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Trabalhador rural empregado X trabalhador rural em regime de economia familiar (segurado especial): diferenças previdenciárias

Trabalhador rural empregado X trabalhador rural em regime de economia familiar (segurado especial): diferenças previdenciárias

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SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. Do trabalhador rural; 3. Do empregado rural; 4. Do trabalhador rural em regime de economia familiar (segurado especial); 5. Do regime previdenciário do empregado rural; 6. Do regime previdenciário do segurado especial; 7. Do artigo 143 da Lei n.º 8.213/91: norma transitória; 8. Conclusão


1. Introdução

O presente artigo tem por escopo tratar das diferenças no enquadramento previdenciário entre duas espécies de trabalhadores rurais – o empregado e o pequeno produtor que trabalha em regime de economia familiar.

A iniciativa em tratar do tema advém do fato de ser comum no dia-a-dia daqueles que lidam com o Direito Previdenciário depararem-se com confusões e equívocos conceituais ao ver a questão ser tratada. Vale dizer, são invocados direitos e normas aplicáveis a uma espécie de segurado ao outro, indistintamente, como se não houvesse diferenças entre ambos.

Busca-se, assim, despretensiosamente, sanar algumas dúvidas conceituais, de forma a enquadrar cada espécie de segurado em seu devido lugar dentro do ordenamento jurídico previdenciário.

Para tanto, inciar-se-á conceituando o que vem a ser o trabalhador rural, genericamente considerado. Em seguida, tratar-se-á de duas espécies distintas de trabalhadores rurais, quais sejam, o empregado e o segurado especial. Por fim, enquadrar-se-á cada uma delas em um determinado grupamento de segurado.

Iniciem-se, então, os trabalhos.


2. Do trabalhador rural

A Convenção n.º 141 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, em seu artigo 2º, definiu o que vem a ser trabalhador rural, no seguintes termos:

Art. 2º – 1. Para efeito da presente Convenção, a expressão "trabalhadores rurais" abrange todas as pessoas dedicadas, nas regiões rurais, a tarefas agrícolas ou artesanais ou a ocupações similares ou conexas, tanto se se trata de assalariados como, ressalvadas as disposições do parágrafo 2 deste artigo, de pessoas que trabalhem por conta própria, como arrendatários, parceiros e pequenos proprietários.

Já de início, vê-se que a própria Convenção da OIT distingue, no mínimo, duas espécies distintas de trabalhadores rurais. Trata-se, portanto, de expressão genérica, que engloba tanto o empregado rural como aquele que se dedica, por conta própria, ao labor rural, seja como arrendatário, parceiro, meeiro ou em sua própria propriedade.

Em síntese, trabalhador rural é toda aquela pessoa física que lida com atividades de natureza agrícola, retirando daí o seu sustento.

No ordenamento jurídico pátrio, era a Lei n.º 4.214/63, o chamado Estatuto do Trabalhador Rural, que tratava do tema. Essa lei, que previa quase os mesmos direitos trabalhistas para os trabalhadores rurais em relação aos urbanos, foi revogada pela Lei n.º 5.889/73 (art. 21), atualmente vigente e regulamentada pelo Decreto n.º 73.626/74.

Ressai do exposto que há várias espécies de trabalhadores rurais. No que interessa ao presente artigo, destacam-se o empregado rural e o segurado especial.


3. Do empregado rural

De início, cumpre advertir que, salvo quando houver determinação em sentido contrário, a CLT não se aplica ao empregado rural, nos termos do artigo 7º, b, dessa mesma Consolidação.

Dito isso, note-se que, nos termos do artigo 2º da Lei n.º 5.889/73, considera-se empregado rural "toda pessoa física que, em propriedade rural ou prédio rústico, presta serviços de natureza não eventual a empregador rural, sob a dependência deste e mediante salário".

Trata de conceito semelhante ao da legislação trabalhista (art. 3º da CLT), com a inclusão do rurícola. Para fins previdenciários, não há distinção entre o empregado urbano ou rural. Tal distinção existia no passado, em períodos anteriores à Constituição de 1988. Atualmente, não é mais cabível qualquer discriminação entre estas figuras. [01]

O empregado rural, conforme se vê, nada mais é do que uma espécie do gênero empregado. Vale dizer, é uma pessoa física que presta serviços habitualmente (não eventual), de forma subordinada e pessoalmente, mediante o pagamento de salário.

