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Unidades de conservação em área urbana.

O (des)caso de Palmas/TO

Unidades de conservação em área urbana. O (des)caso de Palmas/TO

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Esta tese analisa a criação, por meio do Plano Diretor Municipal, das Unidades de Conservação na zona urbana de Palmas (TO) e a efetividade destas áreas na proteção da biodiversidade local.

Resumo

A Constituição da República Federativa do Brasil determinou a obrigatoriedade ao Poder Público de instituir, em toda unidade da federação, espaços territorialmente protegidos. Os Municípios, no momento de criação de suas Unidades de Conservação, deverão observar as normas federais e estaduais pertinentes ao tema, e as regras determinadas pelo Estatuto da Cidade e por seu Plano Diretor. Esta tese analisa a criação, por meio do Plano Diretor Municipal, das Unidades de Conservação na zona urbana de Palmas-TO e a efetividade destas áreas na proteção da biodiversidade local.


1. Introdução

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - CF, acompanhando a preocupação mundial com a preservação do meio ambiente, proclamou um artigo exclusivo à sua proteção, preconizando que todos "têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações." [01]

Acrescentando ainda ser incumbência do Poder Público "preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas, preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;  definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; (...) proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade." [02]

Subtrai-se da norma constitucional que a sadia qualidade de vida é indissociável ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, não podendo existir sem este.

Meio ambiente, por sua vez, pode ser definido à luz da Lei Federal n.º 6.938, de 31.08.1981, que institui a Política Nacional de Meio Ambiente, como "o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas".

A Constituição ao estabelecer ser obrigação, e não direito, do Poder Público, como um todo, definir nas unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, criou para a União, os Estados e os Municípios a obrigação de instituir estes espaços.

A Lei, 9.985, de 18 de julho de 2000 regulamentou o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, criando o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC. Esta norma definiu Unidade de Conservação como "espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção." [03] Determinando ainda, que todos os entes da federação poderão criar suas Unidades de Conservação, ressaltando que se esta for criada pela União, denominar-se-á nacional, se pelos Estados, estadual, e finalmente, se criada pelos municípios, municipal.

Esta tese pretende analisar a criação das Unidades de Conservação, pelo Poder Público Municipal, observando-se o estabelecido no Estatuto das Cidades e especialmente a criação destes espaços em conformidade com o Plano Diretor do município de Palmas, no Estado do Tocantins.


2. Competência Municipal para legislar sobre o Meio Ambiente

Os Municípios foram elevados à categoria de ente político a partir da Constituição da República Federativa do Brasil, em 05 de outubro de 1988 [04], neste contexto, passaram a possuir competências e atribuições próprias.

Esta carta determinou ser competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, ou seja, um dever de todos que integram a estrutura federativa brasileira [05]; proteger as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos, proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas. Portanto, cabe a todos os entes da federação, a implantação e execução da política ambiental, sendo todos responsáveis pela fiscalização de seu cumprimento.

Quanto aos poderes para legislar sobre a questão ambiental, a CF estabeleceu ser competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal expedir normas sobre a proteção ao meio ambiente, o controle da poluição, o patrimônio paisagístico, a responsabilidade por dano ao meio ambiente e a direitos turísticos e paisagísticos. [06] Em relação a estas matérias, à União limitar-se-á a estabelecer normas gerais, em caso de sua inércia, caberá aos Estados e ao Distrito Federal suplementar a União e legislar, observando-se que, caso futuramente seja expedida norma geral pela União, as normas elaboradas terão a sua eficácia suspensa no que contrariarem a lei federal. Em todos os casos caberá aos Estados suplementar a norma geral. [07]

Aos Municípios restou configurada ser competência exclusiva as elencadas no Art. 30 da CF: "I - legislar sobre assuntos de interesse local;II- suplementar a legislação federal e a estadual no que couber(...); VIII- promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano"

Diante da divisão espacial da organização político administrativa da República Federativa do Brasil, estabelecida pela CF, caberá ao Município, havendo normas da União e dos Estados disciplinado uma matéria, suplementar, em seu âmbito (no interesse local), o que ainda não foi disciplinado por aquelas, devendo, desta forma, adequar-se às normas vigentes, podendo, todavia, estabelecer regras mais restritivas. Por exemplo, o Município é competente para legislar, determinando as regras que utilizará para autorizar e/ou licenciar a construção de prédios residenciais, não podendo o Estado manifestar-se sobre este tema, contudo, se é interesse municipal construir uma avenida que interfira em uma Área de Preservação Permanente evidentemente não se aplicará somente a legislação municipal, deverá o município observar a legislação federal e estadual sobre o tema.


3. Espaços Territorialmente Protegidos no Brasil

A legislação pátria estabelece três espécies de espaços territorialmente protegidos, na acepção do art. 225§ 1º, III, da Constituição Federal; as Áreas de Preservação Permanente, a Área de Reserva Legal e as Unidades de Conservação.

As Áreas de Preservação Permanente e a Área de Reserva Legal (florestal) estão disciplinadas pelo Código Florestal, Lei nº 4.771, de 15/09/65, diante das alterações advindas da Lei 7.803, de 18/07/1989, sendo seus escopos a conservação da fauna e da flora original de uma determinada região, no intuito de que esta cumpra a sua função ambiental.

As Áreas de Preservação Permanente – APP são áreas protegidas, cobertas ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo genético de fauna e de flora, proteger o solo e assegurar o bem estar das populações humanas. [08] Estas áreas também poderão situar-se nas cidades, (§ único, do art. 2º, do Código Florestal, acrescido pela Lei nº 7.803/89), compreendidas nos perímetros urbanos, nas regiões metropolitanas e aglomerações urbanas e deverão estar disciplinadas nos respectivos planos diretores e leis de uso do solo. Ressalta-se que estas normas deverão respeitar os princípios e limites mencionados na norma geral, ou seja, o município poderá legislar sobre a fixação destas áreas, todavia nunca em limite inferior ao estabelecido no Código Florestal.

