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Sentença

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Vistos, etc. CARLOS AUGUSTO DA SILVA ARAGÃO ajuizou a presente demanda, sob o rito ordinário, em face de BANCO DO BRASIL S/A, por intermédio da qual pretende antecipação dos efeitos da tutela para determinar que a parte ré efetue a cobrança do percentual de 30% dos vencimentos liquidos do autor, nulidade da cláusula abusiva que permita descontos no percentual acima de 30% por cento dos vencimentos, restituição em dobro dos valores cobrados a maior e danos morais, sob fundamento de que celebrou contrato com a parte ré no período de maio de 2010 até abril de 2014 com desconto em conta no valor de R$ 731,21, o que compromete sua subsistência. A inicial de fls.02/16 veio instruída com os documentos de fls. 17/26. Deferimento da gratuidade de justiça e indeferimento do pedido de antecipação dos efeitos da tutela (fls. 28). Petição, a fls.30, requerendo a reconsideração da decisão. Decisão, a fls.31, deferindo o pedido de antecipação dos efeitos da tutela para que a parte ré se abstenha de descontar valores superiores a 30% do salário do autor. Regularmente citado e intimado (fls. 43), o réu ofereceu contestação (fls.45/53) aduzindo, em síntese, que o autor anuiu de forma livre e consciente com todas as cláusulas do contrato que requereu ao banco e depois de se tornar devedor confesso busca invalidar as cláusulas contratadas, não cabimento da anulação de ato jurídico perfeito e acabado, ausência de prova de vício de consentimento, inexistência de anatocismo e taxas abusivas e danos morais. Réplica (fls.87/94). Instados a se manifestarem em provas (fls.95), a parte autora requereu a inversão do ônus probatório (fls.097/98), enquanto a ré permaneceu inerte (fls. 100) É o relatório. DECIDO. Desnecessária a produção de qualquer outra prova para o deslinde da causa, podendo o processo ser julgado no estado em que se encontra, eis que a causa encontra-se madura para sentença. Primeiramente é de se destacar que a parte autora não formula qualquer pedido com fundamento na existência de anatocismo ou juros ilegais ou abusivos, resumindo a lide na impenhorabilidade ou não do salário e a tese de superendividamento. A presente relação jurídica firmada entre as partes é regida pelas regras do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que a parte autora é destinatária final dos serviços e produtos fornecidos pela ré, conforme preceituam os artigos 2.º e 3.º da Lei n.º 8.078/90. O Código de Defesa do Consumidor estabelece a responsabilidade objetiva da empresa fornecedora dos serviços e produtos por prejuízos ocasionados ao consumidor, decorrente de defeito na sua prestação, cabendo ao réu, para se eximir da responsabilidade, comprovar a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro e/ou a inexistência de defeito. Não há dissenso quanto ao fato incontroverso de que a parte autora contratou empréstimos e que os valores estão sendo descontados sem respeitar o percentual de 30% do salário da parte autora. Ressalta-se que a parte autora não questiona o débito e os contratos e afirma, inclusive, que a forma de pagamento dos empréstimos contratada foi de desconto em folha, contudo, sustenta que deve ser preservado o salário com a impenhorabilidade. Os extratos de fls.21/24 demonstram que os descontos estão sendo feitos, diretamente, em folha de pagamento, não havendo qualquer ilegalidade nas cláusulas contratuais, desde que, segundo a jurisprudência pátria, não comprometa mais do que 30% (trinta por cento) dos rendimentos da parte autora, o que está ocorrendo. Assim, não há nulidade na cláusula contratual que permite o desconto em folha de pagamento, mas sim na conduta do fornecedor de serviço em efetuar cobrança que comprometa mais de 30% (trinta por cento) dos vencimentos ou remuneração do consumidor. Destaca-se que a Jurisprudência firmou entendimento no sentido da adoção da denominada ´teoria do superendividamento´ com o intuito em assegurar o mínimo existencial e garantir o princípio da dignidade da pessoa humana, limitando os descontos em 30% (trinta por cento) dos vencimentos ou remuneração do consumidor. Neste sentido são os acórdãos abaixo transcritos: ´APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C INDENIZATÓRIA. SUPERENDIVIDAMENTO. DESCONTO DE PARCELAS DE EMPRÉSTIMOS EM CONTA SALÁRIO. LIMITAÇÃO AO PERCENTUAL MÁXIMO DE 30% DOS RENDIMENTOS LÍQUIDOS DO CONSUMIDOR. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES JÁ DESCONTADOS. INOCORRÊNCIA DE DANOS MORAIS. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO PARÁGRAFO 5º, DO ART. 6º, DA LEI 10.820/2003. ENUNCIADO N. 15 DO AVISO 55/2009 DO TJ/RJ. