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Competência criminal da Justiça Federal

Competência criminal da Justiça Federal

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Procuraremos abordar, ainda que sumariamente, casos práticos de competência criminal da Justiça Federal: crimes políticos, contrabando e descaminho, tráfico, crimes praticados por prefeitos e ex-prefeitos, crimes ambientais, lavagem de dinheiro...

1. INTRODUÇÃO

             Através deste artigo, pretendemos trazer uma singela colaboração aos leitores no sentido de fomentar o debate sobre algumas dúvidas a respeito da competência criminal da Justiça Federal, tentando, ao final deste debate, dirimi-las. Tema que proporciona discussões infindáveis na doutrina e jurisprudência, a competência, como medida de uma das faces de nossa soberania – a jurisdição, é um saber obrigatório ao operador jurídico. Um processo decidido por juiz incompetente poderá ser declarado totalmente nulo, fazendo com que tempo e dinheiro sejam perdidos, propiciando situações não permitidas ao Poder Público, como a prescrição de uma prática criminosa ou dispêndios desnecessários de dinheiro público na busca da resolução de um determinado processo criminal.

             Primeiramente, seguiremos numa breve digressão a conceitos basilares, como jurisdição, competência, espécies de competência, distribuição, perpetuação da competência, prorrogação da competência, delegação de competência, conexão e continência, premissas verdadeiramente indispensáveis a todo bom estudioso do Direito Processual, mas que, normalmente, permanecem recônditas nas memórias dos operadores do Direito.

             Em seguida, procuraremos abordar, ainda que sumariamente, diante da vastidão de temas, vários casos práticos de competência criminal da Justiça Federal, como causas acerca de crimes políticos, crimes praticados em detrimento de bens e serviços de entes federais, crimes contra a fé pública, crimes de contrabando e descaminho, crimes de tráfico internacional de entorpecentes, crimes praticados por prefeitos municipais e ex-prefeitos (inconstitucionalidade da Lei 10.628/2002), crimes ambientais, crimes praticados por servidor público federal, crimes contra populações indígenas, crimes de tráfico de crianças e mulheres, crimes de tortura, crimes de pornografia infantil e pedofilia, crimes de corrupção ativa e tráfico de influência em transações comerciais internacionais, crimes contra a organização do trabalho, crimes de submissão e redução à condição de escravidão, crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, crimes contra a ordem econômico-financeira, crimes de lavagem de dinheiro e capitais, crimes praticados a bordo de navios e aeronaves e processos de habeas corpus na JF.

             Assim, com estas palavras, almejamos trazer luz aos temas criminais de competência da Justiça Federal.


2.CONCEITO DE JURISDIÇÃO

             Fernando Capez assim fornece seu conceito de jurisdição: "jurisdição é a função estatal exercida com exclusividade pelo Poder Judiciário, consistente na aplicação de normas da ordem jurídica a um caso concreto, com a conseqüente solução do litígio. É o poder de julgar um caso concreto, de acordo com o ordenamento jurídico, por meio do processo (1)".

             Por sua vez, Galeno Lacerda assevera que jurisdição é "a atividade pela qual o Estado, com eficácia vinculativa plena, elimina a lide, declarando e/ou realizando o direito em concreto (2)".

             De seu turno, Cândido Rangel Dinamarco assim a conceitua: "função do Estado, destinada à solução imperativa de conflitos e exercida mediante a atuação da vontade do direito em casos concretos (3)".

             Athos Gusmão Carneiro afirma que jurisdição é "o poder (e o dever) de declarar a lei que incidiu e aplicá-la, coativa e contenciosamente, aos casos concretos (4)."

             Pensamos nós que a jurisdição é o poder-dever que possui o Estado de exercer sua soberania sobre os jurisdicionados, solucionando as contendas que a ele afluem, de forma coercitiva, mediante a atuação da vontade objetiva do ordenamento jurídico, respeitando-se incondicionalmente os ditames da Constituição Federal.

             Inolvide-se que a corrente dissensão verificada entre jurisdição civil e penal subsiste apenas sob o aspecto doutrinário. A jurisdição, como uma das três formas de expressão da soberania estatal, ao lado da Legislatura e da Administração, não carece substancialmente de tais adjetivações. Sob o aspecto ontológico, ela é una.

             Mas, na prática é inevitável distingui-las, com o fito de serem fixadas as competências das varas criminais e não-criminais, assim como das seções e turmas dos inúmeros tribunais espalhados pelo país. Desta maneira, tais órgãos do Poder Judiciário, em face da prática de um crime, solucionarão os conflitos visualizados entre a pretensão punitiva do Estado e o direito à liberdade do indivíduo, tendo sua competência fixada pelas normas de organização judiciária.


3.CONCEITO DE COMPETÊNCIA

             Enrico Tullio Liebman determina que: "a competência é a quantidade de jurisdição cujo exercício é atribuído a cada órgão, ou seja, a medida da jurisdição. Em outras palavras, ela determina em que casos e com relação a que controvérsias tem cada órgão em particular o poder de emitir provimentos, ao mesmo tempo em que delimita, em abstrato, o grupo de controvérsias que lhe são atribuídas (5)."

             Por seu turno, Athos Gusmão Carneiro: "a competência, assim, é a medida da jurisdição, ou, ainda, é a jurisdição na medida em que pode e deve ser exercida pelo juiz (6)".

             Fernando Capez afirma que "competência é a delimitação do poder jurisdicional (fixa os limites dentro dos quais o juiz pode prestar jurisdição). Aponta quais os casos que podem ser julgados pelo órgão do Poder Judiciário. É, portanto, uma verdadeira medida da extensão do poder de julgar (7)."

             Como visto, uma das formas do Estado realizar as funções que a ele são incumbidas é através do Poder Judiciário, por meio da jurisdição, solucionando os conflitos que a ele chegam, impondo concretamente a solução que deseja o ordenamento jurídico nacional.

             Não pode deixar de ser clarividente o fato de que não será a jurisdição encargo de apenas um juiz. Desta maneira, temos que a competência é o conjunto de normas jurídicas dispostas a distribuir a jurisdição entre os vários órgãos do Poder Judiciário, ante a imensa variedade de demandas possíveis. Assim, a cada um destes órgãos estará direcionada uma parcela da jurisdição, sendo permitido a cada um dos juízes aplicar o direito nos moldes e limites que a lei impõe.

             Por fim, vale aqui ressaltar que é tecnicamente incorreto afirmar que membros do Ministério Público possuem competência. Possuem, sim, atribuições. Ficamos com a elucidação cabal de Marcellus Polastri Lima: "Nunca é desnecessário frisar que, em relação ao Ministério Público, há de se cogitar de atribuição e não de competência, apesar de alguns autores assim se referirem, uma vez que esta diz respeito à jurisdição, atinente, portanto, ao Poder Judiciário" (8). Entretanto, via de regra, os critérios para fixação das atribuições é o mesmo que é disposto para a fixação da competência dos juízes.


4.ESPÉCIES DE COMPETÊNCIA

             Doutrinariamente, temos que a competência para dirimir as lides criminais se determina pelo estudo de três aspectos da causa em estudo:

             a-Natureza do crime praticado – é a competência in ratione materiae;

             b-Função social das pessoas incriminadas – é a competência in ratione persona;

             c-Local onde foi praticado o crime ou onde consumou-se, ou o local de residência do réu – é a competência in ratione loci.

             4.1 Delimitação da competência in ratione materiae:

             Por primeiro, devemos determinar qual o juízo competente em razão da natureza da infração penal praticada.

             A competência da Justiça Federal é expressamente descrita pela CF/88, em seu art. 109. Aquilo que não couber à mesma, e nem às outras Justiças Especializadas, caberá, por exclusão, à Justiça Estadual.

             Eis os incisos do art. 109 da CF, que tratam de matéria criminal afeta à Justiça Federal:

             "Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

             (...)

             IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;

             V - os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;

             VI - os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira;

             VII - os "habeas-corpus", em matéria criminal de sua competência ou quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos não estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição;

             VIII - os mandados de segurança e os "habeas-data" contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de competência dos tribunais federais;

             IX - os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar;

             X - os crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro, a execução de carta rogatória, após o "exequatur", e de sentença estrangeira, após a homologação, as causas referentes à nacionalidade, inclusive a respectiva opção, e à naturalização;

             XI - a disputa sobre direitos indígenas."

             Importante é não olvidarmos do fato de que esta competência é numerus clausus, não sendo permitido ao legislador infraconstitucional criar novas situações ensejadoras da competência da Justiça Federal, sem a devida e prévia previsão constitucional.

             O Código de Processo Penal, em seu art. 69, III, trata da competência in ratione materiae:

             "Art. 69. Determinará a competência jurisdicional:

             (...)

             III - a natureza da infração;"

             4.2 Delimitação da competência in ratione persona:

             Fixada a competência da Justiça Federal em razão da natureza do crime praticado, cumpre observar o grau do órgão jurisdicional que será competente para julgar a matéria. Buscar-se-á definir se a competência será originalmente destinada ao juiz singular ou aos tribunais correlacionados.

             Essa delimitação também é realizada por nossa Carta Magna, de acordo com a prerrogativa de função do incriminado. Devido à importância do cargo que exercem algumas pessoas, a CF entendeu que elas teriam o direito de serem julgadas em foro privilegiado por prerrogativa de função. Com isso, restariam preservadas tanto a independência do agente político no exercício de sua função, enquanto estiver sendo processado e julgado; quanto a independência e isenção do órgão julgador, em suas decisões processuais, proferidas de forma imune a pressões políticas externas. Ao menos esta maior imunidade é aquilo que se espera e se presume, por parte dos julgadores colegiados.

             Os Tribunais Regionais Federais, vale grifar, exercem vários casos de competência criminal in ratione persona delineados pela CF, em seu art. 108, I, a:

             "Art. 108. Compete aos Tribunais Regionais Federais:

             I - processar e julgar, originariamente:

             a) os juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho, nos crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério Público da União, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;"

             Cabe afirmar, arrimado em Mirabete, que "a competência originária por prerrogativa de função dos Tribunais se exerce em uma única instância, não cabendo recurso ordinário da decisão" (9). Fernando Capez, por sua vez, assevera que "gozando o autor de crime doloso contra a vida de foro por prerrogativa de função estabelecido na Constituição Federal, a competência para processa-lo e julga-lo será deste foro especial e não do Júri, já que a própria Carta Magna estabelece a exceção à competência do Tribunal Popular" (10).

             O Código de Processo Penal, em seu art. 69, VII, trata da competência in ratione persona:

             "Art. 69. Determinará a competência jurisdicional:

             (...)

             VII - a prerrogativa de função."

             4.2.1 Lei 10.628/2002. Inconstitucionalidade.

             De se observar que o privilégio de foro determinado pelos critérios legais de competência in ratione persona, a bem da verdade, não é estabelecido em razão da pessoa em si, mas sim em razão da função pública que exerce, não havendo, portanto, em sua aplicação, qualquer ofensa ao princípio da isonomia. Por este motivo, ao agente público somente será concedido o foro privilegiado enquanto estiver ocupando a função que lhe proporcionou tal privilégio. Se após a cessação do exercício da função, o outrora agente público tiver que responder pelos atos praticados durante sua estada na mesma, em vários órgãos jurisdicionais distintos, terá sido este o ônus de ter ocupado tal função pública. A razão pela qual lhe foi concedido o foro privilegiado não mais subsiste com o desligamento da função que ocupava. Diante disto, se nos mostra absurdamente inconstitucional o §1° do art. 84 do CPP, incluído pela Lei 10.628, de 24.12.2002, que concede a prerrogativa de foro para julgar atos administrativos do agente, mesmo que a ação judicial ou o inquérito tenha se iniciado após a cessação do exercício de sua função pública. Tal dispositivo quer nos parecer uma verdadeira dádiva a administradores improbos, confeccionado no apagar das luzes do Governo Federal do quadriênio 1998-2002. Por ora, indispensável a transcrição de decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região acerca desta inconstitucionalidade:

             "CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL - COMPETÊNCIA ESPECIAL POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO - CRIME ATRIBUÍDO A EX-PREFEITO MUNICIPAL - INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 84, § 1º, DO CPP INTRODUZIDO PELA LEI 10.628/02 - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU. 1. O foro especial por prerrogativa de função representa execução

             material do princípio da igualdade, na medida em que objetiva conferir a tutela adequada ao exercício da função pública e somente pode ser reconhecido nas situações específicas constitucionalmente previstas. Assim, qualquer interpretação que amplie a proteção à função pública, de modo a alcançar a pessoa que já não a exerce atenta contra o princípio da isonomia.

             2. Inaptidão de lei ordinária para modificar materialmente o conteúdo do comando constitucional que dispõe sobre competência originária de tribunal.

             3. Na hipótese de crime atribuído a ex-prefeito municipal, cessado o mandato o ex-ocupante retorna ao status quo ante, por não mais subsistir o fator determinante da competência originária do tribunal fundada na prerrogativa da função.

             4. Acolhida argüição de inconstitucionalidade incidenter tantum, suscitada pela Procuradoria Regional da República, para declarar a inconstitucionalidade do § 1º, do art. 84, do Código de Processo Penal, com a redação atribuída pela Lei 10.628/02, com a remessa dos autos ao juízo federal competente. (TRF 3ª Região – Inquérito 80 - Proc. 94030942371 – Dec. 25.09.03 – DJU 30.09.03, p. 146, Rel. Mairan Maia)."

             No mesmo caminhar, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região:

             "1. O foro por prerrogativa de função só prevalece durante o exercício do mandato, conforme é entendimento hoje pacífico no Excelso STF, que revogou a Súmula nº 394 daquele Tribunal, que dispunha em sentido diverso. (...)(TRF 2ª Região – HC 3107 – Dec. 12.08.03 – DJU 15.09.03, p. 190, Rel. Alberto Nogueira)."

             Por sua vez, lamentavelmente, os Tribunais Regionais da 1ª, 4ª e 5ª Região, arrimados na denegação de liminar pelo STF na discussão da ADIN 2797, impetrada contra o dispositivo em comento, têm optado pela presunção de constitucionalidade do §1° do art. 84 do CPP, até segunda ordem. Indagamo-nos pelos motivos que geram decisões neste sentido, temendo em decretar inconstitucionalidade tão flagrante, mesmo que incidenter tantum, se o próprio Pretório Excelso vinha se posicionando no sentido desta inconstitucionalidade. Inolvide-se o cancelamento da Súmula 394 do STF, em 25.08.99, que dispunha no exato sentido desta inconstitucional disposição. E, por fim, veja-se a óbvia Súmula 451 do Pretório Excelso: "A competência especial por prerrogativa de função não se estende ao crime cometido após a cessação definitiva do exercício funcional". Ao crime anterior que venha a ser processado e julgado após a cessação de mandato, o foro privilegiado também não se destina. Acompanhando esta súmula 451: STJ-QOAPN – 211, STJ-HC - 23952.

             4.3 Delimitação da competência in ratione loci:

             A competência in ratione loci é a competência de foro, sendo estabelecida de acordo com o lugar onde foi consumado o delito, em conformidade com o caput do art. 70 do CPP:

             "Art. 70. A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução."

             É o lugar da prática delituosa o mais indicado para se instaurar o processo penal. É nele onde se encontrarão mais facilmente as provas do crime, assim como é no lugar do crime que a aplicação da pena melhor cumprirá um de seus objetivos: a prevenção geral.

             Com a opção pela teoria do resultado para a determinação da competência, contrapôs-se este artigo à teoria da ubiqüidade, eleita pelo Código Penal, em seu art. 6°. Sendo assim, o que importará para a definição da competência será o local onde se produziu o resultado da conduta criminosa. Neste sentido, leia-se as súmulas 200 (11) e 244 (12) do STJ.