Subtrai-se da norma, que na maioria dos casos a intenção do legislador, ao criar as Áreas de Preservação Permanente, não é de tutelar especificamente a vegetação, mais sim outros recursos naturais. Neste contexto, estas áreas são espaços territoriais especialmente protegidos, de proteção integral, que não podem ser exploradas, que somente podem ser alteradas ou suprimidas por uma lei e quando for necessária a execução de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social. [09]

O Código Florestal criou duas formas de APP, seu art. 2º fixa quais espaços territoriais são obrigatoriamente protegidos, e o art. 3º as APPs administrativas, ou seja, que serão criadas por atos administrativos. [10]

Resta claro, que o art. 2º, da norma mencionada, tem por objetivo a mediata proteção da água e da qualidade do solo, visando garantir os recursos hídricos e evitar a erosão que pode ocorrer, caso a vegetação localizada em certas áreas seja retirada. Já as APPs administrativas são aquelas que serão delimitadas, demarcadas e declaradas de proteção pela administração pública, por ato específico, quando se julgar necessário.

A Área de Reserva Legal - ARL segundo conceituado pelo Código Florestal, com as alterações advindas da MP 2166-67, é a "localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas." [11]

Este instrumento prevê a proteção de amostras/fragmentos territoriais visando à conservação da fauna e da flora local. A porcentagem da propriedade a ser destinada à fixação de ARL dependerá do local onde se encontra o imóvel rural, podendo variar de 20 a 80% de toda área.

A terceira categoria de áreas protegidas são as Unidades de Conservação, disciplinadas pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC, Lei 9.985, de 18 de julho de 2000. Estas são divididas em unidades de conservação de proteção integral e de uso sustentável.


4. Os Sistemas de Unidade de Conservação da Natureza

A Lei nº 9.985/00 regulamentou os incisos I, II e III, art. 225, parágrafo 1° da CF, instituindo o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza - SNUC.

Conceitua-se Unidade de Conservação - UC, como área a ser instituída em propriedade pública ou particular, protegida de "forma permanente, em caráter de perpetuidade ou perenidade absoluta, sendo vedada qualquer alteração de seus objetivos, princípios limites ou finalidades, por parte de proprietários ou de seus sucessores a qualquer título, em razão do vínculo juridicamente perenizado de sua função ecológica indispensável ao equilíbrio ecológico dos ecossistemas ali integrantes justificador da contínua proteção constitucional e legalmente assegurada no interesse das presentes e futuras gerações." [12]

4.1 O Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza - SNUC

O SNUC estabelece os critérios e as normas para a criação, implantação e gestão das Unidades de Conservação, dividindo-as em dois tipos: as de proteção integral: [13] Estação Ecológica, Reserva Biológica, Parque Nacional, Monumento Natural e Refúgio da Vida Silvestre e as de uso sustentável: [14] Área de Proteção Ambiental – APA, Área de Relevante Interesse Ecológico – ARIE, Floresta Nacional – FLONA, Reserva Extrativista – RESEX, Reserva de Fauna, Reserva de Desenvolvimento Sustentável e Reserva Particular do Patrimônio Natural – RPPN. [15]

Este Sistema é constituído por todas as UCs independentemente do ente que a tenha criado (poderão ser federais, estaduais ou municipais), e tem por objetivo:

"I- contribuir para a manutenção da diversidade biológica e dos recursos genéticos no território nacional e nas águas jurisdicionais;

II- proteger as espécies ameaçadas de extinção no âmbito regional e nacional;

III- contribuir para a preservação e a restauração da diversidade de ecossistemas naturais;

IV- promover o desenvolvimento sustentável a partir dos recursos naturais;

V- promover a utilização dos princípios e das práticas de conservação da natureza no processo de desenvolvimento;

VI- proteger paisagens naturais ou pouco alteradas de notável beleza cênica;

VII- proteger as características relevantes de natureza geológica, geomorfológica, espeleológica, arqueológica, paleontológica e cultural;

VIII- proteger e recuperar recursos hídricos e edáficos;

IX- recuperar ou restaurar ecossistemas degradados;

X- proporcionar meios e incentivos para atividades de pesquisa científica, estudos e monitoramento ambiental;

XI- valorizar econômica e socialmente a diversidade biológica;

XII- favorecer condições e promover a educação e interpretação ambiental, a recreação em contato com a natureza e o turismo ecológico;

XIII- proteger os recursos naturais necessários à subsistência de populações tradicionais, respeitando e valorizando seu conhecimento e sua cultura e promovedoras social e economicamente." [16]

Enquanto instrumento de intervenção ambiental, as unidades de conservação, se instituídas como determinam as normas ambientais, podem muito contribuir na redução progressiva dos abusos na exploração dos recursos naturais e do meio ambiente como um todo.

O SNUC prevê em seu art. 6º, parágrafo único, que poderão integrá-lo as "unidades de conservação estaduais e municipais que, concebidas para atender a peculiaridades regionais ou locais, possuam objetivos de manejo que não possam ser satisfatoriamente atendidos por nenhuma categoria prevista nesta Lei e cujas características permitam, em relação a estas, uma clara distinção." Assim, após a realização de estudos específicos, os Estados e/ou os Municípios poderão criar outras Unidades de Conservação, além das definidas no SNUC, no intuito de atender especificidades locais.

4.2 O Sistema Estadual de Unidades de Conservação da Natureza – SEUC

Os Estados poderão elaborar seus próprios Sistemas de Unidades de Conservação. No Estado do Tocantins, o Sistema Estadual de Unidades de Conservação da Natureza - SEUC, foi instituído pela Lei n° 1.560, de 5 de abril de 2005, que estabeleceu os critérios e normas para a criação, implantação e gestão das unidades que o constituem, no âmbito do Estado e dos Municípios que o compõe. Acrescendo, ainda, que antes da criação de uma UC é necessária, além da consulta pública, a realização de estudos técnicos, científicos e socioeconômicos que identifiquem a localização, a dimensão e os limites mais adequados para a unidade, [17] instrumentos estes que embasarão o ato de criação da UC, que conterá a categoria de manejo, o órgão executor, os objetivos da Unidade e o memorial descritivo indicando os limites georeferenciados de acordo com o Sistema Geodésico Brasileiro.

