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Ministério Público

questões polêmicas

Ministério Público: questões polêmicas

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"Assim, o desenvolvimento do Ministério Público hoje é dependente de definição da maneira pela qual essa instituição encontrará um justo termo entre a razão e a utopia, conciliando um modo de produzir e aplicar um direito ainda não inteiramente superado e a necessidade de dar respostas a funções jurídicas e sociais inteiramente inovadoras. Com isso, exige-se um direcionamento institucional diverso daquele tradicionalmente colocado pelo direito e pela história do Ministério Público."

Carlos Alberto de Salles [1]


1. Introdução.

Urge abrir um debate acerca de algumas das questões mais polêmicas que circundam a instituição do Ministério Público, visando um direcionamento institucional diverso do existente há séculos. Agressões, cotidianamente visualizadas, têm sido feitas às prerrogativas dos representantes do Ministério Público. Muitos (inclusive representantes eleitos pelo povo), com visão retrógrada e reacionária, querem desvincular o Ministério Público de sua faceta questionadora, fiscalizadora, verdadeiramente promotora, tentando retornar a tempos idos, totalmente ultrapassados e permeados de experiências fracassadas. Após 15 anos de nossa vitoriosa Constituição e 10 anos da edição da Lei Complementar n°. 75/93 e da Lei n°. 8.625/93, o que se vê é um gradativo reflorescimento do ambiente democrático em nosso País. Certamente, alguma participação neste processo de redemocratização teve o Ministério Público. Nada mais natural, num Estado que anseia pelo bem estar de sua população e pelo firmamento do sistema democrático, que instituições que combatam o que há de mais ultrapassado e antitético aos interesses da sociedade sejam atacadas pelos aborrecidos com suas vitórias e sucessos. Sem incorrer numa afirmação perigosamente prepotente, reveladora de uma auto-suficiência que inexiste, a verdade é que incômodos vários são causados pela atuação ministerial, atuação esta que deve ser divulgada para o escorreito acompanhamento da coletividade.

Desta forma, um outro fator de imensa monta, que também ensejou o presente trabalho, é esta premente necessidade de se propalar, a todos os cantos e rincões do país, as prerrogativas institucionais concedidas pelos Constituintes e pelos legisladores, com o fito de serem divulgadas a toda sociedade, que, somente assim, poderá acompanhar a evolução dos resultados dos trabalhos dos Promotores e Procuradores de Justiça, exigindo dos mesmos uma atuação cada vez mais profícua na defesa do interesse público, por eles tutelado.


2. Atuação do Ministério Público no Processo Brasileiro

Através de uma percuciente análise da evolução histórica do Ministério Público brasileiro, percebe-se bem o quanto recrudesceram e se modificaram suas funções. Veio a Constituição Federal de 1988, em seu art. 127, a consagrá-lo como "instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis".

Recebeu o Ministério Público a destinação permanente de defender estes nobres interesses da sociedade: o ordenamento jurídico, a democracia e os interesses sociais e individuais indisponíveis. Deve ele zelar, em suma, pelo interesse público. Ressalte-se que aqui não se trata de interesse público na acepção de interesse estatal. Trata-se do interesse público primário, o interesse geral. Por vezes eles não coincidem. Afirmação interessante que nos traz a CF/88 é este caráter de essencialidade à jurisdição. Comenta-a Hugo Nigro Mazzilli: "Isso diz menos do que deveria (o Ministério Público tem inúmeras funções exercidas independentemente da prestação jurisdicional, como na fiscalização de fundações e prisões, nas habilitações de casamento, na homologação de acordos extrajudiciais, no inquérito civil etc.), e, paradoxalmente, também diz mais do que deveria (pois o Ministério Público não oficia em todos os feitos judiciais)" [2]. A crítica de Mazzilli à clássica definição do art. 127 deve merecer os devidos abrandamentos, afinal, tal definição foi elaborada em 1981, em tempos de dificuldades notórias, e num período de necessária valorização institucional.

Do ponto de vista processual ver-se-á que esta diretriz teleológica constitucional, de essencialidade jurisdicional do Ministério Público, se materializará com a atuação deste em vários dos ramos do Direito, em determinados momentos atuando como parte (órgão agente), e em tantos outros como custos legis (órgão interveniente). Não mais atuará o Ministério Público como representante do Estado (leia-se União ou Estados Federados). Neste sentido, atentemos para o comando do art. 129, IX, da CF, in verbis:

"Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

(...)

IX - exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas."

Esta vedação é tão cogente que requer-se ao membro ministerial a dedicação integral a seu ofício, ressalvadas as devidas exceções legais e constitucionais, consoante se depreende do art. 128, §5°, II, b, da CF [3]:

"Art. 128.....................

§ 5º - Leis complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros:

(...)

II - as seguintes vedações:

(...)

b) exercer a advocacia;"

Por ora, vejamos como se dá a participação do Ministério Público no Processo brasileiro, seja ele civil ou penal.

2.1 Atuação do Ministério Público como parte

De início, vale dizer que esta posição processual de parte ainda tem suscitado debates na comunidade jurídica brasileira. Seria o Ministério Público parte processualmente imparcial ou processualmente parcial? Seria ele parte? Autor e/ou réu?

Pensamos que a resposta a esta indagação está insculpida, sem tirar nem pôr nenhuma letra, nas palavras do Professor Paulo Cezar Pinheiro, fls. 8-9: "A controvérsia, no nosso entender, é falsa. Ser parte não é algo que se possa qualificar em tipos, dependendo do modo como ela atua, e sim o fato de alguém figurar no pólo ativo ou passivo da relação jurídica processual com direitos, poderes e ônus. Do mesmo modo, não é o fato de uma pessoa figurar como parte na relação jurídica processual que irá obrigá-la, necessariamente, ao ataque ou defesa das questões existentes. Caso contrário, não se admitiria o reconhecimento do pedido, a renúncia ao direito, a contestação somente de algum ponto da lide e a aceitação de outros. (...) Ora, ser parte é ser parte simplesmente, sem necessidade de adjetivação. A lei é que definirá os limites de sua atuação seja no âmbito do processo penal, seja no do processo civil." [4]

Materializando esta atuação ministerial como parte, o legislador concedeu ao Ministério Público o poder de promover inúmeras ações, cabendo-lhe levar ao conhecimento do Judiciário as várias questões fáticas que porventura subsumam-se em seu rol de atribuições. Concedeu-lhe também alguns privilégios processuais. Como exemplos destes privilégios, dispostos no nosso Código de Processo Civil, citamos a não sujeição ao pagamento antecipado de custas processuais [5] (também aplicável à sua atuação como custos legis), bem como o prazo contado em dobro para recorrer, e em quádruplo para contestar [6]. E não esqueçamos a prerrogativa disposta na LC n°. 75/93, em seu art. 18: o direito a ser intimado pessoalmente [7].

Assim, como parte no processo o Ministério Público tem legitimidade para impetrar, de forma privativa, a ação penal pública, nos termos do art. 129, inciso I, da Constituição Federal, bem como do art. 24 de nosso Código de Processo Penal. Também promoverá, na forma do art. 5º da Lei nº 7.347/85 (ou seja, de forma concorrente) [8], a ação civil pública para a defesa do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos. Ressalte-se que estes "outros interesses difusos e coletivos" geram uma competência ministerial bastante ampla, requerendo-se a efetividade desta concessão de competência por parte da jurisprudência, bem como por parte dos próprios representantes do Ministério Público.

Exemplificativamente, como parte o Ministério Público poderá promover:

- Abertura de inventário, havendo incapazes (art. 988, VIII, do CPC);

-Ação cautelar de arresto, em caso de intervenção ou liquidação extrajudicial de instituições financeiras (Lei nº. 6.024/74, art. 45);

-Ação cautelar de notificação de loteador (Lei nº. 6.766/79, art. 38, §2º);

-Ação civil ex-delicto, quando o titular do direito à reparação for pobre (art. 68, do Código Processual Penal) e não estiver instituída a Defensoria Pública (STF-RT 755/169);

-Ação civil pública de responsabilidade por danos causados aos investidores no mercado de valores mobiliários (Lei n°. 7.913/89);

-Ação civil pública destinada à proteção de direitos individuais homogêneos, de interesse público e relevância social, como p. ex.: mensalidades escolares abusivas, nulidade de cláusula contratual abusiva, decretação de nulidade de concurso pública, planos de saúde abusivos, correção monetária de prestações para aquisição de imóveis, proteção do direito ao salário mínimo etc. (jurisprudência do STJ e STF, e arts. 81, parágrafo único, III, e 82, I, do Código de Defesa do Consumidor);

-Ação civil pública destinada à proteção dos interesses coletivos ou difusos de pessoas portadoras de deficiência (art. 3º da Lei nº. 7.853/89);

-Ação civil pública para proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos (art. 129, III, CF);

-Ação civil pública, de legitimação genérica, para reparação de danos morais e patrimoniais a interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos (art. 129, III, CF; Lei n°. 7.347/85, arts. 1°, 5° e 21; CDC, arts. 81, 82 e 90; Lei n°. 8.884/94, art. 88);

-Ação de anulação de atos simulados, em processo onde seja necessária sua intervenção (CC, arts. 167 e 168);

-Ação de dissolução de sociedade civil, com atividades ilícitas ou imorais (CPC/39, art. 670 e art. 1.218, inc. VII, do CPC/73);

-Ação de dissolução de sociedade civil, de fins assistenciais (Decreto-Lei nº. 41/66, art. 3°);

-Ação de execução de obrigação de fazer, imposta pelo doador ao donatário, de interesse geral (art. 553, parágrafo único, do CC);

-Ação de execução para cobrança de multas penais (Lei de Execução Penal, art. 164, caput);

-Ação de extinção de fundações (art. 69 do CC, e art. 1.204 do CPC);

-Ação de investigação de paternidade, nas hipóteses do §4º do art. 2º da Lei nº. 8.560/92;

-Ação de nulidade de casamento prevista no Código Civil (art. 1.549 do CC);

-Ação de perda ou suspensão do pátrio poder, ou qualquer outra ação cautelar visando à segurança do menor e de seus haveres (art. 1.637 do Código Civil e art. 155 da Lei nº. 8069/90);

-Ação de remoção, suspensão ou destituição de tutor ou curador (arts. 1.735 e 1.766 do CC; e art. 1.194 do CPC);

-Ação de reparação de danos ao meio ambiente e a terceiros (Lei n°. 6.938/81, art. 14, §1°);

-Ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados aos homens, aos animais, às plantas e ao meio ambiente, por descumprimento das normas de uso da engenharia genética e uso dos organismos geneticamente modificados (art. 13, §6°, da Lei n°. 8.974/95);

-Ação de responsabilidade civil por fatos apurados por comissões parlamentares de inquérito (art. 58, §3°, CF);

-Ação de responsabilização dos administradores em caso de intervenção ou liquidação extrajudicial de instituições financeiras (Lei nº. 6.024/74, art. 46);

-Ação de revisão de medida sócio-educativa imposta a adolescente infrator (art. 128, Estatuto da Criança e do Adolescente);

-Ação de seqüestro e perda de bens, em defesa do patrimônio público (Lei n°. 8.429/92, arts. 7°, 17 e 18);

-Ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal (art. 102, I, a, e art. 103, §4°, da CF);

-Ação declaratória de inconstitucionalidade por omissão (arts. 102, I, a; 103, VI e §2°; e 129, IV, da CF);

-Ação direta de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos federais ou estaduais (arts. 102, I, a; 103, VI; e 129, IV, da CF);

-Ação direta interventiva por inconstitucionalidade de lei municipal ou estadual (arts. 35, IV, 36, III e IV, 125, §2° e 129, IV, da CF);

-Ação para defesa dos interesses das populações indígenas (art. 129, V, CF);

-Ação para deslinde de controvérsia sobre o estado civil das pessoas, de cuja solução dependa o julgamento de processo-crime de ação pública (art. 92, parágrafo único do CPP);

- Ação rescisória de sentença fruto de colusão entre as partes (art. 487, III, b, do CPC), ou de sentença em processo em que não foi ouvido, e sua intervenção era obrigatória (art. 487, III, a, do CPC);

-Conflito de competência (art. 116 do CPC; e 115, II, do CPP);

-Correição parcial (art. 32, I, da Lei n°. 8.625/93);

-Execução forçada (art. 566, II, do CPC);

-Habeas-Corpus (art. 654, CPP e Lei n°. 8.625/93, art. 32, I);

-Mandado de injunção, em geral (art. 5°, LXXI, da CF);

-Mandado de injunção em defesa de interesses sociais e individuais indisponíveis de crianças e adolescentes (Lei n°. 8.069, art. 201);

-Mandado de Segurança (Lei n°. 8.625/93, art. 32, I);

-Pedido de cancelamento de registro imobiliário (Lei nº. 6.015/73, art. 13, III, e 214; art. 168 do Código Civil e art. 1.104 do CPC);

-Pedido de cancelamento, por nulidade, de registro de loteamento (Lei nº. 6.766/79, arts. 21, §2º, e 23, I; art. 168 do Código Civil, e art. 1.104 do CPC);

-Pedido de hipoteca legal sobre os imóveis do indiciado (arts. 134, 142 e 144 do CPP);

-Pedido de interdição (CC, arts. 1.768, III e 1.769; CPC, arts. 1.177, III e 1.178);

-Pedido de retificação, restauração e suprimento de assento de registro civil (Lei nº. 6.015/73, art. 13, III e 109; e art. 1.104 do CPC);

-Pedido de revogação, ou modificação de condições e normas de conduta, de livramento condicional (arts. 730 e 731 do CPP);

-Pedido de seqüestro (arresto) de imóveis adquiridos como proventos de infração (arts. 125, 127, 136, 142 e 144 do CPP);

-Reclamação perante o STF (art. 102, I, l, da CF).

