Artigo Destaque dos editores

A delimitação de um conteúdo para o Direito.

Em busca de uma renovada teoria geral com base na proteção da dignidade da pessoa humana

Exibindo página 1 de 6
25/12/2003 às 00:00
Leia nesta página:

Este trabalho busca fazer uma crítica da forma como se pensou e vem se pensando o Direito enquanto produto cultural humano, tentando delinear uma Teoria Geral do Direito renovada que atenda às finalidades e anseios específicos do ser humano.

Sumário: Introdução – delimitação do tema, importância, divisões e metodologia; 1. O ser humano, a sua complexidade, a regulamentação de suas relações pelo Direito e as crises; 2. As perspectivas de análise do direito: necessidade de reconstrução; 3. A busca de um conteúdo para o Direito: tentativa de delimitação; 4. Por uma nova perspectiva de análise para o Direito e sua Teoria Geral: a preservação da dignidade da pessoa humana; 5. A aplicação da perspectiva de uma Teoria Geral do Direito para preservação da dignidade da pessoa humana: uma visão concreta; 6. Conclusões; 7. Bibliografia Referencial.


INTRODUÇÃO – DELIMITAÇÃO DO TEMA, IMPORTÃNCIA, DIVISÕES E METODOLOGIA.

Interessante notar prefacialmente existirem discussões dentro do Direito que, até a presente data ainda, não obtiveram uma pacificação e harmonização por parte do entendimento doutrinário e jusfilosófico.

Estas questões dizem respeito ao próprio fundamento do direito e sua relação com o homem em todos os seus níveis. Pode-se relatar aqui as fundamentais indagações na forma de perguntas: 1-) O direito é ciência ?; 2-) O direito somente é norma ?; 3-) As fontes do direito são apenas as decorrentes do Estado ?; 4-) Direito e poder se confundem ?; 5-) O que é a justiça ?; 6-) O que é dar efetividade às normas jurídicas ?; 7-) O direito é conservador ou transformador da realidade social ?; 8-) No direito, deve prevalecer a forma ou o conteúdo ?

Como se atesta, as questões levantadas são extremamente relevantes e denotam a necessidade da construção de uma Teoria Geral do Direito que realmente delineie o fenômeno jurídico em toda a sua pujança, delimitando-o em seus caracteres fundamentais de forma a que se tenha uma perspectiva formal e um conteúdo seguros ao direito para que este possa atender às suas finalidades precípuas.

Neste ponto, a Teoria Geral do Direito ainda é incipiente, caso comparada com outras searas do conhecimento humano como a física, a matemática, a biologia, entre outros, restando por incrível que pareça ainda a discussão se o direito é ou não uma ciência, como ressaltado acima !!!!

Ora, se ainda não se tem nem plena segurança do caráter científico do direito, resta complexa a tarefa de delimitar uma Teoria Geral do Direito que pressupõe método, conceitos, institutos, harmonização e sistematização para organizar o conhecimento existente sobre o fenômeno jurídico.

Realmente, a importância da Filosofia neste ponto é fulcral. É a filosofia que vai tentar demonstrar as alternativas e detalhar o conteúdo da "Ciência do Direito" e da sua Teoria Geral. A filosofia vai auxiliar na busca dos caminhos que responderão a questões essenciais para o direito que podem ser resumidas em 5 (cinco) grandes indagações: 1-) O que é o direito ?; 2-) O que deve ser o direito ?; 3-) O que pode vir a ser o direito ?; 4-) O que virá a ser o direito ?; 5-) Para que serviu, serve e servirá o direito ?

Estas indagações dizem respeito à tentativa de dar um conteúdo material para o fenômeno jurídico, com a determinação de sua finalidade, da sua ontologia e dos rumos que o Direito deve seguir para realizar-se em toda a sua plenitude.

O presente trabalho está inserido neste contexto, buscando fazer uma crítica da forma como se pensou e vem se pensando o Direito enquanto produto cultural humano, tentando delinear uma Teoria Geral do Direito renovada que atenda às finalidades e anseios específicos do ser humano.

Percebe-se-á nos capítulos seguintes a necessidade de determinar o papel do direito perante a humanidade, e principalmente os questionamentos acerca do conteúdo deste direito. Ressaltar-se-á a necessidade de um comprometimento de todos, para que o direito possa adquirir uma aplicação efetiva rumo à proteção da dignidade da pessoa humana em todos os seus âmbitos.

Este ensaio científico encontra-se dividido em 5 (cinco) capítulos, objetivando-se ao final delinear novos rumos para o entendimento, o estudo e o desenvolvimento de uma Teoria Geral do Direito renovada que tenha como base real a proteção da chamada dignidade do ser humano.