O SEUC, seguindo a norma geral, classifica as UCs em Unidades de Proteção Integral e em Unidades de Uso Sustentável. O Sistema tocantinense diferencia-se do nacional, no âmbito das UCs de proteção integral, ao não prever a criação de Reservas Biológicas; e no âmbito das UCs de uso sustentável, ao não prever a criação de floresta nacional, e ao criar as categorias: Rio Cênico e Estrada Parque, atendendo as peculiaridades locais. [18]

Esta norma determina como áreas prioritárias, para fins de criação das unidades de conservação, aquelas: "I- previstas pela Constituição Estadual; II- que contiverem ecossistemas ainda não satisfatoriamente representados no SEUC; III- onde se constatar situação de iminente perigo de eliminação ou degradação dos ecossistemas; IV- onde ocorrem espécies endêmicas, raras, vulneráveis ou ameaçadas de extinção; V- necessárias à proteção de recursos hídricos e à formação de corredores ecológicos." [19]

4.3 O Sistema Municipal de Unidades de Conservação da Natureza - SMUC

No âmbito Municipal poderá ser criado o Sistema Municipal de Unidades de Conservação da Natureza - SMUC, esta norma disciplinará a criação de UCs nos Municípios, devendo buscar seus fundamentos no SNUC e no SEUC, podendo, todavia, diante de características e necessidades locais criar outras modalidades de UCs.


5. Estatuto da Cidade e o Plano Diretor Municipal

Os impactos decorrentes da degradação ambiental vêm crescendo de forma significativa, consequentemente os desastres naturais estão cada vez mais freqüentes. Na zona urbana, o crescimento demográfico em grande escala, decorrente da ocupação migratória populacional desorganizada, originada pela busca de melhores condições de vida, moradia, saúde e emprego, têm agravado estes impactos, ocasionando a ocupação irracional do solo, o que eleva expressivamente, os custos sociais, econômicos e ambientais dos Municípios.

Neste contexto o Poder Público, preocupado em reverter, ou pelo menos conter este quadro, expediu a Lei nº 10.257, em 10/07/2001, denominada Estatuto da Cidade. Em vigor desde o dia 10 de outubro de 2001, o Estatuto regulamenta o art. 182 da Constituição Federal de 1988, fixando importantes princípios básicos [20] que passaram a nortear as ações da política urbana, sendo um dos mais relevantes a função social da cidade.

O instrumento fundamental para a organização municipal, previsto no Estatuto da Cidade, é o Plano Diretor. Este Plano foi criado pelo art. 182 da CF, que determinou suas diretrizes mínimas e estabeleceu sua obrigatoriedade para as cidades com população superior a 20.000 habitantes. Posteriormente, ao regulamentar o texto constitucional, o Estatuto da Cidade preconizou as demais diretrizes necessárias à sua consecução, tendo inclusive ampliado o rol de cidades que são obrigadas a implementá-lo.

O Plano Diretor [21] é, portanto, um conjunto de normas obrigatórias, elaborado por lei municipal específica, integrando o processo de planejamento municipal, que regula as atividades e os empreendimentos, do próprio Poder Público Municipal e das pessoas físicas ou jurídicas, de Direito Privado ou Público, a serem levados a efeito no território municipal, são diretrizes técnicas para o desenvolvimento global do espaço territorial municipal, que atuará como instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana,

O Estatuto da Cidade relaciona, ainda, dentre os instrumentos de indução de desenvolvimento urbano, a instituição de UCs no âmbito municipal. Assim, por esta norma, deverá o município criar Unidades de Conservação locais, obedecendo, contudo, para a criação, implantação e gestão destas áreas, o determinado pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC e pelo Sistema Estadual de Unidades de Conservação da Natureza – SEUC. Para se tornarem unidades de conservação, as áreas protegidas pelos municípios necessitam ser criadas por lei ou decreto próprio, procedimento este posterior à realização de estudos para definir se a área apresenta relevante interesse ambiental.

Ao determinar a observância do equilíbrio ambiental na aplicação de todos seus instrumentos, restou aos Municípios, no momento de elaboração de toda e qualquer política urbana, a obrigatoriedade da observância das normas ambientais, tanto de vedação ou minoração de efeitos negativos sobre o meio ambiente, quanto da proteção, preservação e recuperação deste. [22]

Assim, caberá ao Plano Diretor regulamentar a política urbana municipal, observando-se, que ao suplementar a legislação federal e estadual, ou regulamentar assuntos de interesses locais, os Municípios não podem contrariá-las, pois são estas que concedem o próprio fundamento de validade das leis municipais. [23] Desta forma, o fundamento de validade do Plano Diretor é o Estatuto da Cidade, o qual impõe a compatibilidade vertical entre os planos nacionais, regionais e municipais de ordenamento do solo e de desenvolvimento econômico e social. [24] Os "interesses locais" municipais não podem, portanto, contradizer o determinado pela Constituição, que garante como direito difuso, transgeracional, o acesso a um ambiente sadio e de qualidade.

