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Apontamentos acerca da nova estrutura do processo de execução de obrigação de fazer e não fazer de título judicial.

Alterações introduzidas pelas Leis nº 8.952/1994 e 10.444/2002

Apontamentos acerca da nova estrutura do processo de execução de obrigação de fazer e não fazer de título judicial. Alterações introduzidas pelas Leis nº 8.952/1994 e 10.444/2002

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1. Considerações iniciais

O trabalho em apreço tem por escopo analisar as execuções (especificas) de obrigações de fazer [1] e de não fazer [2] de título judicial com o advento das Leis nºs. 8.952, de 13.12.1994 (Reforma) e 10.444, de 7.5.2002 (Reforma da Reforma).

Atesta-se que antes da Reforma de 1994, a execução de obrigação de fazer só podia ser amparada em título executivo judicial. O Código de Processo Civil (CPC) não disciplinava a execução de obrigação de fazer e não fazer fundada em titulo extrajudicial; fazia-se necessário ajuizar uma demanda em Juízo, visando a obtenção de uma sentença (titulo judicial), para então, executá-la. Com o advento da Lei n. 8.952, passou a ser possível a execução de título extrajudicial. Por outro lado, desde aquela mesma data, com a instituição do art. 461, a sentença que no processo de conhecimento impõe o cumprimento de dever de fazer ou de não fazer deixou de ter força meramente condenatória, passando a ser efetivada no próprio processo em que proferida. Tal mudança foi expressamente confirmada pela Lei 10.444/2002. Resta frisar que a partir de 2002, os arts. 632 a 645 passaram a incidir somente sobre os títulos extrajudiciais, cabendo ao art. 461 disciplinar os títulos judiciais.

Nas palavras de Nelson Rodrigues Netto, "O grande mérito da 1ª Reforma Processual a nosso ver, reside no fato de que as referidas tutelas foram adotadas como norma geral para as pretensões fundadas em obrigações de fazer e não fazer, por força do art. 461 na redação da Lei 8.952/94 [3]" (2003, p. 199).

Antes da lei n. 8.952/94, entendia-se tradicionalmente que a execução forçada, em direito processual, era caracterizada pela dispensa de qualquer disposição do obrigado a cumprir; havia a tendência a excluir do conceito de execução forçada qualquer sistema de pressões psicológicas exercidas sobre a vontade do obrigado, para que cumprisse. As tentativas de obter cumprimento por ato do obrigado eram havidas como excepcionais.

Assim, um dos pontos de maior realce, na Reforma de 1994, foi a instituição da nova técnica para a execução referente às obrigações de fazer ou de não-fazer, contida em um só artigo e seus parágrafos. O reformador teve a consciência de que essas obrigações são as de mais difícil execução por imposição imperativa do Estado-juiz, porque seu cumprimento depende muito da disposição do obrigado e é muito difícil obter, sem o concurso de sua vontade, os resultados a que o credor tem direito. Essa dificuldade ainda mais se acentua, quanto mais os resultados desejados dependam de uma conduta pessoal do obrigado, nas chamadas obrigações personalíssimas; mesmo nas obrigações negativas e nas positivas que podem ser cumpridas por ato de terceiro, na pratica é sempre muito difícil produzir esse resultado quando o obrigado não quer. A resistência do obrigado sempre foi muito respeitada, ao longo dos tempos, como óbice intransponível à efetivação das obrigações de fazer ou de não fazer, por obra dos órgãos judiciários. O dogma da intangibilidade da vontade humana era o pilar que norteava o entendimento dos Tribunais, em tempos remotos.

Hodiernamente, considera-se integrada em nossa cultura a idéia de que em nada interfere na dignidade da pessoa, ou em sua liberdade de querer ou não querer, qualquer mecanismo consistente na produção, mediante atividades estatais imperativas, da situação jurídica final a que o cumprimento da obrigação de fazer ou de não fazer deveria ter conduzido. Foi nesse contexto e sob influxo da consciência das mazelas das soluções tradicionais que os reformadores de 1994 instituíram o novo art. 461, posteriormente alterado pela lei n. 10.444/2002, que lhe conferiu uma maior eficácia executiva.

Logo, dentre as razões que induziram os juristas a introduzir essa nova estrutura ora analisada, está o fato de que, no âmbito das obrigações (aqui no sentido amplo de deveres) de fazer e não fazer, para que se dê ao titular do direito exatamente aquilo que ele obteria se não tivesse sido necessário o processo, é indispensável um sistema especial de tutela, em que: se faça uso da tutela preventiva, aquela que é posta em prática antes mesmo da lesão ao direito, a fim de inibi-lo ou fazê-la cessar logo no inicio; se adote a antecipação de tutela – até porque se é para ser utilizada a tutela preventiva, não se poderá esperar até o fim do processo para que só então ela seja empregada; imponham-se ordens ao réu, assistidas da cominação de sanções idôneas e capazes de convencer o réu a cumprir o que deve.

Assim, o modelo de tutela que será examinado adiante não é espécie de processo executivo, nos moldes daqueles que vêm sendo vistos, regularmente pelo Livro II. É processo que reúne simultaneamente cognição e execução no sentido mais abrangente.


2. Considerações gerais sobre a modalidade de execução específica

Antes de adentrarmos na temática ora em estudo, faz-se necessário uma breve elucidação sobre a diferença entre execução especifica e inespecífica, e entre aquela e execução imediata. Vejamos então.

2.1. Execução específica ou inespecífica

Diz-se específica, a execução consistente na restauração direta do interesse sacrificado (Cristiano Mandrioli), mediante oferta, a quem tem um direito, da precisa situação que o obrigado deveria haver produzido e não produziu, ou que ele alterou sem ter o direito de altera-la, ou impediu que se produzisse quando devia ser permitido. Visa restaurar direta e especificamente o próprio direito sacrificado ou transgredido pelo obrigado, o que se faz nas execuções para entrega ou por obrigação de conduta.

Já a execução inespecífica propicia dinheiro ao credor, seja para dar efetividade a um crédito que originalmente já tivesse objeto pecuniário, seja para restaurar ao menos a utilidade que o cumprimento específico daquelas obrigações teria produzido.