             Subsidiariamente, em outras duas hipóteses poderá a competência ser firmada através do domicílio ou residência do réu.

             A primeira ocorre quando for desconhecido o lugar da infração. É como determina o art. 72 do CPP. O estudioso deve estar atento que aqui não estamos falando de incerteza do limite territorial entre duas circunscrições, caso em que se aplica o critério da prevenção, disposto no art. 70, §3° do CPP.

             A segunda forma verifica-se nas ações de iniciativa exclusivamente privadas, onde ao querelante é dado optar entre o foro do local da infração e o foro do domicílio do réu (art. 73 do CPP).

             Neste ínterim, o Direito Processual Penal vai buscar subsídios no Código Civil para bem diferenciar os conceitos de domicílio e residência, dispostos em seu Título III, Livro I, arts. 70 a 78.

             Por fim, vale ressaltar que a competência in ratione persona prevalece sobre a competência pelo lugar da infração.

             O Código de Processo Penal, em seu art. 69, I e II, trata da competência in ratione loci:

             "Art. 69. Determinará a competência jurisdicional:

             I - o lugar da infração;

             II - o domicílio ou residência do réu;"

             4.4 Competência por distribuição

             A competência também pode ser fixada através da distribuição. O Código de Processo Penal, em seu art. 69, IV, trata da competência pela distribuição:

             "Art. 69. Determinará a competência jurisdicional:

             (...)

             IV – a distribuição;"

             Fixado o foro competente, poderá haver mais de um juiz competente, diante do que será pela distribuição que se fixará concretamente a competência para o caso. Dividir-se-ão a quantidade de processos existentes no foro entre os juízes que são previamente considerados competentes em razão do lugar, da matéria e da função. Vejamos o art. 75 do CPP:

             "Art. 75. A precedência da distribuição fixará a competência quando, na mesma circunscrição judiciária, houver mais de um juiz igualmente competente."

             Observemos que normas concernentes à distribuição de processos constituem-se em regras de organização judiciária e, diante disto, cabem tanto à União quanto aos Estados, relativamente a suas Justiças, disciplinar a matéria de acordo com suas peculiaridades, a teor do art. 125 da Carta Constitucional.


5.MODIFICAÇÃO DA COMPETENCIA

             5.1 Perpetuação da competência

             É o consagrado princípio da "perpectuatio jurisdictionis". Por tal princípio, a competência se firmará no momento em que a ação é proposta. Mesmo em havendo alguma mudança nos elementos processuais que foram utilizados para definir a competência, esta não poderá mudar. Irrelevantes serão as mudanças de fato ou de direito que venham a ocorrer posteriormente, porquanto inalterável será a competência determinada. Por exemplo, comumente ocorrem mudanças de residência ou domicílio das partes ou mudanças legislativas nas leis que determinam critérios de escolha da competência territorial, mas não será por tais motivos que a competência antes determinada será modificada. Ressalte-se, entretanto e desde já, que tal princípio sofre exceções, como se vê infra.

             Está transcrito no art. 87 do CPC:

             "Art. 87. Determina-se a competência no momento em que a ação é proposta. São irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem o órgão judiciário ou alterarem a competência em razão da matéria ou da hierarquia."

             Este princípio, embora não previsto expressamente no Código Processual Penal, é plenamente admitido pelo Direito Processual Penal, a teor do art. 3° do CPP:

             "Art. 3o A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito."

             Assim decidiu o STJ: "Proposta a ação penal, ainda quando não instalada a vara federal no interior do Estado, firma-se a competência do Juiz processante, ante a combinação dos arts. 3° do CPP e 87 do CPC" (STJ, 5ª T., RHC 4.796/SP, DJU, 20.11.95, p. 39611).

             As exceções a esta regra estão previstas no mesmo art. 87, in fine:

             - Salvo quando suprimirem o órgão judiciário: A primeira exceção é óbvia. Suprimido o órgão que era jurisdicionalmente competente, os processos deste órgão não poderão deixar de ser encaminhados a outro órgão jurisdicional.

             - Ou alterarem a competência em razão da matéria ou da hierarquia: A segunda exceção refere-se a casos de competência absoluta. Como as regras de competência absoluta são baseadas no interesse público, em busca de uma Administração da Justiça mais eficiente, o entendimento deste dispositivo deve ser no sentido de que se uma lei nova modifica a competência, em razão da matéria ou da hierarquia, é porque o legislador quis dotar o processo de uma maior efetividade e celeridade. Diante disto, quando, por exemplo, a única vara criminal de uma seção judiciária da Justiça Federal se subdivide em duas, criando uma Vara de Crimes Ambientais, é por que quis o legislador dar uma melhor atenção ao andamento de processos de crimes ambientais que ali existiam, devendo estes serem encaminhados à nova vara de crimes ambientais. Assim, se a finalidade da criação de novas Varas da Justiça Federal é agilizar a prestação jurisdicional, devemos então buscar uma interpretação teleológica do art. 87 do CPC. É a instrumentalidade do processo penal se materializando, através do princípio processual civil da perpetuação da competência.

             No sentido de manter a competência da vara originária quando a vara criada não for destinada a julgamento de matérias diferentes, Vladimir Souza Carvalho traz decisão singular asseverando pela "competência do juízo da 2ª vara criminal federal de São Paulo para o processo e julgamento do feito, porquanto recebeu a denúncia antes da instalação das varas federais de Piracicaba, pela aplicação ao processo penal do princípio da perpetuatio jurisdictionis, decorrente do art. 87, do CPC c.c. o art. 3°, do CPP (Juiz Sinval Antunes, HC 95.03.016320-0-SP, DJU-II 06.06.95, p. 34.950)" (13).

             5.2 Prorrogação da competência

             Por este princípio processual, a competência de um determinado juízo é alargada, para deter causas que, originariamente, dele não seriam. Este alargamento da competência só poderá se dar por permissão de lei.

             Pode se dar de forma voluntária, nos casos onde a parte não interpõe exceção de incompetência territorial nos prazos legais, como dispõe o art. 108 do CPP; ou no caso de ações penais de iniciativa exclusivamente privada, onde o querelante tem duas opções de escolha do ajuizamento da ação: o foro do domicílio do réu ou o foro do local da infração (art. 73 do Código de Processo Penal). Ou, também, a prorrogação da competência pode se dar de forma necessária, como nas hipóteses de conexão e continência, adiante estudadas. Outros exemplos de prorrogação necessária de competência, segundo Mirabete, são a "desclassificação para infração de competência para infração de competência de juízo inferior, permanecendo a anterior (art. 74, §2°), de exceptio veritatis nos crimes contra a honra de pessoas sujeitas à competência originária da jurisdição superior (art. 85)" (14).

             5.3 Conexão e continência

             Conexão e continência, como se sabe, não são critérios de fixação da competência, mas sim de sua modificação.

             A economia processual ordena, nestes casos, que o juiz intervenha, de ofício, e reúna os processos, com o fito de se harmonizar a decisão do Poder Judiciário. (art. 105, CPC). É como leciona Marino Pazzaglini Filho, em judicioso artigo na Revista Justitia, quando diz que tais critérios "têm por finalidade a adequação unitária e a reconstrução crítica unitária das provas a fim de que haja, através de um único quadro de provas mais amplo e completo, melhor conhecimento dos fatos e maior firmeza e justiça nas decisões, evitando-se discrepância e contradições entre os julgados" (15).

             A conexão e a continência em matéria criminal ocorrem de maneira um pouco distinta da forma do Processo Civil. Da leitura dos arts. 103 e 104 do CPC depreende-se que: quando duas ações possuírem idênticos objetos, ou idênticas causas de pedir, são entendidas ambas como conexas; já a continência ocorreria quando, além de serem iguais as causas de pedir e as partes em litígio, o objeto de uma ação engloba o objeto da outra.

             Por sua vez, a matéria é assim tratada no Código de Processo Penal:

             "Art. 76. A competência será determinada pela conexão:

             I - se, ocorrendo duas ou mais infrações, houverem sido praticadas, ao mesmo tempo, por várias pessoas reunidas, ou por várias pessoas em concurso, embora diverso o tempo e o lugar, ou por várias pessoas, umas contra as outras;

             II - se, no mesmo caso, houverem sido umas praticadas para facilitar ou ocultar as outras, ou para conseguir impunidade ou vantagem em relação a qualquer delas;

             III - quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra infração.

             Art. 77. A competência será determinada pela continência quando:

             I - duas ou mais pessoas forem acusadas pela mesma infração;

             II - no caso de infração cometida nas condições previstas nos arts. 51, § 1o, 53, segunda parte, e 54 do Código Penal."

             Vê-se que a conexão do art. 76 do Código de Processo Penal divide-se em conexão material/substantiva (incisos I e II) e conexão processual/probatória/instrumental (inciso III).

             A conexão material ainda se subdivide em conexão subjetiva (infrações praticadas por várias pessoas em concurso, ou umas contra as outras), em conexão objetiva (infrações praticadas para ocultar outras), e em conexão subjetiva-objetiva (infrações praticadas por várias pessoas reunidas almejando conseguir impunidade em relação a qualquer delas).

             Quanto à continência, temos que, na hipótese do inciso I do art. 77 do CPP, há crime em concurso de pessoas (16), em que duas ou mais pessoas colaboram para a consecução da conduta criminosa, mas onde há a diversidade de critérios de fixação da competência, como prerrogativa de função para um dos agentes criminosos ou a eventualidade da localização diversa de cada um destes colaboradores. Assim, nestes casos, conquanto haja a diversidade de foros competentes, deverá o julgador buscar a unidade de julgamento de ambos os agentes.

             O inciso II do art. 77 refere-se a condutas descritas nos dispositivos originais do Código Penal. Foram eles modificados, devendo a menção ser direcionada aos artigos 70, 73 e 74 da nova Parte Geral do Código Penal, ditada pela Reforma de 1984. Referem-se estes artigos aos casos de práticas delituosas verificadas nas condições de concurso formal de crimes (17), erro na execução (18) (aberratio ictus) e resultado diverso do pretendido (19) (aberratio criminis).

             Com Mirabete, nestas ocasiões de conexão e continência "em que foram instauradas ações penais separadas, o juiz com o foro prevalente deve avocar o processo em curso em outro Juízo; o não prevalente deve remeter os autos à autoridade judiciária competente" (20). Os critérios para a determinação do foro prevalente são esmiuçados nos arts. 78 a 82 do CPP. Em não havendo foro prevalente, o juiz que primeiro conhecer de uma das causas se tornará prevento para as demais, como determina o art. 78, II, c do CPP. As regras para determinar qual será o juiz prevento se encontram no art. 83 do Código de Processo Penal (21).

             Interessa-nos, em demasia, a regra determinada para os casos de conexão e continência de crimes da competência da Justiça Federal e da Justiça Estadual. Embora não haja entre elas hierarquia, o extinto TFR vinha julgando pela exclusão da regra do art. 78, II, a do CPP, firmando a competência, nestes casos, à Justiça Comum Federal. Lembremos da Súmula 52 do TFR, neste patamar. Tal entendimento também foi seguido pelo STJ, ao ditar, em sua Súmula 122: "Compete à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de competência federal e estadual, não se aplicando a regra do art. 78, II, "a", do Código de Processo Penal." Por fim, solidificando esta regra, em nome da competência constitucional expressamente delimitada da Justiça Federal e em detrimento da competência residual da Justiça Estadual, a Suprema Corte também vem seguindo a premissa da Súmula 122 do STJ. Transcrevemos excerto de voto proferido pelo Ministro Sepúlveda Pertence, em decisão de habeas corpus: "Ao votar, na linha do parecer da Procuradoria-Geral, o em. relator aplicou ao caso acórdão de minha lavra, no qual, em caso de conexão emprestei força atrativa à competência da Justiça Federal - especial em relação à Justiça dos Estados - de modo a atrair os crimes conexos a infrações de caráter federal, que à Justiça local ordinariamente tocaria julgar (HC 68.339, 19.2.91, Pertence, RTJ 135/672)(...)" (22).

             Porém, importa observar que, na ocorrência de crimes conexos da competência da Justiça Federal e da Justiça Militar, não é permitida a junção de processos para julgamento, regramento este determinado pelo art. 79, I, do CPP. Os processos, portanto, serão julgados separadamente.

             5.4 Delegação de competência

             Por razões várias (como celeridade processual e instrumentalidade do processo), o ordenamento jurídico impõe que, em determinadas situações, haja uma cooperação judicial entre os vários juízos e tribunais, delegando atribuições jurisdicionais de um a outro. São os casos de delegação de competência.

             Nos casos criminais que sejam da competência da Justiça Federal, em que há a delegação de competência, o embasamento constitucional é o mesmo para as causas cíveis: o artigo 109, §3°. Ei-lo:

             "§ 3º - Serão processadas e julgadas na justiça estadual, no foro do domicílio dos segurados ou beneficiários, as causas em que forem parte instituição de previdência social e segurado, sempre que a comarca não seja sede de vara do juízo federal, e, se verificada essa condição, a lei poderá permitir que outras causas sejam também processadas e julgadas pela justiça estadual."(grifo nosso)

             Athos Gusmão Carneiro indaga, e em seguida elucida: "Pergunta-se: quais serão estas outras causas? Quaisquer feitos? Não. Estas ‘outras causas’ deverão evidentemente estar compreendidas no elenco do art. 109 da Constituição, devem ser ‘causas federais’, sob pena de admitirmos possa a lei ampliar a competência recursal do Tribunal Regional Federal da área de jurisdição do juiz de primeiro grau – art. 109, §4°. (23)".

             Assentado na legislação e jurisprudência nacional há apenas um tipo de causa criminal passível de delegação: o processo e julgamento de crimes de tráfico internacional de entorpecentes. Assim dispõe o art. 27 da Lei n°. 6.368/76, plenamente recepcionada pela Constituição Federal:

             "Art. 27. O processo e o julgamento do crime de tráfico com exterior caberão à justiça estadual com interveniência do Mistério Público respectivo, se o lugar em que tiver sido praticado, for município que não seja sede de vara da Justiça Federal, com recurso para o Tribunal Federal de Recursos".

             O TFR pacificou a matéria, à sua época, editando a Súmula 54, nestes termos: "compete à Justiça Estadual de primeira instância processar e julgar crimes de tráfico internacional de entorpecentes, quando praticado o delito em comarca que não seja sede de vara do Juízo Federal".

             De seu turno, o STF, arrimado no art. 20 da antiga Lei 5.726/71, editou a Súmula 522, que assim diz: "salvo ocorrência de tráfico com o exterior, quando, então, a competência será da Justiça Federal, compete à Justiça dos Estados o processo e o julgamento dos crimes relativos a entorpecentes."

             Tal súmula, a teor do presente ordenamento jurídico, demonstra-se dispensável, não se determinando a hipótese em tela como caso de competência delegada. Isto por que é sabido que, em tese, a Justiça Federal não possui competência para julgar tráfico interno de entorpecentes. E, assim sendo, não se pode delegar aquilo de que não se tem competência.

