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A construção do desenvolvimento sustentável

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Allan Carlos Moreira Magalhães
Ana Beatriz Passos Motta
21/10/2012 às 11:05
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As teorias sobre a polêmica entre crescimento econômico e preservação ambiental não são suficientes para dar conta da complexidade dos desafios que se colocam para o século XXI acerca da forma como o homem se relaciona com a natureza.

Resumo: A busca pelo bem estar individual e coletivo sempre foi constante preocupação do homem, que concebeu o desenvolvimento como o instrumento para concretizar essas aspirações. No liminar o século XXI, com a superação da crença de que o mero crescimento econômico seria capaz de prover todas as necessidades humanas e de melhorar a qualidade de vida, o desenvolvimento ampliou-se em direção aos direitos difusos e passou a abranger também uma dimensão ambiental cristalizada no desenvolvimento sustentável. Porém, a harmonização desses valores não é tarefa simples e apresenta-se como um grande desafio ainda não solucionado definitivamente. Partindo dessa problemática, o presente artigo expõe brevemente a evolução do conceito de desenvolvimento até a formação, na atualidade, do ideal de desenvolvimento sustentável e as mais relevantes teorias que visam a sua concretização.

Palavras-chave: Meio Ambiente. Economia. Desenvolvimento Sustentável.

Sumário: Introdução; 2. Da passagem do desenvolvimento econômico ao desenvolvimento sustentável; 3. A concepção de desenvolvimento sustentável; Considerações Finais; Referências.


INTRODUÇÃO

A evolução dos direitos fundamentais – que passaram das garantias às liberdades individuais aos valores coletivos e difusos – impulsionou a premência de inserir no contexto do desenvolvimento econômico a noção de proteção ao meio ambiente.

Contudo, a conciliação entre estes dois objetivos tem se mostrado um grande desafio a ser alcançado pela sociedade contemporânea, que ainda busca os possíveis caminhos e soluções para a efetivação do art. 225 da Constituição Federal de 1988, através do ideal de desenvolvimento sustentável.

Nesse quadrante, o presente artigo dedica-se, sem a pretensão de esgotar o tema, a expor as raízes do desenvolvimento sustentável e as principais teorias econômicas que visam à sua implementação, com enfoque em dois conceitos chaves: desenvolvimento e sustentabilidade.


2 DA PASSAGEM DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

A construção do conceito de desenvolvimento é um retrato da evolução histórica da economia global. A despeito de inúmeras peculiaridades e de diversas vertentes, pode-se dividir a concepção teórica de desenvolvimento em, basicamente, três fases: i) a que a coloca como sinônimo de crescimento econômico; ii) a que nega a possibilidade de existir um efetivo desenvolvimento mundial e iii) a que agrega o valor ambiental como sustentáculo desenvolvimentista, dando azo ao desenvolvimento sustentável.

A primeira dessas fases pautou-se pela identificação entre desenvolvimento e crescimento econômico. Segundo esta corrente – que predominou de forma marcante no Brasil da II Guerra Mundial até o final do século XX – o grau de desenvolvimento é indicado pela capacidade de cada nação de acumular riquezas.

Assim, parte-se da premissa de que quanto maior o progresso material, maior será a melhoria dos padrões sociais de determinada população. Dito de outro forma, a elevação de benefícios sociais seria uma conseqüência natural do crescimento econômico.

Tal concepção desenvolvimentista claramente privilegia uma visão quantitativa do fenômeno econômico e seus impactos sociais, onde os principais parâmetros indicativos para medir o desenvolvimento são o PIB (Produto Interno Bruto) – índice que compreende a soma de todas as riquezas produzidas por um País em um período de tempo certo – e a renda per capita.

Esse modelo de desenvolvimento também é marcado pelo liberalismo concernente à regulamentação do mercado. Prega-se o não intervencionismo estatal, bem como a capacidade dos atores econômicos de se autodeterminarem e de encontrarem o ponto de equilíbrio necessário à manutenção da saúde do cenário econômico global.

É justamente essa característica que dá início às críticas à associação entre desenvolvimento e crescimento econômico.

A principal delas diz respeito ao papel ao crescimento econômico. Não se nega a importância desse elemento para o desenvolvimento; porém, o crescimento econômico não pode ser encarado como um fim em si mesmo e tampouco como o único caminho para se chegar ao desenvolvimento.