2.2. O sentido, na lei, de tutela especifica e resultado pratico equivalente

O processualista Wambier (2002, p. 284-285) destaca este item afirmando que nos dispositivos do art. 461, tutela especifica da obrigação e obtenção de resultado prático equivalente (ou correspondente) são postas como duas categorias distintas, e a insistência dessa dicotomia (caput, § 1º e § 5º) não deixa dúvida a respeito. Todavia, ambas, tutela especifica da obrigação e obtenção de resultado pratico equivalente, enquadram-se na noção ordinária de tutela especifica, contrapondo-se à conversão em perdas e danos – tutela genérica.

2.3. Execução especifica e execução imediata

A execução específica ocorre sempre que realizada com o objetivo de propiciar ao titular do direito o preciso bem a que ele tiver direito (restauração direta do direito lesado), independentemente de se processar em continuação ao processo de conhecimento ou mediante a formal instauração de um processo executivo autônomo; o que caracteriza não é a imediatidade inerente ao sistema do art. 461, mas a especificidade do resultado a obter. Para Dinamarco, que ventila essa diferenciação, melhor, então, falar com referência à execução realizada sem intervalo em execução imediata [4]. No sistema vigente no Brasil, toda execução imediata é específica, mas nem toda execução específica é imediata; as execuções específicas por título extrajudicial não são imediatas, mas nem por isso deixam de ser específicas. (Nota-se, contudo, que os demais autores pesquisados não levantam essa problemática, tratando a execução inserta no art. 461 como execução especifica).

Nesse diapasão, a executividade sem intervalo caracteriza as sentenças mandamentais, cuja eficácia é a de mandar o sujeito desenvolver determinada conduta, não se limitando a declarar a existência de um direito, a constituir uma situação jurídica nova ou mesmo a condenar e, com isso, autorizar a instauração do processo executivo. O que valoriza a sentença mandamental, em sua capacidade de promover a efetivação dos direitos, é a imediatidade entre seu momento de eficácia e a execução.

Uma ressalva a de ser feita. O art. 461, § 1º, do CPC, conquanto inserido no trato da execução imediata, essa norma legal tem abrangência total, impondo-se em todos os casos de execução especifica, quer quando realizada nos termos do art. 461, quer no processo executivo autônomo (título extrajudicial).


3. Sentenças mandamentais e executivas lato sensu

Outro importante aspecto a ser analisado é a diferenciação entre sentenças mandamentais e executivas lato sensu. Aquelas contêm ordem para o réu, a ser atendida sob pena de ser-lhe imposta alguma medida coercitiva (multa, prisão civil) e, mesmo de se caracterizar crime de desobediência. A efetivação dessa ordem dar-se-á no próprio processo em que foi proferida a sentença, independentemente de processo subseqüente.

De outra banda, as decisões dotadas de eficácia executiva lato sensu define-se pela possibilidade de obtenção da prestação específica ou do resultado pratico equivalente ao adimplemento da obrigação, por intermédio de medidas necessárias determinadas pelo juiz e realizadas por auxiliares da Justiça ou terceiros, independentemente de qualquer atividade do demandado. Distinguem-se das mandamentais porque seu conteúdo principal não é uma ordem para o réu cumprir, mas a autorização para o órgão judicial executar (satisfazer o direito independentemente da vontade do devedor), dentro do próprio processo em que proferidos (ex, ação de despejo, reintegração de posse etc.).

O traço que lhes é comum reside em seu procedimento híbrido, no qual o juiz, prescindindo da instauração do processo de execução e formação de nova relação jurídico-processual, exercita, em processo único, as funções cognitiva e executiva, dizendo o direito e satisfazendo o autor no plano dos fatos.

Nada impede que estas duas eficácias possam decorrer de um mesmo provimento do juiz. È o que acontece na tutela das obrigações de fazer e não-fazer do art. 461.

A introdução do art. 461, elegendo a tutela, por meio de ações mandamentais ou executivas lato sensu, como modo primordial para solução de lides envolvendo obrigações de fazer e não fazer, sem proceder à devida adequação com o ordenamento posto, requereu um exercício exegético do interprete, lançando mão dos métodos lógico e sistemático, para somente assim, conseguir implantar um sistema híbrido de funções judiciais, criado pela Lei 8.952/94.

Os juristas Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, lecionando acerca da natureza jurídica da ação, assim preceituam:

"A ação prevista no CPC art. 461 é condenatória e, portanto, de conhecimento. Nada obstante tem eficácia executivo-mandamental, pois abre ensejo à antecipação da tutela (CPC 461 § 3º), vale dizer, autoriza a emissão de mandado para execução especifica e provisória da tutela de mérito ou de seus efeitos (...)". (Apud WAMBIER, 2002, p. 297).


4. Medidas urgentes

O art. 461, § 3º, do CPC regula a concessão de medida liminar antecipatória da tutela especifica de obrigação de fazer ou de não fazer. Ainda em linha introdutória, observa-se que esta medida submete-se ao mesmo regime geral (requisitos, provisoriedade, fundamentação da decisão que a concede, recorribilidade etc.) de concessão daquela prevista no art. 273, I. Relembremos, contudo, que as obrigações que tem por objeto declaração de vontade escapam à incidência do artigo retrocitado. E ainda, o dispositivo em análise tanto pode antecipar efeitos, conforme os ditames do art. 273 do CPC, quanto poderá ter natureza cautelar, consoante art. 796 e ss. da legislação processual civil.

Esta inovação introduzida pela Reforma abre a possibilidade de ser antecipada a tutela jurisdicional especifica quando for relevante o fundamento da demanda e houver justificado receio de ineficácia do provimento final (requisitos cumulativos). A exigência de fundamento relevante significa que o pedido deve estar revestido da probabilidade de ser procedente, estando apoiado em documentos razoavelmente expressivos e razões jurídicas plausíveis; tal é o fumus boni júris exigido para a concessão de toda medida urgente. O justificado receio é a própria razão de ser das antecipações (interesse-necessidade) indicativo da necessidade de antecipar para preservar, ou seja, para evitar que o fluir do tempo corroa de tal modo o direito da parte que a decisão final, a ser concedida tempos depois, caia completamente no vazio ou ao menos tenha sua utilidade reduzida. A antecipação de tutela especifica aqui tratada visa a pôr o titular de direito no gozo integral ou parcial da própria situação final sonegada pelo obrigado e postulada no petitum. (p.466)

As antecipações serão concedidas liminarmente ou mediante justificação previa, podendo a qualquer tempo ser revogadas ou modificadas (art. 461, § 3º, parte final). Será sempre motivada a decisão que conceder, negar, modificar ou revogar a antecipação da tutela especifica como toda decisão judiciária deve ser (CPC, art. 273, §§ 1º e 4§; CF, art. 93, IX); e por ser uma decisão interlocutória, qualquer dessas decisões está sujeita ao recurso de agravo (art. 162, § 2º c/c rt. 522).