Advirta-se, neste ponto, que:

Na verdade, não é apenas quem presta serviços em prédio rústico ou propriedade rural que será considerado empregado rural. O empregado poderá prestar serviços no perímetro urbano da cidade e ser considerado trabalhador rural. O elemento preponderante, por conseguinte, é a atividade do empregador. Se o empregador exerce atividade agroeconômica com finalidade de lucro, o empregado será rural, mesmo que trabalhe no perímetro urbano da cidade. [02]

Em outros termos, a única diferença entre o empregado rural e o urbano é que aquele presta serviços de natureza agrícola (planta, aduba, ordenha e cuida do gado etc) a empregador que explora a atividade economicamente. Se, por outro lado, a atividade não tiver fim lucrativo, será considerado empregado doméstico (ex.: caseiro). Vale dizer, se há plantação no sítio, mas não há comercialização, o caseiro será empregado doméstico. Se, porém, os produtos cultivados por esse empregado forem vendidos, essa mesma pessoa será considerada empregada rural.

Toda essa diferenciação entre empregado rural e urbano, contudo, perdeu muito de sua relevância, porquanto, com o advento da Constituição de 1988, ambos possuem, em regra [03], os mesmos direitos (artigo 7º, caput) [04].

Dizer que um determinado empregado é rural ou urbano apenas qualifica o tipo de labor ao qual se dedica, e nada mais.


4. Do trabalhador rural em regime de economia familiar (segurado especial)

Espécie de trabalhador rural, o segurado especial é o único com definição no próprio texto constitucional, que, em seu artigo 195, §8º, prevê que:

O produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais e o pescador artesanal, bem como os respectivos cônjuges, que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, sem empregados permanentes, contribuirão para a seguridade social mediante a aplicação de uma alíquota sobre o resultado da comercialização da produção e farão jus aos benefícios nos termos da lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

No mesmo sentido, é a Convenção n.º 141 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, que, no item 2 de seu artigo 2º, diz que:

2. A presente Convenção aplica-se apenas àqueles arrendatários, parceiros ou pequenos proprietários cuja principal fonte de renda seja a agricultura e que trabalhem a terra por conta própria ou exclusivamente com a ajuda de seus familiares, ou recorrendo eventualmente a trabalhadores suplente e que:

a) não empreguem mão-de-obra permanente; ou

b) não empreguem mão-de-obra numerosa, com caráter estacionário; ou

c) não cultivem suas terras por meio de parceiros ou arrendatários.

A Lei n.º 8.213/91, por sua vez, após qualificá-lo como segurado obrigatório da Previdência Social, assim define o segurado especial (artigo 11):

VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de: (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)

a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade: (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

§ 1º  Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)

Em resumo, considera-se segurado especial o pequeno produtor rural e o pescador artesanal que trabalhem individualmente ou em regime de economia familiar, desde que não tenham empregados.

O regime de economia familiar é aquele em que a atividade dos membros da família é indispensável à própria subsistência, em condições de mútua colaboração, sem utilização de empregados.

Todos os membros da família maiores de 16 anos, desde que não exerçam outra atividade econômica, são enquadrados na categoria. No entanto (artigo 11 da Lei n.º 8.213/91):

§ 9º  Não é segurado especial o membro de grupo familiar que possuir outra fonte de rendimento, exceto se decorrente de: (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

I – benefício de pensão por morte, auxílio-acidente ou auxílio-reclusão, cujo valor não supere o do menor benefício de prestação continuada da Previdência Social; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

II – benefício previdenciário pela participação em plano de previdência complementar instituído nos termos do inciso IV do § 8º deste artigo; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

III – exercício de atividade remunerada em período de entressafra ou do defeso, não superior a 120 (cento e vinte) dias, corridos ou intercalados, no ano civil, observado o disposto no § 13 do art. 12 da Lei nº 8.212, de 24 julho de 1991; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

IV – exercício de mandato eletivo de dirigente sindical de organização da categoria de trabalhadores rurais; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

V – exercício de mandato de vereador do Município em que desenvolve a atividade rural ou de dirigente de cooperativa rural constituída, exclusivamente, por segurados especiais, observado o disposto no § 13 do art. 12 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

VI – parceria ou meação outorgada na forma e condições estabelecidas no inciso I do § 8º deste artigo; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

VII – atividade artesanal desenvolvida com matéria-prima produzida pelo respectivo grupo familiar, podendo ser utilizada matéria-prima de outra origem, desde que a renda mensal obtida na atividade não exceda ao menor benefício de prestação continuada da Previdência Social; e (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)

VIII – atividade artística, desde que em valor mensal inferior ao menor benefício de prestação continuada da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)


5. Do regime previdenciário do empregado rural

Conforme já dito, a Lei 8.213/91 não diferencia os empregados urbanos dos rurais ao classificar a sua qualidade. Ambos são enquadrados como segurados obrigatórios da Previdência Social. Veja-se:

Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:

I- como empregado:

a) aquele que presta serviço de natureza urbana ou rural à empresa, em carater não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como direitor empregado;

Enquanto segurado obrigatório da Previdência, a sua inscrição é formalizada, via de regra, pelo contrato de trabalho registrado na Carteira do Trabalho e Previdência Social.