             Importa observar que os crimes de tráfico interno, por vezes, encontram-se em conexão ou em continência com crimes sob a persecução do Ministério Público Federal, como o são o contrabando e o descaminho, cabendo, então, a decisão à Justiça Federal, respeitando-se o preceito da citada Súmula 122 do STJ. Vladimir Souza Carvalho: "...importante observar, ao lado do Juiz Vladimir Freitas, que, oferecida denúncia por tentativa de contrabando, cabe ao juiz federal proferir sentença de mérito, ainda que reconheça o tráfico como local, pois, se simplesmente declinar da competência para a justiça estadual, estará subtraindo do Ministério Público Federal o direito de recorrer ao Tribunal Regional Federal objetivando o reexame da matéria (RC 95.04.1214-8-PR, DJU-II 30.08.95, p. 55.751). (24)"

             Por fim, não é demais relembrar que a delegação de competência influi decisivamente na indicação do tribunal responsável por julgar conflitos de competência. Athos Gusmão Carneiro traz a sistematização correta: "Quando juiz estadual e juiz federal entram em conflito, a competência para apreciar o incidente é do Superior Tribunal de Justiça (CF, art. 105, I, d, in fine); porém, se o conflito se estabelece entre juiz estadual no exercício da jurisdição federal delegada e juiz federal, competente será o Tribunal Regional Federal (Súmula 3 do STJ), salvante se sediados um e outro em áreas sob jurisdição de Tribunais Regionais Federais diversos, hipótese em que o Superior Tribunal de Justiça conhecerá do conflito (CC 2.779-STJ, j. 28-10-1992, rel. Min. Athos Carneiro) (25)".


6. COMPETENCIA NOS CRIMES POLÍTICOS

             A CF de 1988, em seu art. 109, IV, assim determina:

             "Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: (...)

             IV - os crimes políticos (...), excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;"

             A priori, necessitamos conceituar o que seja crime político. Alberto da Silva Franco assim o trata: "O conceito de crime político tem sido enfocado na doutrina sob dois ângulos diversos. Alguns autores partem da natureza do bem jurídico tutelado e dizem político todo crime que lesione ou ameace lesionar a estrutura política vigente em um país. Outros, no entanto, tomam em consideração o móvel que anima o agente à ação criminosa e dizem político todo crime que apresenta uma motivação desse caráter (26)".

             Para conceituarmos o que seja crime político, devemos buscar subsídios, via de regra, na Lei n°. 7.170/83, que define os crimes contra a Segurança Nacional e a Ordem Política e Social, estabelecendo o processo respectivo. Embasados na jurisprudência e neste diploma legal, pensamos que só haverá crime político, quando estiverem presentes na conduta praticada os pressupostos do art. 2º da Lei nº 7.170/83, ao qual devem se integrar os do art. 1º da referida Lei. Ou seja, a materialidade da conduta deve lesar real ou potencialmente ou expor a perigo de lesão a soberania nacional e a ordem política, de forma que, ainda que a conduta esteja tipificada nos artigos da Lei de Segurança Nacional, será preciso que se lhe agregue o principal fator de configuração do crime em estudo: a motivação e objetivos políticos.

             No regime constitucional anterior, em disposição excepcional e justificada pelo nefasto regime político em que se vivia, a competência para decisão destas lides foi destinada à Justiça Militar. Assim dispunha o art. 129, §1°, da Constituição de 1969:

             "Art. 129. À Justiça Militar compete processar e julgar, nos crimes militares definidos em lei, os militares e as pessoas que lhes são assemelhadas.

             § 1º Esse foro especial estender-se-á aos civis, nos casos expressos em lei, para repressão de crimes contra a segurança nacional ou as instituições militares."

             Por sua vez, a própria Lei n°. 7.170/83, em seu art. 30:

             "Art. 30 - Compete à Justiça Militar processar e julgar os crimes previstos nesta Lei, com observância das normas estabelecidas no Código de Processo Penal Militar, no que não colidirem com disposição desta Lei, ressalvada a competência originária do Supremo Tribunal Federal nos casos previstos na Constituição.

             Parágrafo único - A ação penal é pública, promovendo-a o Ministério Público."

             Dispensável o comentário de que esta última norma não foi recepcionada pela Carta de 1988. A Lei de Segurança Nacional deve se compatibilizar com o sistema de competências criado pelo art. 109 da Constituição de 1988, detidamente em seu inciso IV. Ou seja, o julgamento dos crimes políticos caberá sempre à Justiça Federal, ressalvados, por sua natureza específica, os crimes tipicamente militares, definidos no Código Penal Militar, e os crimes propriamente eleitorais, descritos no Código Eleitoral, conquanto tenham eles natureza política indireta.

             De lege ferenda, no anteprojeto do novo Código Penal, em sintonia com a Portaria 232, do Ministério da Justiça, publicada em 24/03/1998, os crimes políticos passarão a ser capitulados no bojo do Código Penal. Serão tratados como crimes contra o Estado Democrático. Dentre os mesmos, poderemos perceber práticas como atentado à soberania, traição, aliciamento à invasão, violação do território, atentado à federação e espionagem (crimes contra a soberania nacional); sedição, sabotagem e atentado a chefe de poder (crimes contra a estabilidade democrática); atentado a direito de manifestação (crimes contra a cidadania).

             Releva observar que "ação de grupo de ‘sem-terra’ que interdita e saqueia caminhão contendo gêneros alimentícios para o próprio consumo e que não foi orientada nem acompanhada por organização política, não caracteriza crime político (Min. Fernando Gonçalves, CC 22.642-MS, DJU-I 27.09.99, p. 40). (27)"

             Por fim, deve ser ressaltado que a competência recursal das sentenças proferidas nestes tipos de ações criminais não é, como sói ocorrer, dos Tribunais Regionais Federais. O recurso a ser impetrado pela parte não será a apelação, mas sim o recurso ordinário, dirigido ao Supremo Tribunal Federal, como dispõe o art. 102, II, b, da CF (28).


7. COMPETENCIA PARA OS CRIMES EM DETRIMENTO DE BENS, SERVIÇOS E INTERESSES DA UNIÃO E ENTIDADES ASSEMELHADAS

             Esta é a competência criminal genérica da Justiça Federal, delineada no inciso IV do art. 109 da CF. Comumente, para que se configure esta competência serão necessários três requisitos: 1) a presença de ente federal privilegiado no pólo passivo da lide criminal; 2) o reflexo do delito em bem, interesse ou serviço de ente federal; e 3) a ocorrência de prejuízo ou dano a ente federal.

             Como a competência é criminal genérica – seja o crime consumado ou tentado, doloso ou culposo, e irrelevante o sujeito ativo – podem ser praticadas quaisquer tipos de condutas criminosas, de qualquer natureza, estejam elas insertas no Código Penal ou em leis extravagantes, ressalvada a competência criminal da Justiça Eleitoral e da Justiça Militar.

             Vale ressaltar, com Fernando Capez, que "o foro por prerrogativa de função estabelecido nas Constituições estaduais e leis de organização judiciária somente é válido perante as autoridades judiciárias locais, não podendo ser invocado no caso de cometimento de crimes eleitorais ou contra bens, interesses e serviços da União" (29).

             7.1 Entes federais privilegiados

             O conceito de entes federais privilegiados engloba a própria União diretamente, as entidades autárquicas federais (aí inclusas as fundações públicas federais), e as empresas públicas federais. Estando qualquer uma delas figurando como vítima de conduta delituosa, a competência para dirimir tais lides será da Justiça Federal. Impende ressaltar que a conduta criminosa deve afetar diretamente alguma destas pessoas jurídicas privilegiadas. A presença delas como assistentes em alguma relação processual, na medida dos arts. 268 e ss. do CPP, somente acarretará a competência da Justiça Federal se a pessoa jurídica privilegiada for também atingida pelo delito.

             Logo se vê, por sua vez, que estão excluídos deste privilégio de foro, as causas relativas a crimes praticados contra as sociedades de economia mista federais, as concessionárias de serviço público federal, as fundações privadas, e os sindicatos, como se têm entendido de forma unânime. É como fulmina a Súmula 42 do STJ: "Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar as causas cíveis em que é parte sociedade de economia mista e os crimes praticados em seu detrimento".

             7.1.1 União

             O termo União, empregado no dispositivo constitucional, abrange todos os órgãos, secretarias e subdivisões da Administração Direta, como os Ministérios, Agências, Departamentos, e tudo o que mais fizer parte destas repartições, integrando seus bens, interesses e serviços.

             7.1.2 Entes autárquicos federais

             Entre os entes autárquicos federais, integrantes da Administração Indireta, estão englobados: a) autarquias, aí inclusas as agências, de quaisquer tipos, reguladoras ou executivas (espécies de autarquia); b) as fundações públicas; e c) os conselhos de fiscalização profissional.

             7.1.2.1 Autarquias federais

             Há definição legal para as autarquias, disposta no art. 5°, inc. I, do Decreto-Lei n° 200/67, onde se afirma que autarquia é: "o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada."

             Todavia, preferimos seguir a sintética e feliz oração de Celso Antônio Bandeira de Mello, onde as autarquias são definidas como "pessoas jurídicas de Direito Público de capacidade exclusivamente administrativa" (30).

             As autarquias federais propriamente ditas detêm personalidade jurídica própria e liberdade administrativa de decisão, nos termos das leis que as criarem; e gozam de autonomia financeira, com o fito de desempenhar atividade tipicamente estatal. Consoante a dicção do art. 37, XIX, da CF, somente por lei podem ser criadas. Nada mais natural que estas representantes do interesse da União possuíssem uma justiça especializada para as causas em que fossem vítimas.

             7.1.2.2 Fundações públicas federais

             Por sua vez, já é entendimento remansoso o fato de que as fundações de direito público, instituídas pelo Poder Público para a prossecução de objetivos de interesse público, com a afetação de bens públicos, integram o gênero entidade autárquica. "Uma vez que as fundações públicas são pessoas de Direito Público de capacidade exclusivamente administrativa, resulta que são autarquias e que, pois, todo o regime jurídico dantes exposto, como o concernente às entidades autárquicas, aplica-se-lhes integralmente (31)".

             7.1.2.3 Conselhos de Fiscalização Profissional

             Os Conselhos de Fiscalização Profissional também têm esta natureza por exercerem atividades típicas da Administração Federal, e por ela delegadas. É consagrada juriprudencialmente esta competência da Justiça Federal para julgar os crimes praticados em detrimento destes Conselhos. Vladimir Souza Carvalho, referindo-se a eles, arremata: "A manutenção da competência da Justiça Federal para todas as suas ações, respeitadas as exceções constitucionais, é a tendência manifestada pelo STJ em inúmeros e inúmeros julgados" (32).

             Ressalte-se que, embora o art. 58 da Lei 9.649/98 tenha afirmado que estes Conselhos exerceriam seu mister em caráter privado, retirando sua natureza autárquica, o STF, na decisão do HC 77.909-3-DF, já decidiu pela competência da Justiça Federal para o julgamento de crimes praticados em detrimento dos Conselhos de Fiscalização Profissional.

             7.1.3 Empresas públicas federais

             Por fim, o delito pode ser praticado contra empresa pública federal. Faz-se mister rememorar o conceito de empresa pública federal, junto ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello: "é a pessoa jurídica criada por lei como instrumento de ação do Estado, com personalidade de Direito Privado, mas submetida a certas regras especiais decorrentes de ser coadjuvante da ação governamental, constituída sob quaisquer das formas admitidas em Direito e cujo capital seja formado unicamente por recursos de pessoas de Direito Público interno ou de pessoas de suas Administrações indiretas, com predominância acionária residente na esfera federal (33)". É da competência da Justiça Federal, inclusive, os crimes falimentares praticados em detrimento de empresa pública federal, diante da norma especial contida no art. 109, IV, da CF.

             7.2 Reflexo do delito em bem, interesse ou serviço de ente federal

             A exigência constitucional é alternativa, sendo indispensável a afetação de ao menos um destes itens para que a causa seja da competência da Justiça Federal, devendo os bens, serviços ou interesses pertencer a um ente federal ou a tutela legal caber aos respectivos entes.

             Bens, na dicção da norma constitucional, significam patrimônio, não importando se o dano patrimonial é diminuto, ou se é material ou imaterial. Entretanto, não é aquela noção privatística de patrimônio, no sentido do conjunto de relações de créditos e débitos de uma determinada pessoa. Patrimônio de um ente federal será, por conseguinte, o conjunto de todos os bens de um ente federal, sejam eles de quaisquer natureza, sob domínio público ou privado, afetados a seu próprio uso, ou ao uso direto ou indireto da coletividade. Na prática, pode ser atingido um número incomensurável de objetos. Observe-se a importante ressalva jurisprudencial que se criou com a edição da Súmula 125 pelo antigo TFR: "Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar ação instaurada em decorrência de acidente de trânsito envolvendo veículo da União, de autarquia ou de empresa pública federal".

             Serviço é aquilo de que o ente federal é encarregado, a finalidade pública específica para a qual foi direcionado o ente federal. A violação, por vezes, atingirá servidor público federal, no exercício de suas funções. O serviço será igualmente violado quando for praticada violação por terceiro atribuindo-se a falsa condição de servidor público federal. A expressão serviços deve possuir um sentido demasiado largo, com o fito de abarcar qualquer tipo de destinação de um ente federal, como por exemplo, as atividades do Poder Judiciário. Daí por que o fato de usar documento falso em qualquer processo de competência das Justiças Especializadas e da Justiça Federal, mesmo em casos de delegação de competência, ter o condão de direcionar a competência para decisão do falsum a esta mesma Justiça Federal.

             Interesse de ente federal, ressalve-se de início, não pode ser o interesse meramente genérico e remoto de ser visto o cumprimento de leis federais em tese. Tal interesse de ente da União deve ser direto e específico, delimitado.

             Na verdade, válida é a lição terminante de Vladimir Souza Carvalho: "Essa tricotomia é de significado simples, se definindo por si só, dada a força com que cada termo encerra, embora, às vezes, se entrelacem, visto se confundirem ou serem sinônimos uns dos outros. A infração, atingindo um desses requisitos, vulnera os outros, já que é difícil delimitar a esfera do bem, do serviço e a do interesse, de forma que uma não interfira na outra. O bem é serviço e se constitui em interesse. O serviço é bem e veste o trajo do interesse. O interesse é bem e é serviço. (34)".

             7.3 Ocorrência de prejuízo ou dano a ente federal

             O dano causado pela conduta criminosa pode ser econômico e/ou moral. Será econômico quando atingir materialmente o patrimônio do ente federal. Será moral quando afetar serviços ou interesses1 do ente federal. Ambos os tipos de dano estão jungidos à decisão proferida pela Justiça Federal, presentes os outros dois requisitos fixadores desta competência.

             7.4 Hipóteses legais

             Os crimes contra a fé pública (arts. 289 a 311 do CP), entre eles o crime de moeda falsa, o delito de contrabando ou descaminho (art. 334 do CP), os crimes praticados por ou contra servidor público federal (infra, cap. 9) são hipóteses legais muito comuns em que pode ocorrer a competência da JF. Basta que sejam preenchidos os requisitos já citados.

             Quanto aos delitos contra a fé pública, vejam-se as Súmulas 73 e 104 do Superior Tribunal de Justiça e a Súmula 31 do antigo Tribunal Federal de Recursos:

             "Súmula 73 – A utilização de papel moeda grosseiramente falsificado configura, em tese, o crime de estelionato, da competência da Justiça Estadual".

             "Súmula 104 – Compete à Justiça Estadual o processo e julgamento dos crimes de falsificação e uso de documento falso relativo a estabelecimento particular de ensino".

             "Súmula 31 – Compete à Justiça Estadual o processo e julgamento de crime de falsificação ou de uso de certificado de conclusão de curso de 1° e 2° graus, desde que não se refira a estabelecimento federal de ensino ou a falsidade não seja de assinatura de funcionário federal".