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL. PRIMEIRO RECURSO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO, SEGUNDO RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO, NOS TERMOS DO ART. 557, §1º-A, DO CPC.´ (0015597-21.2007.8.19.0208 - APELACAO, DES. VERA MARIA SOARES VAN HOMBEECK - Julgamento: 15/04/2010 - PRIMEIRA CAMARA CIVEL ). ´RESPONSABILIDADE CIVIL. SUPERENDIVIDAMENTO. PAGAMENTO DE DÍVIDAS DECORRENTES DE CONTRATOS DE EMPRÉSTIMOS, MEDIANTE RETENÇÃO E DESTINAÇÃO DE PARTE SIGNIFICATIVA DO VALOR DO SALÁRIO DE CORRENTISTA, DEPOSITADO EM CONTA-CORRENTE BANCÁRIA. ALTERADO O QUADRO FÁTICO COEVO DAS CELEBRADAS AVENÇAS, TORNANDO SEU CUMPRIMENTO EXTREMAMENTE ONEROSO. SITUAÇÃO QUE RECLAMA ATUAÇÃO DO JULGADOR NA CORREÇÃO DAS DISTORÇÕES ASSIM PRODUZIDAS, TUDO COM BASE NO ART. 6, V DO CDC. NATUREZA DE VERBA ALIMENTAR. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 649, IV DO CPC, CUJO PRINCÍPIO É APLICÁVEL À ESPÉCIE. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO POR ESTA EGRÉGIA CORTE E PELO COLENDO STJ. LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS DE AMORTIZAÇÃO A 30% (trinta por cento) DOS RENDIMENTOS LÍQUIDOS PERCEBIDOS PELO CORRENTISTA. DEVIDOS, CONTUDO, OS VALORES JÁ DEBITADOS, CORRESPONDENTES A AMORTIZAÇÕES PROMOVIDAS TAIS COMO CONTRATADOS, SEM DEVOLUÇÃO DOS MESMOS. ILEGÍTIMA A INCLUSÃO DO NOME DO DEVEDOR COMO INADIMPLENTE EM CADASTRO DE DEVEDORES REMISSOS, CONSIDERANDO QUE TAL PROVIDÊNCIA FOI ADOTADA APÓS CIENTIFICADO O CREDOR DA DECISÃO CONCESSIVA DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, LIMITANDO O VALOR DOS DESCONTOS AO PERCENTUAL NELA CONTIDO.Parcial reforma do julgado. ´ ( 0010028-81.2009.8.19.0042 - APELACAO, DES. NASCIMENTO POVOAS VAZ - Julgamento: 31/03/2010 - DECIMA QUARTA CAMARA CIVEL). ´Agravo interno na apelação cível. Decisão do relator que negou seguimento ao recurso, fundada em jurisprudência dominante desta Corte. Inteligência do caput do art. 557 do CPC. Consumidor. Instituição financeira. Desconto de empréstimo em conta-corrente. Limitação. Superendividamento. Inteligência do art. 6º § 5º da Lei 10820/03. Apelante que se insurge contra a sentença que julgou procedente o pedido de limitação dos descontos de débitos em conta bancária a 30% dos vencimentos líquidos da autora. Limitação dos descontos em conta corrente de clientes tomadores de empréstimos com descontos em conta-corrente. Possibilidade. Preservação do mínimo existencial. Princípio constitucional da dignidade (art.1º, inciso III CF/88). Boa fé objetiva nas relações de consumo que impõe conduta de lealdade e cooperação com o hipossuficiente. Verbas de natureza alimentar que são impenhoráveis. Inteligência do art. 649 IV CPC. Precedentes jurisprudenciais. Desprovimento do agravo interno.´ (0017254-67.2008.8.19.0206 - APELACAO, DES. CRISTINA TEREZA GAULIA - Julgamento: 30/03/2010 - QUINTA CAMARA CIVEL). Assim, diante da Jurisprudência acima mencionada e das provas dos autos, a tutela antecipada concedida a fls. 28 merece prosperar, contudo, a fixação de multa diária se mostra incompatível com a medida pretendida, devendo, portanto, a parte ré cumprir a tutela de fls.31, sob pena de arcar com o triplo do valor descontado em desconformidade a decisão antecipatória, ou seja, triplo do valor descontado acima dos 30% do salário do autor. Melhor sorte, contudo, não merece prosperar o pedido de indenização por danos morais, eis que não se vislumbra situação que acarrete dor, angústia, sofrimento e humilhação à autora a ponto de ensejar abalos psíquicos a parte autora, mas mero aborrecimento decorrente, inclusive, da ausência de administração e controle das dívidas e empréstimos efetuados, voluntariamente, pela parte autora. De igual forma, não merece procedência o pedido de restituição dos valores cobrados, eis que a contratação foi realizada em conformidade com a autonomia da vontade e, portanto, o contrato era válido e eficaz até a discussão em juízo. Isto posto, JULGO PROCEDENTES EM PARTE os pedidos formulados na inicial, com fulcro no art.269, I do Código de Processo Civil e na fundamentação acima exposta, para: A) tornar definitivos os efeitos da tutela concedida a fls.31, contudo, com multa equivalente ao triplo do valor descontado em desconformidade com a decisão antecipatória, ou seja, triplo do valor descontado acima dos 30% do salário do autor; B) Declarar a nulidade da cláusula abusiva que permita descontos no percentual acima de 30% por cento do salário do autor. Custas e honorários recíprocos e compensados, na forma do artigo 21 do Código de Defesa do Consumidor. Transitada em julgado, cumprida a sentença, dê-se baixa e arquive-se. P.R.I.

