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Tranfusão de sangue em testemunhas de Jeová.

A colisão de direitos fundamentais

Tranfusão de sangue em testemunhas de Jeová. A colisão de direitos fundamentais

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SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Direito à vida. 2.1. Direito à Vida e a Dignidade da Pessoa Humana. 3. Direito de Recusa por Convicçções Religiosas. 3.1. Direito à Liberdade. 3.2. O Direito à Liberdade Religiosa e sua livre manifestação. 3.3. Liberdade de Consciência e de Crença. 4. A Colisão de Direitos Fundamentais. 4.1. A Hermenêutica Constitucional. 4.1.1. A Evolução rumo a "Nova Interpretação Constitucional". 4.1.2. Princípios de Interpretação Constitucional. 4.1.3. A Técnica da Ponderação de Valores na Colisão de Direitos Fundamentais. 4.1.4. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana como Valor Preponderante. 4.2. Direito à Vida versus Direito de Recusa por convicções religiosas. 5. A Questão dos Pacientes Menores. 6. A Responsabilidade do Médico 7. O Fundamento Religioso 8. A Visão dos Tribunais 9. Considerações Finais 10. Referências Bibliográficas


1. INTRODUÇÃO

A realização de procedimento terapêutico que inclua transfusão sanguínea em pacientes adeptos da religião intitulada "Testemunhas de Jeová" é uma questão polêmica que há tempos preocupa médicos e instiga juristas.

Os profissionais da saúde vêem-se acuados diante de tal situação por carregarem consigo o dever, como médicos, de salvaguardar o direito, prima facie, mais essencial de qualquer ser humano: à vida.

Os juristas, por sua vez, sentem-se instigados a dissertar e, talvez, dirimir o conflito de direitos fundamentais que o tema proporciona.

Diante dessas primeiras considerações, indaga-se:

É razoável que o ordenamento jurídico permita a recusa de certo indivíduo à realização de determinado tratamento terapêutico- qual seja: transfusão sanguínea-, imprescindível à preservação de sua vida, por convicções religiosas?

E se esta pessoa estiver em eminente risco de vida e não puder manifestar sua vontade naquele momento? Pode o médico, nesta situação, deixar de realizar a transfusão sanguínea com base na recusa manifestada pelos responsáveis por aquele paciente?

O que ocorre, então, se o paciente é um menor de idade? Têm os pais o direito de dispor da vida de seus filhos?

Pode-se perceber que se trata de questão assaz conflitiva pois abarca colisão de direitos fundamentais, entretanto, é apenas aparente o conflito, com possibilidade de solução no caso concreto, como será demonstrado nos tópicos que seguem.

O presente ensaio objetiva, então, discorrer sobre os direitos fundamentais que aparentemente colidem e apontar uma possível forma de ponderação dos valores envolvidos, no sentido de solucionar a questão no caso sub examine.


2. DIREITO À VIDA

A vida é um direito fundamental, garantida constitucionalmente como bem inviolável, máxime do nosso ordenamento e protegida pelo Estado com prioridade, uma vez que constitui suporte indispensável para o exercício de todos os demais direitos.

A garantia fundamental à vida deve ser entendida como o direito a uma existência com possibilidade de exercer os demais atributos da personalidade, ou seja, é o direito da pessoa humana a uma vida com dignidade.

Entretanto, o direito à vida nem sempre foi entendido dessa forma.

No período da Inquisição- em que Estado e Igreja, Direito e Moral, se confundiam- o direito à vida era, não raras às vezes, entendido como de livre disposição pelo Estado- ou melhor, pelo Estado-Igreja - na medida em que estes impunham penas capitais: determinando a morte de pessoas pelo simples motivo de possuírem convicções filosóficas e/ou religiosas que iam de encontro aos dogmas impostos à época. Observa-se que, em nome da religião, o bem da vida era exterminado, ou seja, em uma escala de valoração: a religião prevalecia sobre a vida.

Acrescenta-se que a autolesão era permitida e até incentivada, através das penitências: para que a pessoa humana se redimisse de seus pecados e ficasse em paz consigo mesmo, a religião pregava a automutilação e, se preciso fosse, até a morte. O direito à vida, era, portanto, perfeitamente disponível.

Com a Revolução Francesa, há o rompimento entre Direito e Moral, surgem os direitos individuais de primeira geração, como garantia do indivíduo frente às atrocidades cometidas pelo Estado. Neste contexto, o direito à vida é garantido e serve como prerrogativa do indivíduo ao estabelecer um limite à atuação estatal. Dessa forma, é entendido como inviolável: há a obrigação do Estado e de particulares em não realizar condutas que atentem contra o direito à vida.

Atualmente, os direitos fundamentais ganham uma outra proporção: o bem da vida interessa não apenas ao indivíduo. O Estado tem intenção de preservá-la: ele assume a posição de garante do bem jurídico vida. Justifica-se a intervenção estatal no sentido de tutelar, salvaguardar e proteger a vida por entendê-la como premissa básica para o exercício de qualquer outro direito fundamental.

No Estado de Direito Democrático e Social, a vida é um bem inviolável, ou seja, não pode ser violada por terceiros, mas também, é indisponível: nosso ordenamento não permite a disponibilidade do direito à vida, por reconhecer a supremacia da dignidade da pessoa humana como seu fundamento e entender a vida como pressuposto básico para que se manifestem os outros direitos fundamentais que, em conjunto, formam o substrato mínimo necessário à dignidade humana.

Poder-se-ia contestar a indisponibilidade do direito à vida em face do Direito Penal não punir o autor da tentativa de suicídio. Ocorre que, deve-se fixar a noção de que a autolesão e o suicídio são condutas ilícitas, repelidas pelo nosso ordenamento, ainda que não punidas pelo Direito Penal pois, se a vida é um bem indisponível, protegida e assegurada constitucionalmente, não poderia ser outro o nosso entendimento.

No entanto, o Direito Penal não pune o autor do suicídio por razões de política criminal, pois a pena não é necessária, não cumprirá sua função de ressocialização e, ainda, porque o que o suicida necessita é de tratamento médico e psicológico que o ajude a ressocializar-se e não de penalização.