             Em suma, a competência da Justiça Federal para os crimes de moeda falsa que se subsumam no teor do art. 289 do CP, se dá diante do fato de que uma das vítimas do delito será sempre o Banco Central do Brasil, competente que é esta autarquia, de forma exclusiva, para a emissão de moeda, consoante dispõe o caput do art. 164 da Constituição. Ressalte-se que, em se tratando de falsificação de moeda estrangeira, também há interesse desta autarquia, visto que é da plêiade de funções a ela acometidas o controle da regularidade do mercado cambial brasileiro. Entretanto não serão todos os casos de moeda falsa que serão julgados pela Justiça Federal, visto que nem sempre será afetada a autarquia citada.

             Assim, temos que há entendimento dominante na jurisprudência, corporificado através da Súmula 73/STJ, na direção de que, quando da prática de falsificação de moeda, somente será competente a Justiça Federal se a falsidade for capaz de iludir o homo medius. Caso contrário, sendo a falsificação grosseira, identificável à primeira vista, a competência será da Justiça Estadual, visto que a fé pública, a ser protegida nestes casos pelo Banco Central do Brasil, não terá sido lesionada, mas sim a esfera patrimonial do particular.

             Com esteio na Súmula 104 do STJ, não será a Justiça Federal competente para o processo e julgamento do crime de uso de documento falsificado relacionado a instituição particular de ensino superior, considerando-se que a atividade delegada federal exercida pela mesma, como fator de fixação da competência federal, resume-se aos atos praticados pelos seus dirigentes e para fins de mandado de segurança, consoante se depreende da Súmula nº 15, do extinto TFR: "Compete à Justiça Federal julgar mandado de segurança contra ato que diga respeito ao ensino superior, praticado por dirigente de estabelecimento particular".

             Por sua vez, competem à Justiça Federal o processo e julgamento do crime de extração ilegal de minérios, tipificado no art. 55 da Lei n°. 9.605/98, visto que os recursos minerais, mesmo estando no subsolo, são bens da União (art. 20, IX, CF).

             O crime previsto no art. 183 da Lei 9.472/96, também compete à Justiça Federal o seu julgamento, visto que é da competência da União explorar diretamente ou mediante concessão, permissão ou autorização os serviços de telecomunicações e radiodifusão, segundo o art. 21, incisos XI e XII, a, da Constituição.

             O julgamento dos crimes contra o serviço postal, previstos nos arts. 36 a 46 da Lei 6.538/78 também deve pertencer à seara da Justiça Federal. Tanto pelo fato de ser a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos uma empresa pública federal, quanto pelo fato de ser o serviço postal um serviço a ser mantido pela União, consoante o art. 21, inc. X, da CF.

             O crime de contrabando ou descaminho, tratado no Código Penal no art. 334, mereceu tratamento sumular, por parte do STJ, com a edição da Súmula 151: "A competência para o processo e julgamento por crime de contrabando ou descaminho define-se pela prevenção do Juízo Federal do lugar da apreensão dos bens". Anteriormente, a regra era de que a competência se firmava na chegada da mercadoria em nosso território. Tal entendimento foi modificado para aquele esposado na citada Súmula, se coadunando com o art. 70 do CPP, que afirma ser o local de consumação do delito que firmará a competência para o julgamento de um delito. Como estes delitos são instantâneos de efeitos permanentes, que se protraem no tempo, a competência será do juízo do local de apreensão, que é onde ocorre a consumação do delito de contrabando ou descaminho. Veja-se: STJ-CC-14707, STJ-CC-14411, STJ-CC-13853, STJ-CC-12257.

             Vale aqui grifar que a jurisprudência tem consagrado entendimento de que o uso de armamento proibido na prática de homicídios não indica, a priori, a prática dos delitos de descaminho ou contrabando. Estes não seriam crimes-meio para a prática de homicídios ou tráfico de entorpecentes, principalmente se levarmos em conta que há tipo penal autônomo para combater o uso e a posse de arma contrabandeada: o art. 16 do Estatuto do Desarmamento, a Lei 10.826/2003. Assim, contra a competência da JF: STJ-CC-16737, STJ-CC-22751, STJ-CC-29180, TRF1ª Reg. ACR 01000870424; a favor da competência da Justiça Federal: STJ-CC-16349. Da mesma forma ocorre com o delito de receptação de armas e produtos contrabandeados, não se presumindo a prática, pelo mesmo autor da receptação, dos delitos de descaminho e contrabando, o que levaria à competência da JF. Neste sentido: TRF 2ª Reg. ACR 9602313480. Contra: TRF 2ª Reg. HC 9602134925.

             Por fim, várias condutas criminosas podem ser praticadas diante de órgão da Polícia Federal, como os crimes tratados pelo art. 109, inc. X, da CF, e outros como, por exemplo, o uso de documento falso para obter passaporte falso, uso de passaporte falso, falsidade ideológica, estelionato etc. Nestes casos, ofendida é a União e competente para julgar tais processos será a Justiça Federal.

             7.5 Crimes praticados por prefeitos municipais

             É sabido que a CF consagrou a idéia de que os prefeitos municipais deveriam ser julgados perante os respectivos Tribunais de Justiça, tenham eles praticado crimes de qualquer natureza. Tal idéia deflui do art. 29, X:

             "Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:

             (...)

             X – julgamento do Prefeito perante o Tribunal de Justiça;"

             Tal prerrogativa de foro se justificaria, no entender de Giovanni Mansur Solha Pantuzzo, visto que "a prerrogativa constitucional em exame reforça, inegavelmente, a independência funcional do Prefeito, na medida em que o distancia de fatores maléficos não raro presentes na política local, capazes de desencadear processos descabidos, lastreados em acusações inverídicas, gerando nociva inquietação à comunidade" (35).

             Com tal raciocínio o Constituinte eliminou do ordenamento jurídico as diferenças de critérios de definição de competência para julgamento de crimes comuns e crimes de responsabilidade praticados, a qualquer tempo, por Prefeitos. Ambos, tipificados, v.g., no art. 1° do Dec.-Lei 201/67, pertencem à plêiade de matérias afetas aos Tribunais de Justiça.

             O julgamento administrativo exercido pelas Câmaras de Vereadores acerca das infrações político-administrativas praticadas pelos Prefeitos Municipais, embasado no art. 4° do Decreto-Lei n° 201/67, não foi eliminado do ordenamento pela regra do art. 29, X, da CF. Ele nada mais é do que a possibilidade do impeachment do Prefeito.

             Isto dito, passou a ser discutido nos Tribunais se seria da competência dos Tribunais Estaduais o julgamento de crimes de Prefeitos que fossem da competência da Justiça Federal e das Justiças Especializadas. O entendimento predominante passou a ser o de que, como a competência da Justiça Estadual é residual, não sendo a ela permitida julgar nas áreas delimitadas às Justiças Especializadas e à Justiça Federal; estariam os Tribunais de Justiça impedidos de decidirem causas relacionadas a Prefeitos que sejam da competência daquelas Justiças. Pensamos com Alexandre de Moraes quando diz que: "as atribuições jurisdicionais originárias do Tribunal de Justiça, constitucionalmente definido como juízo natural dos Prefeitos municipais, restringem-se, no que concerne aos processos penais, unicamente às hipóteses pertinentes aos delitos sujeitos à competência da Justiça local" (36).

             Quanto a possíveis desvios de verbas repassadas pela União à municipalidade, a jurisprudência mais antiga inclinava-se pela competência da Justiça Comum Estadual, sob o pálio de que tais verbas, a partir do momento em que são entregues ao Município, passam a não mais integrar o patrimônio da União, incorporando-se aos cofres municipais. O extinto TFR, ao editar a Súmula 133, assim confirmava este entendimento jurisprudencial então predominante: "Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar Prefeito Municipal acusado de desvio de verba recebida em razão de convênio firmado com a União Federal".

             Com o tempo, contudo, passou-se a entender que se a verba repassada pela União estivesse sujeita a prestação de contas perante órgão federal, aí então a competência seria da Justiça Federal. Foi como definiu a questão o STJ, na Súmula 208: "Compete à Justiça Federal processar e julgar Prefeito Municipal por desvio de verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal".

             Vale ressaltar a orientação do STJ, de que as ações penais contra os Prefeitos Municipais podem ser iniciadas mesmo após o término de seus mandatos. É como dispõe a Súmula 164 do colendo Tribunal: "O prefeito municipal, apos a extinção do mandato, continua sujeito a processo por crime previsto no art. 1. do dec. lei n. 201, de 27/02/67.". Entretanto, isto não quer dizer que o ex-prefeito continuaria a gozar do privilégio de foro, como mencionava a cancelada Súmula 394 (37) do STF, editada em 03.04.1964: "cometido o crime durante o exercício funcional, prevalece a competência especial por prerrogativa de função, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados apos a cessação daquele exercício." Dessa forma não permanece com privilégio de foro o ex-prefeito.

             Concluímos asseverando que, consoante entendimento jurisprudencial pacificado, em casos de Prefeitos que praticam crimes da competência da Justiça Federal, como aqueles praticados contra bens, serviços ou interesses da União, competente será o respectivo Tribunal Regional Federal e não o Tribunal de Justiça Estadual. Leia-se, v.g., excerto do HC n°. 78.728-RS, do Supremo Tribunal Federal, de relatoria do Min. Maurício Corrêa: "(...) Os Tribunais Regionais Federais são competentes para processar e julgar prefeitos municipais por infrações praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União (Constituição, artigo 109, IV), assim entendidas também aquelas relativas à malversação de verbas recebidas da União sob condição e sujeitas a prestação de contas e ao controle do Tribunal de Contas da União".

             Por fim, sobre a questão da inconstitucionalidade da Lei n° 10.628/2002, que muito se aplicará aos casos de ex-prefeitos, causando um frisson dispensável no meio jurídico (pois os operadores do Direito se questionarão em torno de saber se competente será a 1ª ou a 2ª instância); remetemos o leitor ao item 4.2 do presente trabalho, onde dissertamos sobre este malsinado diploma legislativo.


8. COMPETENCIA NOS CRIMES AMBIENTAIS

             O artigo 26, parágrafo único, do anteprojeto da atual lei penal ambiental, criava uma hipótese a mais de delegação de competência, embasada no art. 109, § 3° da CF, assim como é em casos de tráfico internacional de entorpecentes. No Congresso Nacional, tal dispositivo recebeu nova redação estabelecendo a competência da Justiça Federal para todos os crimes previstos na lei 9.605/98.

             Foi o parágrafo único vetado. O veto presidencial à redação desse parágrafo teve o condão de deixar incólumes os entendimentos relativos à competência para o processo e julgamento dos crimes contra o meio ambiente.

             Baseando-se na Súmula 91 do STJ (Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados contra a fauna), muitos julgados foram proferidos deferindo à Justiça da União Federal a competência para julgar tais crimes. Alegavam, arrimados no teor do art. 1° da Lei 5.197/67, que a fauna seria bem da União. Entendia-se que seria esta a mais preparada para cuidar e proteger estes bens, que assumiriam características nacionais.

             Entretanto, em sessão de 08.11.2000, a Terceira Seção do STJ cancelou tal entendimento sumulado. Justifica-se tal medida, a partir do momento em que se entende que o meio ambiente é bem de uso da coletividade. Não só a União é responsável perante a fauna brasileira.

             Porém, isto não impede que surja a competência da Justiça Federal, no caso da conduta criminosa ter sido praticada em bens da União, como aqueles dispostos no art. 20 da Carta Magna ou "no mar territorial brasileiro, nos lagos e rios pertencentes à União e nas unidades de conservação da União, exsurgindo o interesse direto desta, que exerce a respectiva fiscalização" (38). Assim, na ocorrência de crimes ambientais, a competência da Justiça Federal pode vir a obedecer ao art. 109, IV, da Constituição da República, firmando-se no pressuposto de serem praticados crimes em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, entidades autárquicas e empresas públicas federais. Tem sido esta a consagrada jurisprudência dos Tribunais Superiores.

             Isto é, aplica-se o raciocínio de que competirá à Justiça Estadual o processo e o julgamento das ações criminais e cíveis envolvendo o meio ambiente, quando não se configurar lesão a bem, serviços ou interesse da União ou de suas autarquias e empresas públicas.

             No mérito desta argumentação, é certo que a proteção ao meio ambiente é matéria disciplinada pela Constituição Federal, que atribui dever à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, concorrentemente, sua preservação e proteção (39). Não houve definição exclusiva de competência em razão desta matéria, a favor de algum dos entes federativos.

             Entretanto, hodiernamente, várias decisões judiciais, inclusive do STF, têm olvidado do interesse direto de autarquia federal, o IBAMA. Um dos pretextos utilizados é o fato da Mata Atlântica, assim como outros patrimônios nacionais (art. 225, §4°, CF) não ser propriedade da União. Outro é a inexistência de interesse direto e específico da autarquia federal nos casos do art. 46 da Lei de Crimes Ambientais. Pensamos ser esta argumentação falaciosa.

             Certo é que a proteção à Mata Atlântica e equiparados é de supremo interesse também dos Estados e dos Municípios. Os patrimônios nacionais do art. 225 da Carta Magna não devem ser estudados através do conceito patrimonial estrito de bens da União, o que afastaria, em tese, da competência da Justiça Federal as causas a eles relacionados.

             No entanto, essa interpretação, no que tange especificamente à Mata Atlântica, não parece ser a mais correta, eis que, à evidência, há o interesse direto da União, por estar sendo atingido diretamente o serviço de uma autarquia federal.

             A Lei 6.938/81, da Política Nacional do Meio Ambiente, em seu art. 17-B, instituiu Taxa destinada a custear o regular poder de polícia conferido ao IBAMA. Eis o dispositivo:

             "Art. 17-B. Fica instituída a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental – TCFA, cujo fato gerador é o exercício regular do poder de polícia conferido ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – Ibama para controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais."

             E, para viabilizar a realização prática destes atos de poder de polícia, com efeito, instituiu-se, através da Portaria IBAMA 44-N/93, a Autorização de Transporte para Produtos Florestais – ATPF, a ser emitida pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais – IBAMA. Trazemos à colação seu art. 1º, e §1°:

             "Art. 1º - A ATPF, conforme modelo apresentado no anexo I da presente Portaria, representa a licença indispensável para o transporte de produto florestal de origem nativa, inclusive o carvão vegetal nativo. § 1º - Entende-se por produto florestal aquele que se encontra no seu estado bruto ou in natura, abaixo relacionado: a) madeira em toras; b) toretes; c) postes não imunizados; d) escoramentos; e) palanques roliços; f) dormentes nas fases de extração/fornecimento; g) mourões ou moirões; h) achas e lascas; i) pranchões desdobrados com moto-serra; j) lenha; l) palmito; m) xaxim; n) óleos essenciais. o) bloco ou filé, tora em formato poligonal, obtida a partir da retirada de costaneiras." (grifo nosso)

             Vejamos o que nos diz o art. 2º da Lei 7.735/89, legislação criadora do IBAMA:

             "Art. 2º. É criado o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, entidade autárquica de regime especial, dotada de personalidade jurídica de direito público, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de executar as políticas nacionais de meio ambiente referentes às atribuições federais permanentes relativas à preservação, à conservação e ao uso sustentável dos recursos ambientais e sua fiscalização e controle, bem como apoiar o Ministério do Meio Ambiente na execução das ações supletivas da União, de conformidade com a legislação em vigor e as diretrizes daquele Ministério."

             Portanto, paralelamente, tem também o IBAMA, como autarquia federal e órgão executor das diretrizes da política nacional para proteção do meio ambiente e recursos ambientais, o encargo de fiscalizar pessoas físicas ou jurídicas quanto ao cumprimento do comando legal que estabelece a imprescindibilidade de licença válida para o transporte de madeira e de outros produtos vegetais, autuando o infrator quando for o caso, inclusive executando-o judicialmente e representando-o à autoridade competente para fins penais, tudo isso como executor da política nacional do meio ambiente em todas as suas etapas.

