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A prova para a concessão da justiça gratuita

A prova para a concessão da justiça gratuita

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A mera afirmação de hipossuficiência econômica, isolada de qualquer outro elemento de prova de titularidade do pretenso beneficiário, não é mecanismo suficiente para a ampla concessão do benefício.

Resumo: Este trabalho estrutura uma base para o estudo da prova na concessão da justiça gratuita. Apresenta o tratamento dado pela doutrina sobre o tema em questão, ao mesmo tempo em que traz também jurisprudência e legislação. Orienta sua evolução introduzindo o estudo pelo instituto do acesso à Justiça, passando em seguida à análise da própria justiça gratuita para então adentrar ao cerne do trabalho, tal sejam as críticas e sugestões para a definição de um justo meio de prova para a concessão da justiça gratuita. No decorrer do seu desenvolvimento nota-se a estreita ligação entre os recentes entendimentos jurisprudenciais com a premente necessidade de se pensar sobre a atualidade e eficaz operacionabilidade da Lei da assistência judiciária gratuita. Mencionada Lei é estudada dentre os abusos e prejuízos advindos de sua simplicidade probatória, com o intuito, diga-se, de delimitar sob que cenário deve-se esperar o desenrolar de uma relação de prova mais útil. Esta monografia oferece, ainda, hipóteses de verificar de que forma os beneficiários eventualmente poderiam agir de modo a ensejar a criação de uma prova em favor da boa-fé durante a fase de pré-ajuizamento da ação. E, por fim, importa constar que o fundamental sobre todo o pensar que vise à melhoria da concessão da justiça gratuita é a preservação do acesso do hipossuficiente à Justiça.

Palavra-chave: justiça gratuita – Lei da assistência judiciária – prova


INTRODUÇÃO

A escolha do presente tema tem razão no entendimento de que não há hoje eficácia no método legal de verificação da necessidade de uma pessoa, seja física ou jurídica, pleitear o direito à gratuidade processual (justiça gratuita).

Acredita-se que a mera afirmação de hipossuficiência econômica isolada de qualquer outro elemento de prova de titularidade do pretenso beneficiário não é mecanismo suficiente para a ampla concessão do benefício -- vide a crescente preocupação da doutrina e da jurisprudência sobre a atualização do instituto, conforme este trabalho se propõe a demonstrar.

Some-se a isso o intuito de garantir uma nova sistemática que, além de i) evitar o acesso gratuito ao judiciário por litigantes de má-fé que procuram a “lide sem risco”, uma vez que se condenados os ônus financeiros de sucumbência ficam suspensos por cinco anos e depois prescrevem, a não ser que a parte contrária comprove que o beneficiário possa arcá-los (artigo 12 da Lei da assistência judiciária gratuita), também ii) evite que haja dúvida quanto aos meios permitidos ou possíveis de identificação do litigante hipossuficiente, afastando hipóteses de denegação do direito à justiça gratuita à pessoas que realmente a ele façam jus. 

Dessa forma, com o embasamento na doutrina, legislação e jurisprudência, este estudo tem o objetivo de descrever os elementos caracterizadores da justa concessão da justiça gratuita.

Para tanto, será analisada a noção de acesso à Justiça, custo da justiça, outros obstáculos ao acesso à Justiça e formas de vencê-los, como também o conceito e principais características procedimentais da gratuidade processual, para, enfim, tratar sobre o tema da prova na concessão do benefício da assistência judiciária gratuita.

Importa destacar que o norte da pesquisa é a Lei da assistência judiciária gratuita, pois trata da justiça gratuita e sua forma de concessão, como também, dos aspectos que ensejam a caracterização do beneficiário do instituto.

Assim, a partir desses dois institutos, acesso à Justiça e justiça gratuita, e seus respectivos regramentos, urge demonstrar como eles podem se entrelaçar e até que ponto pode ser considerado justo o atual procedimento probatório de outorga do benefício da gratuidade processual. 

Ainda, o escopo desta pesquisa é demonstrar a relevância e interesse jurídico da questão da prova para a concessão da assistência judiciária gratuita, com a menção, inclusive, de exemplos de como, eventualmente, há a injusta concessão do benefício.

Apresentará, a recente discussão doutrinária e jurisprudencial sobre a eficácia e a atualidade da Lei da assistência judiciária gratuita, englobadas todas as principais questões inerentes à presente monografia: o reconhecimento do beneficiário, o meio probatório atual, a impugnação do benefício, etc.

A relevância da prova na concessão da gratuidade processual será de suma importância para a pesquisa, de modo que sem essa conscientização, não pode haver uma justiça gratuita de qualidade no Brasil.

Em suma, a prova bastante deve ser parâmetro para a concessão de um benefício que vise o acesso à Justiça de uma parcela da população nacional que enfrenta obstáculos financeiros nesse acesso.

Será demonstrado, por exemplo, que a omissão de mecanismos mais eficazes na outorga do benefício, ou a desproporcional disposição do ônus probatório à parte contrária, geram insegurança jurídica e injustas concessões da gratuidade processual.

Por fim, são enfrentadas sugestões de melhoria na atual perspectiva da justiça gratuita brasileira, tanto na forma de outorga do benefício, quanto, consequentemente, como se verá, na maneira de impugnação dessa concessão.


1. ACESSO À JUSTIÇA

Quando se pensa em acesso à Justiça, a primeira ideia comum é a da entrada, ingresso ao sistema Estatal que provê a Justiça. É esse mesmo o paradigma desta monografia, a ligação entre o acesso à Justiça, como Poder Judiciário, a justiça gratuita e sua coesa e justa operacionalização.

Conforme se verá, a isenção das custas do processo é um direito que é indispensável ao acesso à Justiça. Para a sua consecução, entretanto, é necessária a existência de mecanismos processuais que estabeleçam o modo como esse direito será disponibilizado àqueles que o fazem jus. Isto é, ao direito deve corresponder um procedimento eficaz e justo para o seu acesso.

Nesse aspecto, o direito processual tem importante papel transformador do direito material, isto é, por meio da jurisdição se procura dar efetividade ao direito. Esse é o entendimento de Jônatas Luiz Moreira de Paula, in verbis:

(...) o Direito Processual é para o povo. A sociedade não legisla diretamente no direito processual, senão por meio de seus representantes no parlamento. O Direito Processual é produto da necessidade de aprimoramento da atividade jurisdicional. Suas normas indiscutivelmente regulam os princípios informadores, temperados pela realidade e pelo bom-senso. O caráter transformador que impregna a atividade jurisdicional bem norteia o endereçamento do direito processual: o proveito social. A sociedade é “consumidora” das normas processuais no afã de conferir eficácia forçada dos direitos subjetivos espontaneamente ineficazes. (...) No âmbito da realização da inclusão social, a efetividade da jurisdição é mister para a consecução do fim desejado.[1]

Cândido Rangel Dinamarco, em sua obra “A instrumentalidade do processo”, aponta para essa estreita ligação entre direito material e direito processual, afirmando que somente com uma interpretação inteligente e atualizada da técnica processual, será possível atingir a consciência de que o processo deve ser manejado como mecanismo de distribuição de justiça entre as partes e de amplo acesso às pessoas ao Judiciário.[2]

O autor, ainda, conclama pela necessidade constante de re-análises da legislação processual em vigor para, se necessário, optar por reformas que visem o incremento de velhos instrumentos processuais, nos termos apresentados no parágrafo anterior. Cita a reforma do Código de Processo Civil como exemplo.[3]

Em suma, sobre essa relação o jurista José Roberto dos Santos Bedaque traz uma síntese apropriada aos anseios de Justiça: Menos tecnicismo e mais justiça, é o que se pretende.[4] Ou seja, não basta a previsão do direito material, por melhor que ele seja, mas importa que se estabeleçam instrumentos processuais eficazes para a asseguração do direito criado, em caso de sua não observância espontânea pela sociedade.[5]

É certo, porém, que o instituto do acesso à Justiça não se limita a esse contexto de acesso ao judiciário, mas engloba também a discussão sobre a prestação justa do serviço judicial: conscientização da população sobre seus direitos, sobre a importância e função dos juristas – juízes, promotores, advogados, etc. – e sobre o custo, demora e alcance – beneficiados – de uma lide.

No entanto, nessa monografia, em virtude de que a justiça gratuita se vê inserida no primeiro aspecto, tratar-se-á, somente, repita-se, sobre o acesso ao judiciário.

Nesse sentido, sobre o conceito de acesso à Justiça, a doutrina estrangeira, representada no seguinte trecho por Mauro Cappelletti e Bryant Garth, expõe que:

A expressão “acesso à Justiça” é reconhecidamente de difícil definição, mas serve para determinar duas finalidades básicas do sistema jurídico – o sistema pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob os auspícios do Estado. Primeiro, o sistema deve ser igualmente acessível a todos; segundo, ele deve produzir resultados que sejam individual e socialmente justos.[6]

A doutrina nacional, na pessoa de José Cichocki Neto, ensina:

Tem-se por insuprimível a relação de conteúdo e de funcionalidade, entre o acesso à justiça e o processo. Sob o ponto de vista da atividade jurisdicional, não há como referir-se ao acesso à justiça sem se considerar o processo como um instrumento de sua realização. Nessa perspectiva, a expressão “acesso à justiça” engloba um conteúdo de largo espectro: parte da simples compreensão do ingresso do indivíduo em juízo, perpassa por aquela que enfoca o processo como instrumento para a realização dos direitos individuais, e, por fim, aquela mais ampla, relacionada a uma das funções do próprio Estado a quem compete, não apenas garantir a eficiência do ordenamento jurídico; mas, outrossim, proporcionar a realização da justiça aos cidadãos.[7]

Paulo Cesar Santos Bezerra assevera que “(...) para que haja o efetivo acesso à justiça é indispensável que o maior número de pessoas seja admitido a demandar ou a defender-se adequadamente, nos casos de escolha da via judicial, (...)”.[8]

O mesmo autor lembra-se da criação histórica, com a promulgação da Constituição Federativa do Brasil de 1946, do princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional ou princípio da acessibilidade ampla ao Poder Judiciário, como, ao lado da assistência gratuita e da assistência jurídica integral (afirmadas pela Carta Magna, como se verá a diante), importante elemento de acesso à Justiça.[9]

Sobre o princípio da inafastabilidade ou, ainda, princípio da legalidade, na definição de Alexandre de Moraes:

O princípio da legalidade é basilar na existência do Estado de Direito, determinando a Constituição Federal sua garantia, sempre que houver violação do direito, mediante lesão ou ameaça (art. 5º, XXXV). Dessa forma, será chamado a intervir o Poder Judiciário, que, no exercício da jurisdição, deverá aplicar o direito ao caso concreto. (...) o Poder Judiciário, desde que haja plausibilidade da ameaça ao direito, é obrigado a efetivar o pedido de prestação judicial requerido pela parte de forma regular, pois a indeclinabilidade da prestação judicial é princípio básico que rege a jurisdição, uma vez que a toda violação de um direito responde uma ação correlativa, independentemente de lei especial que a outorgue.[10]

José Cretella Júnior, em ainda nova denominação, diz sobre o princípio da inarredabilidade do controle jurisdicional[11]:

(...) “apreciação” é “revisão”, “controle”, “contraste”, “contrasteamento”. Cabe ao Poder Judiciário, no policiamento da legalidade, apreciar, mediante provocação do interessado, a lesão de direito ocorrida. Ou a ameaça de lesão. Se se tratar de direito líquido e certo, cabe o mandado de segurança. Se a lesão for dirigida à liberdade de locomoção, cabe o habeas corpus.[12]

Sobre esse relevante princípio, por fim, em total consonância com o escopo do estudo sobre mecanismos de acesso amplo e justo à Justiça que esta monografia propõe, em especial sobre a gratuidade processual, Rogério Lauria Tucci relembra que a garantia constitucional da tutela jurisdicional tem igual definição no artigo 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948[13] (alías, dispositivo de grande inspiração à nossa Constituição Cidadã):

“Toda pessoa tem direito, em condições de plena igualdade, de ser ouvida publicamente e com eqüidade, por um tribunal independente e imparcial, para a determinação de seus direitos e obrigações, ou para o exame de qualquer acusação contra ela dirigida, em matéria penal.”

Portanto, observa-se a importância da previsão expressa do acesso amplo à Justiça no ordenamento jurídico, assim como, a concomitância de instrumentos que o viabilizem, os quais, sem esgotá-los, serão detalhados a diante, em especial a gratuidade processual.

Outrossim, o acesso à Justiça, entendido como o acesso ao Judiciário, trafega a partir do trâmite de uma demanda judicial em que sejam exigidas custas e despesas processuais, além da possibilidade de condenação em honorários advocatícios decorrentes da sucumbência.

Nesse sentido, a doutrina aponta a justiça gratuita como um mecanismo essencial ao pleno acesso à Justiça do jurisdicionado.

Novamente, Alexandre de Moraes, analisando o artigo 5º, inciso LXXIV[14], da Constituição Federal, ensina que:

Sem assistência jurídica integral e gratuita aos hipossuficientes não haveria condições de aplicação imparcial e equânime de Justiça. Trata-se, pois, de um direito público subjetivo consagrado a todo aquele que comprovar que sua situação econômica não lhe permite pagar os honorários advocatícios, custas processuais, sem prejuízo para o seu próprio sustento e de sua família[15].

Hélio Márcio Campo, analisando o mesmo inciso, assevera que:

Trata-se do exercício do direito de ação e da plena aplicação do princípio do contraditório e da ampla defesa, consubstanciados nos incisos XXXV e LV, do art. 5º, da Constituição Federal, que, como tais, foram erigidos à categoria de direito e garantia individual.[16]

José Cretella Júnior:

A assistência jurídica deve ser integral, plena. A prestação jurisdicional é ato vinculado. Provada pelo interessado sua condição de necessitado, tem ele o direito de exigir do Estado aquilo que a regra jurídica constitucional lhe assegurou.[17]

Nelson Nery Júnior, de forma incisiva, defende a existência da gratuidade processual como pressuposto basilar do acesso do cidadão à Justiça:

A isenção das custas e honorários ao beneficiário da assistência judiciária (LAJ 3º) não constitui ofensa à isonomia. Haveria vedação do acesso à justiça caso se obrigasse o necessitado a pagar as despesas processuais.[18]

Ainda, já novamente perante a doutrina estrangeira, cabe prestigiar a lição de Mauro Cappelletti:

Na maior parte das modernas sociedades, o auxílio de um advogado é essencial, senão indispensável para decifrar leis cada vez mais complexas e procedimentos misteriosos para ajuizar uma causa. Os métodos para proporcionar a assistência judiciária àqueles que não a podem custear são, por isso mesmo, vitais.[19]

Percebe-se, assim, a vital importância da previsão de acesso gratuito àqueles que necessitem da prestação da jurisdição estatal, mas, por razões econômicas, não possuam acesso à demanda a qual exige desde logo o pagamento de encargos financeiros para seu ajuizamento.

No entanto, cabe delimitar a importância, por sua vez, da fixação de um custo ao acesso ao judiciário.

1.1.Custo da Justiça

Por mais que o suporte financeiro do judiciário não recaia totalmente no jurisdicionado, uma vez que o Estado cria primeiro toda a estrutura física da Justiça (prédios, funcionários, material de escritório, etc.), grande parte do financiamento da manutenção e das melhorias dessa estrutura inicial será paga pelos “clientes” da Justiça, os jurisdicionados.

No direito comparado, Mauro Cappelletti e Bryant Garth, observam que:

A resolução formal de litígios, particularmente nos tribunais, é muito dispendiosa na maior parte das sociedades modernas. Se é certo que o Estado paga os salários dos juízes e do pessoal auxiliar e proporciona os prédios e outros recursos necessários aos julgamentos, os litigantes precisam suportar a grande proporção dos demais custos necessários à solução de uma lide, incluindo os honorários advocatícios e algumas custas judiciais.[20]

Dinamarco, também lembra o custo de uma demanda:

Sabido que o processo custa dinheiro, inexistindo um sistema de justiça inteiramente gratuita onde o exercício da jurisdição, serviços auxiliares e defesa constituíssem serviços honorários e portanto fossem livres de qualquer custo para o próprio Estado e para os litigantes, para que os necessitados possam obter a tutela jurisdicional é indispensável que de algum modo esse óbice econômico seja afastado ou reduzido. Daí a busca de meios para suprir as deficiências dos que não têm.[21]

Ato contínuo, importante ponderar que o custo da Justiça tem uma função necessária: ao mesmo tempo em que é utilizado para suportar os custos de operacionalização do judiciário, também serve para inibir causas temerárias.