Neste sentido, Nucci ensina que:

No Brasil, não se pune o autor da tentativa de suicídio, por motivos humanitários: afinal, quem atentou contra a própria vida, por conta de comoção social, religiosa ou política, estado de miserabilidade, desagregação familiar, doenças graves, causas tóxicas, efeitos neurológicos, infecciosos ou psíquicos e até por conta de senilidade ou imaturidade, não merece punição, mas compaixão, amparo e atendimento médico. Pune-se, entretanto, aquele que levou outra pessoa ao suicídio, ainda que nada tenha feito para que o resultado se desse, tendo em vista ser a vida um bem indisponível, que o Estado precisa garantir, ainda que contra a vontade de seu titular. De outra parte, fica nítido que o suicídio é ato ilícito- embora não seja penalmente punido, até mesmo porque, quando se consuma, não teria sentido algum aplicar sanção à família- quando se vê, no art. 146, §3°, II, do Código Penal, não ser típica a "coação exercida para impedir suicídio". [1]

Ademais, salienta-se que o Direito Penal, acertadamente, não o pune por entender que não é sua a função de tratar este comportamento, porém, este fato não significa que o direito à vida é disponível.

Luiz Vicente Cernicchiaro afirma ser o bem da vida não passível de disposição e confirma nosso entendimento:

O Direito Penal brasileiro volta-se para um quadro valorativo. Nesse contexto, oferece particular importância à vida (bem jurídico). Daí ser indisponível (o homem não pode dispor da vida). A irrelevância penal do suicídio decorre de Política Criminal, a fim de a pessoa que tentou contra a própria vida seja estimulada a mudar de idéia, o que provocaria efeito contrário se instaurando inquérito policial, processo e, depois, condenação, cumprimento da pena [2]

Frisa-se que o direito à vida foi erigido à categoria de direito fundamental pela nossa Constituição e que o Estado, após longo período evolutivo, passa de opressor a seu garante, interessando a vida não apenas ao indivíduo mas a toda coletividade. A vida, então, possui valor social.

Diante desses apontamentos acerca do direito à vida, resta discorrer sobre a questão de sê-lo direito absoluto ou relativo e a possibilidade, nesse último caso, de ceder ante outros direitos.

2.1.Direito à Vida e a Dignidade da Pessoa Humana

O direito à vida é inerente ao ser humano que, para existir não necessita de reconhecimento expresso de sua existência em nenhum texto legal. Porém, a inserção do direito à vida de modo explícito na Constituição denota o seu objetivo nitidamente garantista: ao Estado incumbe o dever de agir no sentido de preservar a vida.

Não se pode olvidar que, primeiramente, a previsão do direito à vida deu-se em razão da desigualdade entre o poder do Estado Soberano e a debilidade de seus súditos e, assim, são reconhecidos os direitos fundamentais como forma de equilibrar a relação entre Estado e indivíduo.

Atualmente, ainda persiste este dever de abstenção do Estado e dos particulares em não atentarem contra a vida, mas também se ressalta o dever positivo do Estado de proteção da vida humana, de cunho garantista, dando outro enfoque àquele direito.

Entretanto, ainda que revestida de inegável relevância jurídica, o direito à vida não possui caráter absoluto. Uma correta apreciação do direito à vida insta considerá-lo ao lado de outros direitos constitucionais. Nesta seara, surge a dignidade da pessoa humana, fundamento do nosso Estado de Direito Democrático e Social, como valor absoluto no sentido de balizar qualquer ingerência a outros direitos fundamentais.

Dessa forma, entende-se que nenhum direito é absoluto e basta por si só, uma vez que o exercício de qualquer preceito fundamental encontra limites no princípio da dignidade da pessoa humana. Cuida-se, então, de aplicar-se o valor absoluto da dignidade da pessoa humana a cada um dos direitos fundamentais- o direito à vida será o direito à vida digna- pois "situada à frente de todos os direitos fundamentais, a dignidade humana lhes serve de alicerce e informa seu conteúdo, convertendo-se na fonte ética que confere unidade de sentido, valor e de concordância prática ao sistema de direitos fundamentais." [3]

Sendo relativo o direito à vida, o legislador, em alguns casos, exerce opção axiológica por outro direito fundamental. E isso é confirmado pelo Código Penal, no qual consta a permissão de realização de aborto, quando resultante de estupro [4], em que numa ponderação de valores, a liberdade sexual prevalece sobre o bem vida, com fundamento na dignidade da pessoa da gestante.

O direito à vida é um valor relativo, presente na nossa Constituição como fundamental e será digno de preponderância quando, posto em contraposição com outros direitos fundamentais, mais se aproximar da dignidade da pessoa humana.


3. DIREITO DE RECUSA POR CONVICCÇÕES RELIGIOSAS

3.1. Direito à Liberdade

O direito à liberdade representa uma conquista dos cidadãos pela manifestação de sua autonomia individual. É garantia positivada em diversas constituições de sistemas democráticos, sendo considerado como o fundamento da democracia, na medida que possibilita a liberdade de atuação e serve como limite às opressões do Estado.

A liberdade está intimamente ligada à legalidade, pois, em conjunto, significam que as pessoas são livres para exercerem quaisquer atos, salvo os proibidos em lei.

Nas palavras de Carlos Alberto Bittar, "consiste esse direito em poder a pessoa direcionar suas energias, no mundo fático, em consonância com a própria vontade, no alcance dos objetivos visados, seja no plano pessoal, seja no plano negocial, seja no plano espiritual." [5]

O direito à liberdade possui vários elementos que o compõe, sendo que, interessa para o presente a elucidação do direito à liberdade religiosa, em seus aspectos da liberdade de consciência, de crença e sua livre manifestação.

3.2. O Direito à Liberdade Religiosa e sua livre manifestação

O direito fundamental à liberdade, em acepção ampla, engloba direitos fundamentais a liberdades específicas, sendo uma delas: a liberdade de religião.

A garantia de liberdade, no aspecto da religião, consiste na possibilidade de livre escolha pelo indivíduo da sua orientação religiosa e não se esgota no plano da crença individual, meramente subjetiva, de foro íntimo, mas abarca a prática religiosa, também denominada de liberdade de culto.

Compreende-se que "não há verdadeira liberdade de religião se não se reconhece o direito de livremente orientar-se de acordo com as posições religiosas estabelecidas" [6], ou seja, o direito à liberdade religiosa pressupõe a sua livre manifestação.

Dessa forma, respeitados os preceitos de ordem pública, isto é, as imposições legais, há o direito dos indivíduos manifestarem a orientação religiosa por eles seguida, sendo-lhes assegurado o direito de recusa à prática de atos que atentem contra as suas convicções pessoais.

A liberdade resulta na possibilidade de recusa por convicções religiosas também com fundamento na garantia de liberdade de consciência e de crença.

3.3. Liberdade de Consciência e de Crença

O direito à liberdade de consciência e de crença está assegurado pela Constituição, em seu art.5º, inc. VI, ao determinar a sua inviolabilidade. O dispositivo constitucional concretiza uma das vertentes da liberdade de expressão de pensamento: a liberdade de espírito. [7]

Como bem pondera Celso Ribeiro Bastos, "no contexto mesmo da liberdade de pensamento, há que se destacar a liberdade de opinião cuja característica é a escolha pelo homem de sua verdade, não importando em que domínio: ideológico, filosófico ou religioso" [8] e destaca a liberdade de consciência como sendo expressão da liberdade de opinião quando tem como objeto: a moral e a religião. A intenção é, então, garantir a liberdade de espírito sob a ótica religiosa e moral.