A referida constatação nasce da observância do recorrente descompasso entre desenvolvimento e crescimento econômico, que nem sempre é acompanhado de mudanças sociais ocorridas na mesma proporção ou velocidade. Com efeito, em cenários de rápido crescimento econômico, o desenvolvimento tem se mostrado uma exceção histórica e não a regra geral.

Outro fato muito criticado em relação ao crescimento econômico é o favorecimento à alta concentração de riqueza e de renda nas mãos de poucas pessoas. Essa característica se mostra especialmente presente em modelos econômicos que estimulam a criação de arquipélagos isolados de geração de riqueza, propiciando padrões de crescimento excludente. Um exemplo desse arquétipo de arquipélago é a Zona Franca de Manaus, cidade que há anos vem se situando entre os melhores índices do PIB brasileiro, mas que também apresenta enormes e crescentes desigualdades sociais.

Diante da desilusão oriunda do fracasso da promessa de melhorias sociais que seriam naturalmente implementadas com o crescimento econômico, muitos teóricos insurgiram-se contra a idealização do desenvolvimento e passaram a encará-lo como um mero mito ou armadilha ideológica para perpetuar relações de dominação social.

Giovanni Arrighi (1997), um dos grandes expoentes dessa corrente ceticista, concebeu o chamado “padrão trimodal” para tentar explicar a dinâmica econômica e social mundial para se atingir o desenvolvimento. Segundo esse padrão trimodal, a economia capitalista é formada por um núcleo, integrado por países considerados ricos e desenvolvidos, em cujo redor encontram-se nações pobres e subdesenvolvidas.

O grande cerne dessa teoria é o ceticismo quanto à mobilidade dos países periféricos em direção ao núcleo desenvolvido, que é tida como algo pouco improvável, senão impossível de ser atingida. Importante frisar que o padrão trimodal não nega a existência do desenvolvimento em si, mas o coloca como um estado praticamente inacessível para a maioria das nações subdesenvolvidas.

Assim como a corrente anterior, a negação quanto à possibilidade de um desenvolvimento compartilhado igualitariamente por todas as nações também foi duramente criticada, sobretudo por não propor uma alternativa ou solução à problemática trazida pelo padrão trimodal e nem enfrentar temáticas que obstacularizam o desenvolvimento, como o desemprego em massa e o drástico crescimento das desigualdades sociais.

A concepção mais moderna de desenvolvimento rompe totalmente com as ideais anteriormente expostas, concentrando-se em um viés mais humanista.

Essa nova fase teórica do desenvolvimento foi inaugurada por Amartya Sen, ganhador do prêmio Nobel de Economia de 1998, notadamente a partir da obra “Desenvolvimento como Liberdade”. Na abordagem do economista indiano, atual fase de exuberância econômica mundial não evita cenários de privações e opressões. Logo, Sen (2010) afirma que o desenvolvimento consistiria na eliminação de tudo que limita as escolhas e as oportunidades das pessoas.

Dessa forma, o desenvolvimento passa a ser associado não somente ao crescimento econômico, mas também à garantia de direitos fundamentais de primeira, segunda e terceira geração, com o claro objetivo de servir de meio para se atingir todas as potencialidades humanas.

Sachs (2008, p. 13-14) explica a profundidade da transformação verificada no conceito de desenvolvimento:

O desenvolvimento, distinto do crescimento econômico, cumpre esse requisito, na medida em que os objetivos do desenvolvimento vão bem além da mera multiplicação da riqueza material. O crescimento é uma condição necessária, mas de forma alguma suficiente (muito menos um objetivo em si mesmo), para se alcançar a meta de uma vida melhor, mas feliz e mais completa para todos.

(...) Igualdade, equidade e solidariedade estão, por assim dizer, embutidas no conceito de desenvolvimento, com conseqüências de  longo alcance para o pensamento econômico sobre o desenvolvimento se diferencie do economicismo redutor.

Em vez de maximizar o crescimento do PIB, o objetivo maior se torna promover a igualdade e maximizar a vantagem daqueles que vivem nas piores condições, de forma a reduzir a pobreza, fenômeno vergonhoso, porquanto desnecessário, do nosso mundo de abundância.

Uma característica que se sobressai desse novo desenvolvimento é o deslocamento da visão quantitativa para uma visão qualitativa, a qual coloca em segundo plano temáticas como economia e contabilidade pública, para ceder lugar a governança de cunho social.

Dados os contornos iniciais do desenvolvimento, em 1990, a Organização das Nações Unidas - ONU apresentou ao mundo um dos mais conhecidos índices utilizados para aferir o nível de desenvolvimento: o IDH – Índice de Desenvolvimento Humano, que segue formula baseada na média geométrica de três subíndices, ligados à expectativa de vida, acesso à educação formal e à renda per capita.