A elaboração do Plano Diretor deve levar em conta todos os objetos previstos no art. 2º do Estatuto da Cidade, devendo o município observar o ecossistema no qual está inserido e principalmente a bacia e sub-bacia hidrográfica de que faz parte. Esta norma é obrigatória para as cidades: com mais de vinte mil habitantes; que integram regiões metropolitanas e aglomerações urbanas; onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instrumentos previstos no § 4º do art. 182 da CF; integrantes de áreas de especial interesse turístico e nas que estão inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional. [25]

Na esfera ambiental, este instrumento está obrigado a observar a legislação ambiental federal e a estadual, principalmente; o Código Florestal, a Política Nacional do Meio Ambiente e o SNUC. [26]

A propriedade urbana e a cidade têm funções sociais, e estas funções serão cumpridas pela política urbana, quando, no que diz respeito ao meio ambiente, se observarem as diretrizes gerais: [27] de 1) garantir-se o direito ao saneamento ambiental; 2) realizar-se o planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da população das atividades econômicas do Município de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente; 3) ordenar-se e controlar-se o uso do solo, de forma a evitar a poluição e a degradação ambiental; 4) adotarem-se padrões de produção e consumo de bens e serviços compatíveis com os limites de sustentabilidade ambiental do Município; 5) proteger-se, preservar-se e recuperar-se o meio ambiente natural e o construído, e ainda, o patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico. [28]

A cidade, para cumprir suas funções sociais, deverá, portanto, garantir a todos os cidadãos, indistintamente, o direito e a garantia ao meio ambiente equilibrado, à moradia, à terra urbana, ao saneamento e infra-estrutura, ao transporte e serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, tanto para as gerações presentes, quanto para as futuras gerações.


6. Critérios para seleção de áreas prioritárias para a conservação.

Grande parte da biodiversidade tropical é intolerante às atividades e exploração humana, e incapaz de persistir fora de áreas efetivamente protegidas, neste contexto, as unidades de conservação se qualificam como um dos principais instrumentos para conservação da diversidade biológica e manutenção dos serviços ambientais proporcionados pela natureza. [29]

Biodiversidade ou diversidade biológica é aqui reconhecida como a variabilidade dos organismos vivos e dos sistemas ecológicos dos quais elas são parte; e serviços ambientais como todos os benefícios outorgados aos ecossistemas, os quais podem ser fornecidos em uma escala global, como a manutenção da qualidade da atmosfera e sua relação com a estabilidade climática, a reciclagem natural dos produtos utilizados pelo ser humano, e em escala regional ou local, conexos à purificação da água, fertilidade do solo, polinização, entre outros.

O processo de seleção de áreas prioritárias para conservação é complexo e tem sido constantemente debatido, portanto, vem evoluindo e se aprimorando, incorporando elementos mais objetivos no procedimento de análise, incluindo aspectos sociais e econômicos, além dos ambientais. Destarte, passaram a ser considerados como um instrumento de gestão socioeconômica do território e não apenas um mero apelo ou necessidade conservacionista.

As primeiras unidades de conservação (ou áreas naturais protegidas) foram criadas tomando por base critérios cênicos e de disponibilidade de áreas, entretanto, percebeu-se que por meio do uso destes critérios nem sempre eram selecionadas áreas de maior diversidade biológica, invalidando-os desde um ponto de vista científico/ecológico.

Somente a partir da década de 70 foram propostas metodologias para seleção de áreas prioritárias para conservação. Dentre as questões debatidas, discutia-se, por exemplo, sobre a vantagem de se proteger uma área grande ou muitas pequenas. Entretanto, as idéias precursoras para sanar algumas das muitas dúvidas, originaram-se da Teoria do Equilíbrio [30], onde: a) áreas de maior tamanho oferecem mais benefícios comparados às pequenas, b) ilhas de habitat possuem maiores taxas de extinção e podem manter menos espécies a longo prazo, c) áreas pequenas mantém populações menores que estariam mais susceptíveis à endogamia e aos efeitos estocásticos, demográficos e ambientais, d) o risco de extinção é inversamente proporcional ao tamanho populacional e, e) as conseqüências negativas do efeito de borda são mais pronunciadas em áreas menores devido a maior proporção de borda em relação à área central.

Avanços conceituais e metodológicos foram incorporados ao processo de seleção de áreas protegidas, alguns passando a considerar a distribuição das espécies e outros a distribuição dos ecossistemas. Métodos baseados na distribuição das espécies priorizam diferentes aspectos, entre eles, áreas de ocorrência de espécies emblemáticas ou espécies "bandeira", áreas com elevada riqueza de espécies, áreas com elevado número de espécies endêmicas, ou seja, com restrições quanto à sua distribuição geográfica e áreas onde se concentra o maior número de espécies ameaçadas de extinção. Métodos baseados na distribuição dos ecossistemas são utilizados em menor escala e preconizam que, por meio da conservação de toda a variação de condições ecológicas encontradas em uma determinada área, conserva-se também a maioria das espécies e suas complexas interações. Entretanto, o conhecimento sobre as espécies em ambientes de elevada biodiversidade, como a encontrada nos trópicos, é ainda incipiente, e o método baseado na distribuição dos ecossistemas tem sido o mais indicado para a seleção de áreas prioritárias para conservação.

O próximo passo consiste em avaliar in loco as condições da área e sua viabilidade para a criação de uma unidade de conservação. Para tanto, uma série de atributos devem ser considerados: a) disponibilidade e estado de conservação da área, priorizando áreas com elevada proporção de vegetação natural e baixa interferência antrópica, b) presença de espécies, endêmicas, raras ou ameaçadas de extinção, c) representatividade dos ambientes contemplados na unidade de conservação com relação à região ecológica, d) complementariedade ao sistema de unidades de conservação, ou seja, a contribuição da área proposta na conservação de paisagens e ecossistemas ainda não protegidos em uma região ecológica, e) diversidade de espécies e ecossistemas, f) valor histórico, cultural e antropológico e g) situação fundiária.

Visando reduzir a subjetividade no processo de seleção de áreas prioritárias para conservação o Ministério do Meio Ambiente recomenda a metodologia baseada no Planejamento Sistemático de Conservação (PSC) [31] o qual prioriza a definição de áreas em função da sua importância. Seus métodos se assemelham ao conjunto de informações descrito anteriormente, objetivando a identificação de alvos de conservação que incluem: "a) alvos de biodiversidade (endemismos, espécies raras, ameaçadas, etc.), b) unidades fitogeomorfológicas (considerado como um indicador de biodiversidade), c) alvos de uso sustentável (áreas de beleza cênica, que forneçam serviços ecológicos, que contenham espécies de uso comercial ou cultural) e d) alvos de persistência e processos (áreas importantes para serviços ambientais)".