Deve-se diferenciar a liberdade de consciência com a de crença. Estas não se confundem na medida que "uma consciência livre pode determinar-se no sentido de não ter crença alguma" [9].

Dessa forma, há que se perceber o direito à liberdade de consciência e de crença como valores diferentes que se igualam na medida que a Constituição protege a recusa à prática de determinados atos devido à autonomia individual, que pode se consubstanciar em motivações de ordem religiosa ou não. Define-se, assim, que a recusa dar-se-á por motivos de foro íntimo, materializado em convicções pessoais, e será garantida, desde que não contrarie a ordem pública ou não importe em ofensa a outro valor que, considerando o caso concreto, se imponha como superior e, assim, prevaleça.


4. A COLISÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS

A colisão de direitos fundamentais dá-se quando, no momento do exercício destes direitos, há o confronto entre os mesmos ou, entre eles e outros bens jurídicos protegidos constitucionalmente.

O legislador pode resolver esse confronto na medida que cria a "reserva de lei" na Constituição, ou seja, quando restringe o exercício de um direito à observância do outro. Por outro lado, em se tratando de direitos fundamentais não acobertados pela "reserva de lei", a solução fica a cargo da jurisprudência, a qual deve realizar a "ponderação dos bens envolvidos", com o intuito de resolver a colisão por meio do "sacrifício mínimo dos direitos em jogo". [10]

O tema da recusa às transfusões de sangue por pacientes adeptos da religião Testemunha de Jeová envolve uma aparente colisão de preceitos fundamentais. De um lado, está o direito indisponível à vida e, de outro, o direito de recusa por convicções religiosas, ambos protegidos igualmente na nossa Constituição, isto é, o legislador constituinte não estabelece cláusula de reserva. Sendo assim, em não havendo prevalência in abstrato por nenhum destes direitos fundamentais, como se proceder diante da colisão entre eles no plano concreto?

Em primeiro lugar, deve-se fixar a noção de que nenhum direito é absoluto. Nem mesmo o direito à vida. Prova disto é a permissão constitucional de condenação à pena de morte em estado de guerra e, ainda, a possibilidade de realização de aborto autorizado judicialmente, diante da previsão no Código Penal, no caso de gravidez resultante de crime de estupro, conforme analisamos anteriormente.

Em segundo, afirma-se que se trata somente de um conflito aparente de direitos constitucionais pois, de acordo com os princípios da Hermenêutica Constitucional a ser expostos, as normas constitucionais não entram em colisão, uma vez que há critérios para que a jurisprudência realize o mencionado juízo de ponderação. Ressaltando-se que esta, ao realizar "uma necessária e casuística ponderação dos bens envolvidos", deve visar o "sacrifício mínimo dos direitos contrapostos". [11]

A solução é, então, buscar estes critérios para resolver a aparente colisão de direitos fundamentais, diante de um caso concreto, nos princípios informadores da Hermenêutica Constitucional, já que não há um critério dogmático a priori, e balizar a ponderação de tais valores na supremacia da dignidade humana, fundamento do nosso Estado de Direito democrático e social e princípio informador de qualquer interpretação de direitos fundamentais.

4.1. A Hermenêutica Constitucional

4.1.1. A Evolução rumo a "Nova Interpretação Constitucional"

Com a ascensão do Estado Liberal, surgem os movimentos de codificação e a consolidação dos ideais constitucionais em textos escritos, predominando o Positivismo Jurídico. Neste, objetivou-se limitar a interpretação da norma, argumentando-se que a Ciência do Direito funda-se em juízos de fato e não em juízos de valor, ou seja, o intérprete deveria realizar estritamente o que determinava a lei, sem perquirir os valores envolvidos.Nesse período, os magistrados eram conhecidos como juízes "boca- da- lei", pois o seu papel limitava-se ao exercício de subsunção dos fatos à norma e preponderavam os métodos clássicos de interpretação, quais sejam: o gramatical, histórico, sistemático e teleológico.

A superação desse movimento dá-se, mais precisamente, com o fim da II Guerra Mundial e com a derrota dos movimentos totalitários, passando-se a um período de reflexões acerca da função social do Direito e sua interpretação: O Pós-Positivismo.

É no ambiente do Pós- Positivismo que se percebe a reaproximação entre Direito e Ética, com a valorização dos princípios, sua incorporação pelos textos constitucionais e o reconhecimento pela ordem jurídica da supremacia dos direitos fundamentais e da sua normatividade. [12]

Diante da concepção de Estado de Direito Democrático e Social, com a positivação de direitos fundamentais e a inserção de cláusulas constitucionais de conteúdo aberto, principiológico, a Hermenêutica Constitucional urge por mudanças. A idéia de "Nova Interpretação Constitucional", defendida, dentre outros, por Luís Roberto Barroso e Ana Paula Barcellos [13], não importa em desprezo dos métodos clássicos, mas na constatação de sua insuficiência, principalmente quando se depara com a colisão de direitos fundamentais.

Na colisão de direitos fundamentais não é possível uma solução adequada in abstrato, esta somente podendo ser formulada à vista dos elementos do caso concreto. A moderna interpretação envolve juízo discricionário do intérprete, o qual, por sua vez, encontra limites nos princípios informadores da Hermenêutica Constitucional, que servem como parâmetros para ponderação de valores e interesses.

4.1.2. Princípios de Interpretação Constitucional

É cediço que os direitos fundamentais contêm um fundamento ético e uma alta carga valorativa. Sendo assim, a colisão destes direitos é não somente possível, como faz parte da lógica do sistema, pois valores estão sujeitos a variações conforme o contexto social e, além disso, necessitam de um juízo discricionário no momento da interpretação casuística.

Na tentativa de auxiliar o intérprete na busca do sentido alvejado pela nossa Constituição ao elencar determinado direito fundamental, da efetividade na concretização deste valor in abstrato e diante da colisão de dois ou mais direitos fundamentais no caso concreto, a doutrina enumera princípios específicos para a interpretação constitucional.

Tratando-se de questão relativa a colisão de direitos fundamentais, entende-se como principais, dentre outros, os princípios da unidade da Constituição, da concordância prática ou harmonização e da proporcionalidade.

O princípio da unidade da constituição determina a análise do texto constitucional como um todo, como um sistema que necessita "compatibilizar preceitos discrepantes" [14], surgindo para o intérprete o ônus de detectar na Constiuição as normas pertinentes ao caso, identificar eventuais conflitos entre elas e considerá-las em conjunto para sua solução.