Apesar da relevância do IDH, também não tardaram a chegar as críticas ao índice, que se fundam, em grande parte, na limitação de critérios utilizados pela ONU para se medir o desenvolvimento, já que outros indicativos a par da educação, renda e saúde mostram-se igualmente importantes para essa finalidade. Com isso, surge a necessidade de se conjugar o IDH com outros índices e tabelas estatísticas para se obter uma visão mais global e real do desenvolvimento.

Um dos indicativos olvidados pelo IDH relaciona-se com o meio ambiente. Sendo um direito fundamental de terceira geração, o acesso ao meio ambiente ecologicamente equilibrado passou a integrar, de maneira gradual, o foco das discussões sobre o alcance do desenvolvimento, dando espaço para que a sustentabilidade agregue-se a várias outras faces desse conceito.

Inaugura-se, assim, a fase do desenvolvimento sustentável, o qual preconiza a conciliação entre crescimento econômico e preservação do meio ambiente, ao mesmo tempo em que exige uma responsabilidade intergeracional, decorrente do dever de solidariedade diacrônico e sincrônico.

Em mais uma pertinente colocação de Sachs (2008, p. 15), o desenvolvimento sustentável apresenta-se com os seguintes contornos:

O conceito de desenvolvimento sustentável acrescenta uma outra dimensão – a sustentabilidade ambiental – à dimensão da sustentabilidade social.

Ela é baseada no duplo imperativo ético de solidariedade sincrônica com a geração atual e de solidariedade diacrônica com as gerações futuras. Ela nos compele a trabalhar com escalas múltiplas de tempo e espaço, o que desarruma a caixa de ferramentas da economia convencional. Ela nos impele ainda a buscar soluções triplamente vencedoras, eliminando o crescimento selvagem ao custo de elevadas externalidades negativas, tanto sociais quanto ambientais.

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Outras estratégias, de curto prazo, levam ao crescimento ambientalmente destrutivo, mas socialmente benéfico, ou ao crescimento ambientalmente benéfico, mas socialmente destrutivo. Os cinco pilares do desenvolvimento sustentável são:

a – Social, fundamental por motivos tanto intrínsecos quanto instrumentais, por causa da perspectiva da disrupção social que paira de forma ameaçadora sob muitos lugares problemáticos de nosso planeta;

b – Ambiental, com as suas duas dimensões (os sistemas de sustentação da vida como provedores de recurso e como “recipientes” para a disposição de resíduos;

c – Territorial, relacionado à distribuição espacial de recursos, das populações e das atividades;

d – Econômico, sendo a viabilidade econômica condição sine qua non para que as coisas aconteçam;

e – Político, a governança democrática é um valor fundador e um instrumento necessário para as coisas acontecerem; a liberdade faz toda a diferença.

O desenvolvimento sustentável, além de constituir uma finalidade em si mesmo, também representa um meio para garantir o bem estar coletivo. Para Rodrigues Júnior (2010, p. 123),

Desenvolvimento sustentável consiste tanto em um fim quanto em um processo para alcançá-lo. Como fim, consiste na expansão da autonomia do indivíduo e de grupos humanos de perseguirem seu projeto de vida por meio da realização integral de seus direitos fundamentais e da simultânea  proteção da base de recursos naturais de que depende sua sobrevivência. (...)

Desenvolvimento sustentável como processo constitui uma estratégia de crescimento econômico de longo prazo, caracterizada pela integração das dimensões humana e ecológica ao processo econômico.  Seu fim último é a dignificação de todos os seres humanos e povos através da erradicação da pobreza e da realização de seus direitos fundamentais.

 Como conceito aberto que é, sujeito a oscilações de valores e de contextos políticos, sociais econômicos, o desenvolvimento sustentável ainda está em plena construção.

Um dos maiores desafios desse início de século é descobrir os caminhos para a sustentabilidade. Nesse sentido, diversas teorias foram elaboradas com o objetivo de colocar em prática a dimensão ambiental almejada por esse novo desenvolvimento.


3 A CONCEPÇÃO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

A relação do homem com a natureza apresenta-se em crise. Trata-se da crise ecológica que François Ost aborda como a crise do vínculo e do limite.