             Por vezes, ocorre que o fato ensejador da persecução penal é justamente a autuação de cidadãos por parte do IBAMA, em razão do transporte de madeira proveniente da Mata Atlântica, sem a expedição da devida licença – ATPF.

             Em assim sendo, é evidente que a ausência da Autorização, mencionada no art. 46 da Lei 9.605/98 (40), necessária ao transporte de madeira, configura infração penal em detrimento de serviços (expedição de ATPF) ou interesses (exercício do poder de polícia) do IBAMA, o que atrai a competência da Justiça Federal, indubitavelmente, para o julgamento destes casos.


9. COMPETENCIA NOS CRIMES PRATICADOS POR SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL OU CONTRA SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL

             Nestes crimes, parte-se da premissa de que são infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, como dispõe o art. 109, inciso IV, da CF.

             Primeiramente, podem ser praticados contra o servidor federal, no exercício de sua função ou em razão de sua investidura. Portanto, para firmar a competência da Justiça Federal nestes casos, não importando o autor da conduta criminosa, a jurisprudência pacificou o entendimento de que necessários são dois requisitos: 1) o delito deve ser praticado contra servidor público federal no exercício de suas funções; e 2) deve ter relações com as funções exercidas pelo mesmo.

             Estas foram as conclusões extraídas das Súmulas 98 do extinto TFR: "Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados contra servidor público federal, no exercício de suas funções e com estas relacionadas", e 147 do colendo STJ: "Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados contra funcionário público federal, quando relacionados com o exercício da função".

             Entretanto, impende observar que se o servidor estiver a serviço de ente que não seja federal a competência será da Justiça Comum Estadual. Dois julgados excelentes são trazidos por Vladimir Souza Carvalho:

             "Se o delegado não se encontrava no exercício de suas funções de polícia judiciária federal, mas em apuração de crime sujeito à competência originária do eg. TJ do Estado da Paraíba, não há infração contra bem, serviço ou interesse da União Federal (Juiz Nelson Gomes da Silva, AC 90.01.14629-5-MT, DJU-II 25.11.91, p. 29.777; Min. Carlos Madeira, HC 6.466-CE, DJU 27.06.85, p. 10.500, RC 2-PB, DJU-I 21.02.92, p. 3.510)

             (...)

             Da mesma forma o crime de resistência perpetrado contra agentes da polícia federal quando executavam mandado de captura expedido por magistrado estadual, pois os executores não atuavam no exercício de sua função própria, mas como órgão auxiliar do juízo penal (Min. Torreão Braz, RC 592-RJ, DJU 07.05.81, p. 4.056 (41). "

             Por outro lado, crimes podem ser praticados por servidor federal, como delegados, peritos e agentes da Polícia Federal, no exercício de suas funções, o que impõe a competência da Justiça Federal, em nome do zelo pelo bom conceito de que deve gozar o serviço público federal na sociedade. Os requisitos para configurar a competência da Justiça Federal são os mesmos utilizados para casos de crimes contra servidores federais: 1) o delito deve ser praticado por servidor público federal no exercício de suas funções; e 2) deve ter relações com as funções exercidas pelo mesmo.

             Tal entendimento pacificou-se, através da Súmula 254 do TFR, in verbis: "Compete à Justiça Federal processar e julgar os delitos praticados por funcionário público federal, no exercício de suas funções e com estas relacionadas".

             No caso do servidor federal não estar em serviço, ou estar em serviço a outro ente federativo, a competência não será da Justiça Federal. Enfim, "a simples condição de funcionário público federal não confere ao agente a faculdade de ver-se processado e julgado em foro federal. (42)"

             Quando ocorrer a circunstância de outrem praticar conduta delituosa passando-se por servidor público federal, ver-se-á se tal falsidade é fator determinante para o deslocamento da competência para a Justiça Federal. Entendemos que muito dificilmente não será posta em julgamento a credibilidade do Serviço Público Federal, quando da prática de atos criminosos por indivíduos que se arrimam numa falsa identidade de servidor público federal. Imagine-se o caso de existirem estelionatários se passando por policiais federais! Porém, a jurisprudência recomenda que, no caso concreto, o juiz deverá aquilatar o falso ideológico para determinar se o mesmo foi capaz de afetar bens, serviços ou interesses da União e seus entes.

             Seja ressaltado, por sua via, que será da competência do júri federal o julgamento dos crimes dolosos contra a vida praticados por ou contra servidores públicos ou agentes da administração quando, no exercício da função estatal, suas ações refletirem no interesse da União e entes autárquicos federais (CF, art. 5º XXXVIII, b; art. 109, IV e art. 37, § 6º).

             E, por fim, não esqueçamos do amplíssimo conceito de servidor público trazido pelo Código Penal, em seu art. 327:

             "Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.

             § 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública. (Parágrafo único renumerado pela Lei nº 6.799, de 23.6.1980 e alterado pela Lei nº 9.983, de 14.7.2000).

             § 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 6.799, de 23.6.1980)".


10. COMPETENCIA PARA OS CRIMES PREVISTOS EM TRATADOS INTERNACIONAIS

             Alguns requisitos se fazem necessários para a fixação da competência, nestes casos de crimes previstos em tratados internacionais, inseridos no comando constitucional do art. 109, inc. V, da CF. Não basta a ocorrência de conduta criminosa prevista em tratado ou convenção internacional. Deve restar demonstrado um nexo de internacionalidade na conduta combatida. Este não existindo, a competência será da Justiça Estadual.

             Este nexo é representado pela exigência de que o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, embora a execução tenha se iniciado no Brasil, ou o contrário: o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no Brasil, embora a execução tenha se iniciado além de nossas fronteiras.

             Como a União detém a exclusividade constitucional para manter relações com Estados estrangeiros e com eles celebrar tratados e convenções (43), se nos mostram nítidas as razões pelas quais se afetaram tais causas à Justiça Federal.

             Aristides Alvarenga Junqueira, ex-Procurador Geral da República, bem assevera: "... tendo o fato conotação internacional, a União, como pessoa jurídica de Direito Público externo, signatária de tratado ou convenção, juntamente com outros Estados estrangeiros, tem interesse particular, específico e direto em honrar o compromisso de punir determinados crimes (44)".

             Ressaltemos que o crime praticado pode ser qualquer um entre os que já estejam previstos na legislação penal comum ou especial. O tratado ou a convenção internacional apenas estabelecerá uma comunhão de esforços entre as nações que o firmam, no sentido de combater determinadas espécies delituosas.

             Após a verificação da existência desta prévia comunhão de esforços, é que serão perquiridos pelos nexos de internacionalidade na conduta criminosa. Somente após a verificação destes dois pressupostos é que poderemos firmar a competência da Justiça Federal.

             Entre os crimes que têm previsão nos instrumentos de direito internacional estão os exemplos citados adiante, sobre os quais teceremos breves comentários.

             10.1 O crime de guarda de moeda falsa (Convenção Internacional para a Repressão da Moeda Falsa, aprovada pelo Decreto-Lei 411/38 e promulgada pelo Decreto 3.074, de 14.09.38);

             Remetemos o caro leitor aos apontamentos colacionados no início do item 7.4 deste trabalho, acerca do delito de moeda falsa, reafirmando que, no caso da competência da Justiça Federal se firmar pelo art. 109, V, deverá ser acrescido o requisito do nexo de internacionalidade da conduta criminosa. Assim, de qualquer forma, o delito de moeda falsa será da competência da Justiça Federal, exceto quando a falsificação for grosseira, consoante entendimento sumulado do Superior Tribunal de Justiça.

             10.2 O crime de tráfico internacional de entorpecentes (Convenção única sobre entorpecentes, de 1961, promulgada pelo Decreto 54.216/64 e a Convenção sobre as substâncias psicotrópicas de Viena, de 1971, promulgada pelo Decreto 79.388/77);

             Lembremos a hipótese de delegação de competência da Justiça Federal à Justiça Estadual, tratada pelo art. 27 da Lei 6.368/76. As circunstâncias ensejadoras do nexo de internacionalidade, a serem trabalhadas na denúncia, é que dirão se a competência é da Justiça Federal. A conduta típica deverá estar integrada à rede de atos criminosos do comércio ilegal de substâncias entorpecentes, não sendo necessário, todavia, um acervo probatório vasto, mas sim indícios veementes da internacionalidade da conduta. Impende observar que também não será necessária a junção de esforços de aparatos policiais de países diferentes, em torno da conduta criminosa, para que se declare competente a JF.

             Entretanto, a competência da Justiça Federal é controversa, quando há desclassificação do delito de tráfico internacional para tráfico interno. As posições mais acertadas se encontram nos TRF’s, que em alguns julgados, contrariando posição do STJ, e assentados no art. 81 do CPP, determinam que a competência deve permanecer com a Justiça Federal, mesmo diante da desclassificação do delito para área de jurisdição que não seja sua. Embora estes julgados tenham se utilizado de dispositivo tratante de conexão e continência, certo é que o STF, sedimentando o debate, manteve a competência da Justiça Federal, "sob o argumento de que a absolvição pelo crime que motivou a conexão não implica no deslocamento do processo para a Justiça do Estado, exatamente pela aplicação do art. 81 do Código de Processo Penal" (45).

             Entendemos ser possível utilizar analogicamente o princípio da perpetuação da competência, insculpido no art. 87 do CPC, em conjunto com o art. 81 do CPP, no interesse de que permaneçam afetos à Justiça Federal os processos relacionados a tráfico internacional que sejam desclassificados para tráfico interno de entorpecentes.

             10.3 O crime contra as populações indígenas (Convenção n° 107, sobre a proteção e integração das populações indígenas e outras populações tribais e semitribais de países independentes, aprovada pelo Decreto 58.824, de 14.07.66);

             Conforme se depreende de seu art. 109, inc. XI, a Constituição pôs no rol de matérias afetas à União e à subseqüente competência da Justiça Federal questões relacionadas a disputas sobre direitos indígenas, como as atinentes a direitos reais, à posse, ocupação, exploração, invasão e temas afins da terra indígena.

             A Lei 6.001/73, o Estatuto do Índio, anterior à CF vigente, já desta forma tratava a matéria. Basta observar o que dispunha o seu art. 36, in verbis:

             "Art. 36. Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, compete à União adotar as medidas administrativas ou propor, por intermédio do Ministério Público Federal, as medidas judiciais adequadas à proteção da posse dos silvícolas sobre as terras que habitem.

             Parágrafo único. Quando as medidas judiciais previstas neste artigo forem propostas pelo órgão federal de assistência, ou contra ele, a União será litisconsorte ativa ou passiva."

             Com isso, a jurisprudência já há muito tempo atribuía a competência para assuntos de interesse de comunidades indígenas à Justiça Federal. A Nova Ordem, estatuída com o advento da Constituição de 1988, inovou ao considerar como bens da União não só as terras ocupadas pelos indígenas como aquelas que eram tradicionalmente ocupadas por estes, atribuindo a competência para dirimir questões acerca destas terras e de direitos a elas correlatos à Justiça Federal, ante o peremptório interesse da União na matéria. A Carta Magna visava, então, proporcionar às famílias indígenas o bem-estar e as condições necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições, procurando mantê-las em um ambiente que, por tradição, foi de seus antepassados – algo que é tratado com muito respeito e devoção pessoal por estas comunidades.

             De toda forma, esta tormentosa concepção social e antropológica do que sejam terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas certamente necessita de uma Justiça especializada na busca da resolução dos conflitos social delas decorrentes, o que mostra a importância, a amplitude e o inarredável incremento da competência da Justiça Federal na matéria em estudo.

             Assim, faz se mister afirmar que a competência da Justiça Federal não deve abarcar crimes comuns, praticados ou sofridos pelo indígena, que não possuam ligação com os direitos tradicionais dos indígenas, trabalhados de modo percuciente pelo Constituinte no art. 231 da CF, e que devem ser protegidos eficientemente pela União.

             Por esse motivo, ainda que de uma forma incompleta, o Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento, editando a Súmula 140, afirmando que: "Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar crime em que o indígena figure como autor ou vítima". Entretanto, excetuam-se aqueles crimes que estejam relacionados à situações de disputas de bens e direitos indígenas, que envolvam a comunidade em que vive o sujeito ativo ou passivo do crime, praticados ou não no interior da aldeia ou da reserva indígena. Isto deflui da compreensão do Decreto 58.824/66 (46) c.c. o art. 109, inc. V, da CF. Neste sentido, já há decisão do Pretório Excelso, da lavra do Min. Marco Aurélio, onde diz que: "A competência para julgar a ação penal em que imputada a figura do genocídio, praticado contra indígenas na disputa de terras, é da Justiça Federal. Na norma definidora da competência desta para demanda em que envolvidos direitos indígenas, inclui-se a hipótese concernente ao direito maior, ou seja, à própria vida." (47). Outras causas já foram decididas neste caminho: RREE 192.473-RR (DJU de 29.8.97) e HC 71.835-MS (DJU de 22.11.96). Outra decisão bastante profícua foi proferida pelo Min. Néri da Silveira, em ação acerca de crimes de abuso de autoridade e lesões corporais praticadas por policiais militares, pugnou pela competência da Justiça Federal, sob a alegação de atentado a serviço de interesse da União na pessoa de ente da sua Administração Indireta, FUNAI. Leia-se:

             "A Turma deu provimento a recurso extraordinário interposto pelo Ministério Público Federal para, reformando acórdão do TRF da 1ª Região, afirmar a competência da justiça federal para julgar crimes de abuso de autoridade e de lesões corporais praticados por policiais militares contra silvícola, no interior de reserva indígena. Considerou-se que o caso se enquadra no art. 109, IV e XI, da CF ("Aos juízes federais compete processar e julgar:... IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;... XI - a disputa sobre direitos indígenas."), porquanto configurado o atentado ao serviço da União de proteção ao índio, sendo os delitos cometidos por policiais que, em princípio, deveriam prestar assistência à comunidade indígena. Determinou-se a remessa dos autos à Seção Judiciária do Estado de Roraima. Precedente citado: RECr 192.473-RR (DJU de 29.8.97). RECr 206.608-RR, rel. Min. Néri da Silveira, 11.5.99."

             Assim, concluímos que a competência para julgamento de delitos cometidos contra indígenas, quando não possuírem o necessário nexo de internacionalidade do art. 109, V, da CF, poderá ser também da Justiça Federal, de acordo com o art. 109, incisos IV e XI, em nome dos direitos dos mesmos, que devem ser protegidos pela União.

             10.4 O crime de tráfico de mulheres (Convenção para Repressão ao Tráfico de Mulheres e Crianças de Lake Sucess, Estados Unidos, 1947, aprovada pelo Decreto Legislativo 7/50) e o envio ilegal e tráfico de menores (Convenção sobre os Direitos da Criança, aprovada pelo Decreto Legislativo 28/90 e promulgada pelo Decreto 99.710/90);

             O crime de envio ilegal e tráfico de menores vem delineado pelo art. 239 do Estatuto da Criança e do Adolescente, com recentíssimas modificações:

             "Art. 239. Promover ou auxiliar a efetivação de ato destinado ao envio de criança ou adolescente para o exterior com inobservância das formalidades legais ou com o fito de obter lucro:

             Pena - reclusão de quatro a seis anos, e multa.

             Parágrafo único. Se há emprego de violência, grave ameaça ou fraude: (Incluído pela Lei nº 10.764, de 12.11.2003)

             Pena - reclusão, de 6 (seis) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência."