Assim, o cidadão pensa duas vezes antes de se aventurar em uma causa, em função, como se viu, dos seus altos custos (adiantamento de valores, possível sucumbência, preparos recursais, etc.).

A doutrina, presa a essa fundamental concepção da Justiça, defende que:

(...) prepondera universalmente a onerosidade do processo, para as partes, porque a gratuidade generalizada seria incentivo à litigância irresponsável, a dano desse serviço público que é a jurisdição. Os casos de gratuidade são excepcionais e específicos, estando tipificados em normas estritas.[22]

Dessa forma, caberá analisar a hipótese da assistência judiciária com mais profundidade, para delimitar sua importância e eventuais pontos de melhoria.

1.2.            Outros obstáculos ao acesso à Justiça

Antes de analisar o instituto da justiça gratuita, que não se olvide, contudo, da existência de outros obstáculos ao acesso à Justiça, como, por exemplo, a resistência[23] da população, em regra, ao Poder Judiciário (em vista de sua notória demora[24], má prestígio, em geral, da classe de advogados, etc.).

O estudo desses obstáculos é importante para que se perceba como a melhoria do sistema da assistência judiciária é um mínimo diante do que ainda se pode fazer em termos de acesso à Justiça, conforme se verá no próximo subcapítulo.

Assim, um dos mais comuns obstáculos, aliás, intimamente ligado à justiça gratuita, é o da sensível falta de informação/educação que assola as classes mais humildes, justamente as que mais utilizam o direito à gratuidade processual e os serviços da assistência jurídica, custeada ou não pelo Estado (Defensoria Pública, advogados nomeados pelo Juízo, advogados do convênio do Estado com a Ordem dos Advogados do Brasil – Seção de São Paulo, assistência jurídica gratuita prestada por faculdades de direito[25], etc.).

Augusto Tavares Rosa Marcacini, intitulando essa falta de informação como uma barreira cultural e ligando, outrossim, essa questão à falta de recursos, como mencionado acima, aduz que:

(...) como a falta de recursos vem, muitas vezes, acompanhada da falta de informação, o acesso à Justiça é obstado até mesmo pelo fato do pobre desconhecer que tenha direitos a pleitear, ou que possa ter sucesso na tarefa de lutar por seus direitos. As barreiras culturais são, na verdade, mais difíceis de serem vencidas do que as barreiras econômicas. Estas podem ser afastadas isentando-se o carente das despesas com o processo e fornecendo-lhe gratuitamente um advogado para patrocinar seus interesses. As barreiras culturais só serão afastadas de fato na medida em que o nível sociocultural da população evoluir.[26]

Mauro Cappelletti, analisando um obstáculo novamente ligado à carência de recursos do litigante, nomeado como recursos financeiros (dentro do item “possibilidades das partes”, que também, no sentido do exposto acima como uma barreira cultural, engloba o obstáculo “aptidão para reconhecer um direito e propor uma ação ou sua defesa”), assevera:

Pessoas ou organizações que possuam recursos financeiros consideráveis a serem utilizados têm vantagens óbvias ao propor ou defender demandas. Em primeiro lugar, elas podem pagar para litigar. Pode, além disso, suportar as delongas do litígio. Cada uma dessas capacidades, em mãos de uma única das partes, pode ser uma arma poderosa; a ameaça de litígio torna-se tanto plausível quanto efetiva. De modo similar, uma das partes pode ser capaz de fazer gastos maiores que a outra e, como resultado, apresentar seus argumentos de maneira mais eficiente. Julgadores passivos, apesar de suas outras e mais admiráveis características, exacerbam claramente esse problema, por deixarem às partes a tarefa de obter e apresentar as provas, desenvolver e discutir a causa.[27]

Mencionado autor cita ainda outro obstáculo ligado às possibilidades das partes, a questão da freqüência dos litigantes em lides judiciais, o que chama de litigantes “eventuais” e litigantes “habituais”.[28]

O autor explica que a utilização constante do Poder Judiciário dá a esse litigante habitual (a quem chama de “litigantes organizacionais” – cita como exemplo as empresas) muitas vantagens em relação àquele que eventualmente (menciona como exemplo as “pessoas comuns”) faz uso do Judiciário, como por exemplo, o acúmulo de experiência judicial, o que traria possibilidade de planejarem os litígios e a possibilidade do desenvolvimento de relações informais com os membros da instância decisória. Essas vantagens dariam mais eficiência aos litigantes habituais.[29]

Como se vê, não são poucos os obstáculos ao acesso à Justiça. Em geral, estão eles ligados à carência de recursos e a falta de informação/instrução dos indivíduos.

Porém, existem, por sua vez, alternativas criadas para possibilitar a melhoria do acesso à Justiça, como o subcapítulo a seguir demonstrará.

1.3.            Alternativas para melhorar o acesso à Justiça

É certo, como visto, que a dificuldade financeira é apenas um de outros obstáculos sócio-culturais ao acesso à Justiça, seja no conceito de acesso ao Judiciário, seja no de acesso à outorga de um justo serviço judicial.

Sobre a importância do enfrentamento dos chamados obstáculos à Justiça, Luiz Guilherme Marinoni defende que:

(...) para se garantir a participação dos cidadãos na sociedade, e desta forma a igualdade, é imprescindível que o exercício da ação não seja obstaculizado, até porque ter direitos e não poder tutelá-los certamente é o mesmo do que não os ter.[30]

Assim, além do instituto da justiça gratuita, objeto de estudo mais aprofundado nessa monografia, já existem outras medidas em que se credita uma melhoria ao acesso à Justiça no Brasil.

Nesse sentido, cabe registrar a advertência de Rogério Lauria Tucci:

Realmente, para ser assegurada a liberdade e, sobretudo, a igualdade das partes faz-se imprescindível que, durante todo o transcorrer do processo, sejam assistidas e/ou representadas por um defensor, dotado de conhecimento técnico especializado, e que, com sua inteligência e domínio dos mecanismos procedimentais, lhe propicie a tutela de seu interesse ou determine o estabelecimento ou o restabelecimento do equilíbrio do contraditório.[31]

Dessa forma, apresenta-se a primeira pertinente medida efetiva para um melhor acesso à Justiça, a Defensoria Pública que, aliás, tem estreita ligação com a justiça gratuita, uma vez que se insere no conceito maior de assistência jurídica integral e gratuita, prevista na Constituição Federal, como será detalhado a diante.

Guilherme Braga Peña de Morais conceitua a Defensoria Pública como:

(...) uma instituição essencial à função jurisdicional do Estado, correspondendo a uma manifestação e instrumento do regime democrático, cabendo-lhe a orientação jurídica integral e gratuita, a postulação e a defesa judicial (em todos os graus de jurisdição) e extrajudicial, de direitos, individuais e coletivos, titularizados por hipossuficientes econômicos. (...) o termo “assistência jurídica” abrange a defesa, em juízo, de interesses e direitos titularizados por hipossuficientes econômicos, a prevenção, o aconselhamento, a consultoria e a informação jurídica, bem como a prática de atos extrajudiciários em favor dos despossuídos.[32]

E continua o autor, tratando da vertente consultiva da Defensoria Pública, verbis:

O aconselhamento, a consultoria e a informação jurídica são estabelecidos no artigo 4º, I, da Lei Complementar nº 80, de 1994, e possuem como objetivo, através dos acordos celebrados entre as partes envolvidas em um conflito de interesse, com a participação do Defensor Público, a quem cabe instruir os litigantes de seus direitos e deveres e das conseqüências da demanda judicial; evitar a propositura de inúmeras ações judiciais, vindo a desafogar os órgãos jurisdicionais, já que tais medidas decorrem, geralmente, do desconhecimento do direito titularizado.[33]

Como se observa, a Defensoria Pública foi instituída (artigo 134, da Carta Magna) para prover a assistência judiciária integral e gratuita para os hipossuficientes. Sua existência é fundamental para assegurar um eficaz patrocínio judicial aos desfavorecidos, pois não bastaria a isenção de custas se a eles também não fosse outorgado um serviço de qualidade e gratuito para a defesa de seus interesses legais. 

Além da Defensoria Pública, como visto, Marcacini cita três importantes diplomas jurídicos que vieram para ampliar o acesso à Justiça ao cidadão: a Lei dos juizados especiais (Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995), relativamente à defesa dos interesses das chamadas “pequenas causas”; a Lei da ação civil pública (Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985), que disciplina a defesa de interesses difusos e o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990), que estabelece diversos direitos e medidas de proteção ao consumidor.[34]

Sobre a efetividade dessa facilitação ao acesso à Justiça, o mesmo autor, relativamente ao Código Consumeirista, defende que:

(...) temos que a defesa coletiva de interesses do consumidor pode evitar inúmeras causas individuais – por exemplo, ao buscar retirar um produto do mercado, afastar práticas lesivas ou proibir propagandas enganosas, previne-se a ocorrência de futuros conflitos (...).[35]

Sobre os Juizados Especiais, José Renato Nalini, expressa suas boas esperanças para, de forma geral, depositar a expectativa da população, principalmente na classe desprovida de recursos financeiros, em uma melhora da prestação jurisdicional do Poder Judiciário.

O autor defende que a criação dos Juizados veio democratizar o acesso à Justiça, pois institucionalizou uma mentalidade de “tolerância zero” perante qualquer injustiça. E continua, afirmando que enquanto à justiça tradicional (leia-se, a justiça comum), historicamente formal e hermética, é rechaçada pelo povo, os Juizados são procurados com a credibilidade de instituição humana ordenada para a solução eficaz dos problemas judiciais.[36]

Pedro Manoel Abreu comenta sobre a origem, evolução e o êxito dos Juizados Especiais ensinando que seu surgimento veio da experiência prática do Poder Judiciário do Rio Grande do Sul. Este, continua o autor, superou a burocracia, onerosidade e lentidão do sistema judiciário tradicional e, em pouco tempo, teve o apoio maciço da sociedade brasileira, ensejando na criação da Lei dos Juizados, democratizando o Judiciário e indo ao encontro do objetivo maior do acesso à Justiça, o alcance à cidadania plena.[37]

Os Juizados Especiais, ademais, trouxeram importante inovação: o seu acesso, em primeiro grau, é isento de custas e de honorários advocatícios (artigo 54, caput, da Lei nº 9.099/95).

A Lei dos Juizados Especiais, com isso, como apontou a doutrina ora colacionada, quis democratizar o acesso ao judiciário, notadamente àqueles chamados hipossuficientes, como os consumidores e todas aquelas pessoas economicamente e culturalmente vulneráveis.

Com relação à defesa aos interesses difusos, traçando uma interessante relação com a defesa dos direitos individuais, Marinoni ensina que as demandas coletivas superam o custo e a demora das lides individuais, pois em uma hipótese em que o lesado teve um prejuízo pequeno, a demanda individual não compensa, mas se o cidadão estiver, por exemplo, amparado por uma associação de consumidores, aí sim verá seu direito devidamente tutelado, pois a Lei prevê a legitimidade para essa entidade de classe pleitear em Juízo os interesses desse cidadão e de todos os outros por ela tutelados que tiverem seu direito lesado.

O autor ainda assevera que essa proteção legal evita que o lesado aceite inerte a violação de seu direito, o que com certeza acarretaria transtorno individual e, na esfera coletiva, “perigosa insatisfação coletiva”.[38]

O surgimento desses modernos sistemas de proteção às minorias e defesa de interesses coletivos, conjuntamente com a Defensoria Pública, vem ao encontro de uma tendência de facilitação de acesso à Justiça às classes menos favorecidas e, ao mesmo tempo, desvirtua, ao menos na teoria, a pecha negativa sofrida pelo Poder Judiciário.

Fábio Campelo Conrado de Holanda, ao apontar o Judiciário como quase único meio de acesso à Justiça buscado pela maioria das pessoas, reconhece a necessidade do incentivo de “aprimoramento de mecanismos processuais e a implementação de políticas públicas tendentes a resguardar os direitos e a reduzir as desigualdades entre as pessoas (...)”.[39]

Ainda, Marinoni lembra que: “os conflitos civis podem ser eliminados por ato dos próprios envolvidos, quando ocorre a autocomposição (...) ou ainda por via da mediação ou da arbitragem (por um terceiro que não exerce o poder estatal).”[40]

Com efeito, é crescente o incentivo do Estado e da sociedade em geral na opção das chamadas “formas alternativas de resolução de conflitos”, que têm na arbitragem, na mediação e na conciliação suas principais representantes. São alternativas que visam a solução mais rápida e menos custosa dos conflitos. No caso da mediação e da conciliação, um terceiro imparcial ao caso dirige as partes para um acordo que pode, posteriormente, ser homologado em Juízo. Já na arbitragem, em linhas gerais, as partes, em litígios que envolvam direitos disponíveis, optam pela solução do conflito por um árbitro escolhido e custeado por elas. Esse sistema, pelo custo, em regra, superior ao do judiciário, é mais comum entre causas de empresas. A arbitragem é regulada pela Lei nº 9.307/96.

Marinoni diz sobre a conciliação:

A conciliação, realizada fora do processo do Estado e por juízes que não seus agentes, foi inicialmente instituída na forma de “Conselhos de Conciliação e Arbitramento” (Rio Grande do Sul) e de “Juizados de Conciliação” (São Paulo), e objetiva solucionar os conflitos de interesses sem dizer que “A” ou “B” tem razão, mas buscando conferir às partes condições favoráveis para a eliminação do conflito através de atos de sua própria vontade, ou melhor, buscando induzir as próprias partes a resolver seu caso.[41]

Agora sim, verificados alguns outros obstáculos ao acesso à Justiça e algumas alternativas para vencê-los, passa-se ao estudo da justiça gratuita e ao cerne do trabalho, sua forma de concessão, especialmente o que diz respeito à prova para a consecução do benefício.


2. JUSTIÇA GRATUITA

2.1. Conceito, distinções e amplitude

A justiça gratuita, no contexto desta monografia, insere-se no conceito da gratuidade processual, ou seja, grosso modo, da isenção pela parte do pagamento prévio e, de forma definitiva, após o interregno de cinco anos do deslinde da ação judicial (se nesse meio tempo não sobrevier condições de pagar[42]), das custas, das despesas processuais e dos honorários advocatícios devidos em razão da sucumbência.

A gratuidade processual tem suas principais previsões legais na Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950.

O Código de Processo Civil, Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, em seu artigo 19, caput, ao prescrever sobre a obrigatoriedade ao pagamento de custas nos processos em geral, ressalvou a existência do instituto da justiça gratuita:

Art. 19. Salvo as disposições concernentes à justiça gratuita, cabe às partes prover as despesas dos atos que realizam ou requerem no processo, antecipando-lhes o pagamento desde o início até sentença final; e bem ainda, na execução, até a plena satisfação do direito declarado pela sentença.[43]

Sobre esse artigo, Antônio Cláudio da Costa Machado, escreve:

Os beneficiários da assistência judiciária gratuita (Lei n. 1.060/50) estão isentos do pagamento de taxas, emolumentos, custas, despesas de publicação, indenizações, honorários de advogado e perito, despesas com a realização de exame de código genético – DNA e depósitos previstos em lei para interposição de recurso, ajuizamento de ação e demais atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório (art. 3º). Eis a ressalva estabelecida na parte inicial do texto focalizado. A regra é a imposição do ônus da antecipação do pagamento das despesas do ato à parte que requer a sua prática ou que tem de praticá-lo por imposição legal ou judicial (v. arts. 24, 33, 208, 212 e 419).[44]

Nelson Nery Júnior define a gratuidade processual como o benefício que “(...) libera a parte que dele dispõe de prover as despesas dos atos que realizam e requerem no processo (CPC 19), bem como de responder pelas custas e honorários advocatícios.”[45]

No conceito do jurista Hélio Márcio Campo:

A assistência judiciária pode ser definida como o benefício concedido ao litigante que não dispõe de recursos financeiros suficientes para fazer frente às custas judiciais, isentando o Estado, total ou parcialmente, seja em forma definitiva ou provisória, o hipossuficiente do recolhimento antecipado das taxas e demais despesas processuais. (...) ficando ainda suspensa a exigibilidade do ônus da sucumbência, quando tenha perdido a demanda o favorecido, até que cesse o seu estado de necessitado e enquanto a prescrição não se operar (arts. 11, § 2º, 12 e 23 da Lei da Assistência Judiciária Gratuita).[46]

Já Lívio Goellner Goron, enfatizando a característica de meio de acesso à Justiça, lembra que:

A gratuidade de Justiça remete à noção de um mínimo existencial. Trata-se da compreensão de que o indivíduo não pode ser privado de condições adequadas de existência para ombrear como o custeio de um processo; e de que tampouco pode ele – o litigante – encontrar nessa exigência uma indevida barreira levantada contra seu direito de acesso à Justiça.[47]

Outrossim, delimitado o conceito de justiça gratuita, importante diferenciá-lo[48] de assistência judiciária (ou assistência jurídica integral e gratuita) e de assistência jurídica.