A importância da definição de critérios e métodos aplicados à seleção de áreas prioritárias para conservação tem promovido um avanço significativo na qualidade das ferramentas, incluindo o uso de modelos matemáticos. Em geral estes modelos tem se baseado no conceito de complementaridade [32], que é definida como uma medida do quanto uma área contribui para a representação de espécies não representadas previamente, sendo dependente da composição de qualquer área previamente selecionada. Os algoritmos baseados em complementaridade procuram por áreas onde todas as espécies de interesse estão representadas na menor área possível.

Avanços posteriores destes modelos propuseram uma alternativa, por meio do mapeamento de um atributo contínuo chamado insubstituibilidade, [33] que é uma medida da importância de uma área com relação ao objetivo de proteger todas as espécies. Áreas totalmente insubstituíveis contêm espécies não encontradas em outros locais. Esta abordagem permite verificar o padrão espacial das opções de áreas numa região e a possível substituição de qualquer área, dadas as restrições na alocação de reservas.

Independente do método proposto é imperativo a realização de estudos prévios. Informações básicas, sobre a ocorrência de espécies em uma determinada área, são o ponto de partida fundamental e necessário para o delineamento de ações visando a seleção e definição de áreas prioritárias para conservação.


7. O Plano Diretor de Palmas e a Criação de Unidades de Conservação na área urbana

Foram criadas pelo Plano Diretor de Palmas, [34] 12 (doze) Unidades de Conservação, todavia, estranhamente, restou estipulado que estas áreas seriam "enquadradas em até 2 anos, a partir da aprovação" daquela Lei. Ou seja, o Município de Palmas criou UCs inominadas, nitidamente sem a realização de estudos específicos, porque se diferente fosse, saber-se-ia exatamente o que se pretende proteger. Este Plano prevê, ainda, em seu art. 28, que as UCs criadas, constituirão o Sistema Municipal de Unidades de Conservação-SMUC.

A criação de Unidades de Conservação na cidade de Palmas e a previsão de criação do SMUC, já estavam estabelecidas na Lei municipal nº 1.011 de 04 de junho de 2001, que dispõe sobre a Política Ambiental, o equilíbrio ecológico, a preservação e recuperação do meio ambiente, do município de Palmas. Esta norma definiu que as UCs criadas no município seriam "definidas dentre outras, segundo as seguintes categorias: I- estação ecológica; II- reserva biológica; III- parque natural; IV- monumento natural; V- área de refúgio da vida silvestre". [35]

Atualmente Palmas possui treze UCs municipais, 12 (doze) criadas pela Lei Complementar nº 155 e uma, pela Lei Complementar nº 165. Sete encontram-se dentro do perímetro urbano: UC Suçuapara, UC Brejo Comprido, UC Prata, UC Tiúba, UC Machado, UC do entorno do lago do Lajeado e UC das ARNOs, quatro em bairros periféricos: UC Água Fria, UC Taquari, UC Santa Barbara e UC Santa Fé 2ª etapa, uma no distrito de Taquaruçu: UC Taquaruçuzinho e uma Parque Municipal Serra do Lajeado (única na qual se definiu o tipo de Unidade, ainda que, sem critérios técnicos) na área rural.

Verifica-se que a maioria das UCs criadas, sobrepõe-se às áreas de preservação permanente situadas ao longo dos cursos d’água, portanto, áreas já protegidas pelo Código Florestal. Desta maneira não se percebe nenhum avanço significativo na ampliação dos espaços protegidos em Palmas.

As áreas atribuídas como unidades de conservação, especialmente aquelas localizadas na área urbana, possuem ainda, amostras representativas da vegetação do cerrado e rica biodiversidade, mas devido ao descaso do Poder Público, e da falta de uma definição do que se pretende proteger, têm sofrido impactos de diversas ordens. Para mensurar os impactos sofridos nas UCs "inominadas", utilizou-se como referência a Avifauna encontrada na capital, uma vez que este grupo zoológico é considerado excelente indicador da qualidade do ambiente. Estudos realizados em Palmas constataram uma redução na riqueza de espécies deste grupo [36]. Presume-se que o mesmo esteja ocorrendo em toda a biodiversidade encontrada na cidade, havendo, portanto, um empobrecimento no número de espécies, na qualidade dos ambientes e dos processos ecológicos na área urbana.

Neste contexto, é importante avaliar a situação atual de algumas destas "áreas protegidas":

1) UC Brejo comprido - O córrego Brejo Comprido nasce na APA Estadual da Serra do Lajeado e segue seu curso em direção ao lago do Lajeado (APP do reservatório da Usina Hidroelétrica Luis Eduardo Magalhães). Neste trajeto, atravessa a área rural e adentra-se à zona urbana a partir da rodovia TO 050, quando então passa a ser considerada uma unidade de conservação. Diversos impactos são evidenciados ao longo do seu curso; na zona rural constata-se a retirada da vegetação ripária, uso indiscriminado da água para irrigação, barramento para formação de piscinas naturais, erosão das margens e assoreamento, entretanto, é no perímetro urbano, quando então se torna uma área protegida, que os impactos proliferam, dentre eles: é cortado por diversas, ruas, avenidas e uma rodovia estadual; barramento e formação de um lago artificial; uma estação de tratamento de esgotos que libera seus resíduos diretamente no leito do córrego; diversos pontos de captação de água para rega dos canteiros e jardins públicos; supressão da mata de galeria para construções diversas, incluindo um shopping center; deposição de resíduos sólidos em sua margem; trilhas para caça e pesca furtiva; queimadas recorrentes e recepção de galerias pluviais. Uma das conseqüências destes impactos, diz respeito à significativa redução na vazão do córrego e o comprometimento da qualidade da água. O ribeirão Brejo Comprido, apresenta características extremamente importantes do ponto de vista ecológico ao formar um corredor biológico natural, [37] conectando a área de proteção permanente do lago do Lajeado com a área de proteção ambiental da serra do Lajeado. Apresenta ainda uma elevada diversidade biológica, tendo sido inventariadas mais de 150 espécies de aves. Portanto, esta unidade de conservação linear poderia exercer um importante papel na manutenção dos processos ecológicos dentro do centro urbano de Palmas, ao permitir o fluxo gênico, promover o restabelecimento de populações locais e aumentar a diversidade de espécies. Entretanto, as barreiras artificiais criadas ao longo do seu curso têm restringido a circulação das espécies conforme comprovado por estudos realizados ao longo de todo o seu curso, usando o método de captura/recaptura de aves. [38] Percebe-se, portanto, que o conjunto de impactos a esta UC, tendem a comprometer a biota local, ocasionando a perda de diversidade biológica e o empobrecimento dos processos ecológicos.

