Ecolabel: conhecendo o standard ambiental da União Européia

10/10/2014 às 08:26
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No artigo é apresentado o Ecolabel, o selo para produtos e serviços sustentáveis na União Europeia, e são discutidos seu processo de obtenção, suas vantagens, seus custos, os fatores que explicam sua criação e sua legitimidade

1.   Escolha do Selo
1.1.               Background Histórico

            Foi escolhido o selo europeu Ecolabel por fazer parte do método europeu de Eco-rotulagem que cobre bens de consumo diário e serviços (exceto comidas, bebidas e medicamentos).

            Tal sistema de rotulagem foi estabelecido por meio do Regulamento (CEE) nº 880/92 do Conselho das Comunidades Européias em 23 de Março de 1992 com os objetivos de:

  • promover a concepção, produção, comercialização e utilização de produtos com um impacto ambiental reduzido durante o seu ciclo de vida completo;
  • informar melhor os consumidores sobre o impacto dos produtos no ambiente, sem contudo comprometer a segurança do produto ou dos trabalhadores nem afetar significativamente as qualidades que tornam o produto apto para utilização.

            Do ponto de vista da atribuição do selo, podem ser rotulados todos os produtos que estejam de acordo com os objetivos do Regulamento (CEE) nº 880/92 e em conformidade com as exigências comunitárias em matéria de saúde, de segurança e de meio ambiente. Sendo portanto, não rotulados os produtos fabricados por processos suscetíveis a prejudicar de forma significativa o ser humano e/ou o ambiente, bem como produtos importados que não satisfaçam seus critérios.

            Considerando que o Ecolabel já estava em uso há quase 20 anos, em Novembro de 2009 foi realizada uma atualização do Regulamento (CEE) nº 880/92  por meio do Regulamento (CE) nº 66/2010 de forma a corrigir suas deficiências e ampliar o alcance do referido standard.

1.2.               Objetivos do Ecolabel

            São objetivos do Ecolabel servir de instrumento para a implementação da política comunitária sobre consumo e produção sustentáveis, estimular alto desempenho ambiental por meio do uso de produtos com rótulo ecológico da União Européia e respeitar os critérios técnico-científicos baseados no melhor desempenho ambiental obtido pelos produtos no mercado comunitário.

1.3.               Características do Ecolabel

            O  Ecolabel apresenta critérios de atribuição progressivamente atualizados (mais restritivos) para garantir a consideração do desenvolvimento tecnológico mais recente, os quais são facilmente compreensíveis para orientar o consumidor na escolha de consumo ambientalmente sustentável e estão relacionados aos impactos ambientais mais significativos dos produtos durante todo seu ciclo de vida.

            Os critérios do Ecolabel apresentam uma abordagem from cradle to grave bastante condizente com a Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) dos produtos que permite detectar impactos desde a extração de matérias-primas (qualificação e seleção de fornecedores), passando pelos processos (impactos do fabricante), pela distribuição (incluindo a embalagem) e por uso e descarte do produto.

            De forma a avaliar os produtos na análise realizada quando da atribuição do selo são levados em conta: consumo de energia, poluição das águas e do ar, produção de resíduos,  conservação de recursos naturais, segurança ambiental e proteção dos solos.

            Vale ressaltar que o Ecolabel é:

  • Voluntário: fabricantes, importadores ou distribuidores podem requerer o selo, uma vez que for verificado o cumprimento dos critérios por seus produtos;
  • Seletivo: é um atestado de excelência concedido somente aos produtos que têm reduzido impacto ambiental (critérios de excelência e alto desempenho dos produtos);
  • Europeu: referência técnico-institucional pública aplicável nos Estados Membros.

            Na definição dos critérios do selo são consultados as autoridades públicas, as grandes indústrias, as pequenas e médias empresas, os distribuidores, os representantes dos consumidores e as organizações ambientalistas não governamentais, o que garante uma abordagem multi-stakeholder.

            Além disso, o Ecolabel tem a vantagem de definir os critérios por grupo de produtos o que possibilita maior nível de precisão na inclusão e no descarte de determinados critérios que façam sentido em um certo grupo, mas sejam desprezíveis em outro. Tais critérios são escolhidos com base no nível de difusão no mercado europeu (que deve ser tal que induza, por meio das escolhas dos consumidores, melhoramentos ambientais significativos) e na viabilidade (feasibility) técnica e econômica das adaptações necessárias às empresas para poderem aderir ao sistema em tempo razoável.