A assistência jurídica é o mais amplo dos institutos, pois engloba, além dos dois primeiros “a prestação de serviços jurídicos extrajudiciais (como, por exemplo, a distribuição, por órgão do Estado, de cartilha contendo os direitos básicos do consumidor) – trata-se, como se vê, de direito bem abrangente”.[49]

Já a assistência judiciária ou assistência jurídica integral diz respeito ao serviço custeado pelo governo, nas esferas federal, estadual e municipal, de suporte jurídico àqueles que gozem da gratuidade processual.

Fredie Didier Jr. e Rafael Oliveira doutrinam que “assistência judiciária é o patrocínio gratuito da causa por advogado público (ex.: defensor público) ou particular (entidades conveniadas ou não com o Poder Público, como, por exemplo, os núcleos de prática jurídica das faculdades de direito)”.[50]

Assim, como a justiça gratuita significa a mera isenção das custas processuais, é possível que a parte possua advogado particular (que terá direito ao recebimento dos honorários de sucumbência ou, até mesmo, contratuais) e sejam concedidos os benefícios da Lei de assistência judiciária (Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950).

Isso ocorre, porque a referida Lei legisla tanto os interesses daquele necessitado que procura o judiciário representado por um advogado particular, quanto daquele que se socorre do Poder Público para que seja patrocinado por advogado público, seja por meio de convênio com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seja pela própria Defensoria Pública (da União ou dos Estados).  

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário nº 205.029-6-SP, em trecho se seu inteiro teor, delimitou a diferença entre a mera postulação da gratuidade processual e o patrocínio da demanda pelos serviços públicos de advogado gratuito:

(...) A Constituição Federal, art. 5º, LXXIV, garante, mediante, a prova de insuficiência de recursos, “assistência jurídica integral”, o que não quer dizer que a “assistência jurídica aos necessitados”, com norma infraconstitucional, haja sido revogada pela referida norma constitucional. Esta, a assistência jurídica aos necessitados, assegurada por norma infraconstitucional, é parte da “assistência jurídica integral”, que a Constituição assegura. Para obter aquela, basta a declaração, feita pelo próprio interessado, de que é pobre. A obtenção do benefício maior – “assistência jurídica integral” – é que demanda a prova da insuficiência de recursos. (...)[51]

Robson Flores Pinto afirma que:

(...) verifica-se que a Constituição de 1988 trouxe importante inovação acerca do tema em foco, ao substituir a “assistência judiciária” pela “assistência jurídica”, reforçada pelo acréscimo do “integral e gratuita”, de modo a significar uma superlativa ampliação do universo que pretende abarcar.[52]

Dessa forma, já adentrando no cerne da presente monografia, ou seja, a questão probatória do requerimento do benefício da gratuidade, é importante reafirmar a diferença entre os institutos da justiça gratuita (Lei nº 1.060/50) e da assistência jurídica integral e gratuita (que, aliás, engloba também a assistência jurídica, como mencionado), em razão da fundamental diferença probatória entre eles: a concessão do primeiro depende de mera declaração do postulante, enquanto que para o segundo, seguem-se as normas próprias advindas com a Carta Magna (prova de insuficiência de recursos) e dos órgãos do Estado designados para a efetivação desse direito fundamental.

Mais uma vez, Hélio Márcio Campo expõe que:

Para alcançar o beneplácito da assistência jurídica e, por conseqüência, a judiciária, há a necessidade, primeiramente, de o postulante fazer prova da insuficiência de recursos junto ao órgão administrativo incumbido de prestá-las, que é, no caso, a Defensoria Pública, tal como dessume do art. 134 da Constituição Federal. Obtida a assistência jurídica pelo interessado, mediante a comprovação da insuficiência de meios econômicos, se for o caso de propositura de uma ação ou apresentação de uma defesa, deverá ele postular, também, só que agora em juízo, assistência judiciária, cuja prova é despicienda, visto que já realizada junto à equipe da Defensoria Pública, de sorte que basta neste momento a simples afirmação, na própria petição inicial ou por ocasião de seu ingresso em juízo, de que não está em condições de suportar os custos do litígio.[53]

Repita-se, porém, que, como o próprio autor afirma a diante na mesma obra[54], o postulante pode estar representado por causídico particular e mesmo assim pleitear o direito à gratuidade. Esse advogado pode optar por exercer seus serviços profissionais pro bono, receber apenas em caso de êxito na demanda ou ainda parcelar seus honorários. Não há a obrigatoriedade de buscar o benefício por meio da assistência jurídica prestada pelo Estado.

Contudo, note-se que, segundo o entendimento que segue, a contratação de advogado particular, por si só, pode ser dado (de modo equivocado, com o devido respeito, pois, como citado, o advogado pode estar trabalhando de graça) como elemento de indeferimento da concessão da justiça gratuita:

(...) Vistos. 1. Indefiro, por ora, a gratuidade da justiça. Os embargantes não apresentaram a declaração do imposto de renda do ultimo exercício fiscal, além do que a contratação de advogado particular sugere que não fazem jus ao beneficio que pleiteia. 2. De outra parte, vale consignar que a lei 1060/50 foi recepcionada pela Constituição Federal. Em verdade, esta, por razões óbvias, ao ser editada recriou todo o ordenamento jurídico nacional, dando-lhe novo fundamento de validade. As normas editadas anteriormente ao ano de 1988, portanto, devem ser interpretadas conforme seus ditames. O art. 5º, LXXIV, afirma que o "Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovem insuficiência de recursos". Afirmou, então que a concessão da gratuidade depende da comprovação acerca da insuficiência de capacidade econômica. Não basta, então, interpretando a legislação infraconstitucional ao lume da Constituição, afirmar-se necessitado, indispensável a comprovação da necessidade real e concreta. 3. Apresente em 5 (cinco) dias, a Declaração de Imposto de Renda do ultimo exercício fiscal.[55]

Marcacini:

(...) a parte, embora tenha o direito à assistência judiciária, pode optar por ser defendida por advogado que aceite o encargo, gratuitamente, ou mesmo que seja contratado, pagando seus honorários a final, com o que receber mediante o processo, sem que isto implique a perda do direito à gratuidade processual, que poderá ser pedida e deverá ser-lhe concedida pelo juiz.[56]

Já quanto à amplitude do instituto, a melhor interpretação[57] parece ser a de Augusto Tavares Rosa Marcacini[58], Hélio Márcio Campo[59], Robson Flores Pinto[60] e Fredie Didier Jr. e Rafael Oliveira[61], de que a gratuidade envolveria “toda e qualquer despesa necessária ao pleno exercício dos direitos e das faculdades processuais, sejam tais despesas judiciais ou não”[62], pois somente dessa forma seriam garantidos os princípios constitucionais da isonomia, do direito de ação e do contraditório e ampla defesa.[63]

Theotonio Negrão, sobre o rol de isenções que traz o artigo 3º, da Lei nº 1.060/50, cita decisão do Superior Tribunal de Justiça que se harmoniza com o entendimento citado: “O rol do art. 3º da Lei 1.060/50 é meramente exemplificativo, pois deve ser interpretado de acordo com o art. 9º da mesma Lei e com o art. 5º, XXXV e LXXIV, da CF.”[64]

Porém, importa lembrar que essa isenção não pode ser demasiada ampla que atinja toda e qualquer despesa que possa nascer de uma lide. Refere-se aqui às chamadas multas processuais, como a prevista no artigo 17, do Código de Processo Civil (litigância de má-fé) e aquela do artigo 601, do mesmo diploma (ato atentatório à dignidade da Justiça). Pois, de modo contrário, o Judiciário seria palco de lides temerárias respaldadas pela gratuidade processual que, como se sabe, não tem essa função.

Fredie Didier comenta sobre o assunto, lembrando, também, das multas coercitivas que o Código Ritual prevê para o cumprimento de suas tutelas jurisdicionais, como por exemplo, a prevista no seu artigo 461, § 5º:

A gratuidade judiciária não abrange, nem poderia abranger, as multas processuais. Se assim não fosse, estar-se-ia admitindo um acesso irresponsável e inconseqüente à justiça, consubstanciado no fato de o beneficiário poder, impunemente, abusar do direito de demandar, sem que nenhuma sanção lhe pudesse ser aplicada (nos casos de multa com caráter punitivo) ou sem que fosse possível impor-lhe medidas coercitivas para efetivação da tutela jurisdicional (nos casos de multa com caráter coercitivo). Deve-se lembrar que o escopo da norma é beneficiar a pessoa carente de recursos, jamais municiá-lo com um escudo legal para defendê-la da própria torpeza.[65]

O mesmo autor igualmente ensina que a gratuidade processual também abrangerá o depósito necessário à propositura da ação rescisória (artigo 488, II, do Código de Processo Civil), da mesma forma que, em geral, os demais depósitos previstos no Código de Rito e em leis extravagantes[66].

Porém, lembrando o autor a diferenciação pertinente entre depósito processual inerente a assegurar o exercício da ampla defesa e do contraditório e depósito processual ligado à garantia processual da parte contrária, cita a hipótese do artigo 475, III, do citado diploma, e defende que:

Não se trata essa caução de uma despesa processual, mas de medida exclusivamente acautelatória. Dispensar o beneficiário de efetivá-la seria impor ao executado um sério risco de não mais poder ter de volta a parcela do seu patrimônio que lhe fora retirada em razão de execução fundada em título que, ao fim, não mais prevaleceu. Principalmente, considerando que o beneficiário é, por definição, uma pessoa carente de recursos financeiros.

Por fim, imperioso notar que o âmbito dessa monografia restringe-se à discussão da justiça gratuita. Não serão tratados, em profundidade, os temas da assistência jurídica e da assistência jurídica integral ou assistência judiciária.

2.2. Escorço histórico

A preocupação de prever normas sobre a isenção ao pagamento das despesas geradas pela movimentação do órgão que provê a Justiça em um Estado, segundo a doutrina, remonta ao Código de Hamurabi (2067-2025 a.C.).[67]

Esse ancestral compilado de regras, segundo Robson Flores Pinto, já garantia um tratamento diferenciado a certas pessoas carentes de recursos financeiros e, com isso, delimitava um valor máximo para ser cobrado pelos defensores e pelos demais serviços legais postos à disposição delas.[68]

Mais a diante no tempo, em Atenas e em Roma, eram indicados advogados pelo Estado a fim de atuarem em prol dos necessitados, sendo o segundo povo influenciado pelos preceitos de igualdade fomentados pelo Cristianismo.[69]

Ato contínuo, Gláucia Lopes ensina que:

Com a Declaração de Direitos do Estado de Virgínia (1776) e a Declaração dos Direitos do homem e do Cidadão (1789), o benefício perde o caráter caridoso e passa a ser direito do cidadão e dever do Estado.[70]

Mauro Cappelletti, em tarefa de delimitar as ‘soluções práticas para os problemas de acesso à Justiça’ e sua ordem de aparição, indica que a partir do interesse dos países ocidentais pelo acesso efetivo à Justiça (por volta de 1965)[71]: “Podemos afirmar que a primeira solução para o acesso – a primeira “onda” desse movimento novo – foi a assistência judiciária; (...)”[72]

Sem dúvida, nasce dessa característica precursora a noção de importância que se deve depositar no sistema de concessão justa da justiça gratuita, ou seja, na identificação precisa de seus pretensos beneficiários e na modulação das formas probatórias da final outorga do benefício.

Por fim, sobre o benefício no Brasil, Lopes assevera que “(...) tradicionalmente, sempre garantiu a assistência judiciária. A partir da Constituição Federal de 1934, tratou expressamente do tema.”[73]

Hélio Márcio Campo, em detalhada lembrança histórica, assevera que:

No Brasil, já ao tempo das Ordenações Filipinas (iniciadas por Felipe I, de 1527 a 1598, como o nome de Felipe II, reinando também na Espanha, e, depois, com Felipe II, em Portugal, de 1578 a 1621) previa-se o benefício da assistência judiciária gratuita no Livro III, Título 84, § 10: “em sendo o agravante tão pobre que jure não ter bens móveis, nem de raiz, nem por onde pague o agravo, e dizendo na audiência uma vez Pater Noster pela del Rey Don Diniz, ser-lhe-á havido, como que pagasse os novecentos réis, contanto que tire de tudo certidão dentro do tempo, em que devia de pagar o agravo”.[74]

Nos dias atuais, como já se viu, a assistência judiciária é prevista na Carta Magna de 1988 (artigo 5º, inciso LXXIV) e, infraconstitucionalmente, como, aliás, objeto principal da presente monografia, na Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950.

Ao contínuo, cabe agora, mesmo que brevemente, apresentar o atual entendimento de quem poderiam ser os beneficiários da gratuidade processual.

2.3. Beneficiários

O conceito de beneficiário pode ser encontrado em dois principais diplomas: na Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LXXIV, e na lei específica sobre o tema da justiça gratuita, a Lei da assistência judiciária gratuita, Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950.

A Constituição Federal, pelo artigo citado, dispõe que: “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”.[75]

Desse preceito constitucional, nesse momento, importa analisar a questão da insuficiência de recursos.

De maneira mais óbvia e próxima, poder-se-ia pensar que esse conceito apenas abrangeria a questão da insuficiência de recursos materiais, econômicos. Mas, é possível pensar também sobre, como mencionado como um dos obstáculos de acesso à Justiça, acima, uma interpretação mais social, ou seja, de que a insuficiência seja, ao mesmo tempo, de recursos culturais, educacionais e organizaconais.[76]

Ada Pellegrini Grinover ensina que:

Quando se fala em assistência judiciária, logo se pensa na assistência aos necessitados, aos economicamente fracos, aos minus habentes. É este, sem dúvida, o primeiro aspecto da assistência judiciária: o mais premente, talvez, mas não o único. (...) necessitados não são apenas os economicamente pobres, mas todos aqueles que necessitam de tutela jurídica: o réu revel no processo-crime, o pequeno litigante nos novos conflitos que surgem numa sociedade de massa, e outros mais que podem emergir em nossas rápidas transformações sociais.[77]

Daí a importância, como visto, de não apenas garantir a isenção de custas e despesas processuais, mas a do Estado assegurar também os meios necessários para que os necessitados (aqueles hipossuficientes economicamente, culturalmente e organizacionalmente) tenham um acesso à Justiça de qualidade, com auxílio de advogados públicos (Defensoria Pública, fundamentalmente) que os auxilie no ajuizamento de uma ação ou de qualquer outra solução jurídica ou não, como por exemplo, a mediação de conflitos ou a conciliação e demais alternativas, como visto, para a garantia de um satisfatório acesso à Justiça (ações coletivas, juizados especiais, Código de Defesa do Consumidor, etc.).

Isto é, o conceito de necessitado trazido pela Constituição Federal não traz apenas a situação de pobreza econômica, mas a de hipossuficiência cultural e, no mesmo dispositivo mencionado, como já estudado, assegura que esses necessitados terão acesso à assistência necessária para atingir o acesso à Justiça.

Já, na esfera infraconstitucional, de maneira literal, com base no artigo 2º, da Lei da justiça gratuita, o beneficiário da gratuidade processual será aquele, nacional ou estrangeiro residente no país, que necessitar se socorrer do Poder Judiciário, no nível estadual ou federal, nas esferas penal, civil, trabalhista, administrativa, eleitoral, militar e nos juizados especiais, em grau recursal, uma vez que não são exigidas custas em primeiro grau[78].

O verbo ‘necessitar’, nesse caso, tem conotação jurídico-legal de um estado econômico-social de necessidade financeira, uma vez que o parágrafo único do citado artigo completa-o trazendo o conceito de necessitado: “... todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.”[79]

Cabe notar que, embora o mencionado artigo não seja expresso sobre a possibilidade da concessão do benefício para as pessoas jurídicas, grande parte da jurisprudência e da doutrina[80] converge para essa possibilidade. Vale citar os seguintes julgados do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. ART. 4º DA LEI 1.060/50. PESSOA JURÍDICA. HIPOSSUFICIÊNCIA FINANCEIRA. COMPROVAÇÃO. INDEPENDENTE. FINALIDADE LUCRATIVA. SÚMULA 7/STJ.