O dispositivo em análise silencia quanto a necessidade do pedido de parte para que a tutela especifica possa ser antecipada, mas a aplicação do disposto no art. 273, caput, que é o centro sistemático da disciplina das antecipações no CPC, exclui por completo a possibilidade de concessão ex-officio, ao dizer que tais medidas serão concedidas "a requerimento da parte".

Reforçando o exposto supra, acentua Humberto Theodoro Junior, in verbis:

"A propósito, é bom lembrar que, in casu, como aliás já se previra em caráter geral no novo texto do art. 273, a medida liminar não se confunde com simples medida cautelar (preventiva), pois assume a função especifica de antecipação da tutela visada a alcançar com a sentença de mérito (medida, portanto, satisfativa). Como tal, a liminar comporta, em caráter provisório, as mesmas providências que, em caráter definitivo, se intenta obter com o julgamento final da causa’. (Apud WAMBIER, 2002, p. 297).


5. As medidas de efeito equivalente ao do adimplemento e os casos de conversão

5.1. As medidas necessárias (art. 461, § 5º) – Conjugação de ordem (e coerção) com mecanismos sub-rogatórios

Um dos aspectos das agilizações trazidas pelas Reformas consiste na associação, entre medidas de coerção sobre a vontade do obrigado e medidas de constrição sobre seus bens. O juiz tem o intenso poder de exercer pressões psicológicas destinadas a persuadir o obrigado a adimplir, impondo-lhe situações cada vez mais gravosas na esperança de que em algum momento ele acabe por perceber que lhe custará menos o adimplemento que a renitência (multa, provação de bens, restrições às atividades).Tem também o poder-dever de atuar sobre o patrimônio do renitente, produzindo por sub-rogação os resultados que este insiste em não produzir – o que é feito mediante imposição de todas as medidas necessárias, entre as quais o imperativo de desfazimento de obras etc., inclusive empregando-se a força policial quando for preciso (art. 461, § 5º).

Como em toda relação jurídica envolvendo obrigação de fazer ou de não-fazer o objeto de interesse do credor é o resultado da conduta devida e não a conduta em si mesma, o juiz estará autorizado a alterar o que antes decidira na sentença mandamental, de modo a criar para o executado uma nova obrigação, talvez mais grave que a original, mas que seja apta a oferecer àquele o resultado a que tem direito.

Leciona Cândido Rangel Dinamarco acerca das providências que assegurem o resultado pratico equivalente ao do adimplemento:

"Não se trata de criar ou determinar a criação de uma situação final diferente daquela que desde antes já constituía o objeto da obrigação de fazer ou de não fazer: determinar em uma sentença um resultado que não estava na obrigação significaria obrigar o réu fora dos limites da lei ou do contraditório (Constituição, art. 5º, inc. II), além de, provavelmente, transgredir os limites do objeto do processo (CPC, arts. 128 460). Ao determinar essas providências, o juiz deve ater-se rigorosamente aos limites do pedido feito pelo autor na inicial, sempre tendo em mira o resultado final a que ele tinha direito". (Apud Wambier, 2002, p. 296).

Se por nenhum meio se consegue persuadir o proprietário de uma casa noturna a reduzir o volume dos sons que emitem para desassossego da vizinhança, o juiz impor-lhe-á a sanção consistente em lacrar a casa noturna – solução que para os vizinhos produz o mesmo resultado da conduta omitida pelo obrigado desobediente. Tal solução é mais gravosa para este.

Consoante o art. 461, § 5º, fica autorizado o juiz – que haja antecipado a tutela especifica, ou a providencia que assegure o resultado prático equivalente por liminar (§ 3º) ou a tenha concedido na sentença – a determinar, no mesmo ato, outras medidas complementares que possam significar, uma vez cumpridas, a realização do interesse do autor. A norma do § 5º, portanto, autoriza não só o emprego de mecanismos que substituem a conduta do demandado. Confere ao juiz igualmente poderes para a imposição de outros meios coercitivos (além da multa diária), destinados a acompanhar a ordem judicial dirigida ao réu, para que ele cumpra o fazer ou não fazer. Destaca-se, que os mecanismos sub-rogatórios e coercitivos poderão ser utilizados simultaneamente.

A enumeração contida no texto do artigo não é exaustiva, e sim rol meramente exemplificativo. Contudo não se trata de poder ilimitado que o juiz recebe. Fica afastada a adoção de qualquer medida que o ordenamento coíba (tal como, a prisão civil, permitida somente na estrita hipótese do art. 5º, LXVII, CF). Ademais, as providencias adotadas devem guardar relação de utilidade, adequação e proporcionalidade com o fim perseguido, não podendo acarretar na esfera jurídica do réu sacrifício maior do que o necessário.

Em suma, para obter o cumprimento do preceito contido em sentença mandamental, o juiz tem o poder de impor qualquer das medidas contidas na exemplificação e mais qualquer outra que as circunstâncias de cada caso concreto exijam e não destoem da razoabilidade inerente ao devido processo legal. Essa é a função sistemática das normas de encerramento – permitir que o interprete vá além da exemplificação, não se prendendo aos limites das tipificações contidas no texto legal. "deve-se ter por admissível todo modo de atuação da lei e todo meio executivo que seja praticamente possível e não contrarie uma norma geral ou especial de direito" (Chiovenda). O limite das medidas a serem impostas é ditado pelos critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, que não tem contornos fixos, mas devem servir de guia para a atuação ao mesmo tempo enérgica e prudente do juiz; não chegar ao ponto de degradar o obrigado, humilhando-o com medidas incompatíveis com a dignidade humana, nem ceder a temores e preconceitos irracionais que são óbices ilegítimos à efetividade da tutela jurisdicional.