1.4.               Produtos Ecolabel

São os produtos para os quais a Comunidade Européia definiu os critérios de atribuição do selo:

  • Fertilizantes;
  • Aspiradores de pó;
  • Calçados;
  • Papel para impressão e papéis gráficos;
  • Laptops;
  • Pisos de madeira, cerâmica e tecido;
  • Detergentes multiuso;
  • Sabões para lavagem de roupas;
  • Detergentes para lava-louças;
  • Detergentes para lavagem de louça;
  • Geladeiras;
  • Lâmpadas elétricas;
  • Lava-louças;
  • Lava-roupas;
  • Lubrificantes;
  • Colchões;
  • Móveis de madeira;
  • Tecidos;
  • Tintas;
  • Sabonetes, xampus e condicionadores;
  • Televisões;
  • Papel de seda.
1.5.               Serviços Ecolabel

São os serviços para os quais a Comunidade Européia definiu os critérios de atribuição do selo:

  • Alojamentos;
  • Acampamentos.
1.6.               Atores envolvidos

Requerente: podem requerer o Ecolabel as empresas produtoras de bens e fornecedoras de serviços, os atacadistas e varejistas que vendem suas próprias marcas e os importadores;

Comitê de Concessão e de Auditoria: organismo responsável pela concessão e pela gestão do selo;

Instituto Superior para Proteção e Pesquisa Ambiental: apoio técnico para concessão do selo. Tem as funções de avaliação dos pedidos de atribuição do Ecolabel, de promoção da marca e de participação nas equipes de revisão dos critérios.

Laboratórios acreditados: estruturas nas quais são feitas as provas técnicas para demonstrar conformidade do produto aos critérios definidos para o grupo de produtos ao qual pertence.

1.7.               Procedimento para atribuição do selo
  • O requerente envia o pedido e a documentação ao Organismo Competente (Comitê);
  • O Instituto Superior para Proteção e Pesquisa Ambiental avalia o demanda (prazo de 60 dias) e exprime seu parecer técnico à Comissão;
  • Se a avaliação demonstrar conformidade, o Comitê libera o selo (prazo de 30 dias) e notifica a atribuição à Comissão Européia.
1.8.               Vantagens

            Para o consumidor: disponibilidade de produto com menor impacto ambiental em relação a outros presentes no mercado e que foi submetido a severos testes para assegurar qualidade e desempenho ambiental, disponibilidade de informações transparentes e seguras que são verificadas por organismo independente e garantia de que produto não tem componentes danosos à saúde.

            Para o produtor: permite a atribuição de um selo que vale em todos os países europeus, aumenta a visibilidade do produto no mercado europeu,  dá acesso aos mercados verdes e permite acesso à publicidade adicional positiva por meio dos sites dedicados à promoção do Ecolabel e das campanhas de divulgação do selo.

1.9.               Custos

            Os custos envolvidos na atribuição do Ecolabel são: custos para redação do pedido e elaboração da documentação técnica, custo para as provas com os laboratórios acreditados, custos para avaliação (custos do Instituto Superior para Proteção e Pesquisa Ambiental) e custos de utilização do selo (custos anuais).

2.   Avaliação do tipo/modelo de certificado/selo

            Para que possamos entrar nesse assunto, necessário se faz que definamos o que vem a ser Certificação.

            Certificação é a declaração formal de "ser verdade", emitida por quem tenha credibilidade e tenha autoridade legal ou moral. Ela deve ser formal, isto é, deve ser feita seguindo um ritual e ser corporificada em um documento, e deve declarar ou dar a entender, explicitamente, que determinada coisa, status ou evento é verdadeiro. Deve também ser emitida por alguém, ou alguma instituição, que tenha fé pública, isto é, que tenha credibilidade perante a sociedade. Essa credibilidade pode ser instituída por lei ou ser decorrente de aceitação social.

            A certificação ambiental pode ser feita através de:

  • Certificado;
  • Selo;
  • Código de conduta;
  • Co-regulação;
  • Outros.

            No âmbito deste trabalho foi escolhido para análise o Ecolabel, criado pela Comunidade Européia em 1992, que trata-se de um Selo, pois é expedido por uma entidade ou instituição e por medida de produto/processo.

            O selo é atribuído por categoria. A validade geralmente não é superior a 3 anos e nunca supera a do critério de atribuição. Ambas, porém, são passíveis de prorrogação.