A concordância prática, ou princípio da harmonização, expressa uma conseqüência lógica do princípio da unidade da constituição pois, conforme aqueles, os valores e direitos fundamentais devem ser harmonizados, no caso concreto, por meio de juízos de ponderação que vise concretizar ao máximo os direitos constitucionalmente protegidos, não se devendo por meio de uma precipitada ponderação de bens ou valores in abstrato, desprezar um direito a custa da prevalência do outro. [15]

A proporcionalidade, por sua vez, consiste na "realização do princípio da concordância prática no caso concreto", ou seja, significa a "distribuição necessária e adequada dos custos de forma a salvaguardar direitos fundamentais e/ou valores constitucionalmente colidentes". [16] O princípio da proporcionalidade caminha junto com o princípio da razoabilidade, formam uma espécie de parceria: significam a ponderação entre os meios empregados e os fins atingidos: é a busca do razoável.

O princípio da proporcionalidade manifesta-se como um senso de justiça, balizador do juízo de ponderação a ser realizado pelo intérprete no caso sub examine.

4.1.3. A Técnica da Ponderação de Valores na Colisão de Direitos Fundamentais

Na colisão de direitos fundamentais ocorre a incidência de mais de uma norma, princípio ou valor sobre o mesmo conjunto de fatos. Daí a técnica da subsunção mostrar-se insuficiente na solução deste conflito, pois a solução dada por esta técnica implicaria na escolha de uma única premissa maior e, por força do princípio da unidade da constituição, anteriormente analisado, sabe-se que não é dado ao intérprete o poder de optar por uma norma, desprezando a outra em tese aplicável, criando certa hierarquia entre elas.

Torna-se mister um outro tipo de raciocínio, de estrutura diversa, mais complexo: "que seja capaz de trabalhar multidirecionalmente, produzindo a regra concreta que vai reger a hipótese a partir da síntese dos distintos elementos normativos incidentes sobre aquele conjunto de fatos". [17]

A ponderação, explica Luís Roberto Barroso e Ana Paula Barcellos, configura "uma técnica jurídica aplicável a casos difíceis, em relação aos quais a subsunção se mostrou insuficiente, especialmente quando uma situação concreta dá ensejo à aplicação de normas de mesma hierarquia que indicam soluções diferenciadas". [18]

A técnica da ponderação consiste em apurar os pesos ou a importância relativa que devem ser atribuídos a cada elemento em disputa, a fim de se escolher qual deles, no caso concreto, prevalecerá ou sofrerá menos constrição do que o outro, de modo que na decisão final, "tal qual como um quadro bem pintado, as diferentes cores possam ser percebidas, ainda que uma ou alguma delas venham a se destacar sobre as demais" [19], ressalvando-se que a produção dessa solução deve nortear-se pelo princípio da proporcionalidade.

Por último, ressalta-se que o fundamento, de acordo com Robert Alexy, para a prevalência de um direito fundamental está na lei da ponderação: "a afetação de um direito só é justificável pelo grau de importância de satisfação de outro direito oposto". [20]

No caso de colisão de direitos fundamentais, faz necessária a opção de preferência de um direito sobre o outro oposto, em que se perquire, inicialmente, todos os valores constitucionais envolvidos e, num juízo de ponderação, aplica-se ao caso concreto os princípios constitucionais específicos, especialmente a proporcionalidade e a razoabilidade.

4.1.4. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana como Valor Preponderante

Após longo processo de ponderação de valores, é imprescindível considerar a força do princípio da dignidade humana como valor preponderante, com vistas a guiar a decisão final acerca da prevalência de um direito fundamental. Será considerada razoável a opção axiológica por um valor, consubstanciado num direito fundamental, que melhor atenda às necessidades da pessoa humana.

O princípio da dignidade da pessoa humana denota "um respeito à criação, independente da crença que se professe quanto à sua origem" [21], isto é, assegura o direito à integridade moral e ao mínimo ético [22] a todas as pessoas apenas por sua existência no mundo.

Ao eleger a dignidade da pessoa humana como fundamento do nosso Estado de Direito Democrático e Social, o legislador explicita o seu papel fundamental na estrutura constitucional: o de fonte normativa dos demais direitos fundamentais. É baseado na dignidade humana que emergem os demais direitos e garantias fundamentais, é aquele princípio que dá unidade e coerência ao conjunto destes.

É imprescindível que se reconheça a força normativa do princípio da dignidade humana e, por um raciocínio lógico, a sua carga axiológica como um valor absoluto, o único que possui este atributo. Não é demais frisar que nenhum direito fundamental é absoluto: é tolerada a preponderância de um direito fundamental sobre outro em decorrência da constatação de sua maior chance de dar efetividade ao princípio da dignidade da pessoa humana, no caso concreto.

Na colisão de direitos fundamentais, conclui-se pela prevalência da dignidade da pessoa humana como limite e fundamento do exercício dos demais direitos, isto é, no momento da concretização daqueles valores positivados.

4.2. Direito à Vida versus Direito de Recusa por convicções religiosas

Neste tópico, propõe-se enfrentar a questão da colisão de direito fundamentais, tomando-se a hipótese de recusa à transfusão sanguínea por parte das Testemunhas de Jeová. Não é um caso fácil uma vez que engloba direitos fundamentais, sem que a Constituição forneça, in abstrato, a solução adequada.

Salientou-se que, num Estado de Direito Democrático e Social, a interpretação da colisão dos direitos fundamentais é feita de forma casuística, ou seja, não há como fugir da análise caso a caso, considerando cada um destes como único em suas especificidades, o que possibilitará a ponderação dos interesses envolvidos naquela hipótese fática.

No caso das transfusões de sangue em Testemunhas de Jeová, há um aparente conflito entre o direito fundamental à vida e o direito fundamental à liberdade de consciência e de crença, mais especificamente, o direito de recusa por convicções de ordem religiosa. Todavia, essa aparente colisão não se mostra como um "ponto escuro sem definição", pelo contrário, é perfeitamente transponível na medida em que se utiliza mecanismos específicos de Hermenêutica Constitucional, buscando-se harmonizar os valores envolvidos.

A compatibilização dar-se-á, como se sabe, pela técnica da ponderação entre os valores em conflito, na qual o intérprete, ao final, utilizando-se, principalmente, do princípio da proporcionalidade, efetuará escolhas, mas sempre visando concretizar ao máximo os direitos constitucionalmente protegidos. Sendo assim, cumpre verificar o conteúdo especial dos valores em colisão em cada hipótese do caso concreto.