1. Firmou-se a jurisprudência da Corte Especial do STJ no sentido de que a pessoa jurídica, seja qual for sua finalidade, deve demonstrar o preenchimento dos requisitos para se beneficiar da assistência judiciária gratuita.

2. Alterar a afirmação do tribunal de origem de ausência de comprovação de pobreza demanda revisão de fatos e provas.

3. Concreção do enunciado da Súmula n. 07/STJ.

4. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.[81]

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PEDIDO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. PESSOA JURÍDICA. INDEFERIMENTO PELO COLENDO TRIBUNAL DE ORIGEM COM BASE NO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. SÚMULA 7/STJ. PRECEDENTES.

1. Conforme decidido no julgamento do REsp 1.064.269/RS (sessão da Quarta Turma de 19 de agosto de 2010, desta Relatoria), a jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que "é plenamente cabível a concessão do benefício da assistência judiciária gratuita às pessoas jurídicas, em observância ao princípio constitucional da inafastabilidade da tutela jurisdicional (CF/88, art. 5º, XXXV), desde que comprovem insuficiência de recursos (CF/88, art. 5º, LXXIV). É que a elas não se estende a presunção juris tantum prevista no art. 4º da Lei 1.060/1950".

2. Recentemente, a c. Corte Especial, dirimindo divergência no âmbito deste Tribunal Superior, concluiu que o benefício da assistência judiciária gratuita somente pode ser concedido à pessoa jurídica, independentemente de ser ou não de fins lucrativos, se esta comprovar que não tem condições de arcar com as despesas do processo sem o comprometimento da manutenção de suas atividades.

3. Na hipótese, o Tribunal de origem, ao ratificar o indeferimento do pedido de assistência judiciária gratuita, asseverou que o ora recorrente não logrou demonstrar a impossibilidade de arcar com as despesas do processo.

4. Rever as conclusões do acórdão demandaria o reexame do contexto fático-probatório dos autos, providência inviável em sede de recurso especial, a teor da Súmula 7/STJ.

5. Agravo regimental a que se nega provimento.[82]

No mesmo sentido, o Supremo Tribunal Federal:

Ao contrário do que ocorre relativamente às pessoas naturais, não basta a pessoa jurídica asseverar a insuficiência de recursos, devendo comprovar, isto sim, o fato de se encontrar em situação inviabilizadora da assunção dos ônus decorrentes do ingresso em juízo.” (Rcl 1.905-ED-AgR, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 15-8-2002, Plenário, DJ de 20-9-2002.) No mesmo sentido: AI 810.593-AgR-segundo, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 20-9-2011, Segunda Turma, DJE de 4-10-2011; AI 726.444-AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 8-9-2009, Segunda Turma, DJE de 16-10-2009; AI 646.251-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 23-6-2009, Segunda Turma, DJE de 7-8-2009; AI 716.294-ED, Rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 31-3-2009, Segunda Turma, DJE de 30-4-2009.[83]

Assim, percebe-se que as pessoas jurídicas também podem ser beneficiadas pelo instituto da justiça gratuita.

Nesse sentido, vale citar o seguinte entendimento doutrinário:

As pessoas jurídicas de direito privado são entes coletivos constituídos voluntariamente por pessoas físicas, com o objetivo de obter determinados resultados na ordem econômica, cultural, esportiva, religiosa etc. e, como tais, são projeções dos próprios sujeitos que as compõem. Os sucessos ou fracassos ocorrentes na vida desses entes coletivos repercutem econômica, social ou moralmente na vida dos sócios ou associados. Por isso, fechar as portas da Justiça a elas significaria, em ultima ratio, fechá-las a seus próprios integrantes.[84]

Voltando a tratar sobre a concessão do benefício às pessoas físicas, o necessitado pode também ser nominado como hipossuficiente.

A hipossuficiência é a realidade de muitos brasileiros[85] que não possuem recursos financeiros suficientes para arcar com as custas e as despesas processuais e honorários de advogado sem que o montante despendido comprometa sua própria subsistência ou de sua família (conferir artigo 2º, parágrafo único, da Lei da assistência judiciária).

Marinoni assevera que grande parte dos brasileiros tem os encargos financeiros de um processo como uma espécie de barreira ao acesso ao judiciário, pois esses custos (contratação de advogado, despesas com a produção de provas e as custas do processo) não poderão, sem que admitam complicado sacrifício de suas economias, ser tirados de seu orçamento familiar.[86]

Ressalte-se que, embora o dispositivo (artigo 2º, da Lei da assistência judiciária gratuita) comporte diversas interpretações, deve-se crer que ele não traz o conceito do miserável, aquele que mal tem recursos para sobreviver, mas da pessoa que, caso precise arcar com as despesas de uma lide, sofrerá prejuízos no seu sustento ou no de sua família.

Nesse sentido, em feliz decisão, o Meritíssimo Juízo da 2ª Vara Cível do Foro Regional de Santana da Comarca de São Paulo (SP), em incidente de impugnação à concessão dos benefícios da justiça gratuita autuado sob o nº 0833427-45.2006.8.26.0001, considerou que:

(...) o ordenamento jurídico não exige estado de miserabilidade ou de indigência, para que alguém receba os benefícios, nem mesmo que aliene imóvel próprio, em que resida, ou outros bens, para dispor de recursos (liquidez) e, assim, suportar as despesas, os gastos de um processo. (...)[87]

Na doutrina, Didier defende que uma pessoa que possua dois ou três imóveis, mas que não detenha patrimônio “disponível” para custear o processo judicial, não pode ser privada do direito à justiça gratuita, pois para delimitar a necessidade que a lei estatui não é necessário que o beneficiário esteja em “estado de penúria”, mas, tomando-se o caso concreto, deve-se considerar a medida que o custo do processo acarretará em seu orçamento e não “sua situação financeira em abstrato”.[88]

Da mesma forma, adverte Cândido Rangel Dinamarco que:

A incapacidade de custear a defesa judicial de direitos e interesses não é pura incapacidade econômica, como os dizeres da lei poderiam fazer pensar ao aludir à situação econômica do interessado (LAJ, art. 1º, par.). Aquele que tem bens, mas não dispõe de liquidez, é também merecedor dos benefícios da assistência judiciária; a Constituição Federal apoia esse entendimento, ao falar em insuficiência de recursos (art. 5º, inc. LXXIV), sendo sabido que recursos significa dinheiro. Mas não tem direito à gratuidade aquele que dispõe de recursos financeiros (rendimentos, poupança) ainda quando seu patrimônio ativo seja muito inferior ao valor das obrigações pelas quais responde (insolvência, desequilíbrio econômico) – do contrário, toda falência seria gratuita para o empresário sujeito a ela, pois o desequilíbrio econômico é requisito para que progrida. Melhor é falar em insuficiência financeira, no trato desse requisito da assistência judiciária.[89]

Nesse sentido, o exemplo de Hélio Márcio Campo é emblemático: “Imagine-se o proprietário de um edifício com três andares que não dispõe de recursos financeiros para custear uma ação de reparação de danos contra a seguradora que se nega a indenizar o prédio incendiado.”[90]

E continua:

Por sinal, se vai fazer uma incursão a respeito, até mesmo a existência de aplicações financeiras pode não ser, num dado momento, óbice ao benefício. Basta lembrar a tão discutida Medida Provisória do ex-Presidente Fernando Collor de Mello que, à guisa de empréstimo compulsório, confiscou os valores que se encontravam aplicados em cadernetas de poupança e outros investimentos em instituições bancárias. Ter-se-ia como se negar, nesta hipótese, a concessão do benefício da ajuda legal àquele que teve o seu dinheiro confiscado para recorrer ao judiciário? Certamente que não.[91]

Nos dias atuais, com a promulgação da Lei Complementar nº 118, de 9 de fevereiro de 2005, seu artigo 185-A[92], operacionalizou o bloqueio judicial célere e eficaz, por meio eletrônico, de ativos financeiros (investimentos, depósitos em conta-corrente, etc.) mantidos em instituições financeiras, o famigerado (pelos devedores) Bacen-jud.

Dessa forma, é de se questionar se uma pessoa que, possuidora de vultosos investimentos financeiros e dinheiro vivo em conta-corrente, teve todos os seus ativos (sua liquidez) bloqueados judicialmente, não faria jus ao benefício da justiça gratuita.

Sobre essa discussão, a liquidez do requerente à justiça gratuita, o Superior Tribunal de Justiça assim se posicionou:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. OMISSÃO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SÚMULA 7/STJ.

1. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.

2. Hipótese em que Tribunal de origem, ao analisar o contexto fático dos autos, concluiu que a remuneração líquida mensal da requerente autorizaria a concessão do benefício. A revisão desse julgado, na forma pretendida pela recorrente, implica reexame de fatos e provas contidos nos autos, inviável em  Recurso Especial, de acordo com a Súmula 7/STJ.

3. "A mera isenção no pagamento de Imposto de Renda não pode ser sobrelevada como prova única, passível de gerar presunção absoluta de hipossuficiência econômica das partes, devendo o magistrado motivar o indeferimento da 'justiça gratuita' à vista de elementos concretos dos autos, que revelem tanto a condição financeira satisfatória dos postulantes, como o impacto razoável das despesas do processo sobre a receita da parte"(REsp 1158335/PR, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 22/2/2011, DJe 10/3/2011).

4. Agravo Regimental não provido.[93]

Mas, é na forma como a lei exige a comprovação desse estado de necessidade que reside o maior problema prático adstrito à normatização da gratuidade processual, como se verá a seguir.

2.4. Critério / Comprovação para sua concessão e outros aspectos procedimentais

Tanto na Constituição Federal do Brasil, quanto na Lei da assistência judiciária, há a previsão expressa dos requisitos a serem observados para a obtenção do benefício da justiça gratuita e, mais amplamente, na Carta Maior, da assistência jurídica integral e gratuita, como já se viu.

A Lei 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, em seus artigos 2º e 4º, assim prescreve:

Art. 2º. Gozarão dos benefícios desta Lei os nacionais ou estrangeiros residentes no país, que necessitarem recorrer à Justiça penal, civil, militar ou do trabalho.

Parágrafo único. - Considera-se necessitado, para os fins legais, todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.

Art. 4º. A parte gozará dos benefícios da assistência judiciária, mediante simples afirmação, na própria petição inicial, de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família.[94]

Dessa forma, a legislação admite, para a concessão do benefício, que o postulante apenas declare a necessidade à gratuidade (essa declaração é comumente chamada na prática forense de “atestado de pobreza”), seja em petição/documento próprio, seja no próprio corpo da peça/petição[95], em momento inicial ou ulterior[96] ou, ainda, no momento da interposição de um recurso[97].

O pleito do benefício não suspenderá o processo[98], seja ele inicial ou ulterior, e seu indeferimento comportará agravo de instrumento[99].

Essa interpretação de que o pleito ao direito da justiça gratuita só depende da mera declaração do pretendente à beneficiário é reconhecida pela jurisprudência pátria.

Goron, lembrando que a Constituição Federal não prescreveu de forma diversa, mantendo como suficiente a mera declaração de pobreza, assevera:

Ao interpretar a cláusula de gratuidade o STJ vem prestigiando a presunção da necessidade decorrente da simples afirmação da parte, numa confirmação da compatibilidade da Lei 1.060/1950 com o texto constitucional.[100]

Como exemplo, o julgado a seguir:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. VIOLAÇÃO DO ART. 535, I E II, DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. INDEFERIMENTO FUNDAMENTADO PELO JUIZ. POSSIBILIDADE. AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA. SÚMULA 7/STJ.

1. Afasta-se a ofensa ao art. 535, I e II, do CPC quando o decisório está claro e suficientemente fundamentado, decidindo integralmente a controvérsia, não se confundindo decisão desfavorável com omissão.

2. Em se tratando de concessão da assistência judiciária gratuita, o STJ perfilha entendimento no sentido de que basta a simples declaração do autor afirmando a sua hipossuficiência para que seja deferido o benefício, ressalvado, entretanto, ao juiz rejeitar fundamentadamente o pleito, na forma do art. 5º da Lei n. 1.060/50.

3. É defeso aferir, neste momento, as condições de hipossuficiência dos postulantes, tendo em vista a necessidade de revisão do contexto fático-probatório dos autos, providência expressamente vedada pela Súmula 7/STJ.

4. Agravo regimental não provido.[101]

Note-se, assim, que o meio de prova admitido é a presunção relativa dada à afirmação do postulante de que “não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família”.

A presunção é relativa, como se detalhará a diante, pois admite prova em contrário.

Ato contínuo, importante não confundir os ditames sobre a gratuidade processual tratados na Lei citada e na Constituição Federativa do Brasil.

Nesse sentido, traçando um paralelo ao regramento da Constituição Federal, Hélio Márcio Campo ensina que:

Ao passo que para a Constituição Federal o pressuposto para a obtenção do benefício funda-se na insuficiência de recursos, para a Lei n. 1.060/50 o requisito é o prejuízo do sustento próprio ou da família, caso tivesse o necessitado de recolher as custas judiciais, tendo em vista a sua situação econômica. São, portanto, acepções que não se excluem, mas se complementam.[102]

Percebe-se, portanto, que a Lei não exige qualquer prova da condição de necessitado, seja por insuficiência de recursos, seja pela impossibilidade de arcar com as custas e os honorários de advogado sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família.

A mera declaração de pobreza é elemento muito frágil para a concessão de tão importante direito processual. De modo que, embora a presunção seja uma espécie de prova, como se verá a diante, deve-se, no mínimo, ser acompanhada de um início de outra espécie de prova, como por exemplo, a documental ou a prestação de outras informações sobre a capacidade financeira do postulante. Essa e outras sugestões serão abordadas oportunamente em capítulo próprio.

Outrossim, como parâmetro desse capítulo e, de forma geral, de toda a tese defendida nesta monografia, cabe transcrever trecho de decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível do Foro Regional de Itaquera da Comarca da Capital (SP), em que é demonstrada a atual situação, de acordo com a experiência profissional da magistrada, da análise da concessão do benefício da justiça gratuita:

(...) A concessão dos benefícios da Justiça Gratuita a qualquer parte, em processo judicial, não é sinônimo de que esse serviço judicial não terá custo. O serviço judicial sempre tem custo e, na hipótese de concessão dos benefícios da Justiça Gratuita, esse custo será suportado: a) por todos os contribuintes de impostos estaduais do Estado de São Paulo, pois o orçamento da Justiça Comum Estadual decorre de repasse de valores, formados por impostos, do Governo do Estado de São Paulo; b) por todos os demandantes que pagam a taxa judiciária, nas ações em trâmite da Justiça Comum Estadual, pois 30% desse tributo é repassado ao Poder Judiciário do Estado de São Paulo, para integrar o “Fundo Especial de Despesa”. Ora, a taxa judiciária é um tributo. Assim sendo, a isenção de seu pagamento deve observar, estritamente, o estabelecido na Constituição Federal e, como conseqüência, o juízo não deve ser um mero expectador do deferimento, ou não, do benefício da Justiça Gratuita. Portanto, o disposto no art. 4º, “caput”, da Lei n. 1.060/50 deve ser interpretado à luz do art. 5º, LXXIV, da CF, pois o benefício há de ser concedido às pessoas comprovadamente pobres. Todavia, está sendo requerido, em muitos casos, como verificado em primeiro grau, somente com o simples objetivo de se isentar o postulante do benefício do pagamento da taxa judiciária, das despesas processuais (para citação, realização de perícia etc.) e dos honorários advocatícios. Em outras palavras, muitos[103] têm buscado a concessão da gratuidade, não como uma forma de acesso à Justiça, mas para lograr uma “demanda sem risco”. Ora, nessa situação, o pedido de concessão do benefício caracterizaria violação ao disposto nos incisos I a IV do art. 14 do CPC, e seu deferimento representaria verdadeiro incentivo a “aventuras jurídicas”. Dessa forma, considerando, de um lado, já ultrapassada a postura paternalista do Poder Judiciário e diante da necessidade de se resgatar a responsabilidade dos demandantes, na utilização do serviço público judicial, e, de outro, a fim de que a pretensão não se caracterize um abuso do direito ou o desvirtuamento da Lei n. 1.060/50, bem como atento(a) ao fato de que o legislador não especificou a “forma como deveria ser dar” a declaração (A.I. n. 551.301-4/2-00, 7ª Câmara de Direito Privado do Eg. Tribunal de Justiça, Rel. Des. José Carlos Ferreira Alves, j. em 30 de janeiro de 2008), o(a)(s) autor(a)(s) deve(m) subscrever declaração, sob as penas do crime de declaração ideologicamente falsa, com as seguintes informações: a) a(s) atividade(s) econômica(s) que exerce(m), o rendimento mensal e os bens que possui(em) em seu nome. Se trabalha(m), profissão, local de trabalho e qual a remuneração, com comprovante de rendimento, inclusive com a juntada da CTPS e declaração de rendimentos ou de isento(s) perante a Receita Federal; b) quantas pessoas residem no imóvel e quantas trabalham; c) se é(são) possuidor(es) de mais de 01 (um) imóvel. Em caso afirmativo, se recebe(m) rendimentos do segundo bem; d) se é(são) possuidor(es) de automóvel. Em caso afirmativo, qual a marca e o ano. Deve(m) informar também se possui(em) mais de 01 (um) veículo; e) se está(ão) isento(a)(s) de honorários advocatícios, aos quais se deve estender o benefício requerido (art. 3º, inc. V, da Lei 1.060/50). Caso desista(m) do requerimento dos benefícios da justiça gratuita, deverá(ão) providenciar o recolhimento da taxa judiciária, das despesas com citação (G.R.D., se por oficial; ou da guia de recolhimento das despesas com carta, se pelo correio), sob pena de indeferimento da exordial, sem prejuízo do recolhimento da guia previdenciária OAB.[104]

A decisão, com a devida vênia, por um lado equivocada (considerou que a Constituição Federal exige comprovação para a concessão do benefício da justiça gratuita, o que é uma premissa errônea, como já se viu), erige uma discussão de suma importância: se a atual configuração da Lei do benefício da gratuidade é adequada, especialmente no que concerne à maneira em que se é exigida a prova do preenchimento do seu único requisito (“... todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.”), qual seja, a mera declaração de necessidade financeira, e na distribuição do ônus probatório (impugnação à justiça gratuita).