2.2 Atuação do Ministério Público como custos legis

Como órgão interveniente, o Ministério Público atua em diversas ocasiões processuais. A exigência de sua participação vem sempre da própria lei. Esta exigência ocorre mesmo naquelas situações onde o Ministério Público seja parte no processo. Nas lides em que atuará como fiscal da lei, o Ministério Público terá os mesmos direitos e poderes processuais das partes. Humberto Theodoro Júnior afirma a respeito:"O Ministério Público, quando (...) atua como custos legis, apresenta-se como sujeito especial do processo ou do procedimento. Como destaca José Frederico Marques, ‘atua em nome próprio, para defesa de interesse que o Estado deve tutelar nos conflitos litigiosos, ou na administração judicial de direitos subjetivos, a fim de que não fiquem à mercê da vontade privada. Ou, ainda, sujeito especial que participa do processo, como viva vox de interesses da ordem jurídica a serem salvaguardados na composição da lide’".(sic) [9]

Neste sentido, recordemos o que nos diz a Súmula 99 do STJ: "O Ministério Público tem legitimidade para recorrer no processo em que oficiou como fiscal da lei, ainda que não haja recurso da parte".

São de dois tipos estas intervenções ministeriais. Ora o Ministério Público atuará in ratione materiae, ora in ratione persona. Na primeira hipótese, desvinculado totalmente das partes em litígio, o Ministério Público atuará em vista da natureza do direito discutido. Intervirá como fiscal de direitos e interesses tidos como indisponíveis para toda a sociedade. Será ele incumbido de velar pela primazia do interesse público.

Até pouco tempo atrás era um grande ponto de dissenso saber quem deveria dizer se havia interesse público a ensejar a intervenção do órgão ministerial. Alguns juízes e doutrinadores argumentavam ser da competência do Judiciário decidir pela presença ou não do interesse público justificador da presença ministerial. Se o juiz julgasse ser necessária a intervenção do Ministério Público, este nada podia fazer a não ser proferir sua opinião sobre a causa. Era uma forma de submissão do Ministério Público ao Judiciário. Com a elevação institucional verificada com a CF/88, em relação ao Ministério Público, esta celeuma não mais possui razão de existir. O caminho correto para resolução destas questões é aquele trazido por Sérgio Gilberto Porto: "...há um consenso jurisprudencial sobre a questão no sentido de que uma vez identificado o interesse público deverá o Juízo intimar o órgão para que este se pronuncie, não havendo, outrossim, cogência em torno da necessidade da intervenção efetiva. Resulta como conseqüência desta linha de orientação a posição de que compete ao Ministério Público definir sua efetiva participação ou não, em razão de sua absoluta soberania e independência." [10](grifo nosso)

De outro lado, atuando in ratione persona, trabalhará em defesa dos interesses de determinados destinatários, carecedores de uma maior atenção da por parte da sociedade, que aqui é representada pelo Ministério Público. Elas são assim declaradas através de lei. Exemplos destas pessoas são os incapazes, os indígenas, os consumidores, as fundações, os acidentados do trabalho, os portadores de deficiência, entre outras. Entretanto, faz-se mister ressaltar que não será pelo motivo de atuar em nome destas pessoas que o agente do Ministério Público olvidará de se pautar pela legalidade. Vale citar que o Ministério Público sempre intervirá como custos legis nestes casos, e, conquanto possa parecer que nestes tipos de intervenções ele está a defender estritamente o direito da parte, o Ministério Público, de uma forma mediata, buscará a satisfação do interesse público correlacionado às lides sob sua intervenção.

Nestas intervenções ao representante do Ministério Público é concedido o direito de, entre outras coisas, interpor recurso; ser intimado pessoalmente de todos os atos do processo; manifestar-se após as partes; requisitar provas e depoimentos pessoais das partes; opor exceções de impedimento e suspeição; suscitar incidente de uniformização de jurisprudência; e ter prazo em dobro para interpor recurso de qualquer decisão.

De forma expressiva e numerosa, percebemos as intervenções do Ministério Público como custos legis, no Processo Brasileiro. Alguns exemplos são passíveis de citação, sobrelevando-se o que está dito nos arts. 82 e 83 do Código de Processo Civil Brasileiro:

"Art. 82. Compete ao Ministério Público intervir:

I - nas causas em que há interesses de incapazes;

II - nas causas concernentes ao estado da pessoa, pátrio poder, tutela, curatela, interdição, casamento, declaração de ausência e disposições de última vontade;

III - nas ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural e nas demais causas em que há interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte. (Redação dada pela Lei nº 9.415, de 23.12.1996)

Art. 83. Intervindo como fiscal da lei, o Ministério Público:

I - terá vista dos autos depois das partes, sendo intimado de todos os atos do processo;

II - poderá juntar documentos e certidões, produzir prova em audiência e requerer medidas ou diligências necessárias ao descobrimento da verdade."

Colacionamos alguns outros exemplos de atuação interveniente, dispostos no ordenamento jurídico brasileiro, de forma esparsa:

-Ação civil pública em geral (art. 5º, §1º, da Lei nº. 7.347/85);

-Ação de alimentos (art. 9°, Lei n°. 5.478/68);

-Ação de anulação de casamento (Código Civil, art. 1549);

-Ação de desapropriação de imóvel rural, por interesse social, para fins de reforma agrária (art. 18, §2°, Lei Complementar n° 76/93);

-Ação de divórcio, consensual ou litigioso (Lei nº. 6.515/77);

-Ação de separação judicial, quer seja ela litigiosa, quer seja consensual (art. 1.122, §1º, do CPC);

-Ação de usucapião de terras particulares (art. 944 do CPC);

-Ação penal privativa do ofendido (art. 45 do CPP);

-Ação popular (arts. 6º, §4º; 7º, inciso I, letra "a" e §1º, arts. 9º, 16 e 19, §2º, da Lei nº. 4.717/65);

-Ação rescisória (RT 528/105, RJTJESP 56/270 e 73/260, RSTJ 64/296);

-Ações coletivas onde se discutam interesses e direitos do consumidor (arts. 82, inciso I, e 92 da Lei n°. 8.078/90);

-Ações, coletivas ou individuais, onde se discutam a deficiência de pessoas (art. 5º da Lei nº. 7.853/89);

-Acordo, ou transação extrajudicial (Lei 9.099/95, art. 57, par. único);

-Alienações judiciais (art. 1.105 do CPC c/c art. 1.113 do CPC);

-Aprovação de testamentos e codicilos (art. 82, II, do CPC);

-Argüição de inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo do Poder Público (art. 480 do CPC);

-Arribada forçada – descarga de navios abandonados (art. 775, parágrafo único do CPC/39);

- Arrolamentos (art. 1.036, §1º, CPC);

-Busca e apreensão de menores (art.888, V, CPC);

-Concessão de liberdade provisória, nas condições do art. 23, I, II e II do CP, e na inocorrência das hipóteses que autorizam a prisão preventiva (art. 310, caput, do CPP);

-Conflito de competência (art. 121 do CPC);

-Conversão de separação em divórcio (Lei nº. 6.515/77);

-Declaração de extinção de punibilidade, por morte do acusado (art. 62 do Código de Processo Penal);

-Declaração de inconstitucionalidade (arts. 480 e 482, § 1°., do CPC);

-Deferimento de inscrição em listagem própria de crianças e adolescentes para adoção (art. 50, §1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente);

-Demandas que envolvam litígios coletivos pela posse de terra rural (art. 82, III, do CPC, e Lei Complementar nº. 88/96, art. 6º, §§ 3º, 4º e 5º);

-Desinternação do adolescente infrator (art. 121, §6º, ECA);

-Entrega de coisa vaga (art. 1.172 do CPC);

-Exceção de incompetência do juízo penal (art. 108, § 1°, do CPP);

-Falências (Decreto-Lei nº. 7.661/45), especificamente quando for caso de:

1.Autorização para alienação ou oneração de bens na concordata (art. 149);

2.Cassação de autorização para seguimento do negócio (art. 74, §6º);

3.Continuação do negócio (art. 74);

4.Cumprimento da concordata (art. 155, §2º);

5.Declarações e impugnações de créditos (art. 91 e 98, §3º);

6.Destituição do síndico, quando não for o requerente (art. 66, §1º);

7.Extinção das obrigações (art. 137, §2º);

8.Falência frustrada pela ausência ou insuficiência de bens (art. 75);

9.Pedido de reabilitação (art. 198, parágrafo único);

10.Pedido de restituição de coisa arrecadada (art. 77, §6º);

11.Prestação de contas do síndico (art. 69, §3º);

12.Remuneração pedida pelo falido diligente (art. 38);

13.Venda antecipada de bens (art. 73, §1º);

14.Venda de bens da massa falida, mediante propostas (art. 118, §2º);

- Habeas data (art. 12 da Lei n°. 9.507/97);

- Herança jacente e arrecadação (arts. 1.144, I, 1.145, §2º, e 1.151 do CPC);

- Herança que envolve bens de ausentes (art. 1.163, §2º, do CPC);

- Interdições (arts. 1.177, III, 1.178, 1.179 e 1.182, §1º, do CPC);

- Inventário com a presença de herdeiros ausentes ou incapazes (art. 999 do CPC);

- Justificações, quando o interessado não puder ser citado pessoalmente (art. 862, parágrafo único, do CPC);

- Liberdade assistida do adolescente infrator (ECA, art. 118, §2º);

- Liquidação de sociedade por ações (art. 209, inciso II, da Lei nº. 6.404/76);

- Mandado de segurança (art. 10 da Lei nº. 1.533/51);

- Organização e fiscalização das fundações (arts. 1.200 a 1.204 do CPC);

- Parcelamento do solo urbano – loteamento e desmembramento – (art. 19, §2º, da Lei nº. 6.766/79);

- Pedido de insolvência (JTJ 141/263);

- Pedidos de alienação, locação e administração da coisa comum onde haja interesse de incapazes (arts. 1.122, §1º, e 1.104 do CPC);

- Pedido de reabilitação criminal (art. 745 do CPP);

- Pedido de restituição de coisas apreendidas (art. 120, §3°, do CPP);

- Pedidos de sub-rogação de vínculos em imóvel (art. 1.112, II, c/c art. 1.105 do CPC);

- Petição de livramento condicional (art. 716, §2°, do CPP);

- Posse em nome do nascituro (art. 877 do CPC);

- Procedimentos de jurisdição voluntária em geral (art. 1.105 do CPC);

- Processo eleitoral (art. 24 da Lei nº. 4.737/65);

- Processos de ausência (art. 82, II, do CPC);

- Registro Torrens (art. 284 da Lei nº. 6.015/73);

- Remição da hipoteca legal em que haja interesse de incapaz (art. 274 da Lei n°. 6.015/73);

- Retificação de registro civil (arts. 57 e 109, da Lei nº. 6.015/73);

- Retificação de registro de imóvel (art. 213, §3º, da Lei nº. 6.015/73);

- Retificação de registro de nascimento (art. 8º da Lei nº. 8.560/92);

- Revogação de guarda de menores (art. 35 da Lei nº. 8.069/90);

- Separação de corpos (art. 82, II, CPC, c/c arts. 7º e 8º da Lei nº. 6.515/77);

- Seqüestro contra a Fazenda Pública (art. 731 do CPC e art. 100, §2º, da CF);

- Sucessão provisória de ausentes (art. 1.169 do CPC e 33 do Código Civil);

- Suscitação de dúvida (art. 200 da Lei nº. 6.015/73);

- Testamentos (processos relativos aos arts. 1.126, 1.131, III, 1.133 e 1.141 do CPC);

- Tutela ou curatela (art. 1.189 do CPC);

- Uniformização de jurisprudência (art. 478, parágrafo único, do CPC);

Por fim, conquanto a Instituição deva batalhar para ver maximizadas e aperfeiçoadas suas atribuições e funções legais e constitucionais, gostaríamos de deixar uma indagação aos leitores, para reflexão em busca de melhorias na rotina de trabalho ministerial. Tal pergunta não é nova, posto ter sido colocada ao público no 9º Congresso Nacional do Ministério Público, em Salvador/BA, nos idos de 1992, por João Lopes Guimarães Júnior [11]: "Não haveria na área cível um indevido predomínio, na prática, do ‘Ministério Público interveniente’ em prejuízo do ‘Ministério Público agente’?

Entre as várias respostas que serão dadas a esta questão e tantas outras que já se encontram na doutrina, pensamos serem indispensáveis as palavras de Maurício Augusto Gomes, Procurador de Justiça em São Paulo: "...não há dúvida que é mesmo necessário compatibilizar as disposições legais que impõem a intervenção do Ministério Público nas ações e procedimentos de natureza civil em geral ao seu novo perfil constitucional, que enfatiza suas funções como órgão agente, devendo ser buscada a redução das hipóteses de intervenção no processo civil, até mesmo e especialmente para viabilizar atuação eficiente em defesa de interesses superiormente relevantes, como são aqueles que se refletem de maneira coletiva ou difusa na comunidade, a serem tutelados por meio da instauração de inquérito civil e da promoção da ação civil pública.