             Da compreensão deste tipo penal, percebe-se que ele pune o criminoso haja ou não o intuito lucrativo. Quando existir um processo de adoção internacional que não observe as formalidades legais do art. 52 do ECA, mesmo não havendo o intuito fraudulento ou lucrativo, e ainda assim o interessado auxilie ou promova o envio irregular de menor para o exterior, estará ele cometendo o crime em estudo, e o julgamento deverá ser da competência da JF. Mas, na maioria das vezes, ocorre o intuito lucrativo neste envio ilegal, ou então ocorre o emprego de violência, ameaça ou fraude. É nestas situações que se vivencia o tráfico de menores. Ficamos com a assertiva de Damásio de Jesus, quando afirma que: "o tráfico envolve a movimentação de crianças de seu local de moradia para um novo local e, consequentemente, sua exploração em algum estágio deste processo. É a combinação entre a movimentação e a exploração que caracteriza o tráfico, não importando o momento em que ocorre a exploração e qual o tipo de exploração a que a criança é submetida. O tráfico é um ato de violência, mas a violência per se nem sempre é empregada, pois, em alguns casos, os traficantes tiram vantagem da vulnerabilidade das pessoas que passam por uma situação desfavorável, que não lhes permite fazer escolhas, por exemplo, imigrantes ilegais (48)".

             Portanto, irregularidades como uma adoção internacional que não obedeça as formalidades legais; ou práticas outras como adoção internacional fraudulenta, tráfico de menores para execução de trabalhos forçados ou para turismo sexual, prostituição infantil ou exploração sexual, devem ser combatidas, indubitavelmente, pelo aparato judiciário da União.

             Por sua vez, o crime de tráfico de mulheres, em uma de suas facetas, está descrito em nosso Código Penal, art. 231:

             "Art. 231 - Promover ou facilitar a entrada, no território nacional, de mulher que nele venha exercer a prostituição, ou a saída de mulher que vá exercê-la no estrangeiro:

             Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos.

             § 1º - Se ocorre qualquer das hipóteses do § 1º do art. 227:

             Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos.

             § 2º - Se há emprego de violência, grave ameaça ou fraude, a pena é de reclusão, de 5 (cinco) a 12 (doze) anos, além da pena correspondente à violência.

             § 3º - Se o crime é cometido com o fim de lucro, aplica-se também multa."

             Insta observar, ab initio, que o consentimento da mulher traficada é irrelevante para a consumação do delito, devendo ser ela tratada como vítima, mesmo que tenha consentido na movimentação de um país a outro. O tráfico de mulheres, bem como o tráfico de menores, devem estar inseridos dentro de um contexto mundial de combate ao tráfico de pessoas. Neste sentido, devemos nos reportar ao Protocolo para Prevenir, Suprimir e Punir o Tráfico de Pessoas, especialmente mulheres e crianças, que veio a complementar a Convenção da ONU contra o Crime Organizado Transnacional, adotada em meados de novembro de 2000. Assim trata a matéria, seu art. 3°:

             "a) Tráfico de pessoas deve significar o recrutamento, transporte, transferência, abrigo ou recebimento de pessoas, por meio de ameaça ou uso da força ou outras formas de coerção, de rapto, de fraude, de engano, do abuso de poder ou de uma posição de vulnerabilidade ou de dar ou receber pagamentos ou benefícios para obter o consentimento para uma pessoa ter controle sobre outra pessoa, para o propósito de exploração. Exploração inclui, no mínimo, a exploração da prostituição ou outras formas de exploração sexual, trabalho ou serviços forçados, escravidão ou práticas análogas à escravidão, servidão ou a remoção de órgãos;

             b) O consentimento de uma vítima de tráfico de pessoas para a desejada exploração definida no subparágrafo (a) deste artigo deve ser irrelevante onde qualquer um dos meios definidos no subparágrafo (a) tenham sido usados;

             c) O recrutamento, transporte, transferência, abrigo ou recebimento de uma criança para fins de exploração devem ser considerados "tráfico de pessoas" mesmo que não envolvam nenhum dos meios definidos no subparágrafo (a) deste artigo;

             d) "Criança" deve significar qualquer pessoa com menos de 18 anos de idade."

             Dissemos, supra, ser o art. 231 do CP uma das facetas do tráfico de mulheres, em vista do grave problema observado com o anacronismo desta disposição do Código Penal. Ela só tipifica o tráfico de mulheres quando destinado à prostituição, o que não se coaduna com a atualidade. O tráfico de mulheres, com o fito de se estabelecer a competência da Justiça Federal para seu julgamento, deve ser entendido em sentido lato. Ipso facto, referindo-se à disposição protocolar supracitada, bem comenta o professor Damásio de Jesus: "Essa definição ampla tem, portanto, algumas qualidades incontestáveis. Ela procura, em primeiro lugar, garantir que as vítimas do tráfico não sejam tratadas como criminosas, mas sim como pessoas que sofreram sérios abusos. Nesse sentido, devem ser criados (...) serviços de assistência e mecanismos de denúncia. Em segundo, coloca em destaque o tráfico de crianças e o considera um capítulo à parte, dentro do enfoque dado pela Convenção sobre os Direitos da Criança e seus Protocolos opcionais. Em terceiro, enfoca o trabalho forçado e outras práticas similares à escravidão e não se restringe à prostituição ou à exploração sexual. De fato, tudo revela que o tráfico engloba a prostituição ou outro tipo de trabalho sexual, trabalho forçado, casamento forçado, adoção ilegal ou outra relação privada" (49).

             Assim, a competência da Justiça Federal deverá se firmar sempre que ocorrer o tráfico ou o envio ilegal de menores, seja qual for a finalidade; e o tráfico de mulheres em qualquer de suas modalidades, isto é, mesmo que não seja para fins de prostituição, como nos casos de mulheres traficadas para tráfico de órgãos ou para trabalho forçado ou escravo.

             10.6 O crime de tortura (Convenção contra a Tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes, aprovada pelo Decreto Legislativo n°. 4, de 23.05.1989);

             Apesar do Brasil ter aderido a vários acordos e convenções internacionais que combatem os crimes contra os direitos humanos, como o é a tortura, a luta contra esta, na prática, deixa bastante a desejar. Constante é a violação de direitos humanos em nossa pátria. A realidade é de um diário clima de insegurança, e uma inaceitável sensação – principalmente nas camadas mais pobres da sociedade -, de ignorância daqueles em quem deveremos confiar. Isto, indubitavelmente, provoca indignações nas nações com as quais travamos relações internacionais e que possuem sistemas de direitos humanos consolidados.

             A jurisprudência, infelizmente, tem ido neste sentido: quando a tortura não possuir o aspecto de internacionalidade que exige o inciso V do art. 109, a persecução criminal e o julgamento de delitos desta espécie estarão afetos ã Justiça dos Estados federados, consoante vem decidindo, inclusive, o Pretório Excelso. Como exemplo, leia-se a respeito, o HC 70389, julgado em 23.06.94:

             E m e n t a: Tortura contra criança ou adolescente - Existência jurídica desse crime no direito penal positivo brasileiro - Necessidade de sua repressão - Convenções internacionais subscritas pelo Brasil - Previsão típica constante do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90, art. 233) - Confirmação da constitucionalidade dessa norma de tipificação penal - Delito imputado a policiais militares - Infração penal que não se qualifica como crime militar - Competência da justiça comum do Estado-membro (...)"

             Com essa postura adotada pelos tribunais, vê-se que o Brasil, embora substancialmente tenha procurado se alinhar àqueles países combatentes da tortura, descurou em relação a propiciar meios processuais capazes de extirpar tal mal de nossas vistas.

             É cediço o fato de que os Estados de nossa nação, por razões culturais, econômicas, históricas e sociais, que se prolongam há dezenas de anos, distanciaram-se de uma atuação profícua em defesa dos direitos humanos, mormente quando dissecamos os aparatos policiais estaduais. Desta forma, entendemos, junto à imensa maioria da doutrina nacional, que os crimes contra os direitos humanos, incluindo-se a tortura, deveriam ser julgados pela Justiça Federal. Esta mudança se faz mister diante da maior isenção política e abrangência nacional que possui a Justiça Federal e o correlato Ministério Público Federal, isenção que não se vem observando com a obrigatoriedade necessária no aparelhamento judiciário estadual.

             A bem da verdade, violações a direitos humanos, em nosso entendimento, podem configurar crimes praticados em detrimento de interesse direto da União, o que permitirá concluir pela competência da Justiça Federal, sob o art. 109, inc. IV, da CF. Basta ver que é a União a responsável pelo descumprimento de tratados internacionais de direitos humanos, como a convenção que instituiu a Corte Interamericana de Direitos Humanos, que tem a responsabilidade de interpretar e aplicar os preceitos do Pacto de San Jose da Costa Rica, acatado pelo Brasil; e de investigar e julgar casos de supostas violações de direitos humanos consagrados em convenções do gênero, que venham a ocorrer em nosso território. Nestes casos, havendo condenação, por violações a estes consagrados direitos humanos, arcará a União (e não os Estados federados) com indenização pelos danos morais e materiais que a vítima ou a família da vítima venha a sofrer, demonstrando então que a mesma possui interesse direto e específico sobre lides criminais que versem sobre este tema. Superada estaria qualquer conclusão pela competência da Justiça Comum Estadual para o julgamento de crimes praticados em detrimento dos direitos humanos, como é a tortura. Pressuposta e certa é a incoerência do ordenamento jurídico pátrio ao remeter à Justiça Estadual o julgamento dos crimes de tortura quando praticados sem o citado nexo de internacionalidade. Esperamos seja aprovada a proposta da Reforma do Judiciário, ainda neste exercício de 2004, no tocante à criação de mais um inciso no art. 109 da CF, propiciando a federalização do julgamento dos crimes contra os direitos humanos.

             Pensamos, inelutavelmente, com Flávia Piovesan, que "considerando que estas hipóteses estão tuteladas em tratados internacionais ratificados pelo Brasil, é a União que tem a responsabilidade internacional em caso de sua violação. Vale dizer, é sob a pessoa da União que recairá a responsabilidade internacional decorrente da violação de dispositivos internacionais que se comprometeu juridicamente a cumprir. Todavia, paradoxalmente, em face da sistemática vigente, a União, ao mesmo tempo em que detém a responsabilidade internacional, não detém a responsabilidade nacional, já que não dispõe da competência de investigar, processar e punir a violação, pela qual internacionalmente estará convocada a responder" (50).

             10.7 O crime de pornografia infantil e pedofilia (Convenção sobre os Direitos da Criança, aprovada pelo Decreto Legislativo 28/90 e promulgada pelo Decreto 99.710/90).

             Ressalte-se que, através do art. 34 do Decreto 99.710/90, o Brasil se predispôs com a comunidade internacional a tomar todas as medidas que se façam necessárias para impedir a prática de delitos deste porte. Assim, presente a internacionalidade de condutas de pedofilia e pornografia infantil digitais (o que ocorre na maioria dos casos), competente para o julgamento destes crimes é a Justiça Federal.

             Uma das medidas foi o art. 241 da Lei 8.069/90, recentemente modificado, tratando deste odioso crime:

             "Art. 241. Apresentar, produzir, vender, fornecer, divulgar ou publicar, por qualquer meio de comunicação, inclusive rede mundial de computadores ou internet, fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente: (Redação dada pela Lei nº 10.764, de 12.11.2003)

             Pena - reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.

             § 1o Incorre na mesma pena quem: (Incluído pela Lei nº 10.764, de 12.11.2003)

             I - agencia, autoriza, facilita ou, de qualquer modo, intermedeia a participação de criança ou adolescente em produção referida neste artigo;

             II - assegura os meios ou serviços para o armazenamento das fotografias, cenas ou imagens produzidas na forma do caput deste artigo;

             III - assegura, por qualquer meio, o acesso, na rede mundial de computadores ou internet, das fotografias, cenas ou imagens produzidas na forma do caput deste artigo.

             § 2o A pena é de reclusão de 3 (três) a 8 (oito) anos: (Incluído pela Lei nº 10.764, de 12.11.2003)

             I - se o agente comete o crime prevalecendo-se do exercício de cargo ou função;

             II - se o agente comete o crime com o fim de obter para si ou para outrem vantagem patrimonial."

             Como o crime pode ser praticado não só pelos meios usuais de comunicação, mas principalmente pela rede mundial de computadores, a Internet, o sujeito ativo desta conduta delituosa pode estar ou não situado em território brasileiro. O controlador do site pode estar morando no Recife e hospedando seu site pornográfico em outro país, veiculando fotos ou cenas de filmes que contenham sexo explícito envolvendo crianças ou adolescentes. Em qualquer situação, ele deverá ser processado pela lei brasileira, conforme o disposto no art. 7°, inc, II, a e b. Isto será o bastante para que se configure a necessária internacionalidade da conduta, e a competência da Justiça Federal.

             10.8 Os crimes de corrupção ativa e tráfico de influência nas transações comerciais internacionais (Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, de 17.12.97, aprovada pelo Decreto Legislativo 125/2000 e promulgada pelo Decreto 3.678/2000).

             Por meio do Decreto 3.678/2000, o Brasil se obrigou a combater a corrupção que envolvesse funcionário público estrangeiro. Assim, em 11.06.2002, passaram a viger em nosso ordenamento, introduzidos pela Lei 10.467, os arts. 337-B e 337-C, do Código Penal:

             "Corrupção ativa em transação comercial internacional

              Art. 337-B. Prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a funcionário público estrangeiro, ou a terceira pessoa, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício relacionado à transação comercial internacional: (Artigo incluído pela Lei nº 10467, de 11.6.2002)

              Pena – reclusão, de 1 (um) a 8 (oito) anos, e multa.

              Parágrafo único. A pena é aumentada de 1/3 (um terço), se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário público estrangeiro retarda ou omite o ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.

              Tráfico de influência em transação comercial internacional

              Art. 337-C. Solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, vantagem ou promessa de vantagem a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público estrangeiro no exercício de suas funções, relacionado a transação comercial internacional: (Artigo incluído pela Lei nº 10467, de 11.6.2002)

              Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

              Parágrafo único. A pena é aumentada da metade, se o agente alega ou insinua que a vantagem é também destinada a funcionário estrangeiro."

             A compreensão do conceito de funcionário público estrangeiro deve ser a mais ampla possível, assim como ocorre com o funcionário público nacional. A respeito, tal definição se encontra no art. 337-D do CP.

             Quando tais condutas forem praticadas com o nexo de internacionalidade necessário, a competência para o julgamento, por conseguinte, estará consagrada à JF. Dessarte, se o ato do funcionário estrangeiro pretendido pelo sujeito ativo dos delitos acima citados encontra-se relacionado com seu trabalho, no exterior, a competência será da Justiça Federal. Quando o ato pretendido pelo criminoso for praticado no Brasil, noutra via, a competência será da Justiça Comum Estadual.


11. COMPETENCIA NOS CRIMES CONTRA A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO

             À Justiça do Trabalho não foi destinada competência para decisão de nenhuma causa de natureza penal. Isto é muito facilmente aferido da leitura da Carta Magna, em seu art. 114. Conhecendo da prática de delitos deste escol, os juízes laborais deverão comunicar os fatos à autoridade policial, ao Ministério Público ou ao juízo competente.

             É sabido que os crimes contra a organização do trabalho estão tipificados nos arts. 197 a 207 de nosso Código Penal. Contudo, não há uma estrita coincidência entre tais delitos e aqueles descritos no art. 109, VI, da CF/88, posterior e de maior hierarquia que o CP. É como bem analisa Roberto da Silva Oliveira:

             "O sentido do termo na Constituição diz respeito à proteção dos direitos e deveres dos trabalhadores em coletividade, como força de trabalho, não podendo ser confundido com aquele adotado pelo Código Penal, que pode conceber um mero crime contra o patrimônio de um empregado como crime contra a organização do trabalho" (51).