2.5. Presunção relativa da afirmação de que se trata o caput do artigo 4º, da Lei nº 1.060/50

Como se viu, a declaração de pobreza é considerada uma presunção relativa, ou seja, a hipossuficiência econômica do pretenso beneficiário será considerada verdadeira até que prove o contrário, seja ex officio ou por iniciativa da parte contrária – impugnação à justiça gratuita.

Nesse sentido, Cândido Rangel Dinamarco aponta a função primordial da presunção relativa que traz a legislação em questão. Afirma que a prova em contrário é fundamental para fechar as portas à “litigância temerária e irresponsável, que o sistema de justiça onerosa visa a coibir”, pois implica em superar a presunção de necessidade financeira, desde que existam suficientes indícios da capacidade de suportar as custas e os honorários advocatícios.[105]

Nossa jurisprudência:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JUSTIÇA GRATUITA. DECLARAÇÃO DE POBREZA. PRESUNÇÃO RELATIVA. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. ADMISSIBILIDADE. ANÁLISE DAS CONDIÇÕES ECONÔMICAS DEMONSTRADAS. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ.

1. De acordo com entendimento firmado nesta Corte, a declaração de pobreza, com o intuito de obter os benefícios da assistência judiciária gratuita, goza de presunção relativa, admitindo, portanto, prova em contrário.

2. Além disso, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o magistrado pode ordenar a comprovação do estado de miserabilidade a fim de subsidiar o deferimento da assistência judiciária gratuita.

3. A pretensão de que seja avaliada por esta Corte a condição econômica do requerente exigiria reexame de provas, o que é vedado em sede de recurso especial, em face do óbice da Súmula 7/STJ.

4. Agravo regimental a que se nega provimento.[106]

Assim, como já se adiantou, cabe à parte contrária ou ao próprio Juízo, apontarem os indícios de falsa necessidade financeira, seja pela impugnação à justiça gratuita[107] (artigo 7º, da Lei da assistência judiciária) ou pelo próprio magistrado, de ofício.

Campo ensina que:

Normalmente o juiz irá examinar a natureza da ação, o valor pecuniário discutido nela, a profissão do postulante e o lugar onde reside ou tem o seu domicílio; enfim, vários serão os dados que o próprio objeto da lide poderá revelar para o juiz conceder ou não o benefício postulado. (...) Concedendo ou não o benefício, o juiz têm de expor as razões de seu convencimento, mesmo que de forma concisa (art. 165 do Código de Processo Civil), a fim de possibilitar a qualquer um dos sujeitos da relação jurídica processual manejar o recurso apropriado, de modo a precisar os motivos pelos quais está a impugnar a decisão.[108]

Nesse entendimento, o seguinte julgado aponta de forma rigorosa e justa a importância da fundamentação e perquirição do Juízo de origem e pela, se houver recurso, precisa reanálise pelo Tribunal de segunda instância, das peculiaridades do caso a fim de determinar a concessão ou não do benefício:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ORDINÁRIA. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. VIOLAÇÃO A DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. ANÁLISE. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO STF. DECLARAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS DO REQUERENTE. PRESUNÇÃO IURIS TANTUM. CONTRARIEDADE. PARTE ADVERSA E JUIZ, DE OFÍCIO, DECORRENTE DE FUNDADAS RAZÕES. CRITÉRIOS OBJETIVOS.

1. Trata-se de recurso especial cuja controvérsia orbita em torno da concessão do benefício da gratuidade de justiça.

2. O STJ, em sede de recurso especial, conforme delimitação de competência estabelecida pelo artigo 105, III, da Constituição Federal de 1988, destina-se a uniformizar a interpretação do direito infraconstitucional federal, razão pela qual é defeso, em seu bojo, o exame de matéria constitucional, cuja competência é do STF.

3. Há violação dos artigos 2º e 4º da Lei n. 1.060/50, quando os critérios utilizados pelo magistrado para indeferir o benefício revestem-se de caráter subjetivo, ou seja, criados pelo próprio julgador, e pelos quais não se consegue inferir se o pagamento pelo jurisdicionado das despesas com o processo e dos honorários irá ou não prejudicar o seu sustento e o de sua família.

4. A constatação da condição de necessitado e a declaração da falta de condições para pagar as despesas processuais e os honorários advocatícios erigem presunção relativa em favor do requerente, uma vez que esta pode ser contrariada tanto pela parte adversa quanto pelo juiz, de ofício, desde que este tenha razões fundadas.

5. Para o indeferimento da gratuidade de justiça, conforme disposto no artigo 5º da Lei n. 1.060/50, o magistrado, ao analisar o pedido, perquirirá sobre as reais condições econômico-financeiras do requerente, podendo solicitar que comprove nos autos que não pode arcar com as despesas processuais e com os honorários de sucumbência. Isso porque, a fundamentação para a desconstituição da presunção estabelecida pela lei de gratuidade de justiça exige perquirir, in concreto, a atual situação financeira do requerente.

6. No caso dos autos, os elementos utilizados pelas instâncias de origem para indeferir o pedido de justiça gratuita foram: a remuneração percebida e a contratação de advogado particular. Tais elementos não são suficientes para se concluir que os recorrentes detêm condições de arcar com as despesas processuais e honorários de sucumbência sem prejuízo dos próprios sustentos e os de suas respectivas famílias.

7. Recurso especial provido, para cassar o acórdão de origem por falta de fundamentação, a fim de que seja apreciado o pedido de gratuidade de justiça nos termos dos artigos 4º e 5º da Lei n. 1.060/50.[109]

Vale citar o trecho, a seguir, do inteiro teor de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em que, claramente, se observa a detida análise e a presença de fundamentação do julgador na decisão sobre a não outorga, no caso, da gratuidade processual:

Por primeiro, fica confirmado o indeferimento do pedido de gratuidade. Os documentos trazidos com o inconformismo demonstram a capacidade financeira para suportar o pagamento das custas e despesas processuais. Ressalte-se que a agravante contratou advogado particular, recebeu o imóvel objeto da demanda por força do arrolamento dos bens deixados por (...), noticiou a aquisição de um veículo Fiat Palio Flex Fire Economy, no valor de R$ 27.000,00 e afirmou possuir condições de arcar com honorários periciais até o limite de R$ 5.000,00. Nesse contexto, infere-se que a agravante não se enquadra no conceito legal de necessitado, de que trata a Lei 1.060/50.[110]

Já no que se refere ao instituto da impugnação à justiça gratuita, por outro lado, a doutrina reconhece que “ao impugnante toca a carga de provar a inexistência dos requisitos que autorizam a concessão do benefício ou o desaparecimento do estado de necessitado do beneficiário.”[111]

Araken de Assis, Hélio Márcio Campo, Arthur Mendes Lobo[112] e Fredie Didier Jr. e Rafael Oliveira[113], por exemplo, apontam a grande complicação gerada por essa espécie de inversão do ônus da prova, uma vez que o ônus de provar que o beneficiário não faz jus ao benefício ou de que deixou de fazer é de complicação, por vezes, insuperável de ser transposta pelo impugnante. Este haveria de reunir, por exemplo, elementos que indicassem quanto aquele recebe e quais suas despesas no momento exato da impugnação[114].

Diante, aliás, dessa constatação, ao lado da presunção a que se trata a própria Lei da gratuidade, Campo afirma que:

Preferiu o legislador utilizar aqui também a pedra angular do procedimento probatório romano, que advém da máxima ei incumbit probatio qui dicit, non qui negat, a qual chega a ser mais perigosa do que útil. (...) Normalmente é concedido o benefício da assistência judiciária, seja porque o juiz tem de atentar para a presunção legal, seja porque é difícil à parte contrária fazer prova de que o beneficiário não carece de recursos financeiros.[115]

Lívio Goellner Goron concorda com Hélio Márcio Campo e acrescenta que há hoje uma tendência, que se pode verificar nas decisões dos Tribunais, de universalizar a gratuidade processual. Reporta que se vê um processo de se relativizar e de se abrandar os requisitos de concessão do benefício, importando em um “deferimento automático” da justiça gratuita, “quase que assimilando o direito do inc. LXXIV à hipótese de gratuidade do inc. LXXVII do art. 5º da CF/1988”.[116]

Como se nota, o autor chega a comparar o deferimento indiscriminado da justiça gratuita com o direito dos cidadãos de manejarem gratuitamente o habeas corpus e o habeas datas.

Como se não bastasse, o mesmo autor, preocupado com a questão, adverte que as Cortes de Justiça pátrias carecem de uma melhor “administração do benefício da gratuidade”, pois pode se perceber que faltam instrumentos eficazes para a concessão do benefício (para a prova do estado de pobreza ou quanto a “atribuição do respectivo ônus probatório”), inclusive para as pessoas jurídicas. Diz ele que a faculdade do juiz presidir o deferimento da gratuidade não é critério suficiente de controle, pois “é colocada em termos puramente discricionários, (...) sem que lhe sejam traçadas orientações mais específicas”.[117]

Em conclusão, o autor aponta que os Tribunais brasileiros, ao não fixarem critérios coesos e reconhecidos para um eficaz controle judicial da concessão da gratuidade processual, permitem que certos pretensos beneficiários sejam agraciados com a justiça gratuita sem a ela fazerem jus ou, pior ainda, que sejam exigidas comprovações demasiadas severas que cheguem a impedir o acesso à Justiça de cidadãos que realmente estejam em estado de necessidade econômica, o que não se pode sobremaneira aceitar.[118]

Cita o autor, outrossim, o seguinte julgado como caso emblemático de seu posicionamento[119]:

AGRAVO REGIMENTAL. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO PROBATÓRIA. SÚMULA 07/STJ.

I – Não viola a legislação federal condicionar a concessão de gratuidade de justiça ante a comprovação da miserabilidade jurídica, se as provas dos autos fazem presumir não se tratar de parte juridicamente pobre.

II – No âmbito especial não há campo para se revisar entendimento assentado em provas, conforme está sedimentado no enunciado 7 da Súmula desta Corte. Agravo regimental improvido.

Não é exagero, então, se admitir que a presunção relativa que admite a Lei é solução muito simplista para a concessão plena do benefício da justiça gratuita. Pois, imputar o ônus probatório da inexistência da necessidade financeira ao juiz ou à parte contrária é, sem dúvida, critério muito arriscado, dando margem à atual tendência de concessão automática da gratuidade, como apontou Goron.

Por derradeiro, o mesmo autor deixa claro, com mais especificidade, que a concessão do benefício sem parâmetros bem delineados gera, nas palavras de Arthur Mendes Lobo:

(...) evasão de receita pública, incremento do volume de demandas judiciais infundadas, desvalorização moral do serviço público jurisdicional, desvalorização do advogado da parte vitoriosa e disposição do bem público pelo juiz, consubstanciada pela isenção das custas.[120]

Ato contínuo, no capítulo 3, a diante, serão sumarizados os principais pontos de deficiência da estrutura vigente de concessão do benefício da justiça gratuita a que essa monografia credita e apontados os possíveis novos critérios que visem à melhoria do instituto. Inclusive, se discutirá possíveis meios de prova para a concessão do benefício e as principais atitudes do magistrado frente ao instituto em comento.

Antes, porém, importante discorrer sobre o vital lugar que merece a prova na concessão do benefício.

2.6. A importância da prova para a concessão do benefício

Como se viu, hoje, o benefício da justiça gratuita é concedido a quem meramente declara sua necessidade, servindo essa declaração como prova (presunção) de que o pretendente ao benefício (sujeito da prova[121]) detém o requisito de insuficiência de recursos financeiros para arcar com as custas, as despesas processuais e os honorários de advogado sem prejuízo de sustento próprio e de sua família (objeto da prova[122]).

Cabe então, mesmo que brevemente, discorrer sobre o instituto da prova, com o fim de se questionar se a presunção erigida pela Lei é meio suficiente para a comprovação do requisito de concessão da gratuidade processual.

A prova, segundo ensina Moacyr Amaral Santos, existe pela necessidade de que “A verdade sobre o fato precisa aparecer para que um direito possa realizar-se ou tornar-se efetivo.”[123]

O autor aponta, ao mesmo tempo, o conceito, a finalidade, a importância e a necessidade da prova, isto é, defende que a prova é um instituto responsável pela busca da verdade e tendo como função exatamente a elucidação de um fato, é necessária para trazer efetividade a um direito, fazer com que este se realize.

Dinamarco traz, igualmente, a delimitação da função da prova: “A atividade probatória que se realiza no processo visa a demonstrar que as alegações feitas são verdadeiras e, portanto, dignas de credibilidade no momento de julgar.”[124]

Ainda sobre a essencialidade da prova, Marinoni escreve que:

Se a regra jurídica pode ser decomposta em uma hipótese fática (onde o legislador prevê uma conduta) e em uma sanção a ela atrelada, não há dúvida de que o conhecimento dos fatos ocorridos na realidade é essencial para a aplicação do direito positivo, sob pena de ficar inviabilizada a concretização da norma abstrata.[125]

Assim é que o juiz se baseia na prova para proferir suas decisões no processo, não sendo diferente no caso da concessão da justiça gratuita.

O meio de prova aceito para a outorga do benefício é a presunção (forma da prova[126]). Existem diversos outros meios de prova, como a exibição de documentos, o arrolamento de testemunhas, a realização de exames e de vistorias, etc. (artigo 212, do Código Civil), sendo certo que não há lista completa que os enumere, mas o próprio artigo 332, do Código de Processo Civil, dispõe que: “Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa.”[127]

Sobre os meios de prova assevera Dinamarco que estes “(...) inserem-se (...) como técnicas de manipulação dos elementos externos, de modo a extrair deles as representações da realidade necessárias para julgar.”[128]

A presunção, segundo Sílvio de Salvo Venosa, “(...) é a conclusão que se extrai de fato conhecido para provar-se a existência de outro desconhecido.”[129]

No caso da presunção admitida pela Lei da assistência judiciária gratuita, como visto, há ainda que se notar que se trata de presunção relativa, ou seja, aquela que admite prova em contrário, cujo ônus de provar esse contrário recai sobre a parte adversária ou pela inquirição da parte pelo Juízo, desde que este indique algum elemento relativo à parte que o levou a questionar a necessidade do benefício, seja nos autos (por exemplo, o fato da parte declarar morar em imóvel de alto padrão) ou fora deles (por exemplo, o fato da parte ser conhecido rico fazendeiro na Comarca).[130]

A presunção relativa, diferente da presunção absoluta ou presunção legal de existência ou de veracidade (artigo 334, IV, do Código de Rito), é utilizada, por exemplo, no caso da presunção de paternidade levantada perante o suposto pai que se recusa a realizar exame de DNA.[131]

Nesse caso, pela relatividade da presunção, admitem-se provas em contrário, sendo certo que deverá haver um mínimo de comprovação sobre “(...) por meio de provas indiciárias, a existência de relacionamento íntimo entre a mãe e o suposto pai.”[132]

Refletindo-se sobre esse exemplo, sem dúvida uma hipótese muito mais complexa de comprovação do que a insuficiência de recursos, fica a dúvida se o meio de comprovação erigido pela Lei para a concessão do benefício da justiça gratuita (mera declaração de pobreza) seria bastante para a aferição da real necessidade de sua concessão ao pretenso beneficiário.

