Adquiri um imóvel em leilão devido a dívida de IPTU. O mesmo possuia dívida de Luz e Água. Consegui religar a luz sem a necessidade de quitaçao do débito anterior pois fui informada que é dívida adquirida e de responsabilidade da pessoa registrada, no caso o dono antigo. Porém com a água estou com um problema sério, pois a empresa de água e esgoto alega que a dívida é do imóvel e eles não "podem" transferir ou manter com o antigo proprietário e nem requisitar a parte deles junto ao processo de leilão do qual adquiri o mesmo. Gostaria de saber se realmente a dívida de água é do imóvel, e sendo o mesmo adquirido em leilão se tenho que assumir a dívida ou como devo proceder para que a empresa de água solicite a dívida antiga junto ao processo do qual efetuei pagamento???

Respostas

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    F

    Fellipe_1 Sábado, 09 de fevereiro de 2008, 5h40min

    Segue excerto pedagógico:


    RELATÓRIO

    Trata-se de apelação cível interposta por Isabel Elaine Pinto de Castro contra a sentença oriunda do Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Porto Velho, que julgou improcedente os seus pedidos iniciais, revogando a antecipação da tutela anteriormente concedida e julgando parcialmente procedente o pedido realizado na reconvenção pela CAERD, condenando a apelante-reconvinda a pagar a importância de R$809,62, relativa às contas de fornecimento dos serviços de água dos meses de maio de 2002 a julho de 2003, atualizada e com juros legais, além das custas processuais e honorários de advogado fixados em 20% do valor da causa, incluídos os honorários de sucumbência da reconvenção, extinguindo o processo com julgamento do mérito, com base no art. 269, inc. I, do CPC.

    A apelante (fls. 136/155) fez um breve relato dos fatos, aduzindo que a sentença foi contrária às provas dos autos, alegando que não poderia ser responsabilizada por dívida do antigo proprietário.

    Enfatizou que a dívida existente está sendo discutida em juízo, não estando consolidada, afirmando que não pode ser considerada válida para efeitos de cobrança, como entendeu o magistrado a quo.

    Alega que não deveria ter ocorrido o corte no fornecimento de água no imóvel, porque a dívida está sendo contestada em juízo, reafirmando que aquele ocorreu realmente, sendo que os funcionários da apelada elaboraram relatório mascarando a verdade, dizendo no verso desse, que não foi juntado nos autos, observou por escrito a real situação ocorrida no imóvel.

    Requereu, ao final, o provimento do presente recurso, no sentido de ser reformada a sentença guerreada para condenar a apelada ao pagamento de danos morais, honorários de advogado e custas processuais, além da declaração de inexistência de débitos entre as partes.

    A apelada apresentou suas contra-razões (fls. 167/170), requerendo o não-provimento do apelo e a manutenção da sentença guerreada.

    É o relatório.


    VOTO

    DESEMBARGADOR MIGUEL MONICO NETO

    Conheço do recurso interposto, porquanto próprio e tempestivo.

    A apelante ajuizou a presente ação declaratória de inexistência de débito, com pedido de tutela antecipada, cumulada com indenização por danos morais contra a apelada - CAERD, pretendendo que fosse declarada a inexistência do débito relativo ao consumo de água do antigo proprietário do imóvel e a condenação em danos morais, em razão do corte e notificação de nova suspensão no fornecimento de água no imóvel, como forma de obrigar o pagamento dos débitos existentes, de responsabilidade do antigo proprietário.

    Segundo observa-se nos autos, a apelante comprou o imóvel residencial onde existia um débito em discussão sobre o valor real do consumo de água do imóvel, de responsabilidade do antigo proprietário (José Ary Gurjão Silveira), conforme documento (fl. 14), protocolizado na empresa-apelada, em 8/7/2003, recebido pelo funcionário Ademar Leite de Amorim, Matrícula n. 1.921.

    No documento aludido destaca-se que, a partir do dia 30/6/2003, a apelante assumiu a responsabilidade do consumo de água do imóvel localizado na rua Tabajara, n. 2.485 (Hidrômetro n. A87S071456), requerendo a transferência da titularidade dessa conta para a sua titularidade (apelante), ficando destacado que o antigo proprietário José Ary Gurjão Silveira era o responsável pelos débitos anteriores.