Nada obsta que, originalmente tendo sido adotado apenas um dos caminhos (só o mandamento ou só a atuação substitutiva da conduta do réu, o outro seja depois empregado. Concedida a tutela típica do art. 461, acompanha-a ainda que não expressa no ato decisório,a determinação do emprego de todos os meios ali dispostos para obtenção do resultado especifico. Desde logo, portanto, o provimento terá eficácia executiva lato sensu e mandamental. A decisão posterior que comine a multa ou defina a forma de atuação sub-rogatória apenas estará efetivando a decisão originária.

Acrescenta-se, ainda, que não se trata de medidas de antecipação de tutela, mas de resguardo à eficácia das decisões judiciárias. Quando se trata de efetivar preceitos ditados em sentença de mérito, especialmente estando esta imunizada pela coisa julgada material, a irreversibilidade da situação a ser criada pela imperativa imposição das medidas de apoio não deve servir de freio à sua concessão, porque são meios hábeis e legítimos para fazer prevalecer o preceito que o obrigado descumpriu, Mas, nos casos em que se quer dar efetividade a antecipação de tutela ou mesmo a sentenças não passadas em julgado, a consciência da irreversibilidade aconselha maior prudência do juiz, porque as decisões antecipatórias são tomadas mediante cognição sumária e são elas próprias sujeitas a revogação a qualquer momento. (arts. 273, § 2º e 461, § 3º).

Nas medidas de sub-rogação, opera-se a substituição da conduta do demandado pelo do próprio Estado, através de agentes seus, a fim de alcançar o mesmo resultado (ou o mais próximo disso) que se teria com o cumprimento voluntário. A sub-rogação é da via para a produção da situação final e não do bem jurídico almejado. Não há assim, a denominada sub-rogação da obrigação.

O caput do art. 461 parece condicionar a determinação de tais providências ao julgamento de procedência da demanda, mas de qualquer modo, é cabível a concessão antecipada das medidas sub-rogatórias.

As multas periódicas são as medidas de coerção mais divulgadas e de maior aplicação na vida forense. Elas e as demais medidas de pressão psicológica caracterizam-se, segundo a linguagem tradicional, como atos de execução indireta; não incidem sobre bens, mas sobre a vontade, e não produzem elas próprias os resultados desejados (sub-rogação), mas buscam persuadir o obrigado a produzi-los. Em quatro manifestações a vigente configuração da tutela das obrigações específicas dispõe sobre as multas a serem impostas como sanção ao inadimplemento: a) no § 2º do art. 461, ao ditar a regra da cumulação da multa com possíveis perdas e danos; b0 e no § 4º do mesmo artigo, ao autorizar o juiz a impô-lo a estabelecer normas para sua imposição e dimensionamento; c) em seu § 5º, ao reafirmar esse poder e de modo explicito associar as astreintes ao cumprimento da obrigação originária ou à obtenção do resultado equivalente de que fala o caput; d) no § 6º do mesmo artigo, dando ao juiz poderes para alterar a periodicidade e valor das multas (os dois últimos dispositivos têm redação ditada pela lei n. 10.444/02).

5.2. Resultado equivalente – a questão das despesas

Via de regra, a atuação dos mecanismos sub-rogatórios importa em significativas despesas, que deverão ser desde logo compostas. O exemplo mais claro disso, ainda que não o único, tem-se com a realização por terceiro da tarefa a que o réu estava obrigado. A simples autorização para que se desenvolva a atividade sub-rogatória não basta. Obviamente, o terceiro a nada está obrigado; realizará a obra na medida em que seja pago. E com esse pagamento arcará pelo réu.

Concedida a antecipação, seria contra-senso pretender-se que a obtenção do numerário junto ao réu para cobrir tais despesas seguisse o procedimento de execução por quantia certa. A concessão antecipada de tutela pressupõe urgência.Vai se aplicar, então, e mais uma vez, o § 5º do ar. 461, que permitindo a adoção de quaisquer medidas necessárias à produção do resultado prático equivalente, autoriza consequentemente a obtenção do numerário que custear tais medidas.

Para cada medida que o juiz determinar, entre os valores envolvidos, terá de examinar qual o mais urgente e preponderante. Alem disso, optará sempre pela via menos sacrificante para o réu. Se for o caso, exigirá caução do autor.

5.3. O emprego de força, prisão e responsabilidade criminal

Hoje, tem-se a consciência de que nada há de inconstitucional no emprego racional e proporcionado da força, dispondo o CPC que, quando isso for necessário para a imposição das medidas ditadas pelo juiz, este estará autorizado a requisitar a força policial (art. 461, § 5º, parte final).

Da eficácia fortemente imperativa das sentenças mandamentais que se resolvem em comandos concretos a serem obedecidos, decorre que o desatendimento ao que elas determinam constitui crime de desobediência, como tal definido no art. 330 do CP, verbis: "desobedecer a ordem legal de funcionário público". O juiz é um funcionário público, as sentenças mandamentais que profere enquadram-se comodamente no conceito de ordem legal, e, portanto, quem desatende a elas desobedece, inclusive para fins penais. Há quem tema pela inconstitucionalidade da repressão a essa desobediência, pensando que ela propicia a prisão por dívida, constitucionalmente vedada (ar. 5º, LXVII, CF). O fundamento dessa repressão e dessa possível prisão não é, contudo, a dívida em si mesma, senão a afronta a um comando do Estado-juiz, como são os mandamentos contidos em sentença. A prisão será licita se o renitente for pilhado em atitudes de flagrante desobediência ao comando legal.

5.4. A conversão pecuniária

Ab initio, cabe esclarecer que a transformação da originaria obrigação de fazer ou não fazer em obrigação de pagar quantia certa é relegada a excepcionalidade: só haverá conversão em perdas e danos se o autor requerer ou se impossível a tutela especifica ou a obtenção do resultado pratico equivalente (art. 461, § 1º).

A primeira hipótese de conversão pecuniária a considerar é a daquela que se impõe em virtude da impossibilidade da execução especifica, sendo melhor converter do que renunciar a qualquer tutela jurisdicional. Há impossibilidade física de executar de modo especifico quando o sujeito obrigado a um fazer personalíssimo houver falecido ou perdido a capacidade com que antes contava (o cantor perdeu a voz) etc; haverá conversão do objeto da obrigação pelo dinheiro correspondente e, se for o caso segundo a lei civil, o obrigado responderá também por perdas e danos. Há impossibilidade jurídica quando alguma norma legal impedir a entrega ou impuser restrições a ela, especialmente na hipótese de haver sobrevindo a desapropriação da coisa pelo Poder Público. Também em relação ao resultado prático equivalente ao cumprimento da obrigação podem opor-se as impossibilidades físicas ou jurídicas, que lhe impedirão a efetividade, sendo nesses casos imperiosa a conversão pecuniária (art. 461, § 1º).