O próximo capítulo trará, em detalhes, esta discussão e apontará possíveis soluções para uma busca da verdade mais adequada à concessão do importante direito à justiça gratuita, uma vez que a atual configuração probatória deixa o pretenso beneficiário em situação muito confortável: com a presunção relativa a seu favor, não precisa, inicialmente, provar nada, o que, evidentemente, gera uma imensa insegurança jurídica e uma porta aberta para lides “sem risco” e temerárias.

Sobre essa perspectiva de isenção probatória, Moacyr Amaral Santos discorre o seguinte, verbis:

Fosse o autor exonerado da obrigação de provar, não corresse ele o risco da falta de prova, porque a presunção da justiça fosse a seu favor, o foro se acumularia de lides temerárias, das quais se desvencilhariam os réus, e, certamente, a estatística acusaria o inverso do que atualmente se verifica, proporção bem maior de causas perdidas pelos autores relativamente às vencidas pelos réus.[133]

Maximo Castro: “É natural que, no momento em que o autor não estivesse obrigado a provar o seu direito (...) a estatística se modificaria, porque qualquer pessoa se aventuraria nesse caso a promover demandas.”[134]

Essa a atual conjuntura da concessão do benefício da justiça gratuita combatida nesta monografia.


3. SUGESTÕES DE NOVOS CRITÉRIOS PARA A OUTORGA DO BENEFÍCIO

Nesse ponto da presente monografia, é possível perceber alguns aspectos marcantes na análise do instituto da justiça gratuita:

a)  por mais que a presunção seja um meio de prova válido[135] (artigo 212, IV, do Código Civil), a mera afirmação de pobreza que a Lei de assistência judiciária gratuita erige como suficiente para a comprovação da subsunção ao instituto, como se viu, é plenamente discutível do ponto de vista prático, pois tendente a resultar i) em aventuras jurídicas, o que, por certo, aumenta a morosidade[136] do Judiciário, ou, ii) diante da ausência de parâmetros claros na jurisprudência, em decisões injustas de indeferimento do benefício e

b) a “inversão do ônus da prova” que cria a citada Lei imputa ao impugnante da concessão da justiça gratuita tarefa árdua de provar fato negativo (que o pretenso beneficiário não carece de recursos financeiros para suportar as custas, as despesas e os honorários de advogado de uma demanda judicial), hipótese em que se vê em desvantagem perante o beneficiário, este sim, com todos os meios necessários à prova de fazer jus ou não ao benefício da gratuidade.

Quanto ao item “a” acima, útil observar o perfil do Poder Judiciário traçado pela autora Maria Tereza Sadek que tem especial vinculação à discussão em tela: a facilitação legitimada pela atual Lei de assistência judiciária em vez de trazer vantagens ao pleno acesso à Justiça traz, ao invés, a abertura do Judiciário a demandas temerárias acobertadas pela lide “sem risco” que a gratuidade processual permite. Assim, a autora, em referência ao Judiciário, questiona:

Trata-se, de fato, de um serviço público no sentido lato do termo, ou de um serviço voltado para um tipo de cliente muito especial – ou seja, aquele que sabe tirar vantagens quer da litigiosidade, quer das características atuais do Judiciário? (...) a excessiva facilidade para um certo tipo de litigante ou o estímulo à litigiosidade podem transformar a Justiça em uma Justiça não apenas seletiva, mas sobretudo inchada. Isto é, repleta de demandas que pouco têm a ver com a garantia de direitos – esta sim uma condição indispensável ao Estado Democrático de Direito e às liberdades individuais.[137]

Em consonância com o perfil ora traçado, Arthur Mendes Lobo, ao delimitar a importância das taxas judiciárias para o financiamento e para a evolução do Poder Judiciário e, aliás, já indicando uma sugestão de alteração na forma de concessão do benefício da justiça gratuita, afirma que:

(...) na prática, a arrecadação das taxas judiciárias tem sido alvo de uma política arcaica, muitas vezes utilizada de maneira abusiva pelos jurisdicionados. Estamos falando da assistência judiciária gratuita. (...) a isenção da taxa judiciária pela assistência judiciária gratuita há de obedecer aos princípios da proporcionalidade, da isonomia material e da verdade real, sob pena de abuso de direito e diminuição da receita do Judiciário, bem como de consequente inviabilização dos necessários investimentos supramencionados.[138]

Diante dessa perspectiva, necessária a reflexão da fixação de novos parâmetros para a operacionalização da concessão do benefício da gratuidade processual. Seguem as sugestões que a presente monografia partilha como relevantes à melhoria do instituto em tela.

3.1. Necessidade de prova pré-constituída, comprovação ao término do processo[139] e união dessas sugestões para o surgimento de uma terceira

É importante, desde logo, que se reconheça[140] o beneficiário da justiça gratuita, ou seja, na postulação ao benefício é necessário que se trace, mesmo que brevemente, um perfil do pretenso beneficiário (diante de suas próprias declarações detalhadas nesse sentido): se é pessoa humilde que realmente é hipossuficiente financeiro; se é indivíduo de classe média ou até de posses, mas atualmente não tem liquidez financeira que possa fazer frente ao custo de um processo, etc..

A forma atual desse reconhecimento é baseada na análise de elementos, como se viu acima, advindos com a petição inicial (profissão, endereço, natureza da demanda, etc.). Essa forma, embora possa evidenciar, de pronto, profunda suspeita de merecimento ou não do benefício do instituto, não traz a certeza que a sua concessão faz jus, mas, como a Lei da justiça gratuita admite, mera presunção.

Assim, de forma a fortalecer a certeza formal e material da concessão do instituto, a prova pré-constituída, independentemente da existência ou não de suspeita quanto ao merecimento à gratuidade, traz a facilitação e a transparência necessárias à outorga desse direito[141] que, além da sua função de instrumento fundamental de acesso à Justiça, onera o Estado e, conseqüentemente, todos os seus cidadãos[142] que, indiretamente, custeiam o instituto da justiça gratuita, seja aqueles que se servem do Poder Judiciário, seja aqueles que não.

Nesse sentido, Goron disserta sobre a ideia da exigência de prova pré-constituída para a concessão do instituto:

A exigência de comprovação prima facie da necessidade, uma que seja facilmente acessível à parte – como, por exemplo, a prova da inclusão do postulante nos limites anuais de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física – poderia proporcionar um controle preliminar hábil e o descarte de pedidos manifestamente improcedentes. (...) A iniciativa judicial seria reforçada à luz de indícios presentes nos autos (profissão, natureza do direito pleiteado), reclamando-se, nesse caso, evidências adicionais.[143]

Observe-se que, de nada adiantaria fixar a necessidade da apresentação de prova pré-constituída sem, em rol, sugere-se, exemplificativo, admitir quais seriam os possíveis meios dessa prova.

Dessa forma, além dos citados pelo autor mencionado, indica-se que, como, aliás, trazido na decisão acima do Foro Regional de Itaquera, seja informado pelo postulante ao benefício, com detalhes (fontes de rendimentos, dívidas) a sua atual situação financeira (liquidez), se possui bens (imóveis, veículos), se tem dependentes (filhos, cônjuge dependente) e quaisquer outros dados[144] que, com transparência, indiquem a subsunção ao ditame legal de que faz jus à assistência judiciária: “... todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família”.

Ainda, como traz Goron na última citação acima, relevante que se reflita no tempo e grau de complexidade da prova exigida.

Destarte, em consonância com Goron, Augusto Tavares Rosa Marcacini comenta a seguir o nível de complexidade da prova de necessitado que se exige para a obtenção da assistência jurídica (Defensoria Pública, advogados nomeados pelo Juízo, etc.) que, como se viu, é instituto diverso da assistência judiciária (ressalva-se que a reflexão desse autor não deixa de ser útil a presente monografia, uma vez que, embora diversos, esses institutos caminham de forma paralela e complementar):

Não se pode, porém, exigir do carente prova muito minuciosa da condição de pobre, a ponto de dificultar por demais o acesso ao serviço. Se uma exaustiva prova da condição de pobreza for exigida, muito poucos serão atendidos em tempo hábil. O excesso de rigores ao apurar a condição de pobreza afasta-se da simplicidade que deve ter o sistema, para bem funcionar, atendendo prontamente aos seus fins.[145]

De tal modo, percebe-se que tanto no processo de concessão da assistência jurídica (prestação de atendimento jurídico aos necessitados pelo Estado), quanto no de gratuidade processual (comprovação perante o Juízo da carência de recursos), não pode se exigir provas desmedidas que estejam fora do alcance do beneficiário, seja por sua complexidade, seja pela demora a sua consecução.

Aliás, cabe sopesar que a Defensoria Pública pode servir como importante parâmetro prático de estudo de quais seriam os melhores elementos para a identificação do pleiteante ao direito da justiça gratuita. Como visto, esse essencial órgão de apoio postulatório aos desfavorecidos já detém meios de julgamento para delimitar se uma pessoa é ou não hipossuficiente financeira[146]. Esses critérios (com a condição de que não se imponham ao beneficiário exagerada ou demorada carga probatória, como visto) serviriam, como se defende nessa monografia, como informações preliminares (prova pré-constituída) do pretendente ao benefício, de modo a assegurar maior segurança em sua concessão e evitando-se qualquer outorga injusta das benesses da justiça gratuita a quem a ela não faça jus.

Esses elementos de identificação são também seguidos pelos advogados conveniados pela Seção de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil que prestam assistência judiciária em Municípios paulistas não atendidos pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo[147].

Maurício Januzzi Santos explica que esses critérios (como, por exemplo, renda de até três salários mínimos e número de pessoas sustentadas pelo pretendente a beneficiário – renda familiar) são importantes para verificar se o indivíduo é realmente hipossuficiente.[148]

Nesse entendimento, apresentando uma segunda hipótese de alteração da atual forma de concessão do benefício e, aliás, apontando falha ou omissão na forma do Projeto de Lei nº 8.046/2010 (Novo Código de Processo Civil), quanto à assistência judiciária gratuita (Seção IV, art. 99[149]), Arthur Mendes Lobo aduz que “a faculdade de o juiz determinar ou não a comprovação favorece o casuísmo e a insegurança jurídica, atrasa o andamento do processo e dará ensejo a inúmeros recursos”[150], se a mera declaração (verdade formal) fosse aceita como um indício suficiente para uma decisão de concessão do benefício de caráter liminar e, na sentença que condenasse o beneficiário, fosse-lhe solicitada a comprovação efetiva (verdade real) da condição de beneficiário, existiria, dessa forma, um processo mais seguro e justo de concessão da justiça gratuita[151].

A presente sugestão do autor tida, aliás, pelo próprio autor, como sugestão de emenda ao Projeto do Novo Código de Processo Civil, no que concerne à gratuidade processual[152], com o devido respeito, deve-se, acredita-se, ser somada à primeira sugestão acima mencionada (prova pré-constituída), para o surgimento, ainda, de uma terceira sugestão de alteração da atual procedimentalidade da concessão do instituto do benefício da justiça gratuita.

Dessa forma, sugere-se que, quando o magistrado, diante da prova pré-constituída de beneficiário, não se convencer integralmente desse status, seja sim erigida uma presunção iuris tantum (como é hoje) e defira-se o benefício, determinando-se sua comprovação definitiva na prolação da sentença. Ou seja, prima facie se exigiria uma prova objetiva voltada à verdade real da condição de beneficiário, porém, se, seja qual for o justo motivo, não se convença o juiz dessa condição, como aplicação analógica do princípio in dubio pro reo[153], o magistrado deferiria o benefício e, como na segunda sugestão, acima, determinaria a comprovação definitiva da condição de necessitado na prolação da sentença[154], desde que condenado o beneficiário.

Entende-se que, assim, preservando-se a celeridade processual (uma vez evitada a dilação probatória já no início do processo), seria afastada a discussão da hipótese do beneficiário vencedor da ação ter se locupletado ilicitamente do deslinde da demanda, pois, mesmo que, pela sucumbência da parte contrária, não tenha que arcar, de qualquer forma com as custas, despesas processuais e honorários de sucumbência, litigou com a benesse da justiça gratuita, sem ter que adiantar despesas, sejam elas processuais ou extraprocessuais.

Ato contínuo, de forma conjunta, é relevante refletir sobre o papel da parte contrária na eventual impugnação à concessão do benefício da justiça gratuita.

3.2. Manutenção da impugnação à justiça gratuita

A impugnação à justiça gratuita é, sem dúvida, essencial instrumento da parte contrária para a justa concessão do benefício.

Em um primeiro momento, parece não haver interesse na impugnação da parte contrária[155], uma vez que o maior onerado pela concessão da justiça gratuita é o Estado, porém há, sim, o interesse da outra parte, pois as custas têm, como visto, um papel inibidor de lides temerárias e há o interesse financeiro do advogado da parte contrária, uma vez que, saído seu cliente vencedor, com o deferimento da gratuidade processual à parte ex adversa, a exigência de honorários ficará suspensa, como também já visto.

Aliás, pode-se pensar, ainda, em uma terceira função: a de se evitar a ocorrência de uma clara injustiça, manifestada na concessão de um direito a quem não o faz jus. Embora, em princípio, essa injustiça não afetasse diretamente a parte contrária, mas sim o Estado, indiretamente afeta sim a parte contrária, pois cidadã como todos, sofre com a onerosidade desnecessária e injusta dos cofres públicos.

Assim, sua função é relevante e esse instrumento processual, na análise crítica da legislação em vigor sobre o instituto em questão, deve ser mantido como é hoje.

Porém, como ensina Goron:

A possibilidade de inversão do ônus da prova, transferindo à parte adversa a prova da necessidade econômica do beneficiário, não se afigura, por si só, incompatível com o molde constitucional do direito à gratuidade. Essencial, todavia, é que tal previsão não afaste a necessidade de um controle prima facie das condições do postulante, nem seja acompanhada de interpretações que limitem as modalidades de prova e imponham à parte que impugna a gratuidade um ônus probatório especialmente intenso, na esteira da jurisprudência atual sobre a matéria.[156]

Dessa forma, seguindo a crítica que se fez em outros momentos dessa monografia, a impugnação à justiça gratuita é, de um lado, fundamental defesa dos interesses da parte contrária e de seu advogado, porém, da forma como operacionalizada atualmente, ou seja, imputando nefasto ônus probatório ao impugnante de provar fato negativo (de que o impugnado não faz jus ao benefício), não parece compactuar com seus inerentes objetivos: o de evitar a litigância temerária e injusta de parte que o usa o benefício sem fazer jus a ele e o de resguardar a remuneração legal (honorários advocatícios) a que se tem direito o advogado da parte contrária, quando vencedora.

Conclui-se então, que o presente instituto posto à disposição daquele que pretende impugnar a concessão da justiça gratuita deve ser mantido juntamente com uma nova interpretação do direito da gratuidade, no sentido de exigir do beneficiário prova pré-constituída de que faz jus ao benefício, melhor forma de afastar os abusos e falhas advindas da Lei nº 1.060 de 5 de fevereiro de 1950 (Lei da assistência judiciária gratuita), como objetiva demonstrar a presente monografia.

3.3. Mudança da legislação e/ou fixação de parâmetros jurisprudenciais

Delimitados os principais pontos controvertidos e apontadas sugestões de alteração da atual forma de concessão da gratuidade processual, importa lembrar os mecanismos possíveis dessa alteração.