    Feita a transferência da titularidade referente aos serviços de água e esgoto, começaram os transtornos na vida da apelante, em razão da insistência, por parte da apelada em cobrar da apelante os débitos anteriores, de responsabilidade do antigo proprietário (documento de fl. 13).

    Observa-se no documento de fl. 13 que todos os débitos existentes e que estão sendo cobrados da apelante são anteriores a sua aquisição, ou seja, todos de responsabilidade do antigo proprietário, conforme documento protocolizado na empresa-apelada e já mencionado.

    A apelante, não observando solução amigável ao problema, interpôs a presente ação, objetivando a declaração de inexistência de débitos, que não era de sua responsabilidade, cumulada com uma indenização por danos morais, pelo fato de ter sido efetivado o corte em seu fornecimento de água (sic), o qual foi restabelecido, de forma precária, por sua conta própria, e pela forma como a empresa-apelada estava agindo para receber as faturas dos serviços de água prestados.

    Por sua vez, a empresa-apelada apresentou reconvenção (fls. 57/61), requerendo a condenação da apelante na importância de R$891,80 referente aos débitos dos meses de maio de 2001, maio de 2002 a julho de 2003 (documento de fl. 62) e denunciando à lide o antigo proprietário José Ary Gurjão.

    Após os tramites processuais, o julgador monocrático decidiu, em sua sentença (fls. 124/132), que o débito que o anterior proprietário discutia em juízo era somente o da conta de fornecimento de água relativo a maio de 2001, deixando de discutir as contas posteriores.

    Conseqüentemente, considerou válidas as contas posteriores, afirmando que a notificação de corte de fornecimento é uma forma de cobrança que a empresa possui, que não gera dano nenhum, a menos que a efetivação do corte tivesse ocorrido.

    Decidiu que a autora poderia ser cobrada pelas contas de água do antigo proprietário mesmo não sendo de seu consumo, afirmando tratar de obrigação propter rem, destacando jurisprudência do TJRS relativa a cotas condominiais (In Apel. Civ. n. 70008997892, 18ª Câm. Cív. TJRS, Rel. André Luiz Planella Villarinho, julgado em 29/9/2005).

    Destacou que o antigo proprietário se responsabilizou, por escrito, perante a empresa-apelada, porém essa decidiu que poderia cobrar a dívida da apelante como também do antigo proprietário.

    Observou que a jurisprudência tem afastado a possibilidade do corte do fornecimento de serviço essencial. Todavia, diante da notificação do corte no fornecimento de água, caso não houvesse o pagamento, não geraria os danos morais alegados.

    Frisou a ausência de provas nos autos da ocorrência do corte no fornecimento de água à apelante, não obstante tenha ocorrido a notificação, julgou improcedentes os pedidos da apelante.

    Por fim, entendeu que a obrigação anterior dos débitos é inerente ao imóvel, responsabilizando e condenando a apelante ao pagamento dos débitos anteriores, exceto o do mês de maio de 2001, totalizando a importância de R$809,62 referente às contas de fornecimento do serviço de água dos meses de maio de 2002 a julho de 2003, conforme extrato juntado aos autos à fl. 62.

    Condenou ainda a apelante ao pagamento das custas processuais e honorários de advogado, os quais fixou em 20% do valor da causa, incluídos os honorários de sucumbência da reconvenção, com base no art. 20, § 3°, do Código de Processo Civil e extinguiu o processo, bem como o feito representado pelos autos de Reconvenção n. 001.2003.022102-0, ambos com julgamento do mérito, com base no art. 269, inc. I, do CPC.

    A irresignação da apelante merece amparo. É forçoso dizer que o comprador do imóvel (apelante) não pode vir a responder por dívida que não contraiu, devendo a concessionária de água buscar o seu crédito com aquela pessoa com quem contratou o fornecimento de água e se responsabilizou por escrito, assumindo os débitos.

    Por via de conseqüência, não pode cortar o fornecimento de água do proprietário que adquiriu o imóvel, se em nome desse não existe débito por ele contraído.