Questão a ser registrada é que o requerimento de conversão em perdas e danos pelo autor independe de concordância do réu. É direito que lhe assegura o ordenamento material diante do inadimplemento. Nota-se, contudo que essa vontade do credor não é tão livre que lhe permita optar pelas perdas-e-danos sem a prévia manifestação de qualquer resistência do devedor ou de dificuldades para efetivar as medidas judiciais. A ampla e irrestrita liberdade de optar pareceria até contar com o apoio da própria lei, que não faz ressalva alguma, assim como da autonomia da vontade, que é filha da garantia constitucional da liberdade – mas esse não é o melhor entendimento. Ao obrigado que em momento algum se mostrou resistente à pretensão representada pelo título executivo pode parecer mais conveniente entregar a própria coisa ou realizar o resultado especifico, não sendo lícito impor-lhe a conversão sem que haja concorrido para isso e sem que haja sobrevindo a impossibilidade de faze-lo; se o credor manifestar preferência pela conversão nessas circunstâncias, optará o obrigado entre aceita-la ou não, sendo rigorosamente indispensável o seu assentimento para que ela prevaleça.

Sempre que houver a conversão em pecúnia, a execução a fazer será por quantia certa, porque é somente esse o modo de executar por dinheiro (CPC, arts. 646 ss.)


6. A questão da multa diária (periódica)

6.1. Considerações gerais

A multa diária funciona como meio coercitivo para a concretização do mandado executivo. Não tem caráter reparatório [5], mas sim sancionatório. É exemplo daquilo que se denomina execução indireta: uso de mecanismos destinados a pressionar psicologicamente o devedor, a fim de que ele mesmo satisfaça a obrigação.É típico mecanismo de preservação da autoridade do juiz. É medida processual, de caráter público. Tal afirmação ficou ainda mais clara com as alterações introduzidas no CPC pelas Leis 8.952 e 8.953/94.

A ordem emitida pelo juiz far-se-á acompanhar de mecanismos coercitivos. Assim, o § 4º do art. 461 do CPC autoriza expressamente a imposição de multa diária, até de oficio, para o caso de descumprimento do comando judicial, inclusive na hipótese de antecipação.

A cumulabilidade entre a multa e a obrigação principal é conseqüência lógica e natural das razões que levam o legislador a instituir aquelas e o juiz, a impô-las em concreto. Elas existem para pressionar a cumprir, não para substituir o adimplemento. Conseqüência obvia: o pagamento das multas periódicas não extingue a obrigação descumprida nem dispensa o obrigado de cumpri-la.

A execução da multa seguirá o previsto no Livro II (processo de execução pr quantia certa).

6.2. O valor da multa

A lei faz referência à suficiência e compatibilidade da multa com a obrigação (art. 461, § 4º). Não se trata de pura e simples limitação do valor da multa ao obrigado – o que só faria sentido se aquela tivesse caráter indenizatório. Haverá de estabelecer-se montante tal que concretamente influa no comportamento do demandado – o que, diante das circunstâncias do caso (situação econômica do réu, outros valores não patrimoniais eventualmente envolvidos etc.) pode resultar em quantum que supere aquele que se atribui ao bem jurídico visado.

Calmon de Passos, discorrendo sobre a definição do valor da multa, afirma ser:

"Suficiente para induzir o devedor a adimplir, pelo que variará em função da capacidade econômica do devedor, mais do que em função da natureza da obrigação, mas essa correlação não pode alcançar o excesso, devendo cingir-se ao compatível. Assim. Dois são os critérios a ponderar: condição financeira do devedor e expressão econômica da obrigação ou algo de caráter não-econômico que importe também valor". (Apud Wambier, 2002, p. 297).

A determinação do valor da multa pelo juiz não é ato discricionário, impassível de controle. O julgador há de estabelecê-lo levando em consideração os parâmetros da suficiência e compatibilidade. Será revisável pelo grau de jurisdição superior a multa fixada em valor tanto insuficiente para induzir o réu quanto excessivo (caso em que será incompatível e ofensiva ao principio do menor sacrifício). Quando fixada na decisão interlocutória que antecipa tutela caberá agravo (CPC, art. 522). Quando estabelecida na sentença, deverá ser impugnada por apelação (art. 513).

Parcela significativa da doutrina e jurisprudência entende que a multa não pode ultrapassar o valor da causa porque isto poderia implicar enriquecimento injusto do credor.

Acrescenta-se que o valor da multa inicialmente estabelecido poderá ser alterado para mais ou para menos, em decisão motivada, conforme variem as circunstâncias concretas. Antes da Lei 10.444/2002, o art. 461 não continha expressa regra acerca disso (diferentemente do que já ocorria no processo executivo – art. 645).

Assim, como sua imposição independe do pleito do autor, igualmente a revisão de seu valor poderá ser procedida de oficio, sempre para adequá-la aos parâmetros da suficiência e compatibilidade. A lei 10.444/2002 veio confirmar esse entendimento (que já estava assente na doutrina e jurisprudência) ao acrescentar um sexto parágrafo ao art. 461.

6.3. Multa contratual e multa processual

Eventualmente a obrigação de fazer ou não fazer tem por base contrato em que já a previsão de multa diária para o caso de descumprimento. É perfeitamente possível que o juiz, diante da insuficiência da multa contratual, acresça outra de natureza processual. O que não é propriamente majoração da multa contratual, e sim acréscimo de outra de índole processual.

6.4. Momento de incidência e de exigibilidade da multa

Concedida a antecipação de tutela, na ordem que encaminha ao demandado o juiz estabelece "prazo razoável para cumprimento do preceito" (art. 461, § 4º). Decorrido o prazo supra, passa a incidir a multa diária. Logo, a decisão de aplicar a multa deve ser incluída na sentença que condena o réu por uma obrigação de fazer ou de não fazer, ou na decisão interlocutória que lhe impõe provisoriamente uma dessas obrigações. Isso não significa que, omitindo-se o juiz naqueles momentos ou negando de modo expresso a cominação, fique excluída a possibilidade de cominar multa depois. A mera omissão pode ser suprida mediante oposição de embargos declaratórios à sentença ou à decisão interlocutória, especialmente nos casos em que haja sido feito um pedido expresso esse respeito (CPC, art. 535, II).