            O Ecolabel só será atribuído a categorias de produtos cujos ciclos de vida sejam coerentes com as normas da Comunidade Européia de saúde, segurança e meio ambiente. Nos casos onde os requisitos da legislação nacional ou local são mais restritivos que as normas da Comunidade Européia, os mesmos deverão ser incorporados aos critérios de concessão do Ecolabel.

            O selo consiste de um logotipo padrão, com validade especifica, que poderá ser usado pelo fabricante, e critérios rígidos estabelecem os limites da utilização do mesmo em caráter de publicidade.

3.   Discussão das variáveis market-oriented e policy-oriented para o selo. Quais fatores explicam a sua criação ?

            Do ponto de vista de políticas públicas, os selos de certificação ambiental são instrumentos que se destinam a educar os fabricantes e consumidores sobre os impactos ambientais da produção, uso e descarte de produtos, levando a uma mudança no padrão de produção e consumo e assim reduzir seus impactos negativos sobre o meio ambiente.

            Nota-se, no entanto, que muitos produtos com certificação ambiental, acabam sendo mais caros que os demais. Isso é uma falha de mercado, pois se um produto é feito através de um processo de fabricação mais eficiente, demanda menos matéria-prima e consequentemente menor gasto. E também produz menos resíduos, fatores esses que influenciam diretamente em seu preço final já que nos seus custos estariam incorporados os custos de disposição dos seus resíduos. Portanto, ele deveria ser mais barato. Mas não é.

            Muitas vezes a política fiscal implantada em um país lhes imprime carga fiscal diferente e elevada, o que faz com que produtos certificados sejam mais caros. Também há a falta de incentivo à produção dos mesmos, como por exemplo a redução fiscal para produtos certificados. Com isso, cria um círculo vicioso: o consumidor continua comprando produtos não certificados, por serem mais baratos, e eles continuam causando mais problemas e exigindo mais gastos das indústrias e do Governo em sua disposição final.

            Deste modo, pensando nas variáveis market-oriented e policy-oriented, é coerente dizer que o Ecolabel tem uma tendência às questões de mercado já que vincula sustentabilidade às questões comerciais no âmbito da União Européia e dá acesso aos mercados verdes. Promovendo a diferenciação, a valorização e o aumento de credibilidade do produto, o selo contribui para as estratégias de vendas, de marketing e de relações públicas da empresa. No entanto, é necessário lembrar que o Ecolabel é uma iniciativa da Comissão Européia que visa estimular a produção mais limpa e sustentabilidade em produtos e serviços, sendo, portanto, um instrumento de política do bloco europeu, razão pela qual há o cuidado de restringir o uso do selo como ferramenta de publicidade. Sendo, assim, um selo que tem aspectos market-oriented e policy-oriented.

            Portanto, o Ecolabel foi criado para atender às necessidades de padronização da rotulagem ambiental na União Européia, garantindo que produtos e serviços em qualquer um dos países membros possam ser comparados. Dessa forma, é uma ferramenta preciosa para atestar desempenho ambiental dos produtos e serviços, para afirmar uma imagem de responsabilidade ambiental dos seus produtores e fornecedores, um instrumento eficaz de abertura de novos mercados e essencial ao estímulo à produção mais limpa e ao desenvolvimento sustentável na União Européia.

            Para garantir o desenvolvimento sustentável são usadas ferramentas de controle e de mercado. No que diz respeito às políticas de controle, o instrumento de gestão ambiental, proposto pela Comunidade Européia é o Modelo de Auditorias e Sistemas de Gerenciamento Ambientais - "THE ECOMANAGEMENT AND AUDIT SCHEME" (EMAS). Tal modelo refere-se à participação voluntária de companhias que desenvolvem atividades industriais. O mesmo propõe a realização de auditorias de gerenciamento ambiental com os objetivos de promover melhorias, através da avaliação do desempenho ambiental nas indústrias, e de prover o público de informações relevantes sobre as atividades industriais e proteção ambiental nas plantas. Em termos da Política Ambiental, a empresa definirá, tornará pública e documentará sua política ambiental.

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            Já na área de políticas de mercado, para que selos ambientais possam atingir seus objetivos de política ambiental, o consumidor, ao considerar as informações contidas no selo, dando preferência  a produtos certificados, pode contribuir para a eliminação de atividades ilegais, predatórias ou de alto impacto sobre o meio ambiente.