Respostas

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    Julianna Caroline Terça, 29 de maio de 2012, 15h37min

    A) tornar definitivos os efeitos da tutela concedida a fls.31, contudo, com multa equivalente ao triplo do valor descontado em desconformidade com a decisão antecipatória, ou seja, triplo do valor descontado acima dos 30% do salário do autor;
    Deferida a tutela e determinado a multa para o requerido em 3x o valor descontado alem dos 30% do permitido por lei.

    B) Declarar a nulidade da cláusula abusiva que permita descontos no percentual acima de 30% por cento do salário do autor. Custas e honorários recíprocos e compensados, na forma do artigo 21 do Código de Defesa do Consumidor. Transitada em julgado, cumprida a sentença, dê-se baixa e arquive-se. P.R.I.
    Anulada a cláusula abusiva citada;

    Nao foi deferido o pedido de indenização por danos morais, pois entendeu-se que não houve.

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    Carlos Aragao Terça, 29 de maio de 2012, 17h26min

    juliana muito obrigado!

    mas você acha que o advogado fez tudo certo ou deu mole?

    porque pela sacanagem que o banco me fez eu esperava ganhar algum dinheiro
    pelo visto so vai para de descontar o juros abusivos.

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    Deusiana 15295/RJ Quinta, 31 de maio de 2012, 0h39min

    Ao que parece sim, pelo menos a principio. O advogado pode pedir, mas não pode ordenar o entendimento do Juiz.

    Caso o Juiz tenha entendido errado, cabe recurso.

    Por fim, o que ele entendeu foi que voce convencionou livremente que seria descontado o valor de R$ 731,21.

    Contudo, ficou provado que tal valor supera 30% do seu salário. Por isso ele anulou a cláusula que permite o desconto neste valor, limitando a 30% do seu salário sob pena de multa com base na teoria do superendividamento.

    Realmente, não cabe devolução porque o valor foi contratado e devido. A distribuição/parcela do desconto mensal que está ilegal.

    Quanto ao dano moral, sua sentença não publicou ainda cabe recurso. Há precedentes que confere indenização quando há negativação do nome. Possível mas não certo, vez que decorrente de inadimplento de valor efetivamente contratado.

    A forte tendencia é a não concessão da devolução e a não incidência de dano moral, questão inclusive sumulada no TJ/RJ.

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    Carlos Aragao Quinta, 31 de maio de 2012, 16h59min

    Muito obrigado Deusiana

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    Carlos Aragao Quinta, 07 de junho de 2012, 18h47min

    Meu caso ja se encerrou tem algo + para mim esperar?

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    Vanderlei Sasso Quinta, 07 de junho de 2012, 20h36min

    Comentário apagado pelo usuário

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    Julianna Caroline Quinta, 07 de junho de 2012, 21h13min

    O Vanderlei voltou!!!
    Bem vindo de volta Vanderlei!!

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