Nesse caso, são devidas contribuições previdenciárias tanto pelo empregado como pelo empregador. No caso da contribuição devida pelo empregado (alíquota de 8% a 11%), é de responsabilidade do empregador retê-la do salário daquele para, em seguida, repassá-la ao INSS. A contribuição do empregador, por sua vez, possui alíquota de, em regra, 20% [05], incidente sobre a totalidade da remuneração. O fato gerador do tributo é o exercício da atividade remunerada, e não o efetivo pagamento dos salários.

Conclui-se, pois, que, para fazer jus aos benefícios previdenciários, o empregado rural, tal como o urbano, deve contribuir para a manutenção do sistema.

A lei não dispensou, em momento algum, o empregado rural dessa obrigação [06].

É verdade, contudo, que, como a obrigação de reter e repassar as contribuições é do empregador, não poderá o empregado ser prejudicado por eventual falta daquele. Ao contrário, uma vez comprovado o vínculo empregatício, mediante início de prova documental [07] suficiente, será ele considerado, para todos os fins, segurado da Previdência. Restará à União buscar, junto ao empregador, o pagamento das contribuições devidas e não pagas.

A regra, no entanto, é que o empregado rural fará jus aos benefícios previdenciários decorrentes de sua qualidade de segurado obrigatório se houver vertido as contribuições pertinentes ao vínculo empregatício alegado, devidamente anotado em sua Carteira do Trabalho.

Se não houver contribuições ou anotação em sua Carteira do Trabalho, deverá, tal como ocorre com o empregado urbano, provar a sua qualidade de segurado mediante início de prova documental suficiente dos vínculos alegados.

Se não conseguir comprovar a sua remuneração, perceberá benefício de valor equivalente a 1 salário mínimo, em conformidade com o artigo 35 da Lei n.º 8.213/91, ressalvando a lei o direito de revisar a renda mensal inicial de seu benefício tão-logo seja apresentada prova do valor real de seus salários de contribuição.

Tudo, portanto, de forma idêntica ao trabalhador urbano. A única diferença, na verdade, no tratamento entre ambos é quanto ao tempo de carência para obtenção do benefício de aposentadoria por idade, que, em se tratando do trabalhador rural, é reduzido em 5 (cinco) anos (artigo 201, §7º, II, da Constituição da República, e artigo 48, §1º, da Lei n.º 8.213/91).


6. Do regime previdenciário do segurado especial

Conforme já se viu, a própria Constituição da República (artigo 195, §8º) já antecipou que as contribuições de tais trabalhadores rurais serão diferentes das vertidas pelos empregados rurais.

No caso dos segurados especiais, a contribuição para a Previdência Social recairá sobre o valor obtido com a comercialização de sua produção. Afinal, não há salário a ser descontado, nem tampouco empregador para pagar a sua respectiva cota-parte.

Se não houver venda de sua produção, que se destina unicamente para a subsistência do grupo familiar, contribuição alguma haverá. Mesmo assim, estará o segurado protegido pela Previdência Social.

É justamente por isso que se chama o segurado, nessa hipótese, de especial.

Todos os membros da família (cônjuge ou companheiros e filhos maiores de 16 anos de idade ou a eles equiparados) que trabalham na atividade rural, no próprio grupo familiar, são considerados segurados especiais.

Ao segurado especial é garantida a percepção dos benefícios de aposentadoria por idade ou invalidez, auxílio-doença, auxílio-reclusão, salário-maternidade e, aos seus dependentes, de pensão por morte, no valor, em todos os casos, de um salário mínimo (artigo 39, I, parágrafo único, da Lei n.º 8.213/91). Veja-se:

Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:

I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido; ou

II - dos benefícios especificados nesta Lei, observados os critérios e a forma de cálculo estabelecidos, desde que contribuam facultativamente para a Previdência Social, na forma estipulada no Plano de Custeio da Seguridade Social.

Parágrafo único. Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício.(Incluído pela Lei nº 8.861, de 1994)

Do segurado especial não se exige carência, que é a comprovação de número mínimo de contribuições vertidas ao sistema previdenciário. Basta o exercício da atividade rural, individualmente ou em regime de economia familiar, sem empregados, pelo número de meses correspondentes à carência do benefício pretendido.