    Não se ignora a existência da legislação, na qual é previsto o corte no fornecimento de água e energia elétrica, quando houver inadimplemento por parte do consumidor. Todavia, essa mesma legislação protege a apelante, senão vejamos:

    Dispõem os arts. 6º da Lei n. 8.987/95 e 17 da Lei n. 9.427/96:


    Art. 6º. Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.

    § 1º - Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.

    § 2º - A atualidade compreende a modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão do serviço.

    § 3º - Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando:

    I - motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações; e,

    II - por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade.

    Art. 17. A suspensão, por falta de pagamento, do fornecimento de energia elétrica a consumidor que preste serviço público ou essencial à população e cuja atividade sofra prejuízo, será comunicada com antecedência de quinze dias ao Poder Público local ou ao Poder Executivo Estadual.

    Parágrafo único. O Poder Público que receber a comunicação adotará as providências administrativas para preservar a população dos efeitos da suspensão do fornecimento de energia, sem prejuízo das ações de responsabilização pela falta de pagamento que motivou a medida.

    Nesse caso, porém, é diferente. Não se trata de débito da apelante, mas de terceiro, ou seja, do antigo proprietário do imóvel vendido.

    Ficou demonstrado nos autos que a apelada mantinha relação jurídica com o antigo proprietário, até porque aceitou o documento protocolizado (fl. 14) e transferiu a titularidade da conta de água para a apelante, nova proprietária do imóvel negociado, assim, desse modo, não pode coagir a apelante a pagar um débito que não era desta.

    A lei veda prática abusiva desse jaez por se traduzir em coação ilegal como disposto nos arts. 42, e parágrafo único, 51, inc. IV, § 1º, incs. I e II, e 54, § 4º, do Código de Defesa do Consumidor:


    Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.

    Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.

    Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

    IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;

    § 1º - Presume-se exagerada, entre outros casos, a vontade que:

    I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;

    II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual;

    Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.

    § 4° - As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.


    Outrossim, tratando-se de serviço essencial, o fornecimento de água, os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos na forma do disposto no art. 22 do CDC, respondendo as pessoas jurídicas pelos danos causados na forma do disposto no parágrafo único do art. 22 e da legislação civil.


    Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

    Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.


    O suposto corte no fornecimento de água no presente caso, mas efetivamente a coação realizada, por meio da notificação de aviso de corte, caso não fosse feito o pagamento das contas de água atrasadas do antigo proprietário para a apelante, revelou nítida coação, o que é vedado pela legislação consumeirista, forçando a apelante a interpor a presente ação para não ser compelida a pagar por dívida que não era sua, ou seja, dívida de terceiro.

    Assim, completando o raciocínio, dizer que o importante é o número da conta e a unidade consumidora, pouco importando em quem venha a recair a dívida, se constitui em alegativa leviana que afronta os princípios jurídicos aplicáveis.

    Não obstante, forçar a apelante a pagar dívida de outrem, mediante drástica coação, consistente na notificação de suspensão nos serviços de fornecimento de água, traduz-se em incompreensível heresia jurídica, ensejando aqui a condenação da apelada em danos morais pela sua indevida e ilegal atuação.

    Outro ponto que merece aclaramento é em relação à decisão guerreada, que considerou a obrigação relativa aos débitos do consumo de água como obrigação propter rem.

    Jamais, vale dizer, que a obrigação neste caso, é uma obrigação propter rem, como quis fazer crer a apelada e decidiu o juízo a quo, mas, sim, é nítida obrigação pessoal.

    Não é sempre e invariavelmente o proprietário do imóvel em que se encontra instalada a unidade consumidora o responsável pelo pagamento das faturas referentes ao consumo. O responsável é quem aparece nas faturas como consumidor de fato, que assumiu perante a concessionária a obrigação de pagar pelo consumo de água ou energia efetivamente usado.