Contudo, a alteração das hipóteses de intervenção do Ministério Público no processo civil não pode ser feita por normas infralegais, dependem de inovação legislativa e, para isso, deve-se promover o mais amplo debate possível na área jurídica e também na sociedade civil, comunidade interessada, para então, a seguir, encaminhar-se aos órgãos competentes anteprojeto de lei fazendo completa revisão dos diversos diplomas legislativos que prevêem a intervenção do Ministério Público nos procedimentos e ações civis, vez que ainda vigentes alguns que, desde a origem, já estabeleciam inadequadas e inconvenientes, ou no mínimo discutíveis, hipóteses de intervenção do Ministério Público..." [12]

Façam vossas análises.


3. Investigação Criminal Direta pelo Ministério Público

Um exemplo atual de retrocesso judiciário e legislativo, em detrimento dos interesses da sociedade como um todo, é a tentativa de retirar do Ministério Público seu poder de investigação criminal direta, sem a presença da Polícia, em nome de (improváveis) excessos que possa vir a cometer. Desde já, deve ser dito que tais possíveis excessos são facilmente puníveis, além do que a história comprova que eles mais ocorrem quando da investigação criminal patrocinada pelo tradicional sistema. E assim, nestes casos, a quem incumbiria a investigação? À mesma corporação da qual participa o investigado?

Antes da celeuma causada por recentes (e hermeneuticamente errôneas) decisões da 2ª Turma do Egrégio Supremo Tribunal Federal [13], o professor Afrânio da Silva Jardim já afirmava que é "até mesmo intuitivo que o Promotor de Justiça deva dispor de mecanismos técnico-jurídicos que permitam exercer plenamente a sua atribuição-fim, qual seja instaurar a ‘persecutio criminis in judicio’. Não estivesse expresso na Constituição e na legislação ordinária, de qualquer sorte, tratar-se-ia dos chamados poderes implícitos." [14]

Valter Foleto Santin, em obra de técnica apurada, assevera que "a previsão constitucional do Ministério Público ‘expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los’ (129, VI, CF) traz evidente a existência de vários ‘procedimentos administrativos’ de atribuição do parquet, além do inquérito civil. Para que serviria o poder de expedir notificação e requisitar informes e documentos para a sua instrução se o Ministério Público não pudesse instaurar os procedimentos administrativos?" [15]

Paulo Rangel assim se pronuncia: "A persecução penal feita, diretamente, pelo Ministério Público encontra amparo assim, na própria Constituição, pois, na medida em que se lhe entrega a defesa da ordem jurídica e dos direitos e garantias fundamentais, deve-se-lhe entregar também os meios pelos quais irá atuar para exercer tal mister. Até para que possa conter os abusos por parte dos agentes públicos que possuem função de investigar". [16]

Ademais deve ser grifado texto de Mario Luiz Bonsaglia, onde diz que "não existe, porém, no âmbito do MP, qualquer espírito de emulação para com a Polícia. A faculdade de efetuar diretamente as investigações é utilizada com prudência e parcimônia, como um complemento à função de controle externo da atividade policial, particularmente nos casos envolvendo delitos econômico-financeiros, em que a atuação da Polícia fica restringida diante da dificuldade de obtenção de informações sigilosas (bancárias ou fiscais)..." [17].

Nunca é demais citar Hugo Nigro Mazzilli: "Há larga diferença entre a diligência, comandada hoje pelo Ministério Público sob autorização judicial, e os execráveis tempos do arbítrio. Nos tempos da ditadura, o Ministério Público não raro era servil ao governo, e uma providência como esta de hoje jamais poderia ter sido tomada, a não ser que conviesse aos governantes de plantão. Hoje, ao contrário, o Ministério Público e o Poder Judiciário têm garantias, oriundas de uma Constituição legítima e democrática..." [18]

Importantíssima contribuição de direito comparado nos traz a Sub-Procuradora Geral da República Ela Wiecko de Castilho: "A tese de que o MP não pode participar da investigação criminal presta um desserviço à sociedade brasileira e se distancia da tendência mundial. A comparação entre os sistemas procedimentais penais mostra que há três grandes grupos de legislação, no tocante à investigação. O primeiro grupo, que dá à Polícia o monopólio, só existe na common law e os abusos motivaram a introdução de uma instituição semelhante ao MP, a Crown Prosecution Service. O segundo se caracteriza por uma associação da Polícia e do MP. O terceiro grupo prevê a investigação pela Polícia, pelo MP, e pelos juizados de instrução. Os juizados de instrução estão sendo abandonados pouco a pouco e, na prática, o papel fundamental tem sido o do MP. Em diversos países, as investigações são conduzidas pelo MP com o auxílio da Polícia. O 8° Congresso das Nações Unidas sobre o Delito, realizado em Havana, em 1990, aprovou a diretriz segundo a qual os membros do MP desempenharão um papel ativo no procedimento penal, incluída a iniciativa do procedimento e, nos termos da lei ou da prática local, na investigação dos crimes, na supervisão da legalidade dessas investigações, na supervisão das execuções judiciais e no exercício de outras funções como representantes do interesse público." [19]

Muitas vezes, o Promotor não se dá por satisfeito com os elementos que consegue reunir, nestes procedimentos de sua lavra, e requisita a instauração de inquérito policial, com o fito de obter elementos comprobatórios suficientes para denunciar. Todavia, tal inquérito policial é totalmente dispensável, segundo legislação, doutrina e jurisprudência solidificadas [20]. Fernando Capez, verbi gratia, afirma: "O inquérito policial não é fase obrigatória da persecução penal, podendo ser dispensado caso o Ministério Público ou o ofendido já disponha de suficientes elementos para a propositura da ação penal (CPP, arts. 12, 27, 39, §5°, e 46, §1°)" [21].

Também o STJ já tinha pacificado o tema, editando, em dezembro de 1999, a Súmula 234, onde diz que: "a participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia". Desta forma, não caberia, em hipótese alguma, argüir por uma imparcialidade do Promotor de Justiça nas investigações por ele realizadas. Inolvide-se que ele faz parte do aparato estatal de persecução criminal, sendo parte no processo penal. Hélio Tornaghi, há mais de quinze anos, já afirmava que: "(...) não há que se falar em imparcialidade do Ministério Público, porque então não haveria necessidade de um juiz para decidir a acusação (...). no procedimento acusatório, deve o promotor atuar como parte, pois se assim não for, debilitada estará a função repressiva do Estado. O seu papel, no processo, não é o de defensor do réu nem o de juiz, e sim o de órgão do interesse punitivo do Estado." [22]

Paulo Gustavo Guedes Fontes, Procurador da República em Sergipe, nos traz percuciente contribuição, que demonstra o quanto são infelizes e ilógicos os pensamentos contrários à tese ora defendida: "(...) deve-se ter em mente que a Lei n°. 8.429/92 autorizou o Ministério Público a conduzir inquéritos civis para apurar atos de improbidade administrativa. Existem milhares deles espalhados pelo país, no Ministério Público Federal e estaduais, em que se apuram atos de corrupção, dispensa indevida de licitações, superfaturamento etc., questões complexas do ponto de vista jurídico para as quais a Polícia nem sempre está preparada. Ao fim dessas investigações, o membro do Ministério Público dispõe de elementos suficientes para a propositura de ações civis por atos de improbidade administrativa. Pois bem, se as provas obtidas no inquérito civil indicarem também a prática de crime, devem ser consideradas imprestáveis para fins penais? Estará o procurador ou promotor proibido de ajuizar as ações penais cabíveis pelo fato de ter realizado as apurações? Estaríamos diante de um absurdo jurídico e prático, com afronta, inclusive, ao princípio constitucional da eficiência, que deve pautar a atuação de todas as esferas estatais." [23]

Ademais, já é até uma rotina ministerial, a instauração de procedimentos administrativos tendentes a apurar uma notitia criminis. Tal rotina jamais poderá deixar de existir, sob pena de ofensa ao direito difuso da coletividade a uma escorreita administração da segurança pública. Em posição de vanguarda, já há até quem defenda a impetração de ação civil pública para defesa deste direito difuso à segurança pública!!! [24]

Por fim, vale salientar a existência de jurisprudência no seio do próprio STF, da lavra de seu Tribunal Pleno, que deverá, por óbvio, prevalecer sobre as malsinadas decisões da Segunda Turma. Falamos da decisão da ADIN n°. 1.571/97, impetrada pelo Ministério Público Federal, onde se discutia a inconstitucionalidade (e assim foi declarada) do art. 83 da Lei n°. 9.430/96. Seu acórdão foi publicado no DJU, em 25/09/1998 e no Informativo 64 do STF, e nela foi relator o Exmo. Ministro Néri da Silveira. Eis brilhante trecho do venerando acórdão:

"É de observar, ademais, que, para promover a ação penal pública, ut art. 129, I, da Lei Magna da República, pode o MP proceder às averiguações cabíveis, requisitando informações e documentos para instruir seus procedimentos administrativos preparatórios da ação penal (CF, art. 129, VI), requisitando também diligências investigatórias e instauração de inquérito policial (CF, art. 129, VIII), o que, à evidência, não se poderia obstar por norma legal, nem a isso conduz a inteligência da regra legis impugnada ao definir disciplina para os procedimentos da Administração Fazendária."(grifo nosso)

Como pode o Ministério Público ajuizar uma ação penal contra o criminoso, e não poder investigá-lo? Qual dispositivo legal ou constitucional faz esta vedação? Há melhor forma de se convencer da culpa de um acusado do que acompanhar diretamente as investigações ou diretamente investigando-o? Não é o Ministério Público parte na ação penal? Com que finalidade se realiza esta empreitada jurídica desairosa e futuramente desastrosa de se retirar o poder investigatório do Ministério Público? Respondamos-nos, urgentemente!

Certamente, as respostas destas indagações obrigar-nos-ão a declarar-se totalmente contrários a esta exclusão, por ferir a Constituição Federal e todo o ordenamento jurídico nela alicerçado, conclamando toda a comunidade jurídica a colaborar e abraçar esta causa em nome do Ministério Público e de toda a sociedade!


4. Nomeação do Procurador-Geral da República

É muito óbvio que os membros do Ministério Público não são funcionários caracteristicamente subordinados, delegatários da legitimidade de outros Poderes do Estado, supostamente maiores. Subordinam-se, sim, ao reinado da legalidade e ao império de sua independência e consciência profissionais. Labutam eles com necessária parcela da soberania estatal, munus público outorgado pelo povo, através de sua Assembléia Nacional Constituinte. Nunca olvidemos que o poder é uno, e emana do Povo.

Desta feita, no cerne deste debate acerca de subordinação ministerial, vivemos a discussão sobre a pertinência e proveito social da atual forma de nomeação do Procurador Geral da República, por parte do Chefe do Executivo.

Até o advento da Constituição Federal de 1988 o sistema de escolha e nomeação do Procurador Geral da República era bastante precário, fragilizando em demasia a Instituição. Era ele nomeado e demitido ad nutum pelo chefe do Poder Executivo.

A Constituição de 1891 assim o tratava, em seu art. 58, §2°: "O Presidente da República designará, dentre os membros do Supremo Tribunal Federal, o Procurador Geral da República, cujas atribuições se definirão em lei".

Por sua vez, a Constituição de 1934, no art. 95, §1° afirmava: "§ 1º - O Chefe do Ministério Público Federal nos Juízos comuns é o Procurador-Geral da República, de nomeação do Presidente da República, com aprovação do Senado Federal, dentre cidadãos com os requisitos estabelecidos para os Ministros da Corte Suprema. Terá os mesmos vencimentos desses Ministros, sendo, porém, demissível ad nutum".

A CF de 1937 dizia em seu art. 99: "O Ministério Público Federal terá por Chefe o Procurador-Geral da República, que funcionará junto ao Supremo Tribunal Federal, e será de livre nomeação e demissão do Presidente da República, devendo recair a escolha em pessoa que reúna os requisitos exigidos para Ministro do Supremo Tribunal Federal."

Assim dispunha o art. 126 da Carta de 1946 a respeito da escolha do Procurador-Geral da República: "Art 126 - O Ministério Público federal tem por Chefe o Procurador-Geral da República. O Procurador, nomeado pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal, dentre cidadãos com os requisitos indicados no artigo 99, é demissível ad nutum".

Nesta evolução, basta relermos o art. 138 da CF/67 (cópia praticamente fiel do art. 126 da CF/46) e compreenderemos a fragilidade e a parcialidade com que era tratada a Chefia da Instituição noutros tempos: "O Ministério Público Federal tem por Chefe o Procurador-Geral da República, o qual será nomeado pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal, dentre cidadãos com os requisitos Indicados no art. 113, § 1º".

Por fim, assim dizia o art. 95 da Constituição Outorgada de 1969: "O Ministério Público federal tem por chefe o Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da República, dentre cidadãos maiores de trinta e cinco anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada".

Sauwen Filho nos traz contribuições de Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda: "Comentando esse dispositivo, Pontes de Miranda reprova-o, advertindo ser inconveniente a uma concepção de Ministério Público onde a independência é indispensável, afirmando que ‘órgão que fica exposto à vontade de outro órgão não tem independência que fora de mister à concepção do Ministério Público.’ É ainda Pontes de Miranda quem propõe a eleição direta do Procurador-Geral da República e por sufrágio universal, (...)." [25]

Atualmente, o Presidente da República escolherá dentre os integrantes da carreira com mais de 35 anos de idade, aquele que será o Procurador-Geral da República, e esta escolha deverá passar pelo crivo do Senado Federal, em argüição pública. Aprovada a escolha, o novo Procurador-Geral passa a ter mandato de dois anos, podendo ser reconduzido reiteradas e ilimitadas vezes. Todavia – em um dos maiores avanços da Constituição de 1988 –, não poderá ele ser destituído sem a deliberação da maioria absoluta do Senado. [26] Um outro avanço significativo é que ele somente poderá vir da própria carreira ministerial, não sendo mais um estranho aos quadros, o que era absurdamente pernicioso.

