Cara Eliane
A NOVA LEI DE ESTÁGIO e O ESTATUTO DA OAB
Juliana Teixeira Esteves
Professora de Direito do Trabalho e Direito Previdenciário da UFPE
Mestre em Ciência Política
Doutoranda em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco
Sócia do Teixeira e Vieira Advogados Associados.
A nova lei de estágio – Lei 11.788 de 25 de setembro de 2008 alterou substancialmente o instituto regulador anterior inovando na relação de trabalho estágiário-empresa contratante. Entre os principais pontos de mudança estão a conceituação de estágio, a definição da jornada de trabalho, a fixação de recesso remunerado no estágio e a responsabilidade dos agentes de integração.
A nova Lei de estágios não revogou o parágrafo quarto do artigo nono do Estatuto da OAB
Dentre as inovações, o artigo terceiro da referida Lei exclui a possibilidade de configuração de vínculo empregatício entre as partes envolvidas na relação de estágio desde que os requisitos dispostos em seus parágrafos sejam respeitados. É imprescindível, assim, que haja três partes envolvidas – o estudante, a instituição de ensino e a empresa ou profissional liberal responsável pelo estágio. Além disso, um termo de compromisso deverá ser assinado pelos envolvidos. Observe-se o trecho legal abaixo transcrito:
NOVA LEI DE ESTÁGIO - LEI 11.788/08
Art. 1o Estágio é ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no ambiente de trabalho, que visa à preparação para o trabalho produtivo de educandos que estejam freqüentando o ensino regular em instituições de educação superior, de educação profissional, de ensino médio, da educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos.
Art. 3o O estágio, tanto na hipótese do § 1o do art. 2o desta Lei quanto na prevista no § 2o do mesmo dispositivo, não cria vínculo empregatício de qualquer natureza, observados os seguintes requisitos:
I – matrícula e freqüência regular do educando em curso de educação superior, de educação profissional, de ensino médio, da educação especial e nos anos finais do
ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos e atestados pela instituição de ensino;
II – celebração de termo de compromisso entre o educando, a parte concedente do estágio e a instituição de ensino;
(...)
Já a Lei 8.096/94 que regula a atividade do profissional da advocacia e que, portanto, é uma lei específica, dispõe sobre a possibilidade de um bacharel em Direito inscrever-se na Ordem na qualidade de estagiário. Nesta hipótese teríamos um ex-estudante ainda na condição de estagiário, o que pela nova lei de estágio caracterizaria o vínculo empregatício. Vejamos o que diz o artigo nono do Estatuto da OAB:
ESTATUTO DA OAB – LEI 8.096/94
Art. 9º Para inscrição como estagiário é necessário:
(...)
§ 4º O estágio profissional poderá ser cumprido por bacharel em Direito que queira se inscrever na Ordem.
Diante na nova regulamentação o estágio pressupõe uma relação trilateral entre estudante - instituição de ensino - empresa concedente; já o Estatuto da OAB prevê uma relação bilateral entre estudante e empresa concedente do estágio.
Ao contrário do que foi ventilado no meio jurídico, as duas normas não são incompatíveis entre si. A hermenêutica jurídica esclarece que não há antinomia entre elas posto que “lei geral não revoga lei específica”. Assim, um bacharel em direito pode continuar estagiário após a extinção do vínculo universitário restando claro que em tal hipótese haverá a configuração formal do vínculo empregatício, excetuando-se a hipótese de matrícula em curso de pós-graduação em que a instituição aceite re-estabelecer a união trilateral.
A abordagem social da lei - polêmica
Além dessa primeira polêmica tem-se que a nova Lei de estágio abordou a problemática de forma social, tentando regulamentar uma atividade utilizada irregularmente pelo mercado de trabalho brasileiro esquecendo-se, ou ignorando que o estágio é um instituto eminentemente educacional e voltado para a formação do aluno. Atribuir efeitos da relação empregatícia, como o instituto das “férias” remuneradas dá ao estágio um caráter social e não educacional.
A justificativa do Executivo para o projeto é por fim às contratações irregulares. Entretanto, mais uma vez esquece-se que a aplicação de uma lei recai sobre a fiscalização da mesma.
Outro ponto polêmico é a previsão legal no sentido de que qualquer desconformidade contratual em relação à lei gerará vínculo empregatício para todos os fins – previdenciários e trabalhistas. Ora o objetivo da lei deve ser a aplicação do estágio e não a formalidade do contrato. Uma irregularidade formal no contrato é um erro sanável, não devendo repercutir, necessariamente, na execução do mesmo. Além disso, a redação legal não deixou claro se a competência para apurar a existência dos requisitos configuradores do vinculo empregatício é da Justiça do
Trabalho ou dos fiscais da Delegacia Regional do Trabalho.
A legislação inovou também na criação do recesso remunerado para aqueles que estagiam a mais de 12 meses o mesmo concedente do estágio, equivalendo à regra das férias devidas ao empregado que labora mais de 12 meses para a mesma empresa. Para este último, entretanto, será devido o acréscimo de 1/3 previsto na Constituição Federal enquanto que o estudante receberá apenas a bolsa-auxílio. Na hipótese de não concessão do recesso no período máximo do estágio, qual seja, dois anos, entendo ser devida indenização na forma prevista no Código Civil, tendo como fato gerador a omissão de uma obrigação do concessor do estágio, devendo, assim, o pagamento ser realizado na forma simples e não em dobro como na legislação trabalhista.