    Nesse sentido:

    MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO CÍVEL. ENERGIA ELÉTRICA. FORNECIMENTO. SUSPENSÃO ANTERIOR POR NÃO-PAGAMENTO. OBRIGAÇÃO PESSOAL. SUBLOCAÇÃO. FATO NÃO OPONÍVEL A TERCEIRO. INOCORRÊNCIA DE SUCESSÃO COMERCIAL. ATO ILEGAL. DIREITO LÍQUIDO E CERTO DEMONSTRADO. APELO DESPROVIDO.

    Não obstante a iterativa jurisprudência admitir o corte no fornecimento de energia elétrica em decorrência do inadimplemento, quando precedido de notificação, o ônus decorrente desta obrigação não pode ser transferido a terceiro, por não ser propter rem. Logo, é ilegal a recusa de fornecimento em sublocação autorizada, por dívida do proprietário do imóvel (TJSC - AC em MS; Acórdão n. 2005.017421-4; Rel. Des. Francisco Oliveira Filho; data de decisão: 23/8/2005).


    Para não restar a menor dúvida, o fornecimento de água como também o de energia elétrica resulta de contrato de adesão, cuja obrigação é de natureza pessoal, o que não constitui ônus real que deva necessariamente acompanhar o imóvel.

    Diferente é a taxa condominial, em que a obrigação existe em razão da coisa, incluindo-se, além do consumo de água da respectiva unidade, as demais despesas como por exemplo: segurança, limpeza, recolhimento de lixo e etc.

    Por sua vez, o artigo 9º da Portaria n. 466/97, que repete e complementa o art. 10 da revogada Portaria n. 222, de 22 de dezembro de 1987, do extinto Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica - DNAEE, hoje ANEEL, aplicável ao caso em tela, traduz o conceito de consumidor e elimina qualquer possível discussão sobre o tema:


    Art. 9º. Entender-se-á por consumidor a pessoa física ou jurídica, ou comunhão de fato ou de direito, legalmente representada, que solicitar ao concessionário o fornecimento de energia elétrica e assumir a responsabilidade pelo pagamento das contas e pelas demais obrigações legais, regulamentares e contratuais.


    Observa-se que, consoante o art. 2º da mencionada Portaria n. 466/97, o pedido de fornecimento de água ou energia elétrica caracteriza-se por um ato voluntário do consumidor, no qual este solicita ser atendido pelo concessionário no que tange à prestação de serviço público de fornecimento de água ou energia elétrica, exigindo-se a celebração, por escrito, de contrato de fornecimento (alínea g do inc. II do § 1º).

    Ademais, o art. 20 da citada portaria complementa:


    O fornecimento de energia elétrica caracteriza negócio jurídico de natureza contratual. A ligação da unidade consumidora implica a responsabilidade de quem solicitou o fornecimento, pelo pagamento correspondente aos serviços prestados e pelo cumprimento das demais obrigações pertinentes.

    Finalmente, no art. 66, disciplina o conteúdo da fatura:

    A conta deverá conter, quando pertinentes, as seguintes informações:

    I - nome do consumidor.


    Mesmo que nenhuma das portarias mencionadas tenha previsto expressamente, é evidente a possibilidade de, no transcurso do tempo, a solicitação originária do fornecimento de água ou de energia elétrica ser transferida a terceira pessoa em nome de quem se transfere o cadastro e a fatura, com a aquiescência da concessionária, perante a qual o novo consumidor passa a ter a responsabilidade de pagamento das contas de consumo, bem como pelas obrigações decorrentes da lei, dos regulamentos e do contrato.

    Assim, consumidor não é apenas aquele que solicita originariamente o fornecimento de água, mas também aquele que assume a responsabilidade pelo pagamento das contas, em decorrência da transferência da obrigação.

    Consumidor é, portanto, em ultima ratio, aquele que realmente consome a água e cujo nome consta da fatura, como é o caso de locatários, em nome dos quais normalmente as concessionárias emitem faturas de água ou de energia elétrica, e não do dono do imóvel alugado.

    Assim, a transferência das contas de água, esgoto, gás ou energia elétrica, com a aquiescência da concessionária do serviço público correspondente, também transfere a responsabilidade pelo pagamento das faturas.