Este atual sistema estabeleceu, inegavelmente, algumas mudanças bastante proveitosas nos critérios de escolha, nomeação e demissão do Procurador-Geral da República. Todavia ainda há falhas. O sistema mostra-se inadequado para o fortalecimento da Instituição e a consecução dos direitos por ela defendidos, quebrantando sua independência perante os Poderes constituídos, mormente diante de nosso hipertrofiado Poder Executivo, e de um Poder Legislativo muitas vezes subserviente. Ao invés de demonstrar um critério de legitimidade, de um ponto de vista de representação política, presta-se a um crescente sentimento de descrédito e falta de confiança nas instituições públicas, sempre que as medidas adotadas pelo Ministério Público, mormente por este seu órgão maior – o Procurador Geral, refiram-se a atos, serviços e contratos da Administração, controlada que esta é pelo Executivo. Isto, além de muito enfraquecer a Instituição, colabora também para esmorecer a necessária crença no correto funcionamento da máquina administrativa.

É conforme já foi dito anteriormente: "a forma de escolha dos chefes do Ministério Público, tal como consagrada nos dispositivos constitucionais referidos, se bem analisada, peca pelo contraponto teleológico em relação ao próprio princípio da independência da Instituição. Isto porque a história tem sido farta em demonstrar que a opção por este ou aquele nome, realizada pelo chefe do Executivo, tem-se pautado, boa parte das vezes, em critérios de afinidade e comprometimento político do escolhido, com evidente prejuízo para os ditames finalísticos decorrentes da independência do ''Parquet'' e, bem por isso, atentando contra os princípios que, mercê do artigo 127, § 1º, da mesma Constituição, devem nortear todo o sistema" [27].

A exemplo do que acontece na totalidade dos Estados-membros da Federação brasileira, em respeito à regra do art. 9° da Lei n°. 8.625/93 [28], (que se baseou no art. 128, §3°, da Constituição), a maioria dos doutrinadores defende que deve haver a eleição direta dentro do seio da Instituição, estabelecendo-se uma lista tríplice, que seria encaminhada ao chefe do Poder Executivo, para a escolha do novo Procurador-Geral da República. Oficiosamente (posto que ainda não foi modificada a CF neste sentido), foi assim que ocorreu com a nomeação do atual Procurador-Geral da República, Cláudio Lemos Fonteles. Nos anos de 2001 e 2002, a ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República) organizou pleito informal com vistas de elaborar lista tríplice, a ser enviada ao chefe do Poder Executivo. Em ato pioneiro, foi através desta lista que, após entrevistas com os candidatos à Chefia da Instituição, foi escolhido pelo Presidente da República o nome do atual Procurador-Geral da República.

Feitas as devidas adaptações à realidade da União, importante contributo é trazido pelos membros ministeriais Antônio Augusto Mello de Camargo Ferraz e Paulo Roberto Dias Júnior, na análise deste sistema da lista tríplice: "Recaindo a escolha sobre outro integrante da lista tríplice que não o mais votado, o Procurador-Geral de Justiça corre o risco de passar seu curto mandato como Dâmocles, tendo sob sua cabeça a espada da desconfiança (de que esteja a serviço daquele que o nomeou). Mesmo quando agir de forma isenta, não faltará quem o acuse de parcialidade, comprometendo assim o conceito da instituição perante a sociedade. Pior: como o sistema admite uma recondução ao cargo, até mesmo a indicação do mais votado deixará plantada a semente da suspeita de que o Procurador-Geral não agirá com a independência esperada, sob pena de perder pontos na corrida para o eventual segundo mandato." [29]

Por sua vez, há quem defenda que o Chefe do Ministério Público da União deveria ser escolhido diretamente entre os próprios membros da classe. Tal sistema é temerário no que toca à legitimidade para atuação do Procurador-Geral. Corre-se, com ele, o grave risco de, legislativamente, verem-se perdidas funções instituições, que, pouco a pouco, seriam transferidas a outras instituições de cunho popular, como Comissões Parlamentares de Inquéritos, Ouvidorias eleitas pelo povo, júris populares etc. Deve-se buscar um ponto de equilíbrio entre a independência funcional da Instituição e a sua legitimidade. Assim, vale salientar a enfática análise de Antônio Augusto Mello de Camargo Ferraz e Paulo Roberto Dias Júnior: "Por essa razão, corre o Ministério Público – e, mais ainda do que ele, o Judiciário –, por insuficiência ou por falta de mecanismos adequados, o risco de viver permanente e invencível crise de legitimidade, a qual, paradoxalmente tende a se agravar na medida em que maior se tornar a relevância concreta de sua atuação. (...) Sob certo ângulo, o Ministério Público precisa ainda mais do que o Judiciário dessa legitimidade, pois não é (nem pretende ser) órgão imparcial e inerte, mas instituição ativa, agente, comprometida direta e exclusivamente com a defesa dos interesses da sociedade. (...) Vale enfatizar: perdendo todos os fios condutores com a sociedade, o Ministério Público não seria visto como instituição, mas como autêntica corporação, aquela que, na aguda observação de Hugo Nigro Mazzilli, passa a ‘viver precipuamente para suas atividades-meio, em vez de viver para suas atividades-fins [30]".

Outros há que optam pelo modelo da eleição direta, com a escolha do chefe de um órgão técnico sendo realizada pelos próprios cidadãos, no exercício do sufrágio universal. Pensamos haver um sério risco ao correto andamento das funções institucionais da corporação ministerial com tal adoção, baseada em conhecido modelo norte-americano. Mazzilli preconiza: "...os candidatos a Procurador-Geral poderiam assumir na campanha compromissos irrealizáveis, quando, na verdade, não depende deles toda a execução da atuação do Ministério Público, dada a independência funcional de cada membro da instituição. A tendência seria que os Procuradores-Gerais procurassem impor à instituição seus planos e projetos de campanha, com riscos à independência funcional dos Promotores, que, a bem da verdade, são hoje muito mais independentes e fazem muito mais o ofício de Ministério Público que os próprios Procuradores-Gerais" [31].

Inobstante as variegadas opiniões, a tendência do constituinte derivado é a escolha pelo sistema da lista tríplice, junto à posterior indicação do Presidente da República. No Projeto de Emenda Constitucional que cuida da afamada Reforma do Judiciário [32], introduziu-se modificação no §1° do art. 128 da CF. Diz ele, se for aprovado, que o Procurador-Geral da República será "escolhido pelo Presidente da República em lista tríplice de integrantes do Ministério Público Federal maiores de trinta e cinco anos e com mais de dez anos de carreira, eleitos por seus membros, e nomeado após aprovação da maioria absoluta do Senado Federal, para mandato de dois anos, permitida uma recondução".

Enfim, o mais importante para o Ministério Público é a diuturna busca pela sua independência e autonomia; e esta busca passará inelutavelmente pelo sistema de escolha do Procurador-Geral da República, que necessita ser modificado. Do contrário, com subordinação política externa, limitando seus poderes e sua autonomia, e com ostensiva manipulação política dos demais Poderes, certamente, os membros ministeriais atuarão menos em nome da sociedade que os legitima que em nome da autoridade que os nomeia, por estarem minudentemente preocupados com a repercussão política de suas decisões.


5. Quinto Constitucional

Também no calor do debate sobre a possível existência de uma subordinação está a nomeação de desembargadores dos Tribunais através do mecanismo do quinto constitucional. Assim diz a Constituição, em seu art. 94:

"Art. 94. Um quinto dos lugares dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais dos Estados, e do Distrito Federal e Territórios será composto de membros do Ministério Público, com mais de dez anos de carreira, e de advogados de notório saber jurídico e de reputação ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes.

Parágrafo único. Recebidas as indicações, o tribunal formará lista tríplice, enviando-a ao Poder Executivo, que, nos vinte dias subseqüentes, escolherá um de seus integrantes para nomeação.".

Esta regra é mera repetição, mutatis mutandis, do que estava dito no art. 144, inciso IV, da Constituição Outorgada de 1969, no art. 136, inciso IV da CF/67, no art. 124, inciso V, da CF/46, no art. 105 da Constituição Outorgada de 1937, e no art. 104, §6°, da CF/34. Observemos as abalizadas opiniões da doutrina nacional a respeito do tema.

Pelo ponto de vista da advocacia, Raul Haidar, advogado tributarista e ex-conselheiro da OAB-SP, assim se manifesta: "Ao submeter a lista sêxtupla ao crivo do próprio Tribunal de que o candidato deseja fazer parte, possibilita-se verdadeira submissão da Advocacia e do Ministério Público ao Poder Judiciário, o que prejudica a liberdade e a autonomia dessas instituições, em evidente prejuízo do interesse maior da Justiça. Outrossim, após a escolha dos Tribunais a decisão final pertence ao Poder Executivo. Isso acaba violando os mais elementares princípios de independência e autonomia que devem existir entre os poderes da República, ignorando o princípio clássico da sua tripartição. Não raras vezes a escolha final recai sobre o indicado que melhor tenha demonstrado defender os interesses do Executivo, desequilibrando a balança da Justiça" [33].

Já, representando o meio ministerial, o Procurador da República Hélio Telho Corrêa Filho assim se pronuncia: "Contam-se nos dedos as vezes em que o Ministério Público se atreveu a invocar a prestação jurisdicional, com vistas ao controle dos atos administrativos do Poder Judiciário. Grande parte dessa inoperância do Ministério Público deve-se à existência do chamado quinto constitucional, que restringe a necessária independência da Instituição. Com efeito, não raro os membros do Ministério Público que atuam perante os tribunais - a quem cabe a fiscalização dos atos administrativos e a invocação da prestação da jurisdicional visando o seu controle - almejam um dia compor seus quadros, de olho nas vagas constitucionalmente asseguradas aos egressos do parquet. Para tanto, precisam angariar a simpatia dos membros do tribunal, já que estes tem o poder de interferir no processo de formação das listas de onde sairá o escolhido (art. 94, Parágrafo único, da CR)." [34]

Através do olhar da magistratura, também vemos a opinião de Alexandre Nery de Oliveira, juiz do Trabalho e professor de Direito do Trabalho em Brasília/DF: "A alteração do atual artigo 94 da Constituição, portanto, quebrando-se a regra do denominado quinto constitucional nos Tribunais, imporia maior respeito à atividade de Advogados e Procuradores, notadamente em relação ao Ministério Público consagrando maior independência à atuação dos seus membros, porquanto sem qualquer interesse em integrar, em futuro qualquer, a Corte perante a qual exercem seus ofícios, enquanto, doutro lado, deveria consagrar a identidade de tratamento entre juízes, promotores, procuradores e advogados, em qualquer grau de atuação jurisdicional". [35]

Acreditamos já estar passada a hora de extirpar esta prática política extremamente demolidora da Instituição, que faz com que esta perca quadros burilados especificamente para a vida ministerial, em troca de um "arejamento" (de duvidosa necessidade) do ambiente dos Tribunais, obrigação sim de suas escolas de formação e dos concursos de ingresso à magistratura.

Ao menos o legislador poderia pensar em outras maneiras de levar avante esta "oxigenação" dos Tribunais. Utilizemo-nos do direito comparado, e facilmente perceberemos uma gama variada de opções de que se utiliza o legislador estrangeiro, para uma melhor consecução e administração de suas Justiças (e não do Poder Judiciário).

Sauwen Filho, assim, fala da similitude das carreiras da Magistratura e do Parquet Alemão: "A semelhança entre as duas carreiras é mais notada nos estados do sul da federação, especialmente na Baviera, onde embora se reconheça a distinção entre os dois quadros, tem-se por certo organizar as duas carreiras substancialmente de forma unitária. Isso permite a seus integrantes a passagem de um quadro a outro com maior facilidade. Examinando o fenômeno, é ainda Guarnieri quem fornece um exemplo ao referir o caso dos juízes nomeados e ainda em período probatório após a aprovação nos exames de acesso, mas ainda não gozando da inamovibilidade própria do cargo, que podem, ocasionalmente ser designados, por um certo tempo a servir num setor do Ministério Público, oficiando normalmente como membro do Parquet e exercendo funções a ele cometidas." [36]

Mais à frente, este mesmo autor fala um pouco sobre os Parquets francês e italiano, comparando-os às suas respectivas magistraturas: "Embora seja em sua gênese uma instituição derivada do Parquet francês, onde a Magistrature du Siège e o Ministério Público ou Magistrature du Parquet se inserem em carreiras ligadas entre si, o que permite aos Magistrados franceses a passagem de uma carreira a outra, o modelo observado no Ministério Público italiano não se confunde com o adotado na França, pois, enquanto neste último o Parquet atua, embora com independência funcional, sob a dependência hierárquica do Poder Executivo, na Itália, além de formar uma única carreira, regulada organicamente por um único instituto, existe a unir ainda mais os Magistrados o fato de exercerem indistintamente funções jurisdicionais e funções de Ministério Público sujeitos à orientação e disciplina de um mesmo mecanismo de poder – o Conselho Superior da Magistratura (CSM)." [37]

José Renato Nalini confirma tal informação: "Estados como a França e a Itália possuem uma só carreira para o Ministério Público e para a Magistratura. Carreira que permite contínuo intercâmbio, não só nos primeiros, mas nos graus finais de jurisdição. A germinação univitelínea de ambas as instituições está a mostrar que devem caminhar juntas, sem que os contingentes antagonismos as desviem do principal: fazer justiça." [38]

Desta forma, acreditamos que o caminho mais correto para o legislador, se não for seguir pela extinção completa do Quinto Constitucional, deveria ser pela criação de mecanismos de permuta entre os membros de ambas as carreiras, para que o arejamento e oxigenação sejam sempre recíprocos. As carreiras não são iguais em direitos e garantias? Assim, evitaríamos que uma carreira siga em reboque de outra, fornecendo-lhe treinados e excelentes representantes, sem o mínimo de retorno à Instituição do Ministério Público. Ambas são essenciais à função jurisdicional. Indispensável é lembrar que a Justiça não é o Poder Judiciário; antes, engloba-o. Os membros ministeriais que acreditam que só podem colaborar para a melhoria da Justiça inserindo-se nas fileiras do Judiciário infelizmente não têm compreendido, concessa vênia, a real importância social e jurisdicional da carreira e da instituição do Ministério Público.