Destarte, a alteração da Lei nº 1.060/50 ou, até mesmo, a promulgação de uma nova Lei[157] sobre a matéria, parece a primeira e a mais acertada opção diante de sua obsolescência, conforme as críticas tecidas. Porém, como afirma Lívio Goellner Goron, há ainda, dada a devida importância, a necessidade de uma hermenêutica dos Tribunais “estruturada em torno de critérios objetivos e racionais, reclamando um maior investimento procedimental e argumentativo no seu exame”.[158]

Assim, os Tribunais pátrios, na ausência de critérios legais, deveriam uniformizar a jurisprudência, fixando critérios objetivos para a segura concessão do direito à gratuidade, como foi exposto nessa monografia.

Ainda sobre o papel dos Tribunais, Augusto Tavares Rosa Marcacini enfatiza que “somente na jurisprudência encontramos o dinamismo, a variedade de situações e a proximidade com a realidade que o tema exige”.[159]

Nesse sentido, é vital que as sugestões apresentadas, vistas como possíveis caminhos a ser seguidos pelo magistrado, “em lugar de meramente discricionárias, sejam convertidas em procedimentos judiciais que estejam fixados de forma adequada pela jurisprudência”.[160]

Portanto, seja por uma alteração legislativa (alteração da Lei de assistência judiciária gratuita ou mesmo a promulgação de uma nova lei sobre a matéria, revogando a atual) ou por uma maior atenção/atuação sobre o tema pelas Cortes de Justiça brasileira, é imperioso que reflita e, efetivamente, seja alterado o atual quadro de concessão do direito à gratuidade, já há muito ultrapassado, como esta monografia se propôs demonstrar.


CONCLUSÃO

Pelo desenvolvimento deste estudo sobre o tema da prova na concessão do instituto da justiça gratuita, sua co-relação com a justa outorga do benefício e sobre a eventual impugnação pela parte contrária da concessão da justiça gratuita ao seu adversário, pode-se perceber que tanto a jurisprudência e a doutrina sugerem uma reestruturação da Lei da assistência judiciária gratuita, especialmente no que concerne à forma de concessão do direito à gratuidade processual.

Seja, assim, pela interpretação do instituto conforme a Constituição Federal, admitindo que a partir da promulgação desta se passou a exigir prova do merecimento ao benefício (o que, como se viu, é uma interpretação equivocada), seja pela enumeração prática dos possíveis reveses causados pela mera exigência de simples declaração de pobreza, a mudança da atual configuração do direito à gratuidade é tema frequente. 

A partir desse pressuposto, foram demonstradas formas de viabilizar essa mudança, como por exemplo, com a exigência de prova pré-constituída ou pela verificação definitiva (verdade real) da concessão do benefício ao final do processo – prolação da sentença.

Para tanto, além de outros pontos congêneres, a diante mencionados, foi de vital relevância a identificação da proximidade e da interdependência entre o direito material e o direito processual.

Essa relação, aliada ao estudo do instituto da prova realizado, demonstrou que não adianta a previsão de justos e aclamados direitos (direito material) aos cidadãos se não houver, da mesma forma, a previsão de instrumentos que os assegurem. O direito processual, com efeito, é o mais importante desses instrumentos (outros foram estudados no item “alternativas para melhorar o acesso à Justiça”), pois garante os meios necessários à postulação das pretensões resistidas, ou seja, a postulação pelo cidadão ao cumprimento de seu direito previsto, mas não cumprido espontaneamente, seja pelo Estado, seja pelo particular.

Sobre o estudo da prova e de sua importância para a concessão do benefício (item específico da monografia), nota-se que a presunção relativa admitida pela Lei para a concessão do direito à gratuidade não se coaduna com a finalidade primordial da prova, qual seja, a de assegurar a verdade sobre o fato a que se exige prova.

Não se pode admitir como verdadeira, mesmo que de forma relativa (à esperar que o Juízo ou a parte contrária a impugne), uma declaração de pobreza desvinculada de qualquer outro elemento probatório e conceder de forma ampla a gratuidade processual.

Não há aí prova e, sem ela, abre-se vazão à litigância temerária, o que não se pode admitir.

Ato contínuo, conclui-se que a jurisprudência alicerça de forma ampla o preenchimento de lacunas legais da legislação que trata sobre a gratuidade processual e, juntamente com a doutrina especializada, garante a atualidade e a importância que o tema da prova para a concessão desse instituto pressupõe (com a ressalva de que ainda há muito o que se conquistar para a perfeita operacionalização do instituto – como esta monografia se propôs a demonstrar).

Foi de suma importância a indicação do conceito de justiça gratuita e de sua diferenciação entre institutos de definição semelhante, mas diversa, pois instrumentou a relação da Constituição Federal com a questão probatória da concessão do benefício e a tormentosa interpretação jurisprudencial e doutrinária sobre a necessidade ou não de prova da condição de beneficiário, em detrimento da mera alegação de necessitado.

Da mesma forma teve lugar fundamental a colocação da importância do custo da justiça, de feita que com isso pode ser mais objetivamente observada a necessidade da eficaz prova da condição de beneficiário, em razão, por exemplo, de, com a justa outorga do benefício, se evitar dano ao erário público e a criação de campo para lides temerárias.

Igualmente, o estudo do acesso à justiça, por seus principais obstáculos e alternativas de superação destes, foi introito eficaz para o melhor enfrentamento do tema da justiça gratuita e sua ultrapassada forma de concessão.

Em suma, verifica-se que há a premente necessidade de se discutir e, seja por meio de alterações na legislação vigente, seja pela promulgação de uma nova lei de assistência judiciária gratuita ou ainda pelo melhor enfrentamento do tema pela jurisprudência (por exemplo, com a criação de súmulas sobre o tema), de se modificar a já ultrapassada Lei da assistência judiciária gratuita, já que a concessão indiscriminada da gratuidade processual vem causando intenso debate doutrinário e jurisprudencial sobre a sua ineficaz forma de concessão que ostenta na mera declaração de situação de necessidade financeira única “prova legal” (se é que essa presunção pode ser considerada como meio de prova) para o pleito desse fundamental direito.


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Notas

[1] A Jurisdição como elemento de inclusão social – revitalizando as regras do jogo democrático. Barueri: Editora Manole, 2002, p. 208, destaque acrescido.

[2] A instrumentalidade do processo. 14. ed. São Paulo: Malheiros editores, 2009, p. 362.

[3] Ibid.

[4] Direito e processo: influência do direito material sobre o processo. 6. ed. São Paulo: Malheiros editores, 2011, p. 23.

[5] Ibid.

[6] Acesso à justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988, p. 8, grifo acrescido.

[7] Limitações ao acesso à justiça. Curitiba: Juruá, 1998, p. 61, destaque do autor.

[8] Acesso à justiça: um problema ético-social no plano da realização do direito. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 101.

[9] Ibid, p. 101/102 e 104.

[10] Direito constitucional. 17ª ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 71/72, grifo acrescido.

[11] Art. 5º, XXXV: a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito. BRASIL. Constituição Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 25/7/2012, grifo acrescido.

[12] Comentários à Constituição Brasileira de 1988, volume 1. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1990, p. 436, grifo acrescido.

[13] Constituição de 1988 e processo: regramentos e garantias constitucionais do processo. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 11, grifo acrescido.

[14] Art. 5º, LXXIV: o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. BRASIL. Constituição Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 25/7/2012.

[15] Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 298, destaque acrescido.

[16] Assistência jurídica gratuita: assistência judiciária e gratuidade judiciária. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2002, p. 51.

[17] Comentários à Constituição Brasileira de 1988, volume 2. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1990, p. 819, destaques do autor.

[18] Código de processo civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 134, grifo acrescido.

[19] CAPPELLETTI, op. cit., p. 32.

[20] CAPELLETI, op. cit., p. 15/16.

[21] Instituições de direito processual civil, volume 2. 5ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2005, p. 677.

[22] Ibid, p. 635, grifo acrescido.

[23] Fábio Campelo Conrado de Holanda disserta: “o descrédito da população em geral com a atuação do Poder Judiciário na resolução dos conflitos, desacreditando da ‘justiça’, decorre também do fardo propiciado pelo tempo do processo, não havendo custo social maior do que o carreado a quem se vê obrigado a abrir mão de parte de seu direito para que sua causa seja resolvida a tempo e a contento.” O acesso à justiça e a lealdade das partes. Fortaleza: RDS, 2011, p. 83.

[24] Mauro Cappelletti afirma que “em muitos países, as partes que buscam uma solução judicial precisam esperar dois ou três anos, ou mais, por uma decisão exeqüível.” CAPPELLETTI, op. cit., p. 20. Luiz Guilherme Marinoni defende que: “(...) é fácil concluir que o autor com razão é prejudicado pelo tempo da justiça na mesma medida em que o réu sem razão é por ela beneficiado. Vistas as coisas através desse ângulo, fica muito claro o valor que o tempo possui diante desses conflitos. Ademais, a morosidade do processo atinge de modo muito mais acentuado os que têm menos recursos. A demora, tratando-se de litígios envolvendo patrimônio, certamente pode ser compreendida com um custo, e esse é tanto mais árduo quanto mais dependente o autor é do valor patrimonial buscado em juízo. (...) Não raro se ouve alguém argumentando que o autor deve fazer um acordo em razão de que ainda terá de aguardar muito o desfecho do processo. Teoria geral do processo (Curso do processo civil; v. 1). 5. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 193/194.

[25] Ruy Pereira Barbosa cita os serviços prestados pelas faculdades de direito, em especial o Centro Acadêmico “XI de Agosto”, da Universidade Estadual de São Paulo (USP) que desde 1919 presta serviço de assistência jurídica à população carente: “o atendimento dos interessados, a elaboração de peças jurídicas e o acompanhamento dos processos em Cartório são tarefas realizadas pelos acadêmicos de Direito, sob a supervisão de advogados-orientadores do Departamento.” Assistência jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 78.

[26] Assistência jurídica, assistência judiciária e justiça gratuita. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 22, grifo acrescido.

[27] CAPPELLETTI, op. cit., p. 21/22, grifos acrescidos.

[28] Ibid, p. 25.

[29] Ibid, p. 25/26.

[30]MARINONI, op. cit., p. 191.

[31] TUCCI, op. cit., p. 23.

[32] Assistência Jurídica, Defensoria Pública – e o acesso à jurisdição no estado democrático de direito. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 1997, p. 41 e 48.

[33] MORAES, Guilherme Braga Peña, op. cit., p. 43.

[34] MARCACINI, op. cit., p. 25.

[35] Ibid, p. 26.

[36] O juiz e o acesso à justiça. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 101/102 e 106.

[37] ABREU, Pedro Manoel. Acesso à Justiça e Juizados Especiais: O desafio histórico da consolidação de uma justiça cidadã no Brasil. Florianópolis: Conceito Editorial, 2008, p. 184 e 254.

[38] Processo de conhecimento (Curso de processo civil; v. 2). 9. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 32, grifo acrescido.

[39] HOLANDA, op. cit., p. 84.

[40] MARINONI, op. cit., p. 32.

[41] MARINONI, op.cit., p. 34.

[42] “Não tendo o beneficiário patrimônio responsável (como na maior parte dos casos acontece), nem vindo a ter patrimônio ou rendimentos suficientes no prazo de cinco anos, a obrigação por despesas e honorários prescreve (art. 12).” Dinamarco, op. cit., p. 684.

[43] BRASIL. Código de Processo Civil. Lei nº 5.869 de 11 de janeiro de 1973. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869compilada.htm>. Acesso em: 15/9/2012.

[44] Código de processo civil interpretado: artigo por artigo, parágrafo por parágrafo. 10. ed. Barueri, SP: Manole, 2011, p. 37.

[45] Código de processo civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 1831.

[46] CAMPO, op. cit., p. 54/55.

[47] Acesso à Justiça e gratuidade: uma leitura na perspectiva dos direito fundamentais. Revista de Processo, volume 195, ano 36, p. 249-278. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 262, grifo acrescido.

[48] Essa diferenciação não é unânime na doutrina, ocorrendo, por exemplo, de autores considerarem justiça gratuita sinônimo de assistência judiciária – cite-se CAMPO, op. cit., p. 65.

[49] DIDIER JR., Fredie; OLIVEIRA, Rafael. Benefício da justiça gratuita. 4ª ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2010, p. 12.

[50] Ibid, p. 11.

[51] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 205.029-6-SP, Segunda Turma, Min. Rel. Carlos Velloso, j. 26/11/96. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=239674>. Acesso em 25/7/2012.

[52] A assistência jurídica aos hipossuficientes na Constituição. São Paulo: LTr, 1997, p. 81.

[53] CAMPO, op. cit., p. 65, grifo acrescido.

[54] Ibid, p. 124.

[55] BRASIL. 1ª Vara Cível do Foro Regional do Jabaquara da Comarca da Capital – SP. Embargos à execução nº 0017707-89.2011.8.26.0003. DJ 27/10/2011. Disponível em: <https://esaj.tjsp.jus.br/cpo/pg/show.do?processo.foro=3&processo.codigo=0300126050000>. Acesso em: 3/8/2012.

[56] MARCACINI, op. cit., p. 33, grifo acrescido. O autor cita os seguintes julgados que admitiram a concessão da gratuidade, mesmo tendo a parte contratado advogado particular: RJTJ-SP, vol. 100, p. 318, vol. 101, p. 276, vol. 119, p. 307. No mesmo sentido, GARCIA, op. cit., faixa 20.

[57] DINAMARCO, op. cit., p. 681/682, em sentido contrário, entende que o benefício não “(...) inclui dispensa de adiantar honorários a perito e outros auxiliares eventuais de encargos judicial, pelo fato de serem profissionais remunerados pelos cofres públicos e não estarem obrigados a prestar serviços gratuitos ou correr o risco de não receber depois”.

[58] No mesmo sentido: ZANON, Artenio. Da assistência jurídica integral e gratuita: comentários à Lei da Assistência Judiciária (Lei n. 1060, de 5.2.1950, à luz da CF de 5-10-1988, at. 5º, LXXIV e direito comparado). 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 58/59.

[59] CAMPO, op. cit., p. 77/78.

[60] A assistência jurídica aos hipossuficientes na Constituição. São Paulo: LTr, 1997, p. 81.

[61] DIDIER, op. cit., p. 14.

[62] CAMPO, op. cit., p. 35. O autor cita que em RJTJ-SP, vol. 129, p. 314, foi determinada a concessão de transporte à partes beneficiárias da gratuidade, para que se deslocassem da cidade de São Carlos para a Capital, a fim de se submeterem a perícia no IMESC.

[63] Idid.

[64] STJ – 3ª T., REsp 1.052.679, Min. Nancy Andrighi, j. 8.6.10, DJ 18.6.10 in NEGRÃO, Theotonio; GOUVÊA, José Roberto F.; BONDIOCI, Guilherme A.; FONSECA, João Francisco N. da. Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. 44. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 1.270, art. 3º, nota 1a. 

[65] DIDIER, op. cit., p. 15.

[66] Ibid, p. 16. O autor cita a recente alteração da Lei da assistência judiciária trazida pela Lei Complementar nº 132/2009, que acrescentou o inciso VII ao art. 3º da primeira, firmando o entendimento da ampliação da isenção, agora englobando os depósitos processuais.

[67] PINTO, p. 48.

[68] Ibid, p. 48/49.

[69] Ibid, p. 49.

[70] LOPES, Gláucia Gomes Vergara. Cadernos de direito processual do trabalho: audiência, conciliação, assistência jurídica gratuita. São Paulo: LTr, 2001, p. 45.

[71] CAPPELLETTI, op. cit., p. 31.

[72] Ibid, destaque do autor.

[73] LOPES, op. cit., p. 45.

[74] Assistência jurídica gratuita: assistência judiciária e gratuidade judiciária. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2002, p. 4/5.

[75] BRASIL. Constituição Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 22 set. 2012.

[76] GRINOVER, Ada Pellegrini. Novas tendências do direito processual. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1990, p. 245 e 247, grifos acrescidos.

[77] Ibid.

[78] GARCIA, Regina Maria de Marchi. Tudo o que você precisa ouvir sobre justiça gratuita. Áudio livro. São Paulo: Saraiva, 2011, faixa 6.

[79] BRASIL. Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L1060.htm>. Acesso em: 23 jul. 2012.

[80] Didier, ibid, p. 33. No mesmo sentido, trazendo interessante cotejo entre os entendimentos dos Tribunais Superiores: ALVES, Ticiano. Os entendimentos divergentes do STJ e do STF acerca do procedimento para a concessão do benefício da justiça gratuita às pessoas jurídicas com e sem fins lucrativos. Revista de Processo, volume 151, ano 32, p. 195-204. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 203. Ver também, GARCIA, op.cit., faixa19.