Ao segurado especial, portanto, é assegurada a aposentadoria por idade desde que demonstre o exercício de labor rural, imediatamente anterior ao requerimento, pelo período de 180 meses se se tratar de segurado especial que deu início às suas atividades após o advento da Lei n.º 8.213/91. Caso exercesse o trabalho rural desde antes da Lei de Benefícios a ele se aplica o disposto no art. 142, que fixa a tabela transitória progressiva de carências, apresentando tempo menor para comprovação de atividade rural, conforme o ano de implemento de idade. [08]

Caso pretenda obter algum outro benefício previdenciário além dos previstos no inciso I do artigo 39 da Lei n.º 8.213/91, ou, ainda, perceber valor maior que o mínimo, deverá inscrever-se como segurado facultativo, vertendo as contribuições previdenciárias pertinentes (artigo 39, II, da Lei 8.213/91 e artigo 25, §1º, da Lei n.º 8.212/91).


7. Do artigo 143 da Lei n.º 8.213/91: norma transitória

A norma prevista no artigo 143 da Lei n.º 8.213/91 será tratada em item apartado porque se trata de norma aplicável tanto ao empregado rural como ao segurado especial. Diz esse artigo que:

Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício. (Redação dada pela Lei nº. 9.063, de 1995) (Vide Medida Provisória nº 410, de 2007).

Apenas o trabalhador rural, seja ele empregado, trabalhador autônomo ou segurado especial, foi contemplado pela norma.

Trata-se de norma transitória, porquanto tem prazo certo para seu fim: 15 anos a contar da vigência da Lei 8.213. Ou seja, somente até o ano de 2006 poderia o trabalhador apresentar seu requerimento administrativo.

Em relação ao empregado rural, e somente a ele, o prazo foi prorrogado até 31/12/2010 (MP 410, convertida na Lei n.º 11.718/2008). Estendeu-se tal prorrogação ao contribuinte individual que preste serviços rurais.

Em relação ao segurado especial, não mais subsiste a norma transitória. No entanto, conquanto expirada a norma do art. 143 em relação ao segurado especial, este não sofre prejuízo algum, já que permanecerá podendo auferir o benefício de aposentadoria por idade com espeque no artigo 39, I, da Lei n.º 8.213/91, já visto em tópico anterior.

Conclui-se, pois, que o escopo do artigo 143 foi tão-somente estender aos demais trabalhadores rurais a regra válida, em princípio, apenas para os segurados especiais, qual seja, a regra de que a carência é contada independentemente de comprovação de recolhimentos à Previdência. Contudo, em relação a eles, a norma tem prazo certo para acabar.

Após esse prazo, estes trabalhadores seguirão a regra geral de carência, devendo comprovar os recolhimentos mensais necessários, à exceção do segurado especial, que continuará em regra própria de carência. A ampliação justifica-se, pois os trabalhadores rurais migraram de um sistema não contributivo para um contributivo. [09]


8. Conclusão

De todo o exposto pode-se concluir que o empregado rural foi tratado pela legislação previdenciária, bem como pela própria Constituição da República, de forma idêntica ao urbano, com apenas algumas ressalvas.

Dentre elas, vale destacar duas. Primeiro, a diminuição, em 5 anos, da idade necessária para obtenção do benefício de aposentadoria por idade. Segundo, a prevista no artigo 143 da Lei n.º 8.213/91, já analisado.

No restante, as mesmas exigências e regras aplicáveis aos trabalhadores urbanos devem ser utilizadas para os rurais.

Ressalvada a regra transitória do artigo 143 da Lei n.º 8.213/91, somente os segurados especiais são beneficiados pela norma que os dispensa de verter contribuições sociais ao INSS, bastando comprovar que, no tempo equivalente à carência exigida para obtenção do benefício pretendido, exerceram, de fato, a atividade rural, individualmente ou em regime de economia familiar, sem o auxílio de empregados.

Na hipótese, portanto, de o trabalho exercido pelo empregado rural, bem como pelo segurado especial, não estar devidamente registrado, cada um tem fatos distintos a serem comprovados.

O empregado rural deverá comprovar que exerceu, de forma subordinada, habitual (não eventual) e pessoalmente, percebendo, para tanto, salários, atividade em favor de empregador rural, que explorava o agronegócio economicamente. Deverá, em outros termos, comprovar o vínculo empregatício, que, uma vez reconhecido, ensejará a anotação na Carteira do Trabalho e a exigência, do empregador, do pagamento das contribuições devidas e não pagas.