Eis a crise ecológica: a desflorestação e destruição sistemática das espécies animais, sem dúvida; mas, antes de mais e sobretudo, a crise da nossa representação da natureza, a crise da nossa relação com a natureza. (OST, 1995, p.8) 

A crise ecológica é, portanto, além daquela decorrente da destruição sistemática das florestas e dos animais (fauna e flora), especialmente, a crise da nossa relação com a natureza colocada como aquela que decorre do fato de não conseguimos identificar o que nos liga a natureza (crise do vínculo) e o que nos distingue da natureza (crise do limite).

Segundo François Ost (1995), a modernidade ocidental pensa a relação do homem com a natureza numa perspectiva de “natureza-objeto” em que o homem é colocado como dono e senhor da natureza transformando-a em mero reservatório de recursos naturais e depósito de resíduos. Prossegue o referido autor afirmando que a modernidade também encerra um dualismo entre o homem e a natureza que conduz a um impasse, pois determina a perda do vinculo com a natureza e suscita a ilimitabilidade do homem.

Esta concepção moderna da relação do homem com a natureza (natureza-objeto) quando deixou o plano das idéias para se tornar ação humana, inclusive com incentivos do poder público, trouxe conseqüências negativas a nível local, regional e global.

Umas das facetas em que esta concepção da natureza-objeto encontra-se presente esta na idéia de crescimento econômico promovido a qualquer custo, ou seja, sem preocupações de ordem ecológica e social que durante algum tempo foi concebido equivocadamente como sendo sinônimo de desenvolvimento econômico (Veiga, 2010). 

O desenvolvimento econômico não se confunde com o crescimento econômico já que os objetivos daquele não são restritos a mera multiplicação da riqueza material que é condição necessária, mas não suficiente para a promoção de uma melhor qualidade de vida. A efetivação das três gerações dos direitos fundamentais[1] e a ampliação da riqueza material é que traduz a idéia de desenvolvimento. (Sachs, 2008)

A terceira geração dos direitos fundamentais em que esta inserida a proteção do meio ambiente traz mais um aspecto a ser introduzido na idéia de desenvolvimento com grande repercussão em que este passa a ser designado inicialmente como ecodesenvolvimento e posteriormente consolida-se na expressão desenvolvimento sustentável. (Rodrigues Junior, 2010)

No cenário mundial, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano que teve lugar em Estocolmo (1972) apresenta-se como um marco nas discussões em torno da dimensão ambiental da concepção de desenvolvimento. O Relatório Founex que serviu de base para as discussões na referida Conferência admite a relação de causa e efeito entre desenvolvimento industrial indiscriminado e degradação ambiental. (Rodrigues Junior, 2010)

O conceito de desenvolvimento sustentável largamente difundido consolidou-se nos trabalhos da Comissão Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento (1987) através do relatório “Nosso Futuro Comum” também conhecido como “Relatório Brundtland” em que considerou o desenvolvimento sustentável como aquele que satisfaz as necessidades presentes sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades. (Marchesan, 2007, p.186)

Segundo Veiga (2010, p.113), o conceito apresentado pela Organização das Nações Unidas – ONU para o desenvolvimento sustentável se traduz num conceito político e amplo voltado para o progresso econômico e social e que institucionaliza nesta expressão o maior desafio e o principal objetivo das sociedades contemporâneas que é a conciliação entre crescimento econômico e conservação da natureza.

A polarização entre crescimento econômico e preservação ambiental cujos debates surgiram nos Estados Unidos na década de 1960 alimentados por um temor apocalíptico  desencadeou a elaboração de duas correntes. Uma afirma que não há dilema entre conservação ambiental e crescimento econômico, pois este só seria prejudicial ao meio ambiente enquanto não atingisse um determinado patamar de riqueza. A outra corrente apregoa que a solução para este dilema é a condição estacionária que consiste numa situação sem crescimento da população e do estoque físico do capital, mas com melhoria em termos qualitativos (tecnológica e ética) (Veiga, 2010).

A superação da crise ecológica desencadeada pelo dilema entre conservação ambiental e crescimento econômico que consiste na relação do homem com a natureza encontra na idéia de sustentabilidade ambiental um caminho para a construção de uma melhor qualidade de vida.

Nesta perspectiva, as duas correntes apresentadas sobre a polêmica entre crescimento econômico e preservação ambiental não se apresentam suficientes para dar conta da complexidade dos desafios que se colocam para o século XXI acerca da forma como o homem se relaciona com a natureza.

