Notável José Carnaúba,
Se o Policial deixar de prender alguém portando uma faca em uma ZBM, por exemplo, e apenas apreender a referida faca, poderá incorrer em crime de prevaricação com infração disciplinar residual.
O Policial não tem escolha, tem que prender, exceto em situações excepcionalíssimas, a exemplo de surgimento de uma ocorrência de grande vulto, a exemplo de um tiroteio nas proximidades, em que não seria razoável exigir que o policial desse continuidade a essa ocorrência (“porte de arma branca”) em detrimento da outra (tiroteio).
Se há vários doutrinadores sustentando que o tipo está em pleno vigor, assim como vários tribunais mantêm a condenação, não pode o Policial deixar de prender a pretexto de entender que o fato é atípico, porquanto não sabe ele se o Juiz da causa iria condenar. Quando o Policial deixa de prender a pretexto da atipicidade do fato está substituindo o Juiz, o que lhe é vedado, “data maxima venia”.
Vejamos os posicionamentos infra:
Na doutrina há posições diversas quanto ao enquadramento no artigo 19 da Lei das Contravenções Penais – Decreto- Lei nº 3.688 de 03/10/1941
1- Tipifica a contravenção . – conceito de arma descrito no artigo 19 é genérico. Uma vez que arma branca tem poder de lesividade, bastando possuir 15 cm de lâmina para ser havida como vulnerante e, consequentemente, uma arma proibida, cujo porte fica na dependência da autoridade , de acordo com o artigo 5º, parágrafo 1º, h, do Decreto 6911/55 – (após LCP). Nesse sentido, também já dispunha o Decreto1.246 de 11/12/1936 (anterior LCP, portanto revogado), que previa proibição de portar arma branca que tivesse mais de 10 cm de lâmina; Jurisprudência favorável (RJDTA Crim, v. 3 , julho setembro de 1989, p. 102, Rel. Walter Theodósio). No mesmo sentido, Fernando Capez, Comentários à lei 9437/97, Saraiva, 1997, pág. 37. Na qualidade de arma imprópria, pode ser instrumento empregado no crime.
\\"Só as armas próprias integram a contravenção\\"
As impróprias não se prestam à sua configuração, uma vez que não podem ser objeto de autorização da autoridade pública...Não se pede licença à autoridade para andar com uma tesoura. Há a contravenção, entretanto, na hipótese de o sujeito desvirtuar o seu uso, cumprindo verificar se carrega a arma para ataque ou defesa ( Lei das Contravenções Penais Anotada, p.61)
Esse também é o entendimento que vem prevalecendo neste Tribunal, conforme se depreende das seguintes ementas colhidas de sua jurisprudência oficial:
Contravenção Penal - Porte de arma branca , tipo facão - ausência de licença regular de autoridade competente - claro propósito de ataque - infração configurada.
Salvo circunstância especiais que justifiquem o porte de faca do tipo em questão, como instrumento útil e necessário ao trabalho, não ha\\'como descaracterizar a tipicidade do fato (RJDTACrim, v. 8 , out/dezembro de 1990, p. 233, rel. José santana).
Contravenção Penal - porte de arma- faca - arma branca - caracterização
Embora a faca seja tida como arma imprópria, se possui potencialidade ofensiva, e se presta à defesa, bem como ao ataque, de quem a porta, com possibilidade de dano físico, há que ser considerada como elemento caracterizador da contravenção do artigo 19 . Estão na mesma situação navalhas, estiletes, \\"peixeiras\\' , bengalas, sprays de gás e até os materiais bélicos (RDJTA Crim, v. 11, julho/setembro de 1991, p. 153, rel. Silva Rico)
Porte ilegal de arma - réu portando faca - caracterização - entendimento:
Age como incurso no art. 19 , caput da lei das contravenções penais, o agente que porta faca, pois esta se inclui na categoria de arma proibida , conforme a legislação estadual. (RJDTACrim, v. 14, abril-junho de 1992, p. 120, rel. José Habice)
Porte de arma- facas usadas para cozinhar- irrelevância- caracterização
Incorre nas penas do art. 19 da LCP o agente que traz consigo uma faca e um canivete , sendo irrelevante a alegação de que tais armas eram usadas para cozinhar, vez que o porte de arma é sempre, potencialmente perigoso tratando-se de infração formal, que não depende de evento(RJDTA Crim, v. 17 , janeiro - março de 93, p. 133, Heitor Prado)
Contravenção Penal - porte de arma - faca e chicote tipo \\"muchaco\\"- instrumento utilizáveis em ataque e defesa, com natureza de armas impróprias- delito configurado.
Armas impróprias são instrumentos usados para ataque ou defesa, quando as circunstâncias de tempo, lugar e modo evidenciem o desvio de sua finalidade específica. Assim, configuram-se a faca e o chicote , como armas lesivas à integridade corporal ou à vida (RJDTA Crim, v. 3 , julho setembro de 89, p. 102, Rel. Walter Theodósio).
Além do mais, em se tratando de arma branca, basta possuir 15 cm de lâmina para ser havida como vulnerante e, consequentemente, uma arma proibida, cujo porte fica na dependência da autoridade , de acordo com o artigo 5º, parágrafo 1º, h, do Decreto 6911/55.
Não há dúvida, portanto, no caso, que o apelado cometeu a contravenção do artigo 19 do estatuto próprio, em que pese o respeitável entendimento em contrário do eminente relator sorteado.
O réu, apesar de seus maus antecedentes, e de já ostentar uma condenação com trânsito em julgado por infração ao artigo 129 do CP, ainda é tecnicamente primário. Confirmada , contudo sua personalidade agressiva pelos seus antecedentes e sopesadas as demais circunstâncias do art. 59 do CP, fixa-se sua pena base em 15 dias de prisão simples em regime aberto, sendo cabível o sursis diante da condenação anterior. Torna-se , então, definitiva na ausência de outras causas de aumento ou diminuição.
Ante o exposto, então é dado provimento ao recurso do Ministério Público para julgar procedente a ação penal e condenar o réu Liberato Cardoso dos Santos, como incurso no artigo 19 da Lei de Contravenções Penais, à pena de 15 dias de prisão simples em regime aberto.
Expeça-se mandado de prisão contra o réu, ainda que o seja para cumprir sua pena em regime aberto.
Érix Ferrreira, relator designado. Magalhães Coelho, vencido com a seguinte declaração de voto:
O MP ofertou o presente recurso de apelação , em face de sentença que absolveu Liberato Cardoso dos Santos da imputação do art. 19 da Lei de Contravenções Penais, poque portava uma faca, sem licença da autoridade , com fundamento no art. 386, V, CPP.
Há crimes, sem objeto material, nos quais a conduta delitiva não produz resultado naturalístico, vale dizer, alteração sensível no mundo físico, não obstante subsistir o dano ou perigo ao bem jurídico tutelado (objeto jurídico).
Assim, quando se diz que um crime é de dano ou de perigo, está se traçando uma relação entre conduta delitiva e objeto jurídico do crime. O dano ou o perigo são aferidos na perspectiva do bem jurídico tutelado pela norma penal incriminadora, e não na do objeto material do crime.
Abraços!