    Desse modo, em virtude da falta de pagamento, cabia à concessionária apelada promover a ação de cobrança contra o titular das faturas em atraso do antigo proprietário ¿ José Ary Gurjão Silveira, que assumiu perante ela a responsabilidade pelo pagamento, e não coagir a apelante, atual proprietária do imóvel, a pagar débitos que não são seus, sob pena de corte no fornecimento de água.

    Em outras palavras, se a concessionária estabeleceu nova relação jurídica, obviamente, não transferiu os débitos de responsabilidade do antigo proprietário para a nova consumidora dos serviços da apelada, que assumiu somente o seu consumo a partir da data convencionada entre as partes.

    Nessa linha de raciocínio:


    ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. CORTE NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. IMPOSSIBILIDADE DE SUSPENSÃO. HIPÓTESE DE EXIGÊNCIA DE DÉBITO PRETÉRITO. AUSÊNCIA DE INADIMPLEMENTO. CONSTRANGIMENTO E AMEAÇA AO CONSUMIDOR. CDC, ART. 42. SÚMULA N. 282/STF.

    1. É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada. Súmula n. 282/STF.

    2. Deveras, resta inviável a apreciação, em sede de Recurso Especial, de matéria sobre a qual não se pronunciou o tribunal de origem, porquanto indispensável o requisito do prequestionamento, in casu, acerca do inadimplemento do usuário no pagamento da conta de energia elétrica.

    3. A Primeira Turma, no julgamento do REsp n. 772.489/RS, bem como no AgRg no AG 633.173/RS, assentou o entendimento de que não é lícito à concessionária interromper o fornecimento de energia elétrica por diferença de tarifa, a título de recuperação de consumo de meses, em face da essencialidade do serviço, posto bem indispensável à vida.

    4. Concernente a débitos antigos não-pagos, há à concessionária os meios ordinários de cobrança, sob pena de infringência ao disposto no art. 42 do Código de Defesa do Consumidor.

    5. In casu, o litígio não gravita em torno de inadimplência do usuário no pagamento da conta de energia elétrica (Lei n. 8.987/95, art. 6º, § 3º, inc. II), em que cabível a interrupção da prestação do serviço, pelo que não há cogitar suspensão do fornecimento de energia elétrica pelo inadimplemento.

    6. Recurso especial a que se nega seguimento (STJ - REsp. n. 821991/SP; Rel. Min. LUIZ FUX; órgão julgador: T1 - PRIMEIRA TURMA; data do julgamento: 9/5/2006; data da publicação/fonte: DJ de 1º/6/2006, p. 167) (g.n.).


    ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CORTE NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. IMPOSSIBILIDADE DE SUSPENSÃO. HIPÓTESE DE EXIGÊNCIA DE DÉBITO PRETÉRITO. AUSÊNCIA DE INADIMPLEMENTO. CONSTRANGIMENTO E AMEAÇA AO CONSUMIDOR. CDC, ART. 42.

    1. A Primeira Turma, no julgamento do REsp. n. 772.489/RS, bem como no AgRg no AG 633.173/RS, assentou o entendimento de que não é lícito à concessionária interromper o fornecimento de energia elétrica por diferença de tarifa, a título de recuperação de consumo de meses, em face da essencialidade do serviço, posto bem indispensável à vida.

    2. É que resta cediço que a "suspensão no fornecimento de energia elétrica somente é permitida, quando se tratar de inadimplemento de conta regular, relativa ao mês do consumo, restando incabível tal conduta quando for relativa a débitos antigos não-pagos, em que há os meios ordinários de cobrança, sob pena de infringência ao disposto no art. 42 do Código de Defesa do Consumidor. Precedente: AgRg no Ag n. 633.173/RS, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, DJ de 2/5/2005 (REsp. n. 772.486/RS, Primeira Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ de 6/3/2006).

    3. Concernente a débitos antigos não-pagos, há à concessionária os meios ordinários de cobrança, sob pena de infringência ao disposto no art. 42 do Código de Defesa do Consumirdor.

    4. In casu, o litígio não gravita em torno de inadimplência do usuário no pagamento da conta de energia elétrica (Lei n. 8.987/95, art. 6º, § 3º, II), em que cabível a interrupção da prestação do serviço, por isso que não há cogitar suspensão do fornecimento de energia elétrica pelo inadimplemento.