Tanto é assim que Murray Gell-Mann (apud Veiga, 2010, p. 167-170) defende a realização de um conjunto de sete transições interligadas para que a humanidade tenha uma situação mais sustentável no século XXI que não ignora as externalidades negativas do crescimento econômico, nem visa alcançar a condição estacionária. O conjunto das sete transições é o seguinte: a) estabilização da população (global); b) praticas econômicas que encorajem a cobrança de custos reais, crescimento em qualidade em vez de quantidade, e a vida a partir dos dividendos da natureza e não do seu capital; c) tecnologia de baixo impacto ambiental; d) distribuição equitativa da riqueza; e) instituições globais e transnacionais fortes; f) um público mais bem informado sobre os desafios do futuro; g) atitudes que favoreçam a unidade na diversidade, ou seja, cooperação e competição não violenta entre tradições culturais diferentes e nações-Estados, assim como a coexistência com os organismos que compartilham a biosfera com os seres humanos.

O Brasil não ficou afastado desta preocupação global em torno da proteção do meio ambiente de sorte que o desenvolvimento sustentável ostenta no ordenamento jurídico pátrio o status de norma constitucional encontrando-se alocado no artigo 225 da Constituição Federal que impõe ao poder público e a coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial a sadia qualidade de vida, para as presentes e futuras gerações.

A compreensão do desenvolvimento sustentável passa necessariamente pela percepção da inter-relação existente entre os seus pilares de sustentação que são segundo Sachs (2008, p. 15-16) o social, ambiental, territorial, econômico e político.

A inter-relação entre estes aspectos é tão arraigada que Nusdeo (2009) apregoa que a sustentabilidade apresenta-se como conceito abrangente e indivisível cuja fragmentação em áreas e setores apenas é possível para fins didáticos, cuja concreção deve ser atingida no seu conjunto englobando os desdobramentos existentes, sob pena de se gerar desequilíbrio no todo social.

Em sua tese de doutoramento Marques (2009, p. 125) discorrendo sobre o tema nos ensina que:

Desenvolvimento sustentável é aquele que satisfaz os interesses de todos os grupos, possibilitando, ao mesmo tempo, proteção ambiental. Deve situar-se em um patamar mínimo de bem-estar e dentro de um limite máximo tolerável de desgaste de recursos ambientais, seja provocado pelo crescimento econômico, seja provocado pela própria comunidade em suas atividades normais. É a harmonização do homem com a natureza. Não significa não crescimento, mas a compatibilização entre crescimento econômico e proteção ambiental.

O inter-relacionamento entre os aspectos ambientais, econômicos e sociais, apregoados pelo desenvolvimento sustentável estão presentes no nosso ordenamento jurídico em que a Constituição Federal elegeu como um dos princípios da ordem econômica a defesa do meio ambiente (art. 170, inciso VI, CF/88). E no aspecto social elegeu como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, assim como o desenvolvimento nacional e a redução das desigualdades sociais (art. 3º, CF/88).

O grande desafio, portanto, é conseguir identificar as práticas sustentáveis para o desenvolvimento em razão da indefinição e instabilidade do conceito de desenvolvimento sustentável que varia no tempo e no espaço e que para Veiga (2010, p. 208) ainda é um “enigma que continua à espera de um Édipo que o desvende”.

Todavia, Marques (2009, p. 126-127) nos alerta para o fato de que apesar destas dificuldades o desenvolvimento sustentável deve ser considerado como meta ou objetivo do poder público e da coletividade, ainda que ele seja considerado inatingível. Destaca também que não se pode a esse pretexto “aceitar a insustentabilidade ambiental e social em beneficio exclusivo do crescimento econômico”.

Trata-se do duplo imperativo ético que compõe o conceito de desenvolvimento sustentável que Sachs (2008) se refere e que traz consigo o desafio de acomodar as vertentes constitucionais de desenvolvimento nacional (econômica) e da proteção do meio ambiente (ambiental) de forma que seja assegurada a dignidade da pessoa humana (social) numa perspectiva de perenidade a fim de que sejam beneficiadas as presentes e futuras gerações. 

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Sobre os autores
Allan Carlos Moreira Magalhães

Mestrando em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas - UEA. Especialista em Direito Público pela Universidade de Brasília – UNB. Professor da Faculdade Martha Falcão - FMF. Advogado da União.

Ana Beatriz Passos Motta

Mestranda em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas – UEA. Procuradora do Município de Manaus.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MAGALHÃES, Allan Carlos Moreira ; MOTTA, Ana Beatriz Passos. A construção do desenvolvimento sustentável. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3399, 21 out. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22847. Acesso em: 29 mar. 2024.

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