2) UC Suçuapara – inclui o ribeirão Suçuapara e suas matas ripárias. Este curso d’água está situado inteiramente no centro urbano de Palmas, próximo a uma das áreas mais densamente habitadas da cidade. Dentre os principais impactos detectados nesta unidade de conservação, destacam-se: a presença de ruas e avenidas que o atravessam; a deposição de resíduos sólidos urbanos; as queimadas recorrentes; o pastoreio pelo gado nas bordas que são dominadas por gramíneas exóticas; trilhas para pesca e caça furtiva; captação de água; remoção da cobertura vegetal; recepção de galerias pluviais; uso para fins recreativos e domésticos para lavagem de roupa e remoção de solo umidificado. Apesar dos inúmeros impactos sofridos por este curso d’água, a biota local é bastante rica, sendo encontradas mais de 120 espécies de aves. Outra característica muito importante diz respeito à sua conexão com a área de proteção ambiental do lago do Lajeado e com o córrego Brejo Comprido. Juntos poderiam formar um grande complexo natural extremamente importante para a manutenção dos processos biológicos, incremento da biodiversidade local e da qualidade de vida da população na área urbana de Palmas.

3) UC Prata – localizada ao longo do córrego Prata, esta unidade de conservação é formada por um gradiente de vegetação, incluindo campos úmidos e buritizais típicos das veredas, e cerrado típico em transição com exuberante mata de galeria. É uma formação vegetal singular e atualmente muito rara de se encontrar em áreas urbanas. Destaca-se ainda pela elevada diversidade biológica, representada por mais de 210 espécies de aves e mamíferos arborícolas como o bugio, Alouatta sp. [39] Assim como as unidades de conservação municipais citadas anteriormente, existem inúmeros impactos de ordem antrópica que vem comprometendo a qualidade do ambiente no córrego Prata, destacando-se: queimadas recorrentes; remoção da cobertura vegetal; presença de trilhas para pesca e caça furtiva; captura de aves silvestres, e presença de uma avenida que corta o córrego. Entretanto, o problema mais grave desta área é a presença de uma estação de tratamento de esgotos que libera seus resíduos diretamente no leito do córrego, o que, juntamente com os outros impactos, como o fogo, tem provocado uma redução significativa da cobertura vegetal e da biodiversidade local. A região do córrego Prata apresenta uma série de atributos singulares para a realização de atividades de educação ambiental além de exercer um papel importantíssimo na manutenção da biodiversidade local, uma vez que, algumas das 324 espécies de aves existentes em Palmas [40], foram encontradas apenas nesta localidade.

A inexistência de estudos prévios e critérios para a seleção de áreas prioritárias para conservação na cidade de Palmas têm feito com que diversos ambientes e suas respectivas espécies, não contemplados no sistema municipal de unidades de conservação, sejam fragmentados e destruídos indiscriminadamente. Neste contexto, inserem-se as áreas de vegetação de cerrado típico, contempladas apenas na unidade de conservação das ARNOs, a qual, a exemplo daquelas descritas anteriormente, apresenta inúmeros impactos de ordem antrópica. A preservação de áreas de Cerrado é extremamente importante, já que esta é a formação vegetal mais representativa localmente e, portanto, composta por uma série de espécies animais e vegetais singulares. Estudos realizados na área urbana de Palmas, em áreas de cerrado típico, mostraram haver uma perda de até 70% das espécies de aves nas quadras residenciais urbanizadas quando comparadas às não urbanizadas. Outro agravante diz respeito ao processo de homogeneização biótica, onde as espécies encontradas nestes ambientes modificados são em sua maioria sinatrópicas, ou seja, adaptadas ao meio urbano.

Ainda que existam estudos realizados por instituições de pesquisa sobre a biodiversidade de Palmas, estes não foram sequer observados pelo Poder Público no momento de escolher as áreas prioritárias para conservação, contrariando as determinações do SNUC, SEUC e do próprio SMUC, que prevêem a realização de estudos técnicos específicos, prévios, à criação de UCs.

Um dos instrumentos previstos no Plano Diretor, que poderia, ou melhor, deveria, ser utilizado para a criação das UCs, é o Zoneamento Ambiental, previsto no art. 4º, III, "c", do Estatuto da Cidade, já que este é "um procedimento por meio do qual se institui zonas de atuação especial com vistas à preservação, melhora e recuperação da qualidade ambiental." [41]

No Plano Diretor de Palmas, a implementação do Zoneamento Ambiental, de forma Ecológico-Econômica, está prevista no §1º, do art. 18, que determina a observância do estipulado no art. 17 da Lei nº 1.011/01 e deverá ser realizado no prazo máximo de 2 (dois) anos da promulgação da Lei, sendo o controle deste prazo incumbência do órgão municipal de planejamento territorial. [42]