[81] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 1328597 / SP, Terceira Turma, Min. Rel. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 13/09/2011. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sLink=ATC&sSeq=17469501&sReg=201001166881&sData=20110923&sTipo=5&formato=PDF>. Acesso em: 23 jul. 2012.

[82] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 17377 / RJ, Quarta Turma, Min. Rel. Raul Araújo, j. 2/8/2011. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sLink=ATC&sSeq=16542729&sReg=201101395072&sData=20110902&sTipo=5&formato=PDF >. Acesso em: 23 jul. 2012.

[83] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. O Supremo e a Constituição. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/artigo.asp#ctx1>. Acesso em: 13 de ago. de 2012.

[84] DINAMARCO, op. cit., p. 680/681.

[85] Segundo pesquisas recentes (2008-2009) do IBGE, no Brasil existem mais de doze milhões de famílias com renda média mensal de até R$ 830,00 e despesa média de até R$ 744,98. Ou seja, os custos de um processo judicial, em geral, não cabem para uma família como essas. Tabela de resultados. Tabela 1.1.1 - Despesas monetárias e não monetária média mensal familiar, por classes de rendimento total e variação patrimonial mensal familiar, segundo os tipos de despesa, com indicação do número e tamanho médio das famílias - Brasil - período 2008-2009. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/condicaodevida/pof/2008_2009/tabelas_pdf/tabela1_1_1.pdf>. Acesso em: 23 jul. 2012. Nesse ponto, cabe lembrar, como visto, que a hipossuficiência no Brasil não é apenas econômica, mas também organizacional, ou seja, cultural e educacional. Muitos brasileiros não têm a mínima noção de como funciona o Poder Judiciário, tampouco quais são seus direitos nos principais conflitos atuais (direito do consumidor, direito de família, direito do trabalho, etc.).

[86] MARINONI, ibid.

[87] BRASIL. 2ª Vara Cível do Foro Regional de Santana da Comarca da Capital (SP). Impugnação nº 0833427-45.2006.8.26.0001. DJ 9/12/2011. Disponível em: <http://esaj.tjsp.jus.br/cpo/pg/search.do?paginaConsulta=1&localPesquisa.cdLocal=-1&cbPesquisa=NUMPROC&tipoNuProcesso=UNIFICADO&numeroDigitoAnoUnificado=0833427-45.2006&foroNumeroUnificado=0001&dePesquisaNuUnificado=0833427-45.2006.8.26.0001&dePesquisa=>. Acesso em: 12 jan. 2012.

[88] DIDIER, op. cit., p. 44.

[89] DINAMARCO, op. cit., p. 679/680.

[90] CAMPO, op. cit., p. 60.

[91] Ibid.

[92] SILVA, José Ronemberg Travassos da. A penhora realizada através do BacenJud. Breves apontamentos. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1130, 5 ago. 2006 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/8751>. Acesso em: 3 ago. 2012.

[93] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1265434 / SC, Segunda Turma. Min. Rel. Herman Benjamin, DJ 9/9/2011, grifos acrescidos. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sLink=ATC&sSeq=17146096&sReg=201101632376&sData=20110909&sTipo=5&formato=PDF>. Acesso em: 13 de ago. de 2012.

[94] BRASIL. Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L1060.htm>. Acesso em: 25/7/2012, grifo acrescido.

[95] DIDIER, op. cit., p. 46. No mesmo sentido: GARCIA, op. cit., faixa 4.

[96]Ibid. E completa: “Entretanto, as despesas que fez, aquelas cujo fato jurídico gerador ou, ainda, aquelas já adiantadas pela outra parte não lhe serão devolvidas ou dispensadas. Isto porque o deferimento do benefício tem efeito ex nunc, constituindo situação jurídica nova, que não abrange as despesas processuais anteriores ao pedido.” Ibid, p. 49. No mesmo sentido, SALEM NETO, José. Prática da justiça gratuita: direito a honorários. São Paulo: LTr, 2000, p. 26. “(...) agem com equívoco todos que interpretam que o pedido de Justiça Gratuita tem de ser formulado na inicial, pois a própria lei consagra o princípio da oportunidade no curso da ação, o que vale dizer que pode ser até no Tribunal, inclusive no processo de execução.”

[97] Ibid, p. 50. O autor admite que caso o relator indefira o pedido de gratuidade, relevando-se a pena de deserção, deverá ser aberto prazo para que a parte efetue o preparo recursal. Ibid, p. 51.

[98] Ibid, p.47/48.

[99] Ibid, p. 51.

[100] GORON, op. cit., p. 265, grifo acrescido.

[101] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo regimental nos embargos de declaração nº 1405985/PR, Segunda Turma, Min. Rel. Mauro Campbell Marques, DJ 25/8/2011, grifo acrescido. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sLink=ATC&sSeq=17170012&sReg=201100471420&sData=20110825&sTipo=5&formato=PDF>. Acesso em: 7 de ago. de 2012.

[102] CAMPO, op. cit., p. 58.

[103] Essa advertência é também encontrada nas palavras de Arthur Mendes Lobo, Assistência judiciária gratuita no novo Código de Processo Civil. Uma proposta de possível emenda ao PL 8.046/2010. Revista de Processo, volume 194, ano 36, p. 351-367. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 354/355: “No cotidiano forense, de maneira progressiva e cada vez mais frequente, é possível notar que há pessoas que teriam condições de arcar com as custas do processo sem prejuízo do seu próprio sustenta ou de sua família, no entanto, elas declaram o contrário e gozam da isenção de modo fraudulento e desmedido, sem maiores dificuldades.” Afirma, outrossim, que a razão desse atual cenário advém de que: “(...) na prática, quase nunca há impugnação da parte contrária quanto ao deferimento da assistência judiciária gratuita. Primeiro, porque se, por exemplo, o autor recebe tal benefício, ele não onerará o réu, razão pela qual este não tem interesse em impugnar, pois o único onerado será o Estado, leia-se o cofre do Judiciário; segundo, porque o juiz, normalmente, não consegue extrair dos autos elementos e provas de que o beneficiário da gratuidade pode pagar as custas processuais, haja vista que os documentos e provas cingem-se à lide. Terceiro, nem sempre nos processos em que há gratuidade, o Ministério Público ou a Fazenda Pública atuam como fiscais da lei e da isenção. Quarto, porque outra pessoa do povo, estranha à lide, não costuma denunciar irregularidades ao juízo, não há esta cultura entre os brasileiros.”

[104] BRASIL. 2ª Vara Cível do Foro Regional de Itaquera da Comarca da Capital (SP). Cancelamento e retificação de registro público nº 007.09.210625-7. 11/5/2009. Disponível em: <https://esaj.tjsp.jus.br/cpo/pg/show.do?processo.foro=7&processo.codigo=070010CAK0000>. Acesso em: 25/7/2012, grifos acrescidos.

[105] DINAMARCO, op. cit., p. 679, destaques do autor.

[106] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 17263 / SP, Quarta Turma, Min. Rel. Luis Felipe Salomão, DJ 30/8/2011, grifos acrescidos. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sLink=ATC&sSeq=17243746&sReg=201100727345&sData=20110830&sTipo=5&formato=PDF>. Acesso em: 13 de ago. de 2012.

[107] A impugnação só pode ser manejada, é bom que se lembre, após a concessão do benefício, de modo que não haverá contraditório antes que o juiz aprecie a requisição do benefício. Isso, quando o pedido for inicial, quando for ulterior, será instaurado como incidente e, sem haja a suspensão do processo, será ouvida a parte contrária, conforme defende DIDIER, op. cit., p. 47/48.

[108] CAMPO, op. cit., p. 71, grifos acrescidos.

[109] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1196941 / SP, Primeira Turma, Min. Rel. Benedito Gonçalves, DJ 23/3/2011, grifos acrescidos. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sLink=ATC&sSeq=14496046&sReg=201001018998&sData=20110323&sTipo=5&formato=PDF>. Acesso em: 13 de ago. de 2012.

[110] BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de Instrumento nº 0310110-05.2011.8.26.0000, 9ª Câmara de Direito Privado, Des. Rel. Grava Brazil, j. 8/2/2012. Disponível em: <https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=5882965&vlCaptcha=kafbn>. Acesso em: 13/8/2012.

[111] CAMPO, op. cit., p. 72.

[112] LOBO, op. cit., p. 362.

[113] DIDIER, op. cit., p. 55/56.

[114] CAMPO, op. cit., p. 73.

[115] Ibid, p. 72/73.

[116] GORON, op. cit., p. 268.

[117] Ibid, p. 250 e 268, grifo acrescido.

[118] Ibid, p. 268/269.

[119] Ibid, p. 268.

[120] Arthur Mendes Lobo apud in op. cit., p. 270, destaque acrescido.

[121] SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1983, p. 48. O autor conceitua como sujeito da prova aquela “(...) pessoa ou coisa de quem ou de onde dimana a prova, a pessoa ou coisa que afirma ou atesta a existência ou inexistência do fato probando.”

[122] Ibid. “Objeto da prova é o fato por provar-se.”

[123]Ibid, p. 6.

[124] DINAMARCO, op. cit., p. 615.

[125] MARINONI, op.cit. v. 2, p. 251.

[126] SANTOS, op. cit., p. 48. “Forma da prova é a modalidade ou a maneira pela qual ela pode apresentar-se ao magistrado, pela qual se constitui ou produz.”

[127] BRASIL. Código de Processo Civil. Lei nº 5.869 de 11 de janeiro de 1973. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869compilada.htm>. Acesso em: 15/9/2012.

[128] DINAMARCO, ibid.

[129] Direito civil: parte geral. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 581.

[130] Ibid, p. 582.

[131] MARINONI, op.cit. v. 2, p. 287.

[132] STJ, REsp 692242/MG, 3ª T., rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 12.09.2005, in ibid.

[133] SANTOS, op. cit., p. 378, destaque acrescido.

[134] Maximo Castro in ibid.

[135] Embora também se possa pensar que havendo presunção, a prova seria dispensada. Nesse caso, o atual sistema de concessão da justiça gratuita, poder-se-ia dizer, não exige qualquer tipo de prova, uma vez que o modus operandi da concessão da gratuidade processual legitima como verdadeira (até prova em contrário) a afirmação de necessidade econômica do pleiteante ao instituto.

[136] Marco Antonio Botto Muscari, em artigo sobre as vicissitudes da concessão desenfreada da justiça gratuita, assevera que “é possível afirmar que a demanda por serviços judiciários aumenta quando é menor o custo de processar e maior o benefício esperado”. Justiça no Brasil: barata para os litigantes de má-fé, mas não para os bons cidadãos. Revista de Processo, volume 181, ano 35, p. 305-312. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 311.

[137] Acesso à justiça. São Paulo: Fundação Konrad Adenauer, 2001, p. 8, 41, grifos acrescidos.

[138] LOBO, op. cit., p. 353, grifos acrescidos.

[139] Ibid, p. 358 e seguintes.

[140] GORON, op. cit., p. 272.

[141] CAMPO, op. cit., p. 63.

[142] Alexandre Schmitt da Silva Mello apud in GORON, op. cit., p. 271.

[143] GORON, ibid, p. 274, grifos acrescidos.

[144] Artenio Zanon reconhece que “Há um conjunto de fatores, de situações, de circunstâncias que, se se desejar, a um rigorismo, deve ser levado em consideração. (...) cada caso é um caso, apesar das similitudes deles (inventário, arrolamento, usucapião, alimentos, separação, divórcio, indenização etc.) (...)” ibid, p. 42.

[145] MARCACINI, op. cit., p. 92, destaque acrescido.

[146] Hoje, citando o exemplo da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, são admitidos como critérios para a comprovação de necessidade dos serviços prestados pela defensoria a renda familiar de até 3 salários mínimos, o patrimônio familiar, o valor da causa e a natureza da causa. BRASIL. Defensoria Pública do Estado de São Paulo. Resposta Consulta Pública Deliberação 892. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/2012.02.02_RespostaConsultaPublicaDeliberacao892.pdf>. Acesso em: 7 de out. de 2012, p. 2.

[147]SANTOS, Maurício Januzzi. Assistência judiciária. Vídeo-aula. Disponível em: <http://www.videosoabsp.com.br/novo/#topo>. Acesso em: 7 de out. de 2012. E, BRASIL. Defensoria Pública do Estado de São Paulo. Cartilha Entendendo o Convênio Defensoria SP / OAB. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/documentos/conv%C3%AAnios/Cartilha-CONVENIO.pdf>. Acesso em: 7 out. 2012, p. 3.

[148] SANTOS, Maurício Januzzi, ibid.

[149] LOBO, op. cit., p. 357/358: “Art. 99. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas e as despesas processuais e os honorários de advogado gozará dos benefícios da gratuidade da justiça, na forma da lei. § 1.º O juiz poderá determinar de ofício a comprovação da insuficiência de que trata o caput, se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos requisitos legais da gratuidade da justiça. § 2.º Das decisões relativas à gratuidade, caberá agravo de instrumento, salvo quando a decisão se der na sentença.”

[150] Ibid, p. 358.

[151] Ibid, p. 358 e seguintes. Afirma, ainda, que “(...) a verdade formal é condição para a concessão provisória do benefício, em decisão interlocutória que examina o requerimento da parte no início ou no decorrer do processo. Porém, para a sua confirmação, na sentença, será imprescindível a busca da verdade real, (...)” p. 366.

[152] Ibid, p. 358.

[153] Esse entendimento de que, diante de elementos concretos, persistir a dúvida quanto à condição de necessitado, o juiz deve julgar em favor do pleiteante à beneficiário é compartilhado por GARCIA, op. cit., faixa 13, que afirma que essa tendência é tomada em vista dos “princípios constitucionais do acesso à Justiça e da assistência jurídica integral.”

[154] É certo que, de qualquer forma, a sentença proferida contra o beneficiário da justiça gratuita poderá ser executada, pois a gratuidade processual só atingirá as despesas, as custas processuais e os honorários advocatícios, de nada importando na imaginária isenção do beneficiário ao cumprimento de uma condenação ao pagamento de determinada quantia ou a obrigação de fazer, deixar de fazer, entregar coisa, etc. Com a ressalva de que, pela condição financeira do executado, não seriam muito eficazes medidas coercitivas em dinheiro – as chamadas astreintes – mas deverá o magistrado delimitar outras medidas coercitivas, como possibilita o artigo 461, § 5º, do Código de Processo Civil. Nesse sentido, DIDIER, op. cit., p. 15, nota de rodapé 18.  

[155] LOBO, op. cit., p. 354.

[156] GORON, p. 275, grifos acrescidos.

[157] Walter Piva Rodrigues e Augusto Tavares Rosa Marcacini lideraram uma mesa de debates de juristas de São Paulo e tiveram a iniciativa de sugerir o texto de um anteprojeto do que seria uma nova Lei de assistência judiciária gratuita. O texto traz a menção, por exemplo, à possibilidade de concessão do benefício às pessoas jurídicas e a conceituação e diversos regramentos sobre a assistência jurídica (assistência judiciária prestada pelo Estado aos carentes de recursos), entre outros pontos de reforma. Quanto à identificação dos beneficiários e a forma de concessão do benefício (comprovação), infelizmente, porém, não houve qualquer inovação à legislação atual.  In BARBOSA, op. cit., p. 131/138.

[158] Ibid, p. 274, grifo do autor.

[159] MARCACINI, op. cit., p. 4.

[160] GORON, op. cit., p. 275, grifo do autor.


Abstract: This essay structures a base for the study of the proof in the grant of the free justice. It presents the treatment of the doctrine on the subject in question, while it also brings jurisprudence and legislation. It guides its development by introducing the study by the institute of the access to justice. Then just after it, through the analysis of the free justice itself, to finally enter in the center of this essay, the critiques and suggestions to define a fair act of proof to grant the free justice. In the course of its development it is noted the close link between the recent cases-law with the urgent need to think of the modernity e efficient runnability of the Law of the free justice. Mentioned Law is studied among the abuses and the losses that born from its proof simplicity, in order to define the scenario that should be expected to conduct in a more useful proof. This monograph offers, in addition, hypotheses to verify how the beneficiaries, eventually, may act as a way that brings the creation of a proof in favor of the goof-faith during the pre-issue period. Finally, it is relevant to note that the fundamental about all thinking that turn to an improving in the free justice it’s the preservation of the access to justice to the poor people.

Keywords: free justice – Law of the free justice – proof.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAPESTRANI, Piero de Manincor. A prova para a concessão da justiça gratuita. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3605, 15 maio 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24336. Acesso em: 1 maio 2024.