Inicia-se a análise, então, afirmando que, em princípio, a liberdade religiosa deve prevalecer nos seguintes termos: se o paciente tiver no gozo pleno de suas faculdades mentais, em condições de manifestar validamente suas convicções religiosas, é seu o direito de decidir sobre qualquer intervenção em seu próprio corpo, da mesma forma que optou por deslocar-se até o hospital ou clínica médica.

Argumenta-se neste sentido porque se a pessoa não pode ser constrangida a procurar o profissional da saúde, da mesma maneira, é proporcional que lhe seja garantida a autonomia individual de decidir sobre seu próprio corpo.

Dessa forma, a submissão forçada aos cuidados médicos, no caso das Testemunhas de Jeová, à transfusão de sangue, implicaria em afronta a dignidade humana.

Entretanto, não é esse o raciocínio tratando-se de situação de perigo iminente de vida. Nesta, a lei penal previamente faz opção axiológica pela vida, conforme o disposto no art. 146, §3°, inc. I, do Código Penal. Sendo assim, o médico poderá e deverá intervir, sem que sua conduta configure o delito de constrangimento ilegal.

É imprescindível discorrer, ainda que de forma superficial, sobre o que seja o perigo iminente. Seria um conceito, à primeira vista, impreciso. Entretanto, a doutrina já tratou de classificá-lo como "um risco de dano determinado, palpável e iminente, ou seja, que está para acontecer" ou "em vias de concretização" [23]. Entende-se que é aquela situação em que o paciente tenha sofrido hemorragia de grande monta ou necessite ser submetido a uma intervenção cirúrgica, ou até mesmo quando está no meio desta, e torna-se imprescindível a transfusão sanguínea para preservação de sua vida.

Na hipótese do paciente não conseguir exprimir validamente sua recusa à terapia, diante do seu estado de inconsciência ou incapacidade de se manifestar, o médico, na posição de garante do bem jurídico vida, possui o dever legal e ético de proceder à transfusão. E, ainda, presentes os elementos da urgência e do perigo imediato, não é outra a atitude esperada, até porque a lei penal assim já determina.

Em ambos os casos descritos, mesmo havendo a recusa manifestada pelos responsáveis do paciente, subsiste o dever de agir. Num juízo de ponderação, o suposto atentado à liberdade individual é tolerado em função da preponderância do direito à vida, pois, nestes casos, não há manifestação válida e consciente, que seja forte suficiente para se sobrepor à preservação da vida. O princípio da dignidade humana, neste caso, urge por se preservar a vida do enfermo.

Registra-se que, ao nosso ver, o direito à vida é pressuposto material do exercício dos demais direitos, constitui antecedente lógico do direito fundamental à liberdade e apenas será por este sobrepujado havendo manifestação consciente do paciente, na qual invoque de forma inconteste a sua vontade de não realizar a transfusão. Isto se ele não estiver em estado de perigo iminente.

Ainda, é de se salientar nossa repulsa ao consentimento antecipado: aquele documento que as Testemunhas de Jeová portam, no qual consta a recusa antecipada para o caso de inconsciência. Porém, será melhor analisada a questão em tópico a frente.

No mais, resta analisar se a recusa em receber a transfusão sanguínea pode, a priori, ser qualificada como atitude suicida e, então, configurar a permissão descrita no art. 146, §3°, inc. II, do Código Penal. É notório que as Testemunhas de Jeová admitem, ainda que de forma indireta, a superveniência da própria morte, pois caso a transfusão sanguínea mostre-se como única solução vital, estes religiosos preferem a morte.

Porém, mesmo diante dessas constatações, acredita-se que não seria justo qualificá-los como suicidas. Na verdade, tudo dependerá do caso concreto: se o médico perceber a presença de uma conduta suicida, isto é, a intenção deliberada de provocar a própria morte, deve intervir, pois estará acobertado pela permissão legal de realizar a transfusão para coibir o suicídio.

Finalmente, apenas a título de ilustração de quão dramática é a situação fática, colacionamos o relato de um obstetra, descrito na obra de Miguel Kfouri Neto. O médico conta que "para salvar a vida de uma paciente, que se recusava terminantemente, por motivos religiosos, a consentir em transfusão, após difícil parto, praticou tal ato, contra a vontade da parturiente e de seu marido. A mulher, após obter alta, não foi aceita em seu lar, pelo cônjuge, nem pôde mais freqüentar a Igreja, sendo repudiada por todos." [24]

Por esse relato, pode-se concluir que se trata de situação extremamente delicada, a qual requer um juízo de ponderação minucioso, que leve em consideração todos os valores envolvidos.


5. A QUESTÃO DOS PACIENTES MENORES

Outra questão bastante conflitiva é a relativa ao direito dos pais se recusarem à realização de transfusão sanguínea em seus filhos menores.

É cediço que aos pais, detentores do poder familiar, incumbe o dever de realizar todo o possível para manter a saúde e a vida de seus filhos. Pertence a eles também, indubitavelmente, a iniciativa de formação religiosa até que seus filhos, chegados à idade adulta, possam decidir pela religião a ser por eles seguida e assumir pessoalmente as conseqüências desta opção.

Todavia, o poder familiar não é absoluto, uma recusa ao tratamento do filho menor por razões de crença religiosa constituir-se-ia em "exercício abusivo do pátrio poder" [25], uma vez que o Estado transporta para os pais o dever de garantir a vida de seus filhos, porém, se atuarem em sentido diverso, não se pode permitir que a vontade dos pais se sobreponha ao direito de viver de seus filhos, impondo-se, portanto, a intervenção estatal.

Vislumbrada esta hipótese, cumpre ao médico proceder à transfusão, defendendo a vida de seu paciente e, caso venha o hospital a pedir autorização judicial, é dever do magistrado a concessão da tutela em nome da vida deste menor, fundamentada na premissa que o direito à vida pertence ao ser humano, ao indivíduo, e não aos seus pais.

Registra-se opinião em sentido oposto de Celso Ribeiro Bastos que, utilizando-se da tese de que o pátrio poder é absoluto [26], entende que a decisão de não submeter o menor de idade a determinado tratamento médico pertence ao parente responsável por ele.

Frisa-se, data maxima venia, nossa discordância acerca desse posicionamento, por acreditar que, após um juízo de ponderação, no caso da transfusão se mostrar imprescindível à manutenção da vida do menor, não seria razoável deixar de realizá-la e, com base em crença religiosa dos pais, dispor justamente daquela vida que precisa de maior proteção pelo ordenamento jurídico: o menor, criança ou adolescente. Não se vislumbra proporcionalidade alguma em afastar a vida de quem sequer possui maturidade para escolher determinada religião.