A Lei Municipal nº 1.011/01, anterior a elaboração do Plano Diretor, definiu que o Zoneamento Ambiental, consiste "na identificação de zonas do território do Município, de modo a subsidiar a implantação de atividades bem como indicar ações para a proteção e melhoria da qualidade de vida e do ambiente, considerando as características e/ou atributos dessas Zonas" acrescendo que as zonas de uso e ocupação do solo urbano e rural, serão definidas em conformidade com os estudos realizados para este fim, de acordo com a destinação predominante da área, devendo ser levado em consideração, além da predominância de uso, os aspectos físicos, biológicos, econômicos e culturais. [43]

O Município de Palmas determinou, no §3º, do art. 29 de seu Plano Diretor, que nas áreas onde foram criadas as UCs "inominadas", ficariam "suspensas todas as licenças para parcelamento do solo, regularização fundiária, abertura de vias, instalação de equipamentos de qualquer natureza e concessões até que sejam definidos os parâmetros de uso e ocupação, plano de manejo e delimitação da área, a fim de enquadramento em Unidade de Proteção Integral ou Unidade de Uso Sustentável, conforme o caso." Contudo, o que se percebe, é que estas áreas, licenciadas, ou não, estão ocupadas, tendo sido, inclusive, autorizado em uma delas a construção de um shopping center.

Ressalta-se que o poder público pode ser responsabilizado por efeitos negativos ao meio ambiente, não só por suas ações, mas principalmente por suas omissões. No caso de Palmas, percebemos a omissão do Município ao deixar de aplicar o disposto na Constituição Federal, quanto à criação de espaços protegidos, mostrando-se nitidamente relapso, no momento de criar unidades para posteriormente "enquadrá-las", sem sequer ter definido se seriam de Proteção Integral ou Uso Sustentável e ao deixar de exercer o necessário papel de fiscalizador do cumprimento das normas ambientais, o que tem permitido a exploração dos recursos naturais da zona urbana de forma degradante.

Palmas, por ser uma cidade com apenas dezenove anos de criação, ainda possui amostras representativas das diversas fitofisionomias do cerrado, com sua rica fauna associada, ou seja, uma riqueza natural raramente encontrada em ambientes urbanos. Portanto, a conservação e o uso sustentado deste patrimônio, por meio da criação de UCs, é fundamental para manutenção da biodiversidade, dos serviços ambientais e da qualidade de vida da população.


8. Conclusões Articuladas

8.1 É obrigação constitucional do Poder Público Municipal, observando-se o Estatuto da Cidade e o Plano Diretor, criar Unidades de Conservação, bem como, proteger e monitorar as criadas pelos demais entes dentro do seu território.

8.2 A criação de Unidades de Conservação em área urbana deverá observar principalmente, a presença de espécies ameaçadas, raras ou endêmicas, a conectividade entre UCs (permitindo o fluxo gênico e o incremento da biodiversidade), a representatividade de cada ecossistema e o estado de conservação da área a ser protegida.

8.3 A existência de Unidades de Conservação em área urbana contribui para manutenção dos serviços ambientais (qualidade da água, ar, ...), conservação das espécies, e como instrumento de educação ambiental.

8.4 O Município de Palmas-TO, por ter apenas dezenove anos, ainda possui uma rica biodiversidade, que necessita ser urgentemente conhecida e protegida.

8.5 A realização prévia de estudos específicos, como o Zoneamento Ambiental, é indispensável ao ordenamento municipal, principalmente no que concerne à criação de Unidades de Conservação em zona urbana.


Notas

  1. Art. 225, da CF
  2. § 1º, art. 225, da CF
  3. Art. 2º, I da Lei 9.985, de 18 de julho de 2000
  4. Arts1º. e 18 da CF
  5. Art.23, incisos da CF
  6. Art. 24, da CF
  7. LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. São Paulo: Método. 2007. p. 288.
  8. Código Florestal, Artigos 2º e 3º:
  9. Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas: a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será(...); b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d'água naturais ou artificiais; c) nas nascentes, ainda que intermitentes e nos chamados "olhos d'água", qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50 (cinquenta) metros de largura; (...)

    Parágrafo único. No caso de áreas urbanas, assim entendidas as compreendidas nos perímetros urbanos definidos por lei municipal,  e nas  regiões  metropolitanas e aglomerações urbanas, em todo o território abrangido, obervar-se-á o disposto nos respectivos planos diretores e leis de uso do solo, respeitados os princípios e limites a que se refere este artigo.

    Art. 3º Consideram-se, ainda, de preservação permanentes, quando assim declaradas por ato do Poder Público, as florestas e demais formas de vegetação natural destinadas: a) a atenuar a erosão das terras; b) a fixar as dunas; c) a formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias; d) a auxiliar a defesa do território nacional a critério das autoridades militares; e) a proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico ou histórico; f) a asilar exemplares da fauna ou flora ameaçados de extinção; g) a manter o ambiente necessário à vida das populações silvícolas; h) a assegurar condições de bem-estar público.(...)

  10. Art. 4º   A supressão de vegetação em área de preservação permanente somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública ou de interesse social, devidamente caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto. (...)
  11. § 2º  A supressão de vegetação em área de preservação permanente situada em área urbana, dependerá de autorização do órgão ambiental competente, desde que o município possua conselho de meio ambiente com caráter deliberativo e plano diretor, mediante anuência prévia do órgão ambiental estadual competente fundamentada em parecer técnico.

    § 3º  O órgão ambiental competente poderá autorizar a supressão eventual e de baixo impacto ambiental, assim definido em regulamento, da vegetação em área de preservação permanente.

    § 4º  O órgão ambiental competente indicará, previamente à emissão da autorização para a supressão de vegetação em área de preservação permanente, as medidas mitigadoras e compensatórias que deverão ser adotadas pelo empreendedor.

    § 5º  A supressão de vegetação nativa protetora de nascentes, ou de dunas e mangues, de que tratam, respectivamente, as alíneas "c" e "f" do art. 2º deste Código, somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública.

    § 6º  Na implantação de reservatório artificial é obrigatória a desapropriação ou aquisição, pelo empreendedor, das Áreas de Preservação Permanente criadas no seu entorno, cujos parâmetros e regime de uso serão definidos por resolução do CONAMA.