Doravante, acaso não haja a desejada extinção, haverá certamente a recusa em participar das listas de votação por parte daqueles que estarão representando a Instituição, imbuídos que estarão de suas vocações e funções institucionais, dificultando a concreção dos objetivos de tal meio, nada eficaz, de composição dos Tribunais. Certamente, modificações então se farão necessárias.


6. O Ministério Público Eleitoral

A Constituição de 1934 previa expressamente a organização do Ministério Público junto à Justiça Eleitoral. Assim dizia o art. 98 daquela Carta:

"Art 98 - O Ministério Público, nas Justiças Militar e Eleitoral, será organizado por leis especiais, e só terá na segunda, as incompatibilidades que estas prescrevem".

Por sua vez, também a Constituição de 1946, em seu art. 125:

"Art 125 - A lei organizará o Ministério Público da União, junto a Justiça Comum, a Militar, a Eleitoral e a do Trabalho".

Também a Lei n°. 1.341/51 já afirmava pela existência do Ministério Público Eleitoral, em seu art. 1°, parágrafo único, quando dizia:

"(...) Parágrafo único. Os órgãos do Ministério Público da União, junto à justiça comum, à militar, à eleitoral e a do trabalho são independentes entre si, no tocante as respectivas funções."

Por sua vez, as CF’s de 67 e 69 não mencionaram expressamente o Ministério Público Eleitoral, delegando totalmente sua organização à Lei Orgânica do Ministério Público da União. Os mesmos motivos levaram a assim tratar a matéria a Constituição Federal de 1988, o que demonstra a inexistência de um tratamento sistemático-constitucional do Ministério Público Eleitoral.

Desta forma, fica a função de Ministério Público Eleitoral abarcada nas funções do Ministério Público Federal, por força da Lei Complementar nº 75/93, Título II, Cap. I, Seção X, arts. 72 a 80. Estes dispositivos regulam-na em todas as instâncias da Justiça Eleitoral, determinando sua atuação em todas as etapas do processo eleitoral. A chefia do Ministério Público Eleitoral é a chefia do Ministério Público da União, i.e., o Procurador-Geral Eleitoral é o Procurador-Geral da República.

Dois são os princípios que regem a atuação dos membros ministeriais em matéria eleitoral: a federalização e a delegação. A bem da verdade ambos são faces da mesma moeda. Pelo primeiro princípio quer se estabelecer que todas as funções eleitorais do Parquet devem ser exercidas por membros do Ministério Público Federal. É assim que comanda o caput do art. 72 da LC 75/93:

"Art. 72. Compete ao Ministério Público Federal exercer, no que couber, junto à Justiça Eleitoral, as funções do Ministério Público, atuando em todas as fases e instâncias do processo eleitoral."

Por sua vez, pela delegação são repassadas ao Ministério Público dos Estados e do Distrito Federal as atribuições de oficiar perante as primeiras instâncias eleitorais. A base legal desta delegação de competência são os arts. 78 e 79 da LC 75/93:

"Art. 78. As funções eleitorais do Ministério Público Federal perante os Juízes e Juntas Eleitorais serão exercidas pelo Promotor Eleitoral.

Art. 79. O Promotor Eleitoral será o membro do Ministério Público local que oficie junto ao Juízo incumbido do serviço eleitoral de cada Zona."

O Ministério Público, em seara eleitoral, poderá atuar como parte ou como fiscal da lei (com todos os ônus, direitos e deveres processuais inerentes a outras lides estranhas ao Direito Eleitoral onde atue o Ministério Público), em todas as fases do processo eleitoral (Preparatória, Votação, Escrutínio e Diplomação), em todas as instâncias da Justiça Eleitoral (Tribunal Superior Eleitoral, Tribunais Regionais Eleitorais, Juízes e Juntas Eleitorais), em todas as épocas (micro e macro processo eleitoral), e sempre com a mesma legitimidade outorgada aos candidatos, partidos e coligações partidárias.

Entre os vários diplomas legais que declaram esta legitimidade se encontram o art. 127 da Constituição Federal, o Código Eleitoral (Lei nº 4.737/65, em seu art. 24, entre outros dispositivos esparsos), a Lei das Inelegibilidades (LC nº 64/90, especificamente em seus arts. 3º e 22), a Lei nº 8.625/93 (art. 32), a LC nº 75/93 (nos citados artigos 72 a 80), a Lei Orgânica dos Partidos Políticos (Lei nº 9.096/95, em seus arts. 28 e 35, conquanto tenha sido tímida no tocante à atuação do Ministério Público Eleitoral). Inolvidem-se também os Códigos de Processo, com incidência supletiva e subsidiária no Direito Eleitoral Brasileiro.

É sabido por todos que uma das incumbências do Ministério Público pós-88 é a defesa do regime democrático. A magnitude desta função é absurdamente incalculável. Presta-se a infindas prosas. Todavia, uma coisa é certa: o legislador ainda não apreendeu bem esta importante destinação ministerial. De uma forma pulverizada, a Lei n°. 4.737/65, traz apenas alguns exemplos de atuação do Ministério Público em matéria eleitoral, não se coadunando com as novas destinações dadas pela CF/88 à Instituição. Ainda existe no organismo jurídico brasileiro um Código Eleitoral vivificado em épocas ditatoriais. É um desmedido contra-senso legislativo, requerendo-se providências.

Entretanto, com o fito de exemplificar ao leitor a atuação eleitoral do Ministério Público, ditada pelo Código Eleitoral, colacionamos enumeração do multicitado Hugo Nigro Mazzilli: "Afora o natural encargo de promover a ação penal pública no tocante aos crimes eleitorais, nessa matéria hoje só se fazem referências esparsas à intervenção do Ministério Público como: a) no processo das infrações penais; b) na cobrança de multas; c) na discriminação das atribuições dos procuradores-gerais respectivos, v.g., exercer a ação penal pública em todos os feitos de competência originária do tribunal; oficiar em todos os recursos; representar ao tribunal para observância e aplicação uniforme da legislação eleitoral; efetuar requisições; d) na fiscalização da abertura das urnas; e) na promoção de responsabilidade por nulidade de eleição; f) na argüição de suspeição; g) nos pedidos de registro de partidos e de seus órgãos dirigentes; h) no pedido de cancelamento de registro de partido; i) no pedido de desaforamento; j) nas justificações e perícias; l) na impugnação de registro de candidato; m) na propositura de ação visando à declaração da perda ou suspensão de direitos políticos." [39]

Octacílio Paula Silva assim já dizia, reportando-se ao límpido art. 79 [40] da revogada Lei Orgânica do Ministério Público da União, em defesa da liberdade de atuação do Promotor Eleitoral: "Isso significa que, sem embargo de regulamentação relativamente restrita no âmbito da legislação eleitoral, o Ministério Público tem atribuições próprias e inerentes à Instituição. Assim, em todas as atividades da Justiça Eleitoral (cujas principais funções foram relacionadas acima) em que haja violação da lei, decretos e atos emanados dos poderes públicos, ou cujos legítimos interesses forem prejudicados, sem falar na perpetração de crimes, aí estará sempre presente o Ministério Público para as providências legais cabíveis, acionando, se necessário, o mecanismo judiciário eleitoral (ou até mesmo outro juízo ou tribunal, se for o caso), no desempenho da sua nobre missão." [41]

Também já há vasto entendimento jurisprudencial pela ampla legitimidade do Ministério Público Eleitoral. Eis exemplo oriundo do Tribunal Superior Eleitoral:

"Agravo de instrumento. Decisão que negou seguimento a recurso especial interposto pelo Ministério Público Eleitoral sob o fundamento de ausência de legitimidade. Entendimento que se encontra superado. Essa Corte admite ampla legitimidade ao Ministério Público para recorrer no processo eleitoral. Precedentes. Agravo provido".(ac. nº 12.454-AM, j. 6.12.1994, rel. Min. Torquato Jardim, DJU 10.2.1995, p. 1949).

Questões que inegavelmente despontam, sobre o Ministério Público Eleitoral, são a forma de investidura e o período de exercício da função. Devido à inexistência do tratamento institucional-constitucional, se têm visto certos equívocos na forma de escolha do membro a oficiar perante os Juízes e Tribunais eleitorais, bem como na estruturação do ofício eleitoral.

Em relação à forma de escolha e nomeação, pensamos que deveriam ser criados cargos fixos de Promotor Eleitoral e Procurador Regional Eleitoral, eliminando qualquer forma de nomeação por rodízio [42] ou mandato, como se função comissionada fosse, devendo a designação se basear em critérios previamente determinados, sendo eles eminentemente técnicos e profissionais. Contudo, não vemos outra causa para a utilização destas equivocadas formas de designação que não sejam aquelas que estão dispostas nos arts. 50, inciso VI, e 70, da Lei n°. 8.625/93. Deve ser creditado ao legislador de 1993 um possível mau funcionamento do Ministério Público Eleitoral, a partir do momento em que ele tratou a função como se fosse uma gratificação, uma missão que só pudesse ser bem realizada com uma compensação pecuniária. Como não se poderia deixar de registrar, argumentação idêntica deve ser aplicada aos juízes eleitorais, em vistas da total equiparação das carreiras.

Por outro lado, em relação à estruturação do Ministério Público Eleitoral, fazemos nossas as palavras do professor gaúcho Joel José Cândido. Pelo princípio da federalização, elas bem cabem ao Ministério Público Federal, embora sejam diretamente ligadas aos Ministérios Públicos dos Estados: "Já é tempo de o Ministério Público Estadual se organizar e se preparar para atuar em Direito Eleitoral. As leis orgânicas estaduais devem dotar a Instituição de órgão administrativo adequado, com cargos criados para o exercício da atividade eleitoral. Um elenco mínimo de atribuições desse órgão, cuja finalidade deverá ser a de preparar o quadro funcional para o exercício das funções eleitorais, deve ficar bem definido, como já vem ocorrendo com as Fundações, Interesses Difusos, Defesa Comunitária, Criança e Adolescência, Proteção ao Meio Ambiente, etc." [43]


7. O Ministério Público junto aos Tribunais de Contas

Há apenas uma discreta menção na Constituição Federal a respeito destes representantes ministeriais, em seu art. 130:

"Art. 130. Aos membros do Ministério Público junto aos Tribunais de Contas aplicam-se as disposições desta seção pertinentes a direitos, vedações e forma de investidura".

Este Ministério Público Especial tem sua origem no ano de 1892, no Decreto n°. 1.166, quando se criou o Tribunal de Contas da União. O Decreto n°. 2.409, de 23/12/1896 considerava-o como o "guarda da observância das leis fiscais e dos interesses da Fazenda perante o Tribunal de Contas".Conquanto pudesse, por vezes, representar os interesses da Administração Pública, nela não estava limitado, nem dela era delegado; tendo, sim, personalidade própria para buscar a defesa da legalidade e da Justiça. A atual Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União, Lei n°. 8.443/92, conceitua, em seus arts. 80 e 81, o Ministério Público Especial, creditando ao mesmo a missão de guarda da lei e fiscal de sua execução, aplicando-se os princípios institucionais da unidade, independência e indivisibilidade funcional.

Conta-se que embora nos trabalhos prévios à promulgação da Constituição fosse este Ministério Público tratado como uma entidade autônoma, chegando a merecer uma alínea independente no art. 128 do Projeto Afonso Arinos, foi ele suprimido da redação final do citado artigo 128. Só que se esquecera o Constituinte de retirar do texto constitucional o também citado artigo 130. Este aparente contra-senso tem explicações históricas. Quem as fornece é J. F. Sauwen Filho: "Embora a Emenda Outorgada de 1969 não incluísse no universo de seus Parquets qualquer Ministério Público autônomo além dos Ministério Público da União, dos Estados e do Distrito Federal e Territórios, referidos nos seus artigos 94 a 96, o §5º do seu art. 72 prevendo o funcionamento do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, ensejou que, em diversos Estados da Federação, sem que se cuidasse, por lei, de implantar a efetiva atuação do Parquet junto àqueles órgãos, o que por si só já desatendia ao comando do texto constitucional, criassem, de forma inconstitucional, órgãos autônomos, alheios ao Ministério Público da União e dos Estados, que, sob a mesma denominação do ofício de Ministério Público, passaram a funcionar perante os Tribunais e Conselhos de Contas." [44](sic)

Destarte, da maneira que agora está, os membros do Ministério Público junto aos Tribunais de Contas possuem as mesmas vedações, os mesmo direitos e a mesma forma de investidura nos cargos dos membros do Ministério Público institucionalizado. Todavia, suas funções não foram explicitadas por esta mesma Constituição Federal, assim como há o peremptório desrespeito ao princípio da unidade institucional (art. 127, §1°, CF) trazendo dubiedades e mais causas de enfraquecimento para o Ministério Público, instituição à qual não é permitido cometer erros perante os jurisdicionados. Merece reparos tal situação.