             Assim, não necessariamente os crimes contra a organização do trabalho que são mencionados no art. 109 da Carta Constitucional somente estarão dentre os trazidos pelos arts. 197 a 207 do Código Penal. É como sói ocorrer com o delito de redução à condição análoga de escravo, citado à frente, que está insculpido no art. 149 do CP e pode ser considerado como crime contra a organização do trabalho.

             Vladimir de Souza Carvalho assim comenta os crimes contra a organização do trabalho descritos na Constituição: "Serão aqueles que têm pertinência com o sistema geral de órgão e instituição que preserva, em termos genéricos, os direitos e os deveres dos trabalhadores em coletividade, como força de trabalho. Seria, por exemplo, o crime de instigar greve quando não autorizada ou impedi-la, quando permitida; ou que impeça de funcionar uma confederação de sindicatos etc. Tais seriam crimes contra a Organização do Trabalho, em sentido próprio, a que, evidentemente, quis referir-se à Constituição." (52)

             Assim, para que a análise desta competência da Justiça Federal não fosse tão simplista, o antigo Tribunal Federal de Recursos editou a Súmula 115, que pacificou imensamente a questão, afirmando que: "compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes contra a organização do trabalho, quando tenham por objeto a organização geral do trabalho ou direitos dos trabalhadores considerados coletivamente".

             Alguns fatos apontados como crimes contra a organização do trabalho não passam de mero delito de dano. Isto costuma ocorrer em atos de violência, praticados durante movimentos grevistas, por pessoas que nem mesmo é trabalhadora em empresas relacionadas ao movimento paredista. Por óbvio que a conduta deve ser tratada como crime contra o patrimônio.

             Por vezes, órgãos federais como o Ministério do Trabalho e a Justiça do Trabalho são afetados por condutas que os induzem a erros, como nas falsificações e usos de documentos falsos. Nestes casos, a competência da Justiça Federal se determinará pelo art. 109, inciso IV, da CF, e não pelo fato de que a organização do trabalho restaria afetada.

             Quanto aos delitos decorrentes de greve, impende ressaltar que não mais subsiste a regra do art. 125, inciso VI, da CF/69, destinando à Justiça Federal a competência para julga-los. No caso concreto, caberá ao julgador verificar se o crime praticado em movimentos grevistas efetivamente atenta contra a organização do trabalho, coletivamente considerada. Somente assim, seria competente a Justiça Federal.

             Vale abrir um parêntesis sobre o abominável crime de submissão e redução à condição análoga a de escravo, que foi bastante modificado pela novel Lei 10.803/2003. O art. 149 do Código Penal assim fala:

             "Art. 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto: (Redação dada pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

             Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência. (Redação dada pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

             § 1o Nas mesmas penas incorre quem: (Parágrafo incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

             I – cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho;

             II – mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho.

             § 2o A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido: (Parágrafo incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

             I – contra criança ou adolescente;

             II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem."

             Discute-se se este delito seria ou não da competência da Justiça Federal, a teor do art. 109, VI, da Constituição. Cremos que, quando se está diante da redução de alguém à condição de escravo, se encontra eivado de morte, no mínimo, um direito coletivo dos trabalhadores: a garantia constitucional ao salário, contra-prestação ao trabalho produzido pelo trabalhador. Indiscutível que a prática do escravismo desestabiliza qualquer sistema de organização e proteção do trabalho, levando à míngua seus correlatos direitos. Inolvide-se que, na quase totalidade dos casos apurados pela Polícia, não é encontrado apenas um ou dois trabalhadores escravos, mas sim vários, compondo um sistema imbricado de escravização praticada por quadrilhas organizadas, geradoras de uma verdadeira legião de trabalhadores que vivem e laboram em condições sub-humanas e indignas, e que não condizem com nenhum Estado Democrático, demonstrando ser uma vergonha nacional a insistente existência de cidadãos trabalhando sem receber salário.

             Ainda, além de afetar drasticamente a organização do trabalho, tal delito vai de encontro a interesse direto da União. O Brasil firmou as Convenções 29 e 105 da Organização Internacional do Trabalho. A Convenção 29 foi aprovada pelo Decreto Legislativo n°. 24, de 29.05.56 e promulgada pelo Decreto n°. 41.721, de 25.06.57. Já a Convenção 105 teve seu conteúdo aprovado pelo Decreto Legislativo n°. 20, de 30.04.65, com promulgação dada pelo Decreto 58.822, de 14.07.66. Em ambas as convenções, o Brasil, através da União, que é ente de direito público interno e exclusivamente representa o Estado brasileiro nas relações exteriores, se comprometeu a adotar medidas eficazes no objetivo de abolir imediata e completamente o trabalho forçado ou escravo. Há, inclusive, equipes montadas de servidores federais incumbidos de combater estas nocivas práticas, como o GERTRAF – Grupo Executivo de Repressão ao Trabalho Forçado e o Grupo Especial de Fiscalização Móvel, este atuando com o apoio logístico da Polícia Federal. Nítido e inconfundível o interesse direto da União na solução deste tipo de delito, consagrando, por conseguinte, a competência da Justiça Federal para o seu deslinde.


12. COMPETENCIA NOS CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO E A ORDEM ECONÔMICO-FINANCEIRA. CRIMES DE LAVAGEM DE DINHEIRO.

             O inciso VI, do art. 109 da CF/88 dispõe que a Justiça Federal será declarada competente para decidir causas relacionadas a "crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira".

             Com isso, demonstrou o Constituinte que deve haver uma preocupação maior por parte da União com a manutenção do Sistema Financeiro Nacional e da ordem econômico-financeira.

             Esta norma constitucional, como se vê, precisa ser complementada pela legislação ordinária, que determinará em quais casos de crimes contra o sistema financeiro e contra a ordem econômico-financeira será competente a Justiça Federal.

             12.1 Crimes contra o Sistema Financeiro.

             Rodolfo Tigre Maia assim descreve estes delitos: "...são criminalizadas aquelas ações ou omissões humanas, praticadas ou não por agentes institucionalmente ligados ao sistema, dirigidas a lesionar ou a colocar em perigo o SFN, enquanto estrutura jurídico-econômica global valiosa para o Estado brasileiro, bem como as instituições que dele participam, e o patrimônio dos indivíduos que nele investem suas poupanças privadas" (53).

             A legislação ordinária a que se refere o Constituinte é a Lei n°. 7.492/86, a famosa Lei do Colarinho Branco, que define os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional. Em seu art. 26, caput, assim está preceituado: "A ação penal, nos crimes previstos nesta Lei, será promovida pelo Ministério Público Federal, perante a Justiça Federal".

             Assim, excluídos da competência da JF estão os delitos previstos na Lei n°. 4.595/64 (v.g. o delito de concessão de empréstimos vedados insculpido no art. 34 da Lei), em vista deste diploma legal nada dispor acerca da competência da Justiça Federal para os crimes nele capitulados.

             Relevante é a assertiva de que vários tipos de empresas e pessoas são equiparadas às instituições financeiras, pelo parágrafo único do art. 1° da Lei de Colarinho Branco (54). Portanto, estas empresas e empresários também podem praticar os delitos contra o Sistema Financeiro e serem processados perante a Justiça Federal.

             Em compasso com a Súmula 122 do STJ, havendo conexão entre crime contra o Sistema Financeiro Nacional e crime da competência do Juízo Estadual, "o fórum attractionis será o da justiça federal não ocorrendo a cisão de processos. (55)" Assim, a competência federal se firmará mesmo que haja conexão com crimes da alçada da Justiça Estadual, como os crimes falimentares.

             Noutro lado, a competência será da Justiça Estadual quando houver a prática de crimes contra a economia popular, em geral tipificados na Lei n°. 1.521/51. Há súmula do Pretório Excelso, nesta direção. É a de n° 498, nestes termos: "Compete à Justiça dos Estados, em ambas as instâncias, o processo e o julgamento dos crimes contra a economia popular".

             12.2 Crimes contra a ordem econômico-financeira

             Como já dissemos, precisa ser regulamentada pela legislação ordinária a norma que o constituinte dispôs na parte final do inciso VI do art. 109. Tal legislação ditará em quais casos de crimes contra a ordem econômico-financeira será competente a Justiça Federal.

             Os crimes contra a ordem econômico-financeira, no entender da maioria dos doutrinadores, abarcam os crimes contra o sistema financeiro. Com este posicionamento, entende-se que a Lei n° 7.492/86 também define crimes que afetam a ordem econômico-financeira.

             Entretanto, as leis que definem crimes contra a ordem econômico-financeira strictu sensu mais conhecidas são, em suma, a Lei n°. 8.137/90 e a Lei n°. 8.176/91. E, como estes diplomas legais não têm disposição específica no sentido da competência da Justiça Federal para o julgamento dos crimes neles previstos, a jurisprudência, pacificamente, se direcionou a firmar a competência da Justiça Comum Estadual para a decisão destas lides criminais. Com efeito, através do art. 24, I, da Carta Maior, vê-se a competência concorrente para se legislar sobre direito econômico.

             No entanto, mesmo na ocorrência dos crimes capitulados nestas Leis, a competência da Justiça Federal poderá se firmar. Basta que afetem a ordem econômica e financeira da União e seus entes, ou que violem bens, serviços ou interesses destes e a competência da Justiça Federal se firmará, através do art. 109, inciso IV, da CF.

             E tal competência se dá, certamente, quando a União institui autarquias relacionadas à fiscalização de determinadas atividades econômicas, nos termos do art. 174 da CF, para a observação da consecução dos princípios estabelecidos no art. 170 da Carta Magna.

             Entre estas autarquias federais podem ser citadas a Agência Nacional do Petróleo – ANP, criada pela Lei n°. 9.478/96 (56), e o CADE, regulado pela Lei n°. 8.884/94 (57).

             Quanto à ANP, devem ser rememoradas as disposições do caput do art. 8° da Lei que a instituiu, reforçando seu caráter regulador de atividades econômicas:

             "Art. 8° A ANP terá como finalidade promover a regulação, a contratação e a fiscalização das atividades econômicas integrantes da indústria do petróleo, cabendo-lhe: (...)"

             Inolvide-se também a participação do Ministério Público Federal nos processos da competência do CADE, como dispõem os arts. 10 (58), IV e 12 (59) da Lei 8.884/94.

             Assim, na ocorrência de delitos contra a ordem econômica, tipificados, v.g., no art. 1° da Lei 8.176/91 e no art. 4° da Lei 8.137/90, que venham a afetar o serviço da União e de suas autarquias, como a ANP e o CADE, competente para dirimi-los é a Justiça Federal.

             Insta observar, com Roberto da Silva Oliveira, que "o pagamento do tributo e de seus acessórios, antes do recebimento da denúncia, acarreta a extinção da punibilidade, nos crimes da Lei 8.137/90, nos termos do art. 34 da Lei 9.429/95; e mais recentemente o art. 15, §3°, da Lei 9.964/2000 previu a mesma hipótese para os tributos e contribuições sociais objeto de concessão de parcelamento (60)".

             12.3 Crimes de lavagem de dinheiro

             No tocante aos delitos de lavagem de dinheiro, a Lei n°. 9.613/98, em seu art. 2°, dispõe expressamente que:

             "Art. 2º. O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei:

             (...)

             III - são da competência da Justiça Federal:

             a) quando praticados contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira, ou em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas;

             b) quando o crime antecedente for de competência da Justiça Federal."

             Desta forma, a competência da Justiça Federal para o julgamento dos crimes previstos na Lei 9.613/98 se dará nas seguintes hipóteses:

             - quando o crime afetar algum ente federal lato sensu;

             - quando o crime for cometido em detrimento do sistema financeiro;

             - quando o crime for cometido em detrimento da ordem econômico-financeira;

             - ou quando o delito anterior ao crime de lavagem for de competência da Justiça Federal.

             O fato de serem afetados bens ou interesses de ente federal já foi objeto de nosso estudo, havendo disposição constitucional neste sentido (art. 109, IV), independente da natureza do crime praticado.

             Quando a lavagem de dinheiro atingir o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira, temos que a competência se firmará pela JF, independente de haver prévia permissão legal, como preleciona o art. 109, VI, da CF. Esta observação é importante, visto que as Leis 8.137/90 e 8.176/91 não possuem dispositivo legal que culmine a competência à Justiça Federal, para julgamento dos crimes contra a ordem econômica nela previstos. Já os crimes tratados na Lei 7.492/86, como vimos, são sempre da competência da JF, a teor de seu art. 26.

             Os crimes passíveis de anteceder a lavagem de dinheiro, por serem propiciadores de uma enorme lesividade social e geradores de consideráveis benefícios econômicos, estão descritos, numerus clausus, nos sete incisos do art. 1° da Lei 9.613/98. São eles: tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins; terrorismo; contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à sua produção; extorsão mediante seqüestro; crimes contra a Administração Pública; crimes contra o sistema financeiro nacional e crimes praticados por organização criminosa. Quando uma destas condutas, citadas genericamente, anteceder ao crime de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores, e tiver que ser julgada pela Justiça Federal, consoante as pertinentes disposições constitucionais, fixada estará a competência da Justiça Federal também para o julgamento do crime de lavagem de dinheiro.

             Vale dizer que a comprovação da conduta antecedente não é plena. Basta que se forneçam ao Juízo os indícios suficientes de sua existência. É desnecessário que haja sentença ou processo em andamento confirmando a existência do delito anterior, ou mesmo que haja autoria delimitada ou punibilidade do autor, em consonância com o §1° do art. 2° da Lei 9.613/98.

             O julgamento do crime de lavagem de dinheiro, ainda, independe de processo anterior para julgamento do crime antecedente, conforme o art. 2° , inc. II (61), da Lei supracitada. Assim, embora, a despeito do art. 76, II e III do CPP, tenhamos que tratar o crime de lavagem de dinheiro e seu respectivo antecedente como crimes conexos, reunindo os processos e proferindo julgamento comum, é a Lei de Lavagem de Dinheiro que cria uma outra normatividade impondo, por conseqüência, a separação dos processos. Inolvidemos o art. 80 de nosso Código de Processo Penal, que traz regras que excepcionam o critério de modificação da competência criado pela conexão, ditando regra semelhante:

             "Art. 80. Será facultativa a separação dos processos quando as infrações tiverem sido praticadas em circunstâncias de tempo ou de lugar diferentes, ou, quando pelo excessivo número de acusados e para não Ihes prolongar a prisão provisória, ou por outro motivo relevante, o juiz reputar conveniente a separação."


13. COMPETENCIA NO HABEAS CORPUS

             A teor do art. 109, inciso VII, da CF/88, a Justiça Federal é competente para julgar os habeas corpus em duas hipóteses: quando for matéria criminal de sua competência, ou quando o constrangimento provier de autoridade a ela processualmente subordinada (através de critérios que veremos adiante). Por vezes, podem ocorrer as duas hipóteses em um só caso, conquanto a existência de apenas um dos requisitos já garanta a competência da Justiça Federal.

             A primeira hipótese se trata de crime da competência de juiz federal. Sabe-se que a matéria criminal a ser julgada pela Justiça Federal se encontra nos incisos IV, V, VI, IX, X e XI do art. 109 da CF. Assim, quando forem praticados atos constrangedores da liberdade de locomoção do indivíduo durante a persecução penal acerca destas matérias, a competência para decidir os habeas corpus deverá ser da Justiça Federal.