    § 7º  É permitido o acesso de pessoas e animais às Áreas de Preservação Permanente, para obtenção de água, desde que não exija a supressão e não comprometa a regeneração e a manutenção a longo prazo da vegetação nativa."

  12. Art. 3º do Código Florestal
  13. 11 GOMES DA SILVA, Vicente. Legislação Ambiental Comentada. Belo Horizonte: Fórum, 2006, p. 72
  14. CUSTÓDIO, Hélita Barreira. Direito Ambiental e Questões Jurídicas Relevantes, Ed Millennium p. 53
  15. Art. 2º, VI, Lei nº 9.985/2000 – Proteção Integral: manutenção dos ecossistemas livres de alterações causadas por interferência humana, admitindo apenas o uso indireto de seus atributos naturais.
  16. Art. 2º, XI, Lei nº 9.985/2000 – Uso Sustentável: exploração do ambiente de maneira a garantir a perenidade dos recursos ambientais renováveis e dos processos ecológicos, mantendo a biodiversidade e os demais atributos ecológicos, de forma socialmente justa e economicamente viável.
  17. Alguns tipos de Unidades de Conservação já haviam sido instituídos por leis anteriores.
  18. Art. 4º e incisos, da Lei nº 9.985/2000.
  19. Art. 33 da Lei 1.560, de 5 de abril de 2005 do Estado do Tocantins.
  20. Lei nº 1.560/2005:
  21. Art. 12. A Unidade de Proteção Integral compõe-se de:

    I - Estação Ecológica Estadual; II - Parque; III - Monumento Natural; IV - Refúgio de Vida Silvestre. (...)

    Art. 18. A Unidade de Uso Sustentável compõem-se de:

    I - Área de Proteção Ambiental; II - Reserva de Fauna Estadual; III - Reserva de Desenvolvimento Sustentável; IV - Rio Cênico; V - Estrada Parque; VI - Reserva Particular do Patrimônio Natural; VII - Área de Relevante Interesse Ecológico; VIII - Reserva Extrativista.

  22. Art. 33 § 3º e incisos da Lei 1.560, de 5 de abril de 2005 do Estado do Tocantins.
  23. Art. 2º, IV, Lei 10.257/2001
  24. §1º, do art. 182, da CF
  25. O Estatuto da Cidade e o Meio Ambiente. Élisson Cesar Prieto. IV Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico SP/2006, disponível em http\\www.ibdu.org.br/imagens/OEstatutodaCidadeeoMeioAmbiente.pdf. Acessado em 16 de março de 2009.
  26. MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente. São Paulo: Revista dos Tribunais 2007, p. 536.
  27. Art. 4º, Lei 10.257/2001
  28. Art. 41, da Lei nº 10.257/2001
  29. FONTENELLE, Miriam. O Plano Diretor como instrumento de implementação da Política Urbana. Disponível em: http:www.conpedi/org/manaus/arquivos/anais/manaus/novos_desafios_miriam_fontenelle.pdf . Acessado em 16 de março de 2009.
  30. art. 2º I, IV, VI VIII e XII, da Lei nº 10.257/2001
  31. MACHADO, Paulo Affonso Leme, ob. Cit. P. 371
  32. BRUNNER, A.G., R.E. GULLISON, R.E., RICE E G.A.B. DA FONSECA (2001) Effectiveness of parks in protecting tropical biodiversity. Science 5501:125-128.
  33. MAC ARTHUR R.H e E.O. WILSON (1963) An equilibrium theory of insular biogeography. Evolution 17:373-387.
  34. Planejamento Sistemático de Conservação. www.wwf.org.br/natureza_brasileira/meio_ambente_brasil/lep/lep_acoes_resultados/psc. Acessado em 15 de março de 2009.
  35. MARGULES, C. R.; NICHOLLS, A. O. e PRESSEY, R. L. 1988. Selecting networks of reserves to maximize biological diversity. Biological Conservation 43:63-76.
  36. PRESSEY, R .L., I.R. JOHNSON, e P.D. WILSON. 1994. Shades of irreplaceability: towards a measure of the contribution of sites to a reservation goal. Biodiversity and Conservation 3:242-262.
  37. Lei Complementar nº 155, de 28 de Dezembro de 2007.
  38. Arts. 21 e 22.
  39. PINHEIRO, R.T., T. DORNAS, E.S. REIS, M.O. BARBOSA e D. RODELLO. (2009). Birds of the urban área of Palmas-TO: composition and conservation. Revista Brasileira de Ornitologia (no prelo).
  40. HOBBS, R.J. 1992. The role of corridors in conservation: solution or bandwagon? Trends in Ecology and Evolution 7:389-392.
  41. PINHEIRO, R.T., E.S. REIS, e D. RODELLO. (2005). Diversidade de aves em um corredor de biodiversidade urbano. Resumos do XIII Congresso Brasileiro de Ornitologia, Belém-PA. R.155.
  42. BARBOSA, M.O., T. DORNAS. (2008). Avifauna da área verde do Prata e sua contribuição à consevção de ambientes naturais no Plano Diretor de Palmas, Tocantins. Resumos XVI Congresso Brasileiro de Ornitologia, Palmas-TO. R.304.
  43. PINHEIRO, R.T., T. DORNAS, E.S. REIS, M.O. BARBOSA e D. RODELLO. (2009). Birds of the urban área of Palmas-TO: composition and conservation. Revista Brasileira de Ornitologia (no prelo).
  44. DA SILVA, José Afonso. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo: 2007. p 274.
  45. Art. 40
  46. Arts. 16 e 17, da Lei nº 1.011 de 04 de junho de 2001, do município de Palmas.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CORIOLANO, Caroline Pires; PINHEIRO, Renato Torres. Unidades de conservação em área urbana. O (des)caso de Palmas/TO. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3002, 20 set. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20025. Acesso em: 26 abr. 2024.