Pelo disposto no art. 461, § 4º, em principio é na sentença ou na concessão de tutela antecipada que o juiz fixará prazo razoável para cumprimento do preceito, incidindo as multas a partir do escoamento desse prazo sem o adimplemento pelo obrigado. È natural que só então elas se apliquem, porque antes inexiste a resistência ou desobediência ao preceito mandamental, que é a razão de ser daquelas penalidades.

Havendo o juiz fixado multa processual, quando já havia multa contratual, os termos iniciais de ambas serão distintos em virtude de suas diferentes naturezas: (a) multa contratual incide desde o descumprimento da obrigação; (b) a multa processual incide só a partir do decurso do prazo estabelecido para cumprir a ordem judicial.

Sendo diminuída a multa judicial em virtude de alteração das circunstâncias concretas, o novo valor incidirá a partir desses fatos que ensejam a mudança. Já se houver aumento do montante originalmente fixado, esse incidirá a partir da sua cominação ao demandado.

Tornando-se impossível a obtenção do resultado especifico, a multa deixará de incidir daí para frente. O crédito decorrente da multa diária que incidiu antes de tal termo, entretanto, será cumulável com a indenização pelas perdas e danos (art. 461, § 1º). O mesmo vale para a hipótese de o autor optar pela conversão por perdas e danos.

Questão outra é saber a partir de que momento a multa se torna. Alguns autores têm sustentado que a multa se tornará exigível com a preclusão da decisão que a estabeleceu (com a não interposição de agravo ou com a decisão final em grau de recurso que pode chegar ao extraordinário, no caso da antecipação de tutela; ou com a não interposição de apelação ou até a decisão final desta, em caso de sentença). Por outro lado, há quem entenda como o jurista Wambier, alegando que a multa é exigível assim que eficaz a decisão que a impôs, ou seja, quando não mais sujeita a recurso com efeito suspensivo. Contundo enquanto pendente recurso sobre a decisão que a fixou, sua execução será igualmente provisória (CPC, art, 588).

Pondera Cândido Rangel Dinamarco, que:

"A cumulabilidade entre multa e perdas e danos é consequência lógica e natural das diferentes naturezas e finalidades dos dois institutos: a primeira visa a motivar o adimplemento e a segunda define o objeto da obrigação do obrigado inadimplente. (...) O novo art. 644, reproduzindo o que vinha antes, estabeleceu que o juiz fixará a data a partir da qual a multa será devida. Não distingue entre multa fixada em sentença, em decisão antecipatória de tutela ou na execução – e, portanto, essa determinação legal tem valia geral. Inexiste qualquer disposição sobre o momento da exigibilidade das multas aplicadas, mas elas só podem ser coradas a partir da preclusão da sentença ou decisão interlocutória que as concede: antes é sempre possível a supressão das ‘astreintes’ ou do próprio preceito pelos órgãos superiores". (Apud Wambier, 2002, p. 296). (destacamos)


7. Efetivação da sentença final

A sentença final será efetivada no próprio processo já instaurado. Antes da Lei 10.444/02, parte da doutrina não compartilhava desse entendimento – reputando que a efetivação da sentença proferida com base no art. 461 dar-se-ia através do processo de execução das obrigações de fazer e de não fazer, do Livro II.

O provimento final do processo amparado no art. 461 apenas ensejará subsequente e autônomo processo executivo (por quantia certa): (a) quando tiver havido conversão em perdas e danos (caso em qeu a sentença será apenas condenatória); (b) para a cobrança das verbas de sucumbência (honorários e custas judiciais); (c) para a cobrança do credito decorrente da incidência da multa diária; (d) para o ressarcimento das despesas adiantadas pelo autor, de custeio da produção do "resultado pratico equivalente", quando não tiver sido possível a concreta adoção de nenhuma técnica simplificada e atípica de obtenção do numerário. Porém, em todos esses casos, ter-se-á execução por quanto a certa – e não a execução do art. 632 e ss.

Na medida em que a sentença é efetivada na própria relação processual em que proferida e não em subseqüente processo de execução, não há oportunidade para a interposição de embargos do executado, mas uma simples petição nos autos, impugnando algo, após a sentença. (Adiante se verá mais profundamente a discussão doutrinária acerca deste ponto).


8. Âmbito de incidência do processo de execução de obrigação de fazer e não fazer

Depois das reformas do CPC, apenas deixou de formar processo executivo autônomo, o titulo judicial decorrente de sentença condenatória em processo civil (art, 584, I) que tenha por objeto obrigações de fazer e não fazer.

Continua, porém, havendo hipóteses de execução de obrigações de fazer e não fazer amparadas em titulo judicial. Considerem-se os seguintes casos: transação realizada extrajudicialmente e penas levadas a homologação judicial; sentença estrangeira homologada pelo STF; sentença arbitral, quando o compromisso arbitral não houver previsto que a sentença teria a força do art. 461 (CPC, art. 584, III, IV e VI). Em todos esses casos tais títulos executivos judiciais podem ser representativos de obrigações de fazer e não fazer e, continuarão ensejando o processo do art. 632 e ss. É que nessa hipótese a questão é trazida a Juízo depois que já está formado o titulo. Se a parte pretende apenas a efetivação concreta do comando contido no titulo, recorrerá ao processo do Livro II e não ao processo para a aplicação do art. 461 que é (também) processo de conhecimento – destinado em principio a casos em que ainda não há titulo executivo.


9. Procedimento informal – poucas regras especificas

O art. 461 do CPC é completamente omisso quanto às formas a serem observadas na aplicação das medidas que institui, mas isso não significa uma total e absoluta liberdade formal, que dispensasse o juiz de qualquer limitação em suas atividades; como é natural a todo sistema processual de liberdade quanto às formas, impõem-se sempre as exigências ordinariamente impostas pela lei com referência aos atos processuais em geral, além das restrições inerentes à clausula due process. As decisões judiciárias serão sempre fundamentadas e lançadas por escrito nos autos ou ali documentadas quando forem proferidas verbalmente, os prazos serão os que o juiz fixar em cada caso concreto ou de cinco dias quando ele nada dispuser a respeito (art. 185), o contraditório será assegurado sempre, mas sem que isso impeça a imposição e efetividade de medidas urgentes etc.