O STF, por sua vez, já se posicionou sobre esta "instituição", entendendo existir um Ministério Público "especial" junto às Cortes de Contas, sem a autonomia institucional do Ministério Público da União, verbi gratia; porquanto ela integra a organização administrativa do Tribunal de Contas da União, ainda que privilegiada por regime jurídico especial. Por oportuno, transcrevemos a ementa da ADIN 789-1-DF, acórdão para onde remetemos o leitor em busca de maiores detalhes sobre o entendimento do Excelso Tribunal a respeito da matéria:

"E M E N T A - ADIN - LEI N. 8.443/92 - MINISTERIO PUBLICO JUNTO AO TCU - INSTITUICAO QUE NAO INTEGRA O MINISTERIO PUBLICO DA UNIAO - TAXATIVIDADE DO ROL INSCRITO NO ART. 128, I, DA CONSTITUICAO - VINCULACAO ADMINISTRATIVA A CORTE DE CONTAS - COMPETENCIA DO TCU PARA FAZER INSTAURAR O PROCESSO LEGISLATIVO CONCERNENTE A ESTRUTURACAO ORGANICA DO MINISTERIO PUBLICO QUE PERANTE ELE ATUA (CF, ART. 73, CAPUT, IN FINE) - MATERIA SUJEITA AO DOMINIO NORMATIVO DA LEGISLACAO ORDINARIA - ENUMERACAO EXAUSTIVA DAS HIPOTESES CONSTITUCIONAIS DE REGRAMENTO MEDIANTE LEI COMPLEMENTAR - INTELIGENCIA DA NORMA INSCRITA NO ART. 130 DA CONSTITUICAO - ACAO DIRETA IMPROCEDENTE."

Por fim, deve ser grifado que os membros do Ministério Público junto aos Tribunais de Contas têm atuação detida à matéria destes Tribunais, oficiando como fiscal da lei nos procedimentos e processos a eles pertinentes. Acaso se depare com algum ilícito penal ou civil, deverá remeter os autos ao "verdadeiro" Ministério Público, para as providências que o Promotor ou Procurador acreditar necessárias.

Remetemos o leitor ao disposto no Capítulo XII, do Título I, do Regimento Interno do Tribunal de Contas da União (Resolução n°. 155, de 04 de dezembro de 2002), em seus arts. 58 a 64, para que, através de leitura própria, observe as diferenças que pululam entre o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União e o Ministério Público da União.


8. A Ética do Membro Ministerial

Palavras iniciais a respeito da Ética Forense fazem-se necessárias. Assim, afirma Manuel Santaella López: "A deontologia jurídica há de compreender e sistematizar, inspirada em uma ética profissional, o status dos distintos profissionais e seus deveres específicos que dimanam das disposições legais e das regulações deontológicas, aplicadas à luz dos critérios e valores previamente decantados pela ética profissional. Por isso, há que distinguir os princípios deontológicos de caráter universal (probidade, desinteresse, decoro) e os que resultam vinculados a cada profissão jurídica em particular: a independência e imparcialidade do juiz, a liberdade no exercício profissional da advocacia, a promoção da justiça e a legalidade cujo desenvolvimento corresponde ao Ministério Público etc." [45]

Na tentativa de alinhar o comportamento ético dos representantes do Ministério Público, nestas suas precípuas funções de promoção de justiça e defesa da legalidade, alguns doutrinadores e profissionais envidaram muitos esforços.

No II Congresso Interamericano do Ministério Público, em 1956, na cidade de Havana, Cuba, J. A. César Salgado, ex-Procurador Geral de Justiça de São Paulo, apresentou aos participantes do evento o propalado "Decálogo do Promotor de Justiça [46]". Por sua vez, Octacílio Paula Silva, ex-Promotor de Justiça em Minas Gerais, no IV Congresso Nacional do Ministério Público, realizado em 1975, em Uberlândia-MG, apresentou aos congressistas o "Código Nacional de Ética do Ministério Público [47]", aprovado pelos mesmos naquela ocasião.

Atualmente, há que ser feita uma releitura destes documentos, obras-primas relativamente antigas e defasadas, diante dos novos preceitos constitucionais e legais em torno da matéria. Destarte, evoluindo neste debate sobre a deontologia ministerial faz-se mister observar algumas disposições, tais como os arts. 37, 127, 128 e 129 de nossa Constituição Cidadã, em conjugação com o Código de Ética e Disciplina da OAB, o Decreto nº. 1.171/94, o Código de Conduta da Alta Administração Federal, e, em especial, o que está dito na Lei nº. 8.625/93 e na LC n°. 75/93.

É nítido o grande incremento das funções institucionais do Ministério Público, mormente após a Carta de 88. Foram quase que totalmente equiparadas em garantias e vedações, as carreiras do Judiciário e do Ministério Público, o que, por si só, já é capaz de mensurar a importância do representante do Ministério Público para o legislador.

Diante desta evolução é que se encontra toda a comunidade jurídica brasileira – que vive o cotidiano dos fóruns e dos tribunais em companhia deste Promotor de Justiça acrescido de poderes, mas também de funções e responsabilidades correlatas; e, deve-se dizer, toda a população brasileira, que poderá se ver diante de uma ação civil pública ou de uma ação penal intentada por este reformulado Promotor de Justiça.

Como compatibilizar estas situações? Cremos que, com uma estrita obediência aos ditames deontológicos da carreira, teremos, sem sombra de dúvidas, a compatibilização entre o exercício das funções ministeriais e os direitos e garantias fundamentais de todos os cidadãos. Nunca esqueçamos das palavras de José Renato Nalini: "Inicie-se por considerar que o objetivo do fortalecimento institucional não foi redobrar o prestígio dos promotores, mas a realização do bem comum e, notadamente, o resgate dos semelhantes excluídos à cidadania. Um país que conseguiu a façanha de multiplicar a legião dos desvalidos, hoje contados aos milhões, precisa de instituições fortes para reverter esse quadro de iniqüidade. O promotor de justiça, até em seu nome, é operador predestinado a tanto". [48]

Assim, com o fim de fixarmos as premissas deontológicas atuais de todo membro do Ministério Público, leiamos atentamente o art. 43 da Lei n°. 8.625/93:

"Art. 43. São deveres dos membros do Ministério Público, além de outros previstos em lei:

I - manter ilibada conduta pública e particular;

II - zelar pelo prestígio da Justiça, por suas prerrogativas e pela dignidade de suas funções;

III - indicar os fundamentos jurídicos de seus pronunciamentos processuais, elaborando relatório em sua manifestação final ou recursal;

IV - obedecer aos prazos processuais;

V - assistir aos atos judiciais, quando obrigatória ou conveniente a sua presença;

VI - desempenhar, com zelo e presteza, as suas funções;

VII - declarar-se suspeito ou impedido, nos termos da lei;

VIII - adotar, nos limites de suas atribuições, as providências cabíveis em face da irregularidade de que tenha conhecimento ou que ocorra nos serviços a seu cargo;

IX - tratar com urbanidade as partes, testemunhas, funcionários e auxiliares da Justiça;

X - residir, se titular, na respectiva Comarca;

XI - prestar informações solicitadas pelos órgãos da instituição;

XII - identificar-se em suas manifestações funcionais;

XIII - atender aos interessados, a qualquer momento, nos casos urgentes;

XIV - acatar, no plano administrativo, as decisões dos órgãos da Administração Superior do Ministério Público."

Assim como o preceituado no art. 236 da Lei Complementar nº. 75/93, especificamente destinado ao membro do Ministério Público da União:

"Art. 236. O membro do Ministério Público da União, em respeito à dignidade de suas funções e à da Justiça, deve observar as normas que regem o seu exercício e especialmente:

I - cumprir os prazos processuais;

II - guardar segredo sobre assunto de caráter sigiloso que conheça em razão do cargo ou função;

III - velar por suas prerrogativas institucionais e processuais;

IV - prestar informações aos órgãos da administração superior do Ministério Público, quando requisitadas;

V - atender ao expediente forense e participar dos atos judiciais, quando for obrigatória a sua presença; ou assistir a outros, quando conveniente ao interesse do serviço;

VI - declarar-se suspeito ou impedido, nos termos da lei;

VII - adotar as providências cabíveis em face das irregularidades de que tiver conhecimento ou que ocorrerem nos serviços a seu cargo;

VIII - tratar com urbanidade as pessoas com as quais se relacione em razão do serviço;

IX - desempenhar com zelo e probidade as suas funções;

X - guardar decoro pessoal."

Os mandamentos encontrados nas disposições legais acima citadas são auto-explicáveis, não merecendo maiores digressões. Muitos deles são cânones éticos para qualquer profissão forense, não só a do Promotor de Justiça. Todavia, gostaríamos apenas de sublinhar alguns itens da enumeração trazida.

A obediência aos prazos processuais não pode nunca ser relaxada. É sabido por todos que há casos em que o Ministério Público tem prazo para se pronunciar, mas que esse prazo não acarreta nenhuma punição ao representante ministerial. Assim ocorre com a maioria dos casos em que ele atua como interveniente. Nestes casos, o representante deverá sempre envidar esforços para levar o processo adiante, sem que se atrase mais ainda a prestação jurisdicional, independente de não haver penalidades. Estas não existem, in casu, mas acreditamos existir um ônus ético ao não se respeitar tais "prazos impróprios". A razoabilidade e o caso concreto decidirão pela existência ou não de infringência do dever ético da diligência.

Por derradeiro, questão tormentosa é a do relacionamento juiz-promotor. Uma relação de cordialidade e urbanidade entre estes profissionais (ou entre quaisquer profissionais jurídicos) é presunção juris et de jure. Não haverá nunca hierarquia entre as carreiras. São eles – juízes e promotores de justiça – sempre autoridades processuais, e suas funções são bem delimitadas pelo ordenamento jurídico pátrio. Promotor requer, denuncia, recorre, promove, impetra; enquanto o juiz, sempre agindo por procuração, receberá ou rejeitará uma peça, absolverá ou condenará, decidirá. Mas, mesmo com toda a preparação por que passam estes profissionais, ainda se percebem atritos entre ambos, prejudicando a perfeição da prestação jurisdicional. Tentando solucionar questões deste escol, ficamos com o ensinamento do professor José Renato Nalini: "Ambos devem eliminar pruridos de sensibilidade extremada. A fogueira das vaidades chamusca as virtudes de um e outro. O sol nasceu para todos, há espaço para inúmeros talentos. Juiz e promotor são cúmplices na realização da Justiça, com a cumplicidade do advogado, da polícia, da comunidade, e até do réu". [49]

Os valores com os quais trabalha o representante do Ministério Público deverão ser bem sopesados, em cada atuação sua, sob pena de se ver frustrado o cumprimento dos cânones éticos da carreira ministerial. Não poderíamos deixar de encerrar este debate sobre a ética do membro ministerial sem antes trazer algumas palavras (já antigas) que demonstram o imenso e eterno choque axiológico existente à alma daqueles que, verdadeiramente, abraçam seu ofício. Em hipótese alguma devem ser esquecidas. Roberto Lyra: "Vale assinalar que o Promotor Público, pleiteante, polemista, não julga, critica. Deve, no entanto, emancipar-se de todos os fatores de subjetividade para corresponder ao seu papel exclusivo e fundamental. O retraimento das paixões e dos interesses, que repercutem na Justiça, não deve embaraçar, ou constranger, a sua comunhão com a vida. O Promotor Público precisa conhecer, compreender e interpretar todas as realidades, todas as lutas em que se chocam os homens, todos os problemas que se debatem na sociedade, para corresponder aos seus deveres, na polêmica judicial. Como homem público, na sua mais bela modalidade, renunciará, no exercício do cargo, a qualquer reserva mental, a qualquer preconceito, a qualquer facciosismo [50]".


9. Conclusões.

Hodiernamente, muito se discute acerca de uma possível reforma do Judiciário. Entretanto, a reforma deve ser mais ampla, deve sim ser a reforma da Justiça brasileira. Isto por que não se pode pensar em uma maior agilidade processual, em uma prestação jurisdicional de qualidade, sem antes pensar em modificar não só o Judiciário, mas também as funções essenciais à Justiça. Disto decorre a necessidade de se discutir melhorias no Ministério Público. Assim, chegamos a algumas conclusões no trabalho apresentado.

Deve ser extinta a instituição do Quinto Constitucional. Neste ponto específico, as carreiras ainda não se encontram equiparadas, estando o Ministério Público a fornecer seus quadros para compor as carreiras da Magistratura. Se o legislador achar por bem que a permuta deva continuar a existir, que a realize, então, de forma recíproca entre as carreiras, assim como ocorre em alguns países europeus que equipararam totalmente Ministério Público e Judicatura.