6. A RESPONSABILIDADE DO MÉDICO

Diante da recusa por convicções religiosas, o médico enfrenta dramática situação: sua formação direciona-o para salvar vidas, porém, se realiza a transfusão contra a vontade do paciente, sujeitar-se-ia às conseqüências de natureza civil e penal, pela intervenção não consentida no corpo do paciente.

Dessa forma, frente à situação clínica que demande a realização de transfusão sanguínea em paciente que recuse a se submeter a tal procedimento, a responsabilidade do médico requer análise cuidadosa por envolver, além de matéria constitucional, aspectos da esfera penal com grande possibilidade de reflexos na seara da reparação civil.

Analisa-se, de início, no capítulo dos direitos da personalidade, o conteúdo do art.15 do Código Civil. Este determina que "ninguém será constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica".

Ao determinar a ilicitude de qualquer intervenção, com risco de vida, sem o consentimento prévio do paciente, este artigo objetiva reforçar o direito fundamental à liberdade de escolha: privilegia a autonomia individual do paciente.

O comando legal visa coibir a intervenção médica que ponha em risco a integridade física e, no caso das Testemunhas de Jeová, a integridade moral de pacientes, sem que haja o prévio consentimento. Dessa forma, entende-se que está incluída naquele dispositivo a hipótese de transfusão sanguínea, quando esta importe em risco de vida.

Entretanto, outro é o entendimento tratando-se de situação de urgência. Ao definir o crime de constrangimento ilegal, o Código Penal considera como fato atípico o ato do médico que, sem o prévio consentimento, realiza a transfusão sanguínea, presente a circunstância do perigo iminente ou para impedir o suicídio.

Transportando-se a permissão legal para o caso em tela, entende-se que, se o paciente Testemunha de Jeová encontra-se em estado de hemorragia grave, devido a um acidente, por exemplo, ou presente o perigo imediato, como na hipótese de imprescindibilidade da transfusão sanguínea no meio de uma cirurgia, incumbe ao médico proceder à transfusão, mesmo que os responsáveis por aquele paciente manifestem-se de forma contrária.

Dessa forma, perante o efetivo risco de vida, o médico deve proceder à transfusão, sem que esta atitude configure crime algum, uma vez que o art.146, §3º, I, do Código Penal, permite o tratamento forçado, se o paciente estiver exposto a iminente perigo de vida.

Salienta-se que se tratando de paciente capaz e totalmente consciente, ou seja, no gozo pleno de suas faculdades mentais e apto a manifestar seu consentimento, a liberdade de consciência, neste caso, urge por ser respeitada: seu direito de escolha deve prevalecer, ressalvando-se a hipótese anteriormente analisada de perigo imediato.

Com relação ao consentimento, insta discorrer, ainda que brevemente, a respeito da validade da vontade antecipada do paciente, por escrito, recusando-se a determinado tratamento médico, para a hipótese de estado de inconsciência.

Ora, em primeiro, reforça-se nosso entendimento que a recusa somente é aceita na hipótese do paciente estar em pleno estado de consciência, pois deve ser real e pessoal, espontânea e consciente [27], uma vez que essa oposição à transfusão, provavelmente, acarretará graves conseqüências à sua integridade física.

Em segundo, há a questão da suspeita de espontaneidade no momento que a pessoa firmou aquele documento. Sobre esta, faço como minhas as palavras de Miguel Ángel Núnez Paz, o qual levanta dúvidas, das mais intensas, acerca da validade daquele documento, pois "correspondendo aos motivos religiosos de grupos muito fechados, é mais fácil suspeitar, com fundamento, que muitas vezes a assinatura daquele não terá sido espontânea e livre de pressões externas". [28]

Sendo assim, presente o perigo iminente, a urgência, o estado de inconsciência, o valor vida prevalece, e surge para o médico o dever de agir, sem que por isto venha a ser responsabilizado.

Para finalizar, corresponde ao nosso o entendimento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, o qual trazemos à colação:

Importante salientar que, de resto, não há porque médicos e hospitais temerem, desde que atuem dentro de normas técnicas tidas como amparadas em conhecimentos científicos sólidos e sérios, fundamentados em boa literatura médica. Não há como evitar divergências técnicas e científicas na Medicina e não pode o médico deixar de agir em nome daquelas divergências, desde que siga corrente técnico-científica reconhecida e acatada nos meios médicos e hospitalares. Basta ao médico e ao hospital demonstrarem ter atuado dentro da Medicina. Aliás, por isto se diz que a obrigação do médico é obrigação de meios e não de resultado [...]. Se o médico, dentro daquelas regras técnicas e científicas, fizer a transfusão de sangue, porque havia perigo iminente de vida para o paciente (novamente o art.146 do CP, em seu §3°, I), não poderá sofrer conseqüências negativas, mesmo que o paciente, seus familiares e todas as Testemunhas de Jeová do mundo não quisessem a transfusão! A liberdade de religião não pode sobrepor à vida e nem a vida é direito disponível. Se o médico não fizesse a transfusão e como decorrência morresse o paciente, seria ele responsabilizado até por crime de homicídio culposo (imperícia) e seria responsabilizado civilmente! Só este aspecto contundente e inatacável mostra como há casos em que o médico deve fazer o que entende correto para salvar a vida do paciente, mesmo contra a vontade dele e de seus familiares, amigos, conhecidos, companheiros de religião, etc. [29]


7. O FUNDAMENTO RELIGIOSO

Mas, afinal, quais são os motivos que levam uma pessoa praticante desta religião a recusar a transfusão de sangue?

Afirma-se que determinados textos do Antigo Testamento proíbem o povo de Deus de alimentar-se com sangue e os adeptos dessa crença estenderam esta proibição à administração de sangue por qualquer via, alegando-se os riscos advindos das transfusões.

Carlos Ernani Constantino, Promotor de Justiça no Estado de São Paulo, em réplica às críticas tecidas ao seu artigo "Transfusão de Sangue e Omissão de Socorro" [30], explica que:

As denominadas Testemunhas de Jeová interpretam erroneamente a passagem bíblica de Atos, cap. 15, vers. 20, em que os Apóstolos, trazendo algumas regras do Antigo para o Novo Testamento, recomendaram aos novéis cristãos (isto é, aos recém-convertidos do Paganismo ao Cristianismo), que se abstivessem do sangue; a sobredita seita vê, aqui, uma proibição implícita da realização de transfusões sanguíneas. Entretanto, o leitor atento, lendo todo o capítulo 15 de Atos, entende que a questão posta em debate era se algumas normas do Judaísmo (Antigo Testamento) deveriam ou não prevalecer no Cristianismo (Novo Testamento); a conclusão foi a de se conservarem as regras contidas no versículo 20, entre elas, a abstenção do sangue; porém, tal proibição, oriunda do Antigo Concerto, era a de se comer o sangue dos animais. (Gênesis, 9:4; Levítico, 3:17). Só dos animais, pois, naquela época, nem se sonhava com transfusões sangüíneas, entre seres humanos... As Testemunhas retrucam que o sangue humano equipara-se ao sangue dos animais, o que é uma falácia, pois a própria Bíblia diz que "a carne (natureza física) dos homens é uma e a carne dos animais é outra" (I Coríntios, 15:39). Por fim, argumentam as Testemunhas que, se não se pode comer, pela boca, o sangue, não se pode, também, ingeri-lo pela veia, em uma transfusão. Contudo, o médico acima mencionado, Dr. Sinésio, esclarece o seguinte: "A reação metabólica é completamente diferente, ao se comer o sangue (de animais) e ao se tomar uma transfusão de sangue (humano) pela veia: quando se come o sangue (animal) - pela boca, é óbvio -, o organismo absorve as gorduras e proteínas, mas a massa sangüínea é posta fora, após a digestão, pelas fezes; quando se toma uma transfusão de sangue (humano), pela veia, a massa sangüínea aplicada não é eliminada pela digestão, mas incorpora-se no sangue do paciente. [31]

Os fiéis desta religião, os intitulados Testemunhas de Jeová, não aceitam a transfusão de sangue por entender que "o sangue de outrem é impuro, moralmente contaminado" [32].

Entretanto, não cabe aqui analisar as justificativas bíblicas para esta recusa, objetiva-se apenas informar o possível fundamento religioso que leva os seguidores desta religião a preferirem a morte à uma transfusão sanguínea.


8. A VISÃO DOS TRIBUNAIS

Neste ponto, para finalizar, objetiva-se expor a visão de alguns Tribunais acerca da matéria. Desde logo, informa-se que não há muitas decisões jurisprudenciais que abordam especificamente a questão e, então, trazemos à baila apenas duas visões mas que melhor representam o entendimento global da questão.

Miguel Kfouri Neto [33] informa que a jurisprudência por ele consultada não registra sequer uma demanda indenizatória que condenasse o médico à reparação civil por ter procedido à transfusão de sangue contra a vontade do paciente ou de seu responsável.

Na seara penal, o TACrimSP manifestou-se sobre a matéria e, nas palavras do autor supracitado, o acórdão "contém preciosas lições- e serve de paradigma", as quais entendemos pertinente colacionar:

A vida humana é um bem coletivo, que interessa mais à sociedade que ao indivíduo, egoisticamente, e a lei vigente exerce opção axiológica pela vida e pela saúde, inadmitindo a exposição desses valores primordiais na expressão literal do texto, a perigo direto e iminente [...] Uma vez comprovado efetivo perigo para a vítima, não cometeria delito nenhum o médico que, mesmo contrariando a vontade expressa dos por ela responsáveis, à mesma tivesse ministrado transfusão de sangue. [34]

Em precioso acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, o Des. Sérgio Gischkow Pereira aborda a matéria de forma a resumir seus pontos de maior relevância e profere, com propriedade, o seu posicionamento acerca do tema. Cumpre trazermos à colação parte do seu voto, pois, além de corresponder à nossa posição, demonstra o que consideramos por uma decisão justa:

CAUTELAR. TRANSFUSAO DE SANGUE. TESTEMUNHAS DE JEOVA. Não cabe ao poder judiciário, no sistema jurídico brasileiro, autorizar ou ordenar tratamento médico-cirúrgicos e/ou hospitalares, salvo casos excepcionalíssimos e salvo quando envolvidos os interesses de menores. Se iminente o perigo de vida, é direito e dever do medico empregar todos os tratamentos, inclusive cirúrgicos, para salvar o paciente, mesmo contra a vontade deste, de seus familiares e de quem quer que seja, ainda que a oposição seja ditada por motivos religiosos. Importa ao medico e ao hospital demonstrar que utilizaram a ciência e a técnica apoiadas em séria literatura médica, mesmo que haja divergências quanto ao melhor tratamento. O judiciário não serve para diminuir os riscos da profissão médica ou da atividade hospitalar. Se transfusão de sangue for tida como imprescindível, conforme sólida literatura médico-cientifica (não importando naturais divergências), deve ser concretizada, se para salvar a vida do paciente, mesmo contra a vontade das Testemunhas de Jeová, mas desde que haja urgência e perigo iminente de vida (art-146, §3°, I, do Código Penal). [...] O direito à vida antecede o direito à liberdade, aqui incluída a liberdade de religião; é falácia argumentar com os que morrem pela liberdade, pois aí se trata de contexto fático totalmente diverso. Não consta que morto possa ser livre ou lutar por sua liberdade. Há princípios gerais de ética e de direito, que aliás norteiam a Carta das Nações Unidas, que precisam se sobrepor às especificidades culturais e religiosas; sob pena de se homologarem as maiores brutalidades; entre eles estão os princípios que resguardam os direitos fundamentais relacionados com a vida e a dignidade humanas. Religiões devem preservar a vida e não exterminá-la. [...] Abrir mão de direitos fundamentais, em nome de tradições, culturas, religiões, costumes, é, queiram ou não, preparar caminho para a relativização daqueles direitos e para que venham a ser desrespeitados por outras fundamentações, inclusive políticas. [...] É o voto. [35]


9. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quando Direito e Moral se chocam, as conseqüências podem ser nefastas. É de se lamentar que os Testemunhas de Jeová imponham como dogma religioso uma censurável resistência à transfusão de sangue, não se abalando mesmo diante da possibilidade desta recusa provocar a morte de um de seus fiéis. Religiões devem incentivar a vida, e não a morte.

Entretanto, num Estado de Direito Democrático e Social, a liberdade é requisito da democracia. A autonomia individual deve ser respeitada e, com ela, o direito de consciência e de crença. As manifestações religiosas não se limitam ao exercício da religião em templos. Entende-se que pressupõe a prática religiosa, com respeito aos seus dogmas, em todas as circunstâncias da vida.

Dessa forma, admite-se a recusa às transfusões sanguíneas por motivos de foro íntimo: convicções pessoais, religiosas ou não. O próprio Código Civil coíbe a intervenção médica ou cirúrgica, com risco de vida, sem o prévio consentimento do paciente.

Todavia, nosso ordenamento não tolera a liberdade religiosa como direito absoluto. Seria inadmissível: teríamos que conviver com as maiores brutalidades, pois justificativas das mais diversas nunca faltam para as violações dos direitos humanos!!!

Por esse motivo, é razoável que se preserve a vida, acima de qualquer outro direito, quando mais se aproximar da dignidade humana. Não há dúvidas que a transfusão de sangue deve ser feita pelo médico caso o paciente encontre-se em iminente risco de vida ou inconsciente.