Vige, portanto, o principio da adaptabilidade, que é um culto à liberdade das formas e consiste em outorgar ao juiz amplas margens de manobra, cabendo a este escolha dos meios que reputar melhores, com o objetivo de produzir os resultados esperados da atividade jurisdicional.

No exercício dessa ampla liberdade formal, cumpre ao juiz na execução imediata, fazer as escolhas adequadas conforme a espécie de obrigação e os resultados a obter.

A única exigência de forma contida de modo explicito no art. 461, como foi visto anteriormente, é a da motivação das decisões relacionadas com as tutelas urgentes (art. 461, § 3º), mas essa explicitude sequer seria necessária porque a exigência é constitucional (art. 93, IX, CF).

Apenas subsidiariamente, e sempre que isso não seja incompatível com os objetivos da execução imediata, o juiz aplicará regras inerentes à disciplina do processo de execução por obrigação de fazer e de não-fazer, o que resulta de expressa determinação contida no art. 644 do CPC.

Não obstante o silêncio da lei, Dinamarco leciona que é indispensável a provocação do credor como requisito para que tenha inicio a execução imediata. Não se trata de instaurar um processo novo, mas ainda assim não seria legitimo munir o juiz do poder de dar inicio a essa execução porque se faz no interesse do credor (CPC, art. 612) e por isso este deve ser o árbitro exclusivo da conveniência e oportunidade de executar. Muitas razões podem levá-lo a preferir o adiamento do início dos atos executivos, como temporária impossibilidade de obter o resultado especifico de uma obrigação de conduta, carência de recursos para custear a execução etc. E pode ainda suceder que ele não queira executar porque perdoa ou até porque já foi satisfeito pelo obrigado; nessa última hipótese, quem executa pelo que já recebeu fica exposto a uma possível responsabilidade civil que obviamente só se legitimará quando a iniciativa da execução houver sido sua.

A provocação do credor não será um exercício de direito de ação, mas um mero conquanto indispensável ato de impulso processual; estamos em um processo que, para passar à segunda fase (da fase cognitiva à executiva), depende desse impulso que ao juiz não é licito dar. Prevalece, pois, a disponibilidade dos direitos e de algumas situações processuais, com restrição do campo reservado à oficialidade dos atos judiciários.

Todavia, deve haver um equilíbrio entre os princípios da disponilidade e o do impulso oficial (e não a prevalência daquele sobre este, como acentua Dinamarco), visto que, o art. 461 foi introduzido justamente para garantir uma execução imediata (auto-executoriedade) da sentença que reconhece uma obrigação de fazer ou de não fazer, pleiteada em sede de cognição, favorecendo desde logo o credor-exequente.

9.1. Atos a realizar

Diante da provocação a executar, o primeiro ato do juiz na execução imediata consistirá em mandar intimar pessoalmente o obrigado, para que cumpra em determinado prazo, ou seja, para que faça o que deve ou se abstenha do que não deve fazer. Também a respeito dessa intimação inicial a lei silencia, mas é obvia a necessidade de estimular o devedor a cumprir, seja porque esse estímulo é a primeira tentativa de faze-lo sair do estado de inadimplemento, seja porque as medidas enérgicas inerentes á execução especifica tem como pressuposto elementar a renitência de quem manifesta não querer adimplir. Intimado o devedor e permanecendo o devedor naquele estado, a partir daí se legitimam as medidas de coerção ou de sub-rogação oferecidas pelos §§ 4º e 5º do art. 461 do CPC.

Haja vista o total silêncio da lei, é imperioso que a intimação seja feita pessoalmente ao obrigado, por via postal e subsidiariamente por oficial de justiça (CPC, arts. 238-239); só os advogados, não as partes, são intimados pela imprensa.


10. Defesa do executado

Como previamente declarado anteriormente, a plena admissibilidade dos embargos do executado não se concilia com o modelo legal da execução imediata, que quer ser ágil e portanto apta a efetivar no menor tempo possível a tutela executiva. Os embargos são fator de inevitáveis demoras, porque lentos em seu processamento formal e, sobretudo, porque no sistema brasileiro tem sempre o efeito de suspender a execução, enfraquecendo sensivelmente a eficácia abstrata do titulo executivo (art. 739, § 1º) e essas demoras são incompatíveis coma eficácia das sentenças mandamentais, por definição, impetuosas e impacientes.

A doutrina brasileira é fortemente comprometida com a tese da negativa dos embargos a toda e qualquer execução imediata.

Da incompatibilidade sistemática entre a execução imediata e os embargos do executado não se infere, porém a suposta inadmissibilidade total destes, nem muito menos a total absoluta negativa de qualquer oportunidade de defesa ao executado; essa postura radical viria de encontro às garantias do devido processo legal e do contraditório, não sendo assimilada pela ordem constitucional. (art. 5º, LIV e LV, CF). Os julgados e as manifestações doutrinarias que se repetem na negativa da faculdade de embargar centram a atenção nos embargos de mérito, que são opostos com o objetivo de negar a existência atual da obrigação, porque já extinta pelo adimplemento, prescrição etc. (art. 461, VI); como a ocorrência desses fatos extintivos é extremamente improvável quando a execução se faz sine intervallo, é mais que legítima a exclusão em tese, dos embargos a esta. Em casos extraordinários, sendo opostos os embargos com fundamento muito plausível em um pagamento amparado por prova desde logo apresentada ou, evidenciando-se a prescrição intercorrente, eles devem ser admitidos e recebidos com o efeito suspensivo que lhe é próprio (CPC, art. 738, § 1º); só em caráter excepcionalíssimo, porém, e sempre segundo a prudente apreciação do juiz em cada caso, como se dá em relação aos embargos à execução de sentença proferida em ação possessória, segundo a jurisprudência corrente do país. Fora desses casos excepcionais, as defesas de mérito que o devedor tiver serão apresentadas mediante simples petição e sem suspensão do processo executivo.