No estudo das hipóteses de atuação processual do Ministério Público, pensamos que deve ser bem sopesada a participação do Ministério Público como órgão interveniente. Nada é mais natural que a eleição de prioridades por parte de qualquer profissional, principalmente aqueles mais atarefados. Não poderia ser diferente com os representantes do Ministério Público. Como são múltiplas as funções a ele destinadas através da Constituição de 1988 (principalmente aquelas dirigidas ao Ministério Público agente), pensamos que as incumbências ministeriais como órgão de intervenção processual, anteriores à Carta Magna, deveriam ser repensadas pelo legislador brasileiro, a fim de que se otimizassem os recursos, tanto financeiros quanto humanos, da Instituição.

A investigação criminal direta pelo Ministério Público é prerrogativa constitucional inafastável da Instituição, para prevalência do interesse público em detrimento de interesses puramente corporativistas. Solidificado este entendimento, será maximizado o exercício da ação penal pública e melhor resguardado restará o direito difuso à adequada segurança.

A forma de nomeação do Procurador-Geral da República deve ser modificada. A urgência desta mudança já é ponto pacífico na doutrina pátria. A tendência legislativa é clara, no sentido de adotar a lista tríplice, usada nos Estados da Federação. Todavia, gostaríamos de deixar alguns adendos.

Cremos que não deve ser permitida mais que uma recondução ao Procurador-Geral da República em exercício. A categoria ministerial poderia, dentre seus membros interessados no cargo de Procurador-Geral da República, realizar a escolha da lista tríplice. Esta lista seria submetida à apreciação do Congresso Nacional, que realizaria a escolha definitiva. Por fim, esta escolha seria submetida ao crivo do Poder Executivo que, como nos vetos legislativos, somente poderia aceitá-la ou recusá-la. O Congresso, representando um Poder independente, poderia aceitar a recusa do Presidente da República e realizar novo pleito; ou nomear o candidato vitorioso, independente da aquiescência do Executivo. As virtudes deste processo seriam: uma forte legitimidade institucional, com a escolha da lista tríplice; uma boa dose de legitimidade difusamente popular, a partir do momento em que a escolha seria realizada pelo Poder Legislativo; e o fortalecimento do equilíbrio institucional, ao ser retirado do hipertrofiado Poder Executivo brasileiro a palavra final na escolha do Procurador-Geral da República, ao menos em tese. A bem da verdade, para que todas estas sugestões fossem bem-sucedidas, necessário seria que os representantes eleitos pelo povo mais se conscientizassem da importância de seu cargo para toda a sociedade, respeitando seus mandatos, e mais especificamente, o grave mister que lhes seria concedido de escolher o chefe da Instituição Fiscalizadora da Democracia e Defensora da Coletividade.

O membro ministerial não deve, nunca, olvidar de seus preceitos éticos, principalmente aqueles que se encontram no art. 43 da Lei n° 8.625/93 e no art. 236 da LC n°. 75/93. O Decálogo do Promotor de Justiça e o Código Nacional de Ética do Ministério Público, monumentos históricos de Deontologia Profissional, enquanto não forem reformulados, deverão ser lidos à ótica de nossa nova Constituição. O representante do Ministério Público deve estar ciente de seu papel social, e de sua inserção no panorama institucional brasileiro, bem interpretando os valores em choque em cada situação de conflito que se lhe apresentar, no exercício de suas funções.

Por sua vez, o Ministério Público Eleitoral deverá atuar de forma plena no processo eleitoral. Em anos eleitorais ou não; com a mesma legitimidade de partidos e candidatos; em todas as fases do processo eleitoral; em todas as instâncias da Justiça Eleitoral; sempre com todos os ônus, direitos e deveres processuais a ele inerentes. Para a busca da perfeição na realização destas funções, deverá ele possuir quadros fixos de Promotor Eleitoral e de Procurador Eleitoral, assim como ocorre com outras especializações na carreira. Como exemplo de funções fixas, basta citarmos as Câmaras de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, nas quais seus membros permanecem por tempo indeterminado.

Assim, pari passu a esta criação de cargos fixos do Ministério Público Eleitoral, pensamos que seria inarredável a extinção da gratificação por realização de função eleitoral, disposta nos arts. 50, inciso IV e 70, da Lei n°. 8.625/93. Assim como a defesa do regime democrático é encargo institucional do Ministério Público, consoante se depreende do caput do art. 127 da CF/88, também o é a defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Sabe-se que os membros do Ministério Público Eleitoral são a principal forma, senão única, pela qual o Parquet conseguirá obter sucesso nesta defesa do regime democrático. Ora, por que motivos só há gratificação para uma das funções ministeriais em detrimento de todas as outras? Urge modificar o tratamento legislativo da matéria, para escorreita evolução do Ministério Público Eleitoral Brasileiro.

Quanto ao Ministério Público junto aos Tribunais de Contas, se faz necessária mudança em seu tratamento, institucionalizando-o, em respeito ao princípio da unidade. Seriam criados, assim como no caso do Ministério Público Eleitoral, cargos fixos de Promotores e Procuradores junto aos Tribunais de Contas, nas carreiras dos respectivos Ministérios Públicos. A fiscalização do respeito à legalidade e ao interesse público, no âmbito dos órgãos que são incumbidos de auditar as contas públicas, seria, indubitavelmente, muito mais profícua e impessoal, com a função ministerial sendo exercida por pessoas não ligadas diretamente a estes Tribunais, como é hoje.

Assim, queremos crer ter trazido ao leitor alguma contribuição neste inafastável e inadiável debate sobre questões polêmicas acerca do Ministério Público. Foram necessárias opiniões pessoais, associadas a algumas doutrinas e jurisprudências de conhecimento geral, para que dúvidas fossem demonstradas e dirimidas. As respostas e dúvidas ficarão pairando sobre nossas mentes, decerto; mas importa afirmar que, em se concretizando vossas opiniões sobre cada um dos temas debatidos, deverão elas ser externadas, para o consenso geral, o crescimento institucional do Ministério Público, e, principalmente, para o bem do interesse público.

Vê-se, após as análises das questões polêmicas trazidas ao longo do texto, que o atual panorama social e jurisdicional brasileiro têm exigido do representante ministerial uma nova postura. Os equívocos do passado devem ser superados. Novos paradigmas e diretrizes de trabalho devem ser perquiridas, racionalizando-se e aprimorando-se as já existentes.

Conquanto haja um conflito a ser dirimido, entre o que ele realmente é capaz de fazer e o que idealmente dele se espera, o interesse público não permite ao Ministério Público deixar de se desenvolver; aprendendo com os erros e acertos do passado, acompanhando a evolução de toda a sociedade, na busca diuturna pela promoção da Justiça.


NOTAS

01. SALLES, Carlos Alberto de. Entre a Razão e a Utopia: A Formação Histórica do Ministério Público, apud VIGLIAR, José Marcelo Menezes & MACEDO JR., Ronaldo Porto (coordenadores). Ministério Público II: Democracia. São Paulo: Atlas, 1999, p. 41.

02. MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público. 3ª. Ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 58.

03. Muito embora o legislador constituinte tenha realizado concessões nebulosas, de interesse público absolutamente inexistente, no malfadado art. 29, §3°, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Brilhante o comentário de Hugo Nigro Mazzilli, em sua obra Introdução ao Ministério Público, p. 100, a respeito de uma das maiores máculas de nossa Carta Magna: "O dispositivo transitório, visando a acomodar situações particulares, acabou desnaturando em grande parte o novo perfil constitucional do Ministério Público".

04. CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. O Ministério Público no Processo Civil e Penal. 5ª. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994, p. 8-9.

05. "Art. 27. As despesas dos atos processuais, efetuados a requerimento do Ministério Público ou da Fazenda Pública, serão pagas a final pelo vencido."

06. "Art. 188. Computar-se-á em quádruplo o prazo para contestar e em dobro para recorrer quando a parte for a Fazenda Pública ou o Ministério Público."

07. "Art. 18. São prerrogativas dos membros do Ministério Público da União: (...) II - processuais: (...) receber intimação pessoalmente nos autos em qualquer processo e grau de jurisdição nos feitos em que tiver que oficiar."

08. "Art. 5º. A ação principal e a cautelar poderão ser propostas pelo Ministério Público, pela União, pelos Estados e Municípios. (...) § 1º O Ministério Público, se não intervier no processo como parte, atuará obrigatoriamente como fiscal da lei.(...)"

09. THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 29ª Ed. Vol I. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 151.

10. PORTO, Sérgio Gilberto. Sobre o Ministério Público no processo não-criminal. Rio de Janeiro: AIDE Editora, 1998, p. 37.

11. GUIMARÃES JR., João Lopes. Ministério Público: Proposta para uma nova postura no Processo Civil, apud FERRAZ, Antônio Augusto Mello de Camargo (coordenador). Ministério Público: instituição e processo. São Paulo: Atlas, 1999, p. 149.

12. GOMES, Maurício Augusto. Ministério Público, mandado de segurança e ação popular, apud ALVES, Airton Buzzo, RUFINO, Almir Gasquez & SILVA, José Antônio Franco da (organizadores). Funções Institucionais do Ministério Público. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 205.

13. Vide RE 233.072-RJ, RE 205.473-AL e RHC 81.326-DF.

14. JARDIM, Afrânio Silva. Direito Processual Penal – 6ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 339.

15. SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na Investigação Criminal. Bauru-SP: Edipro, 2001, p. 241.

16. RANGEL, Paulo. Investigação Criminal Direta pelo Ministério Público. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 148.

17. BONSAGLIA, Mario Luiz. O Ministério Público e a Investigação Pré-Processual. Boletim dos Procuradores da República – Ano 1 – N°. 11 – Março/99, p. 23.

18. MAZZILLI, Hugo Nigro. Ministério Público e o poder de investigação. Observatório da Imprensa, mai. 1999. Disponível em: <http://www.observatoriodaimprensa.com.br/cadernos/cid200599>.

19. CASTILHO, Ela Wiecko V. de. Investigação Criminal pelo Ministério Público. Boletim dos Procuradores da República – Ano 1 – N°. 11 – Março/99, p. 3-5.

20. STF-RTJ 76/741 e STJ-6ªTurma, RHC 5.094-RS, rel. Min. Vicente Leal, DJU, 20 maio 1996, p. 16742).

21. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 9ª Ed. São Paulo: Saraiva, p. 78.

22. TORNAGHI, Hélio. A relação processual penal, 2ª. Ed., 1987, p. 271 apud FONTES, Paulo Gustavo Guedes. O Poder Investigatório do Ministério Público. Boletim Científico ESMPU, ano II – n°. 8, p. 135.

23. FONTES, Paulo Gustavo Guedes. Op. cit., p. cit.

24. Sobre o tema ver o indispensável artigo de J. E. Carreira Alvim, Ação civil pública e o direito difuso à segurança pública, Revista Forense n° 368, p. 81-89.

25. SAUWEN F°., João Francisco. Ministério Público Brasileiro e o Estado Democrático de Direito. Rio de Janeiro: Renovar. 1999, p. 156.

26. Vejamos as disposições dos §§1° e 2° do art. 128 da CF: "§ 1º - O Ministério Público da União tem por chefe o Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da República dentre integrantes da carreira, maiores de trinta e cinco anos, após a aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos membros do Senado Federal, para mandato de dois anos, permitida a recondução.

§ 2º - A destituição do Procurador-Geral da República, por iniciativa do Presidente da República, deverá ser precedida de autorização da maioria absoluta do Senado Federal."

27. Matéria jornalística intitulada Procurador-Geral: a escolha do mais votado e o fortalecimento da democracia interna. Revista CONAMP EM REVISTA, n. 1, outubro/dezembro de 2002, p. 40.

28. "Art. 9º Os Ministérios Públicos dos Estados formarão lista tríplice, dentre integrantes da carreira, na forma da lei respectiva, para escolha de seu Procurador-Geral, que será nomeado pelo Chefe do Poder Executivo, para mandato de dois anos, permitida uma recondução, observado o mesmo procedimento.

§ 1º A eleição da lista tríplice far-se-á mediante voto plurinominal de todos os integrantes da carreira.

§ 2º A destituição do Procurador-Geral de Justiça, por iniciativa do Colégio de Procuradores, deverá ser precedida de autorização de um terço dos membros da Assembléia Legislativa.(...).

§ 4º Caso o Chefe do Poder Executivo não efetive a nomeação do Procurador-Geral de Justiça, nos quinze dias que se seguirem ao recebimento da lista tríplice, será investido automaticamente no cargo o membro do Ministério Público mais votado, para exercício do mandato."

29. FERRAZ, Antônio Augusto Mello de Camargo & DIAS JR., Paulo Roberto. Aperfeiçoamento do Sistema de Investidura do Procurador-Geral de Justiça: Pressuposto para a afirmação do Ministério Público como defensor do Regime Democrático apud VIGLIAR, José Marcelo Menezes & MACEDO JR., Ronaldo Porto (coordenadores). Op. cit. São Paulo: Atlas, 1999, p. 118.

30. FERRAZ, Antônio Augusto Mello de Camargo & DIAS JR., Paulo Roberto. Op. cit., p. 121.

31. MAZZILLI, Hugo Nigro. Propostas de um Novo Ministério Público. Revista Justitia, n° 62 (189/192), jan/dez-2000, p. 274.