    5. Recurso especial improvido (STJ - REsp. n. 756591/DF; Rel. Min. LUIZ FUX; órgão julgador: T1 - PRIMEIRA TURMA; data do julgamento: 4/5/2006; data da publicação/fonte: DJ em 18/5/2006, p. 195) (g.n.).


    Resta incontroverso que a apelante foi ilegalmente e indevidamente notificada e cobrada para quitar débitos que não eram seus, sob pena de suspensão no fornecimento de água do seu imóvel, não obstante o antigo proprietário tenha assumido os débitos perante a concessionária apelada.

    Todavia, a relação jurídica existente entre as partes é, sem dúvida, uma relação de consumo. Assim, a presente lide, cuja origem remonta dos danos causados à apelante, deve ser analisada à luz da Lei n. 8.078/90 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor. A apelante, portanto, realmente consumidora, e, assim deve ser tratada, pois foi vítima de uma relação de consumo.

    Nesse passo, deve ser reconhecida a sua vulnerabilidade no mercado de consumo, de acordo com o art. 4º, inc. I, do Código de Defesa do Consumidor, princípio fundamental para atendimento da política nacional das relações de consumo, além de todos os direitos básicos previstos no referido estatuto.

    À vista disso, é de clareza hialina a responsabilidade da apelada. Esta responsabilidade civil é objetiva, independentemente da existência de culpa e emerge, deve-se repisar, pela simples notificação, sob pena de suspensão do serviço prestado por dívida de terceiro, quando isso jamais se poderia esperar.

    Dispõem os arts. 14 e 25, ambos do Código de Proteção e de Defesa do Consumidor:


    Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

    Art. 25. É vedada a estipulação contratual de cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar prevista nesta e nas Seções anteriores.


    Assim, os danos sofridos pela apelante, no caso consumidora, devem ser suportados pela apelada, porquanto se trata, na forma do direito do consumidor, de responsabilidade objetiva.


    Assim, ausente de dúvidas quanto à responsabilidade da apelada, pois, de forma clara e indiscutível, independentemente dos argumentos feitos pela apelada, resta nos autos demonstrada a sua responsabilidade objetiva. Aliás, não demonstrou a apelada, em nenhum momento, nenhuma das excludentes estabelecidas pelo CDC.

    Os fatos são incontroversos, e ainda que a apelada se esforce para afastar sua responsabilidade, como afirmado, esta é objetiva, por se tratar de relação de consumo, prescindindo da demonstração de dolo ou culpa.

    A forma como a apelada cobrou e está cobrando da apelante as faturas de consumo de água não-quitadas, é extremamente falha, desprovida de cuidado, fazendo a apelante passar por situação que não pode ser admitida.

    Pelo exposto, reformo integralmente a sentença guerreada, julgando procedente os pedidos da apelante, declarando inexistente os débitos cobrados relativos às faturas atrasadas, de responsabilidade do antigo proprietário, e condenando a apelada a pagar uma indenização por danos morais à apelante, que arbitro em R$5.000,00 e, conseqüentemente, julgo improcedente o pedido feito na reconvenção.

    Condeno ainda a apelada ao pagamento das custas processuais e honorários de advogado, os quais fixo em 20% do valor da causa, incluídos os honorários de sucumbência da reconvenção, com base no art. 20, § 3°, do Código de Processo Civil.

    É como voto.



    DESEMBARGADOR ROOSEVELT QUEIROZ COSTA
    De acordo.



    DESEMBARGADOR MARCOS ALAOR DINIZ GRANGEIA
    De acordo.



    DECISÃO

    Como consta da ata de julgamentos, a decisão foi a seguinte: ¿RECURSO PROVIDO NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, À UNANIMIDADE¿.

    Presidente o Excelentíssimo Desembargador Roosevelt Queiroz Costa.


    100.001.2003.019173-3 Apelação Cível

  • 0
    S

    sandra morethe Domingo, 10 de fevereiro de 2008, 10h41min

    creio que a dívida é da antiga moradora, contudo se a adquirinte se comprometeu em quitar os débitos do imóvel quando o arrematou, então tais débitos são dela.

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