11. A execução imediata na teoria geral do processo civil

O conjunto das técnicas instituídas pelo art. 461 do CPC representa a superação de alguns preciosos dogmas preservados pela doutrina como penhores da segurança das partes, mas que em alguma medida podem ser legitimamente atenuados em vista da maior efetividade da tutela jurisdicional.

O dogma do exaurimento da competência do juiz ao cabo do processo de conhecimento, sendo-lhe proibido inovar depois de publicada a sentença (art. 463), é atingido por uma legitima transgressão quando o art. 461, caput, autoriza o juiz a determinar "providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento". Determinar essas providências pode implicar alterações profundas no decisum contido em sentença, como no caso de uma condenação a instalar filtros antipoluição, acabar substituída pela ordem de suspender as atividades nocivas; essa é a inovação que seria perigosamente inadmissível segundo a regra geral contida no art. 463 do CPC, mas permitida pela disciplina da execução especifica e imediata.

Também significativamente atenuado o dogma da correlação entre o provimento e a demanda porque as "providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento" não corresponderão mais ao que houver sido pedido ao início do processo cognitivo; tratar-se-á de medidas diferentes das pedidas justamente porque a concessão daquelas que foram pedidas ter-se-á revelado insuficiente para levar o obrigado a cumprir o direito.

Todas essas transgressões a dogmas são de absoluta propriedade segundo o pensamento processualístico moderno, que privilegia a busca de resultados.


12. Execução imediata em face da Fazenda Pública

A execução especifica há de atuar com a mesma eficácia tanto sobre os entes públicos inadimplentes, prestadores de serviços públicos, quanto sobre os particulares, porque as únicas ressalvas que a CF e o CPC fazem em relação a Fazenda são as que dizem respeito à execução por dinheiro (CF, art. 100, e CPC, art. 730) [6]. Seria incompatível com a índole do Estado de direito imunizar os entes estatais às medidas enérgicas que o Código de Processo Civil estabelece à realização especifica dos direitos em casos nos quais não se trata de desfalcar o patrimônio publico mas de impor aos agentes do Estado certos comportamentos exigidos pelo direito (um fazer, um não-fazer). Nessa linha, o STJ chegou a afirmar que "as astreintes podem ser fixadas pelo juiz de oficio, mesmo sendo contra pessoa jurídica de direito publico, que ficará obrigada a suporta-las caso não cumpra a obrigação de fazer no prazo estipulado". Qualquer tratamento diferenciado nessa matéria seria um privilégio inconstitucional e antidemocrático. Tratando-se de assegurar o equilíbrio entre os valores da autoridade do Estado e da liberdade dos particulares, é indispensável impor aos órgãos estatais o cumprimento especifico do que, mediante a observância da clausula due process em um processo regular, houver decidido o Poder Judiciário. (p. 467-468)

O que na se reconhece ao pretenso usuário é o interesse em acionar o Poder Público com base no art. 461, para que promova a execução dos serviços públicos inexistentes no local para possibilitar o seu uso, pois essa providencia esta fora da interferência do Poder Judiciário, por envolver mérito administrativo.


Referências bibliográficas:

ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

DIDIER JR., Fredie. Notas sobre o novo art. 287 do CPC e a sua compatibilização com a tutela específica prevista nos arts. 461 e461-A do CPC. Revista de Direito Processual. São Paulo, n. 109, p.169-172. jan./mar., 2003.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, v. 4.

_________________. A reforma da reforma. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2003.

RODRIGUES NETTO, Nelson. Notas sobre as tutelas mandamental e executiva lato sensu nas leis 10.358/2001 e 10.444/2002. Revista de Direito Processual. São Paulo, n. 110 p.196-224. abr./jun., 2003.

THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 33. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

WAMBIER, Luiz Rodrigues et al. Curso avançado de processo civil: processo de execução. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. v. 2.


Notas

1 Obrigação de fazer caracteriza-se por possuir como objeto uma prestação de fato, diferente da prestação de dar, cujo objeto é uma prestação de coisa. Versa sobre prestação positiva

2 Obrigação de não fazer tem por objeto, prestação de fato para se abster do ato. Em regra, ocorre nas ações reais, onde há previsão legal proibitiva

3 É oportuno recordar que o art. 461 é praticamente reprodução integral do art. 84, criado para o microssistema ou subsistema do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Era inevitável, como veio realmente a acontecer, que a referida regra privilegiando a tutela especifica fosse sendo gradativamente transplantada para outras leis esparsas (Estatuto da Criança e Adolescente, art. 213; Lei Antitruste, art. 62) até atingir patamar de norma geral no sistema processual pátrio (art. 461 do CPC).

4 A execução imediata pelo sistema desenhado no art. 461 e seus parágrafos entrou no direito positivo brasileiro pela porta do CDC (ver nota 3); uma disciplina instituída inicialmente para a tutela jurisdicional referente aquele campo especifico (relações de consumo) passou-se, por obra da Reforma, a uma disciplina integrante do processo civil comum e, portanto, destinada a uma eficácia muito mais ampla. A origem mais remota desse modo de executar é a Lei do Mandado de Segurança, que impõe a execução imediata e fortemente imperativa das decisões concessivas do writ, quer proferidas em caráter liminar, quer em julgamento final.

5 "A medida coercitiva representada pela multa, concebida para induzir o devedor a cumprir espontaneamente as obrigações que lhe incumbem, principalmente as de natureza infungível, não é de natureza reparatória. Vale dizer, sua imposição não prejudica o direito do credor à realização especifica da obrigação ou a recebimento do equivalente monetário, ou ainda à postulação das perdas e danos. A multa em suma, tem natureza puramente coercitiva" (Kazuo Watanabe apud Dinamarco, 2003, p. 237).

6 Assim não pensam Barbosa Moreira, Lopes da Costa, Vicente Greco Filho. Na visão deste ultimo jurista, "a eficácia fica sacrificada pela impossibilidade jurídica da execução especifica da obrigação de fazer, porque o Judiciário, perante o sistema constitucional vigente, não pode praticar atos administrativos na esfera do Executivo, pois estaria invadindo área privativa de outro poder."


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Janine Medeiros. Apontamentos acerca da nova estrutura do processo de execução de obrigação de fazer e não fazer de título judicial. Alterações introduzidas pelas Leis nº 8.952/1994 e 10.444/2002. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 562, 20 jan. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6206. Acesso em: 30 abr. 2024.