32. PEC n°. 96/1992, da Câmara dos Deputados, e PEC n°. 29/2000, do Senado Federal.

33. HAIDAR, Raul H.. A Reforma do Judiciário e o quinto constitucional. Jus Navigandi, Teresina, a. 3, n. 34, ago. 1999. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=303>.

34. CORRÊA FILHO, Helio Telho. Controle do Poder Judiciário e o Ministério Público. Jus Navigandi, Teresina, a. 2, n. 22, dez. 1997. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=267>.

35. OLIVEIRA, Alexandre Nery de. Reforma do Judiciário (VIII): funções essenciais à Justiça. Jus Navigandi, Teresina, a. 3, n. 33, jul. 1999. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=222>.

36. SAUWEN F°., Op. Cit., p. 69.

37. Idem, ibidem, p. 84.

38. NALINI, José Renato Nalini. Ética Geral e Profissional. 2ª Ed. São Paulo: RT, 1999, p. 257.

39. MAZZILLI, Hugo Nigro. O Ministério Público e a Defesa do Regime Democrático. Revista de Informação Legislativa, n°. 138, abr./jun./98, p. 71.

40. "Art 79. Cabe aos Promotores, investidos na função de membros do Ministério Público Eleitoral, o exercício das atribuições que lhes compete, perante a Justiça comum, com observância das instruções baixadas pelo Procurador Regional."

41. SILVA, Octacílio Paula. Ministério Público. São Paulo: Sugestões Literárias, 1981, p. 389.

42. Comentário pertinente o de Jorge Alberto de Oliveira Marum: "...o rodízio fere frontalmente os princípios da inamovibilidade e do Promotor Natural, pois, ao término de um ano de exercício, o Promotor Eleitoral tem sua designação cessada para atuar nos feitos em que vinha trabalhando, sem que se tenha promovido, removido ou aposentado." O raciocínio é perfeitamente cabível para os casos de mandato do Promotor ou Procurador Eleitoral. Vide MARUM, Jorge Alberto de Oliveira. Ministério Público Eleitoral, apud VIGLIAR, José Marcelo Menezes & MACEDO JR., Ronaldo Porto (coordenadores). Op. cit. São Paulo: Atlas, 1999, p. 162-163.

43. CÂNDIDO, Joel José. Direito Eleitoral Brasileiro. 6ª Ed. – Bauru: Edipro, 1996, p. 58.

44. Op. Cit., p. 217.

45. LÓPEZ, Manuel Santaella. Ética de las profesiones jurídicas – Textos y materiales para el debate deontológico apud NALINI, José Renato. op. cit., p. 172-173.

46. Ver Anexo I deste artigo.

47. Ver Anexo II deste artigo.

48. NALINI, José Renato Nalini. Op. Cit., p. 255-256.

49. NALINI, José Renato Nalini. Op. Cit., p. 257.

50. Lyra, Roberto. Teoria e Prática da Promotoria Pública, 2ª Ed. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1989, p. 75.


BIBLIOGRAFIA:

ALVES, Airton Buzzo, RUFINO, Almir Gasquez & SILVA, José Antônio Franco da (organizadores). Funções Institucionais do Ministério Público. São Paulo: Saraiva, 2001.

BONSAGLIA, Mario Luiz. O Ministério Público e a Investigação Pré-Processual. Boletim dos Procuradores da República – Ano 1 – N°. 11 – Março/99.

CÂNDIDO, Joel José. Direito Eleitoral Brasileiro. 6ª Ed. Bauru: Edipro, 1996.

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 9ª Ed. São Paulo: Saraiva.

CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. O Ministério Público no Processo Civil e Penal. 5ª. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994.

CASTILHO, Ela Wiecko V. de. Investigação Criminal pelo Ministério Público. Boletim dos Procuradores da República – Ano 1 – N°. 11 – Março/99, p. 3-5.

CORRÊA FILHO, Helio Telho. Controle do Poder Judiciário e o Ministério Público. Jus Navigandi, Teresina, a. 2, n. 22, dez. 1997. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=267>.

FERRAZ, Antônio Augusto Mello de Camargo (coordenador). Ministério Público: instituição e processo. São Paulo: Atlas, 1999.

FONTES, Paulo Gustavo Guedes. O Poder Investigatório do Ministério Público. Boletim Científico ESMPU, ano II – n°. 8.

HAIDAR, Raul H.. A Reforma do Judiciário e o quinto constitucional. Jus Navigandi, Teresina, a. 3, n. 34, ago. 1999. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=303>.

ALVIM, J. E. Carreira. Ação civil pública e o direito difuso à segurança pública. Revista Forense, n° 368, p. 81-89.

JARDIM, Afrânio Silva. Direito Processual Penal. 6ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997.

Lyra, Roberto. Teoria e Prática da Promotoria Pública, 2ª Ed. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1989.

MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público, 3ª. Ed. São Paulo: Saraiva, 2000.

_____________________, Ministério Público e o poder de investigação. Observatório da Imprensa, mai. 1999. Disponível em: <http://www.observatoriodaimprensa.com.br/cadernos/cid200599>.

_____________________, O Ministério Público e a Defesa do Regime Democrático. Revista de Informação Legislativa, n°. 138, abr./jun./98.

_____________________, Propostas de um Novo Ministério Público. Revista Justitia, n° 62 (189/192), jan/dez-2000, p. 274.

NALINI, José Renato Nalini. Ética Geral e Profissional. 2ª Ed. São Paulo: RT, 1999.

OLIVEIRA, Alexandre Nery de. Reforma do Judiciário (VIII): funções essenciais à Justiça. Jus Navigandi, Teresina, a. 3, n. 33, jul. 1999. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=222>.

PORTO, Sérgio Gilberto. Sobre o Ministério Público no processo não-criminal. Rio de Janeiro: AIDE Editora, 1998.

RANGEL, Paulo. Investigação Criminal Direta pelo Ministério Público. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2003.

SANTIN, Valter Foleto. O Ministério Público na Investigação Criminal. Bauru-SP: Edipro, 2001.

SAUWEN F°., João Francisco. Ministério Público Brasileiro e o Estado Democrático de Direito. Rio de Janeiro: Renovar. 1999.

SILVA, Octacílio Paula. Ministério Público. São Paulo: Sugestões Literárias, 1981.

THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 29ª Ed. Vol I. Rio de Janeiro: Forense, 1999.

VIGLIAR, José Marcelo Menezes & MACEDO JR., Ronaldo Porto (coordenadores). Ministério Público II: Democracia. São Paulo: Atlas, 1999.


ANEXO I

DECÁLOGO DO PROMOTOR DE JUSTIÇA

I. AMA a Deus acima de tudo, e vê no homem, mesmo desfigurado pelo crime, uma criatura à imagem e semelhança do Criador.

II. SÊ DIGNO de tua grave missão. Lembra-te de que falas em nome da Lei, da Justiça e da Sociedade.

III. SÊ PROBO. Faze da tua consciência profissional um escudo invulnerável às paixões e aos interesses.

IV. SÊ SINCERO. Procura a verdade, e confessa-a, em qualquer circunstância.

V. SÊ JUSTO. Que teu parecer dê a cada um o que é seu.

VI. SÊ NOBRE. Não convertas a desgraça alheia em pedestal para teus êxitos e cartaz para tua vaidade.

VII. SÊ BRAVO. Arrosta os perigos com destemor, sempre que tiveres um dever a cumprir, venha o atentado de onde vier.

VIII. SÊ CORTÊS. Nunca te deixes transportar pela paixão. Conserva a dignidade e a compostura que o decoro de tuas funções exige.

IX. SÊ LEAL. Não macules tuas ações com o emprego de meios condenados pela ética dos homens de honra.

X. SÊ INDEPENDENTE. Não te curves a nenhum poder, nem aceites outra soberania, senão a da lei.

ANEXO II

CÓDIGO NACIONAL DE ÉTICA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Respeitando os desígnios de Deus, os ditames da lei e procurando atender aos anseios da sociedade, o Representante do Ministério Público, no desempenho de suas funções e ao pautar a sua conduta respeitará o presente Código de Ética.

I - DIREITOS E DEVERES GERAIS

São amplos e variados os direitos e deveres do Representante do Ministério Público. Cumpre-lhe exercê-los com dignidade, probidade, equilíbrio, firmeza, independência; com espírito de humanidade e justiça.

Cumpre ainda ao Representante do Ministério Público – além de outras normas aqui não expressas mas que possam resultar do exercício funcional honrado e consciente:

1.Ser firme, intrépido, no cumprimento dos seus deveres; comedido e justo nas críticas, nas denúncias, nas acusações;

2.Dar um tratamento humano – dentro da lei e deste Código – aos injustiçados, perseguidos, humildes, desesperados, doentes e encarcerados;

3.Receber justa remuneração, tudo fazendo por merecê-la, recusando qualquer outra vantagem menos lícita, pouco digna;

4.Repelir qualquer tipo de influência estranha ao livre e consciente exercício das funções quer pelas portas generosas da política, da amizade, do parentesco, da bajulação; quer pelas insinuações maliciosas do suborno ou pela ação ilegítima das pressões. Não proteger nem admitir proteção injustificada;

5.Guardar sigilo do seu proceder, a não ser em razão do próprio dever funcional, evitando publicidade promocional em torno de questões específicas que possam expor as pessoas, ferir direitos humanos;

6.Cumprir fielmente os deveres estatutários e de cidadão, assumindo as responsabilidades do Cargo, as obrigações comunitárias;

II – QUANTO ÀS PARTES

1.Atender as partes e seus procuradores com atenção, polidez, respeito, resolvendo ou encaminhando convenientemente os seus casos e problemas;

2.Assistir – com dedicação e lealdade, em todos os trâmites – as partes a que cumpre legalmente assistir, tudo fazendo para a solução favorável das suas questões, para a proteção dos seus direitos e interesses;

3.Prestar serviços desinteressados, não só nos casos de obrigação legal, mas também àqueles que necessitam de orientação, de ajuda, notadamente os humildes;

4.Ser nobre e comedido na acusação criminal, não ofendendo, mesmo no criminoso, a dignidade da pessoa humana;

5.Eximir-se de indicar profissionais determinados nos casos de medidas cuja iniciativa é vedada ao órgão do Ministério Público, de modo que a preferência de uns possa implicar em concorrência aos demais;

6.Organizar os serviços de modo a não cometer falhas, imperfeições, capazes de ocasionar prejuízos às partes ou a terceiros, comprometendo o prestígio do Cargo, o bom nome da Instituição do Ministério Público;

III – EM JUÍZO

1.Tratar com atenção, deferência, respeito, independência os órgãos de contato funcional, os colegas de trabalho, desde os mais importantes aos mais humildes;

2.Eximir-se de discutir com o órgão judicante, os serventuários, as partes e seus procuradores o teor ou aspectos dos pareceres, dos pontos de vista exarados nos processos ou proferidos em razão de ofício, a não ser no que se refere aos princípios jurídicos atinentes ao caso, de modo a não provocar contendas ou ressentimentos;

3.Manifestar espontaneamente os casos de impedimento legal, declinando, da mesma forma, os motivos de suspeição por razões particulares ou de foro íntimo;

IV – QUANTO ÀS ENTIDADES PÚBLICAS E À SOCIEDADE

1.Defender – com prioridade, esforço e espírito público – os direitos e interesses da Fazenda, dos poderes públicos, da coletividade;

2.Apoiar as associações e campanhas de cunho legitimamente comunitário; prestigiar as comemorações cívico-sociais; cuidar de manter um bom e desinteressado relacionamento com as autoridades constituídas;

3.Inspirar elevado nível moral, não só entre colegas de trabalho, mas também entre as demais autoridades e funcionários com que tenha contato diverso, bem como no relacionamento social;

4.Deixar de prevalecer das prerrogativas do Cargo para favorecer, ainda que indiretamente, a interesses particulares, quer oriundos de outras profissões cujo exercício for permitido, quer de interesses variados. Não negligenciar os interesses da Instituição em benefício de qualquer outra atividade, ainda que estatutariamente não proibida;

V – QUANTO À INSTITUIÇÃO E AOS COLEGAS

1.Concorrer para a eficiência e uniformidade dos serviços; para o aprimoramento da Carreira, para o engrandecimento do Ministério Público;

2.Advogar sem paixão a defesa da Instituição, não com palavras vãs, mas com o exemplo, o sacrifício de constante zelo profissional e de boa conduta;

3.Aprimorar-se em seu mister com estudo, aplicação, mantendo-se atualizado com novos conhecimentos e técnicas eficazes, divulgando trabalhos científicos de interesse jurídico-social;

4.Eximir-se de práticas viciosas, de atitudes pouco honradas, prejudiciais ao desempenho e ao conceito do Cargo, ainda que comumente praticadas, que costumeiramente admitidas;

5.Evitar divulgar ou comentar atitudes censuráveis de colega, a não ser através de comunicação direta aos órgãos competentes em razão do dever legal;

6.Procurar galgar os postos hierárquicos da Carreira dentro dos critérios legais de real merecimento, sem interferência política ou qualquer outro meio além do eficiente desempenho, da habilitação técnica, capacidade e honradez de conduta. Observar os mesmos requisitos isentos, quando tiver que opinar com relação à carreira de outrem;

7.Exercer a função – não com o objetivo de livrar-se dos serviços, despachando meramente papéis – mas empenhando-se consciente e fidedignamente em desincumbir-se bem dos encargos diversos, em toda a sua plenitude.


Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Victor Roberto Corrêa de. Ministério Público: questões polêmicas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 229, 22 fev. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4866. Acesso em: 28 mar. 2024.