Em relação ao segurado especial, deverá ele comprovar outro fato. Que era um pequeno agricultor, que exercia sua atividade individualmente ou em regime de economia familiar, sem o auxílio de empregados, e que dependia desse trabalho para sobreviver.

Situações distintas, portanto, que devem ser tratadas de forma diversa pelo intérprete-aplicador do Direito.


Bibliografia

ALENCAR, Hermes Arrais. Benefícios previdenciários. 4ª ed. rev. e atual. com obediência às leis especiais e gerais. São Paulo: Liv. e Ed. Universitária de Direito, 2009.

IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 10ª edição. Rio de Janeiro: Impetus, 2007.

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 17ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.


Notas

  1. IBRAHIM, p. 147.
  2. MARTINS, p. 152.
  3. Eis algumas regras especiais aplicáveis aos trabalhadores rurais:
  4. O intervalo para descanso/refeição é de acordo com os usos e costumes da região, não havendo um mínimo e máximo como ocorre no trabalho urbano;

    Adicional Noturno de no mínimo 25%. O horário noturno é compreendido das 21 as 5 horas, na lavoura e das 20 as 4 horas, na pecuária. A hora noturna é de 60 minutos;

    Aviso Prévio de 30 dias, com 1 dia livre por semana;

    A indenização por tempo de serviço do safrista é de 1/12 avos do salário mensal, por mês de serviço ou fração superior a 14 dias, no término do contrato de safra;

    Participação nos lucros ou Resultados da empresa;

    FGTS, a partir de 05/10/88;

    Não tem direito ao Vale-transporte;

    Deve ser entregue o CAGED normalmente. A Lei 4.923/65 manda informar somente os empregados regidos pela CLT, porém como o empregado rural passou a ter o direito ao seguro-desemprego, é necessário prestar as informações;

    O empregado rural é cadastrado normalmente no PIS, e informado anualmente na RAIS;

    No trabalho rural, o idoso pode ser despedido por justa causa, caso apresente a incapacidade para o trabalho, desde que comprovado pelo médico da DRT;

    A contribuição sindical é descontado do empregado a base de 1/30 avos sobre o salário mínimo, e não sobre salário percebido;

    Desconto de moradia e alimentação é limitado a 20 e 25%, respectivamente, sobre o valor do salário mínimo;

    No trabalho rural, não se aplica a proporção de 2/3 de brasileiros;

    Na propriedade rural com 100 ou mais trabalhadores é necessário organizar o SEPATR (Serviço Especializado em Prevenção e Acidentes do Trabalho Rural);

    O empregador rural que mantenha a média de 20 ou mais trabalhadores é necessário organizar a CIPATR (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho Rural);

    A aposentadoria por idade: homem aos 60 anos de idade e mulher aos 55 anos;

    Licença-maternidade de 120 dias para segurada especial com mais de um ano de atividade;

    Desde 25/07/91, o trabalhador rural poderá requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 anos, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência exigida (art. 183, do RPS/99, alterada pelo Decreto nº 3.265, de 29/11/99, DOU de 30/11/99). (cf. http://www.sato.adm.br/guiadp/paginas/paral_empdo_rural.htm, consulta em 09/03/2011).

  5. A redação original do artigo 7º, XXIX, previa prazo prescricional diferenciado para empregados rurais e urbanos. Os rurais, na verdade, sujeitavam-se apenas ao prazo decadencial de 2 anos, a partir da extinção do contrato de trabalho, para ajuizar a demanda trabalhista, enquanto os urbanos, além desse prazo decadencial, ainda estavam sujeitos à prescrição das verbas anteriores a 5 anos antes do ajuizamento da demanda. Com a Emenda Constitucional n.º 28/2000, ambos passaram a sujeitar aos mesmos prazos fixados incialmente apenas para o trabalhador urbano (2 anos de decadência e 5 anos de prescrição).
  6. Há exceções, como, por exemplo, a prevista no artigo 22, §1º, da Lei n.º 8.212/91 (22,5%).
  7. Ressalvado o dispositivo transitório do artigo 143 da Lei n.º 8.213/91, que será analisado em tópico seguinte.
  8. Art. 55, §3º, da Lei n.º 8.213/91. Vide, ainda, súmula n.º 149 do STJ. Os documentos que podem ser utilizados como início de prova documental são descritos, exemplificadamente, no artigo 106 da Lei n.º 8.213/91.
  9. ALENCAR, p. 462.
  10. IBRAHIM, p. 508.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MADEIRA, Danilo Cruz. Trabalhador rural empregado X trabalhador rural em regime de economia familiar (segurado especial): diferenças previdenciárias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2823, 25 mar. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18761. Acesso em: 29 mar. 2024.