Não há dúvidas também que o Judiciário deve retirar um filho menor das mãos dos pais para que seja salva a sua vida. O direito à vida pertence à pessoa humana, ao filho como ser humano, titular deste direito básico da personalidade e, nunca aos seus responsáveis. Admitir o contrário seria o mesmo que homologar um homicídio.

Diante da aparente colisão de direitos fundamentais no caso concreto, faz-se necessária a ponderação dos valores envolvidos, com aplicação dos princípios específicos de Hermenêutica Constitucional, optando-se, finalmente, pelo direito que melhor assegure a dignidade da pessoa humana.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 2 ed. ver., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.


Notas

1 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 2 ed. ver., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p.385. (grifos nossos)

2 CERNICCHIARO, Luiz Vicente. Transfusão de Sangue. Juris Síntese n°18, jul/ago, 1999. CD-ROOM. (grifos nossos)

3 CARVALHO, Gisele Mendes de. Aspectos jurídico-penais da eutanásia. São Paulo, IBCCRIM, 2001. p. 113.

4 Art. 128, inc.II do Código Penal.

5 BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2003.

6 BASTOS, Celso Ribeiro. Direito de Recusa de Pacientes Submetidos a Tratamento Terapêutico às Transfusões de Sangue, por Razões Científicas e Convicções Religiosas. São Paulo: Revista dos Tribunais. Ano 90. vol.787. 2001. p. 499

7BASTOS, Celso Ribeiro. Direito de Recusa de Pacientes Submetidos a Tratamento Terapêutico às Transfusões de Sangue, por Razões Científicas e Convicções Religiosas. p. 497.

8 Idem. Ibidem.

9 Idem. Ibidem.

10 FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de Direitos. A Honra, a Vida Privada e a Imagem versus a Liberdade Expressão e Informação. Porto Alegre: Sergio Fabris, 1996. p. 155.

11 FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de Direitos. p.140.

12 BARROSO, Luís Roberto e Ana Paula Barcellos. A Nova Interpretação Constitucional: ponderação, argumentação e papel dos princípios. In Dos Princípios Constitucionais- Considerações em Torno das Normas Principiológicas da Constituição. org. George salomão Leite. São Paulo: Malheiros, 2003. p.

13 BARROSO, Luís Roberto e Ana Paula Barcellos. A Nova Interpretação Constitucional: ponderação, argumentação e papel dos princípios. p. 101-135.

14 FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de Direitos. p. 98. O autor, citando Konrad Hesse, ensina que as normas constitucionais devem ser interpretadas de maneira que se evitem contradições com outras normas constitucionais e que a única solução coerente com este princípio é a que se encontra em consonância com as decisões básicas da Constituição e evite sua limitação unilateral a aspectos parciais.

15 FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de Direitos. p. 98. O autor baseia-se nas teorias de Konrad Hesse.

16 Idem, Ibidem.

17 BARROSO, Luís Roberto e Ana Paula Barcellos. A Nova Interpretação Constitucional: ponderação, argumentação e papel dos princípios. p. 116.

18 BARROSO, Luís Roberto e Ana Paula Barcellos. A Nova Interpretação Constitucional: ponderação, argumentação e papel dos princípios. p. 116.

19 Idem, Ibidem.

20 ALEXY, Robert Apud FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de Direitos. p. 99.

21 BARROSO, Luís Roberto e Ana Paula Barcellos. A Nova Interpretação Constitucional: ponderação, argumentação e papel dos princípios. p. 128.

22 BARCELLOS, Ana Paula de. A Eficácia Jurídica dos Princípios Constitucionais: O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. A autora utiliza a expressão "mínimo existencial" para definir o núcleo da dignidade da pessoa humana, que seria "o conjunto de prestações que cada indivíduo pode exigir do Poder Público com fundamento em sua dignidade".

23 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 2 ed. ver., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p.418.

24 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil Médico. 5.ed. rev. e atual. à luz do novo Código Civil, com acréscimo doutrinário e jurisprudencial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p.176.

25 ROMEO CASABONA, Carlos María Apud CARVALHO, Gisele Mendes de. Aspectos jurídico-penais da eutanásia. São Paulo, IBCCRIM, 2001.p.164..

26 BASTOS, Celso Ribeiro. Direito de Recusa de Pacientes Submetidos a Tratamento Terapêutico às Transfusões de Sangue, por Razões Científicas e Convicções Religiosas. São Paulo: Revista dos Tribunais. Ano 90. vol.787. 2001. p. 493-507. Afirma que "o pátrio poder inclui a tomada das decisões que envolvem toda a vida dos filhos menores sob sua tutela. [...] A decisão sobre não se submeter a determinado tratamento médico, como visto, é perfeitamente legítima e, assim, inclui-se, como qualquer outra, no âmbito de decisão dos pais quando se tratar de filho menor."

27 NANNI, Giovanni Etore. A Autonomia Privada sobre o próprio corpo, o cadáver, os órgãos e tecidos diante da Lei Federal N. 9.434/97 e da Constituição Federal. In Cadernos I de Direito Civil Constitucional coodr. Renan Lotufo. São Paulo: Max Limonad, 1999.p.282. Ao fazer esta observação acerca de que o consentimento não se pode presumir, cita Pietro Perlingieri como o criador desta argumentação.

28 NÚÑEZ PAZ, Miguel Ángel Apud CARVALHO, Gisele Mendes de. Aspectos jurídico-penais da eutanásia. São Paulo, IBCCRIM, 2001.p.164..

29 TJRGS. Apelação Cível. 595000373. 6ª.C.C. Rel. Des. Sérgio Gischkow Pereira. Julgada em 28.03.1995. Disponível em www.tjrs.gov.br. Acessado em 21/09/2004. (grifos nossos).

30 CONSTANTINO, Carlos Ernani. Transfusão de Sangue e Omissão de Socorro. Revista Jurídica n° 246, abril, 1998. p.51.

31 CONSTANTINO, Carlos Ernani. Réplicas às críticas tecidas ao nosso artigo. In http://www.acta-diurna.com.br/biblioteca/doutrina/d36.htm. Acessado em 25/09/2004. (grifos nossos).

32 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil Médico. p.173.

33 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil Médico. p.175. (grifos nossos).

34 Idem. Ibidem.

35 TJRGS. Apelação Cível. 595000373. 6ª.C.C. Rel. Des. Sérgio Gischkow Pereira. Julgada em 28.03.1995. Disponível em www.tjrs.gov.br (grifos nossos).


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LEME, Ana Carolina Reis Paes. Tranfusão de sangue em testemunhas de Jeová. A colisão de direitos fundamentais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 632, 1 abr. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6545. Acesso em: 29 mar. 2024.