            Os selos certificadores diminuem os custos de busca por informação, influenciando o número e o peso dado para os atributos considerados por um consumidor durante seu processo de decisão. Por tanto, se um consumidor tiver informação suficiente e confiável para diferenciar produtos de baixa qualidade dos de alta qualidade, ele terá uma disposição extra a pagar sobre os produtos de alta qualidade. Inversamente, a provisão de informação pode também levar a uma redução na disposição a pagar por bens de baixa qualidade.

4.   Conclusão: qual é a efetividade de certificado/selo ? Ele dá conta das variáveis de mercado e, ao mesmo tempo é legítimo ? Por quê ?

            Hoje, no mundo, cerca de 350 tipos de selos ambientais são usados em 213 países e abarcam 25 setores da indústria, segundo o ECOLABEL INDEX, um banco de dados que agrega informações sobre a rotulagem ambiental. Destes selos, a maioria, 58% foi criada por organizações sem fins lucrativos. O restante foi criado por organizações que lucram com a certificação, governos e pelas próprias empresas fabricantes dos produtos.

            Os selos verdes são referências fortes, uma vez que traduzem o respeito ao meio ambiente. No entanto, as empresas, nas últimas  décadas esqueceram-se de considerar de forma adequada as variáveis ambientais e os custos ambientais, deixando assim, o tripé da sustentabilidade (social, ambiental e econômico) ficar manco, pois menor atenção foi dada ao viés ambiental.

            A problemática dos atuais sistemas de custos baseia-se em dois aspectos: o primeiro, na inadequada alocação dos custos tangíveis, e o segundo aspecto na não incorporação dos custos intangíveis, onde se insere os custos ambientais.

            A atual visão dos custos ambientais reinante, apresenta esses custos como aspectos externos à empresa. Portanto, com a mudança do ambiente empresarial e a variável ambiental surgindo mais como um diferencial competitivo a ser considerado pelas empresas, a visão de custo ambiental não pode ser considerada uma externalidade.

            A identificação e a obtenção dos custos ambientais vêm se colocando como relevante no auxílio de uma gestão de custos adequada à empresa, bem como na alocação dos custos ambientais ao produto, obtendo-se assim um valor mais representativo do mesmo.

            Não podemos nos esquecer que a internalização dos custos ambientais é de máxima importância, porém, ainda mais importante é a explicitação de quanto se gasta, qual o custo ambiental existente na degradação do meio ambiente. Logo, a identificação e a obtenção dos custos ambientais, agora vista sob a ótica empresarial e não somente pela ótica externa, faz-se necessária e de grande utilidade.

            O selo verde é hoje mais que uma necessidade. É uma exigência do mercado, o que torna o Ecolabel efetivo e indispensável em todas as áreas de produção e serviços. No entanto, a legitimidade do selo verde está diretamente ligada ao órgão ou entidade que o emitiu. No caso do Ecolabel é um selo legítimo, emitido por órgão da União Européia que não visa qualquer tipo de lucro ou vantagem a não ser o desenvolvimento sustentável.

            Sabemos que os selos verdes não dão conta de todas as variáveis do mercado. Mas sua instituição já é um bom começo, uma vez que eles são fortes referências internacionais. Empresas que não possuam selos como o Ecolabel, o FairTrade ou o Forest Stewardship Council, não conseguem entrar em determinados países e são preteridas pelos consumidores em outros países desenvolvidos que, por acaso, não exijam determinada certificação. Entre esses produtos incluem-se alimentos ecológicos, produtos naturais sem agrotóxicos, madeiras obtidas de forma sustentável e tecnologias limpas.

            Chegamos então à conclusão de que o selo é hoje um produto que possui  valor mercadológico, pois atesta a excelência do produto, serviço ou processo avaliado. E isso se torna um diferencial competitivo. Devemos encarar com mais naturalidade o fato de que quando empresas capitalizarem em cima de suas ações efetivamente éticas, sociais e ambientalmente responsáveis e o fizerem de forma íntegra e transparente, elas também estão perseguindo seu alvo: o lucro. Não há conflito ético. Todos ganham nesse ciclo: empresa, consumidores, funcionários, governo e sociedade.

            Portanto, o Ecolabel apesar de não dar conta diretamente de todas variáveis de mercado, de forma indireta, as ampara. E aí o tripé se equilibra.

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Sobre o autor
Guilherme Simões Credidio

Engenheiro Ambiental (POLI-USP) e MBA Economia de Empresas (FEA-USP)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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