções por quantia de título judicial. Intimado para cumprir a sentença, ao devedor recalcitrante em cumprir voluntariamente a obrigação reconhecida no título, cabe a via da impugnação e não mais os embargos à execução. Assim, contra a decisão que resolve (decide) a impugnação e não extingue a execução, o recurso cabível é o agravo de instrumento

Portanto, vê-se que as alterações do CPC quanto ao recurso de agravo foram substanciais, exigindo maior atenção dos advogados na defesa dos direitos de seus clientes. A matéria, por certo, será objeto de incansáveis debates e análises pela doutrina e jurisprudência. O importante, nesse momento, é estudar as mudanças para melhor aplica-las no cotidiano forense.


BIBLOGRAFIA

.Antônio Cláudio da Costa Machado. Código de Processo Civil Interpretado, 5ª edição, editora Manole, 2006;

.Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery. CPC comentado e Legislação Extravagante. 9ª edição. Editora RT, 2006;

.Alexandre Freitas Câmara. A nova Execução de Sentença. Lumen Júris Editora, Rio de Janeiro, 2006;

.Lições de Direito Processual Civil. Alexandre Freitas Câmara. Lumen Júris Editora, Rio de Janeiro, 2006, 13ª edição;

.Cássio Scarpinella Bueno. A Nova Etapa da Reforma do Código de PROCESSO Civil, Vol. 1. Saraiva, 2006;

.Humberto Theodoro Júnior. As Novas Reformas do Código de Processo Civil. Editora Forense, Rio de Janeiro, 2007.

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Sobre o autor
Alexandre Nader

advogado, professor de Direito Processual Civil em Franca e São Joaquim da Barra (SP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NADER, Alexandre. As recentes alterações do recurso de agravo e o dia-a-dia do advogado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1263, 16 dez. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9291. Acesso em: 29 mar. 2024.

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