             Quanto à segunda hipótese, para aferir se uma autoridade federal estará sujeita à competência da Justiça Federal, como determina o critério interpretativo do art. 109, VII, in fine, a operação se realizará por exclusão. Definir-se-á a competência em razão da qualificação da autoridade coatora, e de sua não-vinculação a outra jurisdição, sendo totalmente irrelevante a qualificação do paciente.

             Assim, devem ser excluídos da competência da Justiça Federal os habeas corpus contra atos praticados por autoridades federais submetidas ao STF (art. 101, I, d e i, da CF), ao STJ (art. 105, I, c, da CF), aos TRF’s (art. 108, I, d, da CF), à Justiça Militar e à Justiça Eleitoral.

             Vale ressaltar que a Justiça Trabalhista não é competente para julgar habeas corpus provenientes de atos de juízes seus, devido a sua especialização para dirimir as lides laborais. Desta forma, através da análise do art. 108, I, a, da CF, conflui-se que a competência para tanto deve ser dos Tribunais Regionais Federais, e não da Justiça Federal de primeira instância. O TRF da 1ª Região editou a súmula 10, neste sentido: "Compete ao Tribunal Regional Federal conhecer de habeas corpus quando o coator for juiz do trabalho".

             Por este mesmo raciocínio, atrelado à letra do art. 108, I, a, da CF, chega-se à conclusão de que em relação a habeas corpus relacionados a atos oriundos de membros do MPU, que constranjam a liberdade de locomoção do indivíduo, a competência deverá ser, também, fixada nos TRF’s. Vladimir Souza Carvalho traz esta contribuição: "...não é da Justiça Federal a competência para processar e julgar habeas corpus impetrado contra ato praticado por membros da 1ª instância do MPF (Juiz Hermes S. da C. Júnior, HC 1998.04.01.068317-6-SC, DJU-II 16.12.98, p. 319)" (62).


14. COMPETENCIA NOS CRIMES PRATICADOS A BORDO DE NAVIOS E AERONAVES

             Com o objetivo de delimitarmos quais seriam as aeronaves e navios inseridas dentro desta regra, relembremos a teoria do território ficto, disposta nos §§ 1° e 2° do art. 5° de nosso Código Penal:

             "Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

             § 1º - Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

             § 2º - É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em vôo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)"

             Pertencem à competência da Justiça Federal o julgamento de todos os crimes que sejam praticados nas aeronaves e navios, sejam eles consumados ou tentados, independente da posição social do sujeito ativo e do sujeito passivo.

             Também é dispensável o nexo de internacionalidade, requisito necessário apenas para a hipótese do inciso V do art. 109 da Constituição de 1988. Destarte, mesmo que o crime seja praticado em viagens domésticas, a bordo de navios e aeronaves nacionais, sem envolvimento de qualquer elemento extra-nacional, a competência será da Justiça Federal.

             Ressalva-se a competência jurisdicional da Justiça Militar, visto que as Forças Armadas possuem seus próprios esquadrões, tornando-se inarredável que, na ocorrência de crimes em aeronaves e navios militares, o julgamento para os mesmos compita à Justiça Castrense.

             O argumento utilizado para destinar à Justiça Federal a competência para o julgamento de crimes previstos em tratados e convenções internacionais - relacionado às atribuições constitucionais da União, dispostas no art. 21, I, da CF - é o mesmo de que se utilizou o Constituinte para destinar a competência relacionada a estes casos à Justiça Federal.

             Quanto aos navios, vale grifar que o entendimento jurisprudencial consagrado é de que embarcação de pequeno porte não deve ser entendida como navio, somente o sendo as embarcações de navegação em alto-mar.

             Vejamos Vladimir Souza Carvalho: "A Constituição, ao usar a palavra navio, não se refere à embarcação qualquer, mas àquelas a que assim designa a linguagem comum, isto é, embarcações de tamanho e autonomia consideráveis. O termo navio, utilizado na norma constitucional, não compreende as embarcações de pequeno calado, impróprias para a navegação em alto-mar. A regra constitucional não abrange embarcações de pequeno porte (Min. Décio Miranda, CC 1.998-SP. DJU 20.10.77, p. 7.334, RTFR 57/171, CC 2.758-SP, DJU 13.09.76, p. 7.884, CC 2.800-SP, DJU 01.11.76, p. 9.496; Min. Flaquer Scartezzini, CC 5.047-SP, DJU 25.08.83, p. 12.560) (63)".

             Isto posto, não é fixada a competência da Justiça Federal quando os crimes são praticados em embarcação de pesca litorânea, pequenas embarcações de transporte de passageiros, botes, lanchas de passeio, barcos de madeira com motor de popa etc.

             Por sua vez, o conceito de aeronave é trazido pelo art. 106 da Lei 7.565/86 (Código Brasileiro de Aeronáutica), quando diz que "considera-se aeronave todo aparelho manobrável em vôo, que possa sustentar-se e circular no espaço aéreo, mediante reações aerodinâmicas, apto a transportar pessoas ou coisas". Vladimir Souza Carvalho acrescenta dois outros requisitos: "tamanho e autonomia considerável, a fim de afastar da competência da Justiça Federal os crimes cometidos a bordo de aeronaves de pequeno porte (64)". Roberto da Silva Oliveira discorda deste entendimento. Alega o doutrinador que "a competência da Justiça Federal se firma independentemente do porte e da autonomia da aeronave, em face da escorreita interpretação deste termo" (65). Pensamos que assiste razão ao último, porquanto estaríamos diante de uma seletividade que não foi desejada pelo Constituinte, quando este referiu-se a crimes praticados em aeronaves.

             A seção judiciária competente será definida pelo primeiro porto brasileiro em que o navio atracar, ou em que a aeronave pousar, após a prática do delito, a teor dos arts. 89 e 90 do Código de Processo Penal.

             Por fim, questão interessante ocorre quando, na prática do delito de tráfico internacional de entorpecentes, o cidadão é preso em flagrante no interior de aeronave, ao desembarcar em municipalidade que não seja sede da Justiça Federal. Alguns juízes, nestes casos, têm excluído a competência da JF, sob o argumento de que, pelo fato da aeronave ser apenas elemento sugestivo da internacionalidade do tráfico, mas não elemento definidor do tráfico internacional; a Justiça Estadual seria a competente, através da delegação contida no art. 27 da Lei 6.368/76. Tal raciocínio, desrespeitando os fins a que se propõe o art. 109, inc. IX, da Carta Magna, não merece prosperar. Vale grifar o recente entendimento de nosso colendo STJ, que deve sobrepairar acima das decisões em sentido contrário:

             "PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES.

             COMPETÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE VARA FEDERAL NO LOCAL DO CRIME.. LEI 6.368/76, ART. 23.DELITO COMETIDO A BORDO DE AERONAVE. CF, ART. 109,IX.

             1.Ante a ausência de previsão legal, não é possível o exercício da jurisdição federal pelo juiz estadual, por delegação, em caso de crime cometido a bordo de aeronave.

             2. Habeas Corpus conhecido, pedido indeferido. (66)"


15. CONCLUSÃO

             Com as linhas que acima escrevemos, queremos crer ter colaborado para a elucidação de questões controversas acerca da competência da Justiça Federal para dirimir lides criminais. Certamente não pudemos aprofundar o estudo da maneira almejada, num ou noutro tópico, mas fica ao leitor a mensagem de que quisemos ser o mais abrangente possível, em vista da variedade de temas que são regidos pela Justiça Federal. Tentamos trazer à colação as mais atuais decisões judiciais e a mais creditada doutrina a respeito dos temas aqui tratados. Por fim, este estudante, agradecendo a paciência e atenção dispensadas na leitura deste prolongado artigo, apenas requer ao prezado leitor-operador do Direito que se insira nos debates científicos a respeito destes temas, para que cada vez mais evitemos a nulidade e a inutilidade de inquéritos e processos judiciais criminais, causados por uma má indicação da autoridade competente.


BIBLIOGRAFIA

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             THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Volume I – 29ª Ed. – Rio de Janeiro: Forense, 1999.


Notas

             1 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal – 9ª Ed. – São Paulo: Saraiva, 2003, p. 186.

             2 CARNEIRO, Athos Gusmão. Jurisdição e Competência – 9ª Ed. – São Paulo: Saraiva, 1999, p. 4.

             3 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil – Volume I – 3ª Ed. – São Paulo: Malheiros, 2003, p. 309.

             4 CARNEIRO, Athos Gusmão. Op. cit., p. 5.

             5 CARNEIRO, Athos Gusmão. Op. cit., p. 49.

             6 Idem, ibidem.

             7 CAPEZ, Fernando. Op. cit., p. 188.

             8 LIMA, Marcellus Polastri. Ministério Público e Persecução Criminal. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 33.

             9 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. – 13ª Ed. – São Paulo: Atlas, 2002, p. 189.

             10 CAPEZ, Fernando. Op. cit., p. 199.

             11 Súmula 200: O Juízo Federal competente para processar e julgar acusado de crime de uso de passaporte falso é o do lugar onde o delito se consumou.

             12 Súmula 244: Compete ao foro do local da recusa processar e julgar o crime de estelionato mediante cheque sem provisão de fundos.

             13 CARVALHO, Vladimir de Souza. Competência da Justiça Federal. – 4ª Ed. – Curitiba: Juruá, 2003, p. 392.

             14 MIRABETE, Julio Fabbrini. Op. cit., p. 169.

             15 Idem, ibidem, p. 178.

             16 Código Penal: "Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade."

             17 "Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior."

             18 "Art. 73 - Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3º do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste Código."

             19 "Art. 74 - Fora dos casos do artigo anterior, quando, por acidente ou erro na execução do crime, sobrevém resultado diverso do pretendido, o agente responde por culpa, se o fato é previsto como crime culposo; se ocorre também o resultado pretendido, aplica-se a regra do art. 70 deste Código."

             20 MIRABETE, Julio Fabbrini. Op. cit., p. 180.

             21 "Art. 83. Verificar-se-á a competência por prevenção toda vez que, concorrendo dois ou mais juízes igualmente competentes ou com jurisdição cumulativa, um deles tiver antecedido aos outros na prática de algum ato do processo ou de medida a este relativa, ainda que anterior ao oferecimento da denúncia ou da queixa (arts. 70, § 3o, 71, 72, § 2o, e 78, II, c)."

             22 HC 75.219-RJ, Informativo do STF, n°. 83.

             23 CARNEIRO, Athos Gusmão. Op. cit., p. 126.

             24 CARVALHO, Vladimir de Souza. Op. cit., p. 399.

             25 CARNEIRO, Athos Gusmão. Op. cit., 127.

             26 OLIVEIRA, Roberto da Silva. Competência Criminal da Justiça Federal. – São Paulo: RT, 2002, p. 62.

             27 CARVALHO, Vladimir de Souza Carvalho. Op. cit., p. 358.

             28 Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: (...)

             II - julgar, em recurso ordinário: (...)

             b) o crime político;

             29 CAPEZ, Fernando. Op. cit., p. 198.

             30 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 12ª Ed.. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 130.

             31 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 144.

             32 CARVALHO, Vladimir de Souza. Op. cit., p. 34.

             33 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 144-145.

             34 CARVALHO, Vladimir de Souza. Op. cit., p. 299.

             35 PANTUZZO, Giovanni Mansur Solha. Crimes Funcionais de Prefeitos. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 37.

             36 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 1999, p. 254.

             37 Cancelada em 25.08.1999, a partir de questão de ordem suscitada no Inquérito 687-SP.

             38 OLIVEIRA, Roberto da Silva. Op. cit., p. 76.

             39 Art. 23, inc. VI, da CF.

             40 "Art. 46. Receber ou adquirir, para fins comerciais ou industriais, madeira, lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal, sem exigir a exibição de licença do vendedor, outorgada pela autoridade competente, e sem munir-se da via que deverá acompanhar o produto até final beneficiamento:

             Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa.

             Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem vende, expõe à venda, tem em depósito, transporta ou guarda madeira, lenha, carvão e outros"

             41 CARVALHO, Vladimir de Souza. Op. cit., p. 304.

             42 OLIVEIRA, Roberto da Silva. Op. cit., p. 69.

             43 Vide art. 21, I, da CF.

             44 OLIVEIRA, Roberto da Silva. Op. cit., p. 82-83.

             45 OLIVEIRA, Roberto da Silva. Op. cit., p. 85.

             46 Convenção n° 107, sobre a Proteção e Integração das Populações Tribais e Semi-Tribais de Países Independentes.

             47 RE 179.485-2-AM, DJU 10.11.1995, p. 38.326.

             48 JESUS, Damásio de. Tráfico Internacional de Mulheres e Crianças: Brasil: aspectos regionais e nacionais. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 139-140.

             49 JESUS, Damásio de. Op. cit., p. 9.

             50 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos Internacionais e Jurisdição Supra-Nacional: a exigência da federalização. Boletim Associação Nacional dos Procuradores da República, n. 16, ago. 1999.

             51 OLIVEIRA, Roberto da Silva. Op. cit., p. 92.

             52 CARVALHO, Vladimir de Souza. Op. cit., p. 365.

             53 MAIA, Rodolfo Tigre. Dos Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 15.

             54 "(...)Parágrafo único. Equipara-se à instituição financeira:

I - a pessoa jurídica que capte ou administre seguros, câmbio, consórcio, capitalização ou qualquer tipo de poupança, ou recursos de terceiros;

             II - a pessoa natural que exerça quaisquer das atividades referidas neste artigo, ainda que de forma eventual".

             55 MAIA, Rodolfo Tigre. Op. cit., p. 152.

             56 "Art. 7° Fica instituída a Agência Nacional do Petróleo - ANP, entidade integrante da Administração Federal indireta, submetida ao regime autárquico especial, como órgão regulador da indústria do petróleo, vinculado ao Ministério de Minas e Energia."

             57 "Art. 3º O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão judicante com jurisdição em todo o território nacional, criado pela Lei nº 4.137, de 10 de setembro de 1962, passa a se constituir em autarquia federal, vinculada ao Ministério da Justiça, com sede e foro no Distrito Federal, e atribuições previstas nesta lei."

             58 "Art. 10. Junto ao Cade funcionará uma Procuradoria, com as seguintes atribuições:

             (...)

IV - promover acordos judiciais nos processos relativos a infrações contra a ordem econômica, mediante autorização do Plenário do Cade, e ouvido o representante do Ministério Público Federal;"

             59 "Art. 12. O Procurador-Geral da República, ouvido o Conselho Superior, designará membro do Ministério Público Federal para, nesta qualidade, oficiar nos processos sujeitos à apreciação do Cade.

             Parágrafo único. O Cade poderá requerer ao Ministério Público Federal que promova a execução de seus julgados ou do compromisso de cessação, bem como a adoção de medidas judiciais, no exercício da atribuição estabelecida pela alínea b do inciso XIV do art. 6º da Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993."

             60 OLIVEIRA, Roberto da Silva. Op. cit., p. 96.

             61 "Art. 2º O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei:

             (...)

             II - independem do processo e julgamento dos crimes antecedentes referidos no artigo anterior, ainda que praticados em outro país;"

             62 CARVALHO, Vladimir de Souza. Op. cit., p. 388.

             63 CARVALHO, Vladimir de Souza. Op. cit., p. 380.

             64 Idem, ibidem, p. 381.

             65 OLIVEIRA, Roberto da Silva. Op. cit., p. 109.

             66 HC 14108, j. 10/10/2000, Rel. Min. Edson Vidigal, RSTJ 143/468.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Victor Roberto Corrêa de. Competência criminal da Justiça Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 324, 27 maio 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5232. Acesso em: 5 maio 2024.