No primeiro capítulo, analisa-se o ser humano em toda a sua força e complexidade, asseverando a necessidade de formas de controle social, como o direito, para manutenção da harmonia social, atestando-se a existência de crises de valor e da crise no direito que se vive na atualidade. Neste capítulo, busca-se atestar que o homem realmente precisa do direito para manter a paz, harmonia social, possibilitando o progresso da humanidade e que as crises existem para o próprio desenvolvimento e contínuo aperfeiçoamento humano.

Depois, no segundo capítulo, destaca-se de forma breve as principais perspectivas de análise do fenômeno jurídico desenvolvidas pelo homem e que ainda tem reflexos na atualidade, destacando as conhecidas posições formalistas, sociologistas, empiristas, normativas, entre outras, que procuram determinar a forma como o direito deve ser produzido, analisado, aplicado, entendido, pensado e estudado. Neste ponto, vai ficar demonstrada a necessidade de uma reconstrução da perspectiva de análise do fenômeno jurídico, asseverando as novas teorias que tentam superar as visões reducionistas e parciais que tentam delimitar o direito como fenômeno cultural humano.

Na seqüência, no terceiro capítulo, tenta-se demonstrar a necessidade de se buscar um conteúdo para o Direito, delimitando sua finalidade, a fim de se poder construir uma Teoria Geral do Direito dotada de cientificidade. Nesta parte da monografia, restará atestado que atualmente o conteúdo do direito, em todas as formas de sua manifestação, deve estar comprometido com a preservação da dignidade da pessoa humana (direitos humanos, fundamentais, garantia plena da pessoa em toda sua integralidade).

Depois, no quarto capítulo, procura-se destacar a forma como a Teoria Geral do Direito deve delimitar e destacar o conteúdo do fenômeno jurídico, atestando sempre a necessidade de que todos os conceitos, institutos e teorias desenvolvidas devem ter a base e fundamento na proteção plena da dignidade da pessoa humana. Aqui, ver-se-á de forma breve a participação da sociedade, a forma como se deve destacar a proteção do ser humano pelo direito e a maneira como o direito deve ser acessível a todos.

Por fim, no quinto capítulo, destaca-se a necessidade de um comprometimento de toda a sociedade com este novo tipo de Direito dentro da remodelação de sua Teoria Geral, demonstrando-se que a efetividade/ concretização/aplicabilidade do conteúdo normativo do Direito não depende só do Estado, mas de toda a comunidade que tem a responsabilidade em aceitar o encargo de criar um ambiente social inclusivo para todos os seres humanos, em respeito pleno à sua dignidade.

A importância do estudo, que ora se apresenta, consisti em tentar estabelecer uma reflexão multidisciplinar, mudando um pouco a forma de pensar o Direito que tradicionalmente é tão formal e distante, demonstrando poder o Direito servir como uma ciência baseada em uma Teoria Geral que venha a dar ao homem mais "humanização" em suas relações sociais, criando laços de solidaridade e de proteção real aos semelhantes.

Ressalte-se, por fim, que se o trabalho, ora apresentado, for considerado uma crítica utópica em sentido pejorativo ou um sonho, prefiro ser um sonhador do que passar a vida sem tentar contribuir para melhoria do que está posto, principalmente porque triste é aquele que não sonha por um mundo melhor e mais humano. Prefiro, enfim, demonstrar que o suposto sonho pode vir se tornar realidade com base em dados concretos de ciência, do que me omitir e escrever linhas de defesa de algo arcaico e primitivo como o Direito infelizmente ainda se mostra na atualidade.


1. O SER HUMANO, A SUA COMPLEXIDADE, A REGULAMENTAÇÃO DE SUAS RELAÇÕES PELO DIREITO E AS CRISES.

O ser humano, dentro de sua racionalidade, criou um mundo só seu, chamado de mundo cultural na expressão de Carlos Cóssio. Este mundo cultural é formado por interesses, objetivos, sentimentos e vontades que só um ser que tem consciência de sua existência, como o homem, possui.

Na vida em coletividade, o homem construiu este mundo diferenciado da natureza, vivenciando uma multiplicidade de sentimentos dentro de sua evidente complexidade de "animal superior".

Percebeu o ser humano que "a união faz a força", surgindo neste ponto o sentimento de solidariedade. Mas também se conscientizou desde as épocas remotas do fato de que explorando o outro ser humano, irá ter mais vantagens, viver melhor, ser mais rico, poderoso e vigoroso, conquistando posições e firmando-se até como "líder", seja econômico, político, religioso, etc, diante e dentro da coletividade.

O ser humano, nestes termos, é este misto de sentimentos, de dubiedades, em síntese: um intrincado ser espiritual dotado de amor e de ódio !!! Tal fato é percebido de forma clara analisando a história da humanidade, na qual se relatam momentos de pura reflexão espiritual com a tentativa de disseminação de ideais de solidariedade, mas também momentos de competição que conduziram a guerras, mortes e seqüelas que ficaram registrados e foram causados pelo ser humano ao longo dos tempos.

De forma simplória, traça-se o esboço acima para demonstrar que os homens (seres humanos) precisam desenvolver formas de controle social sobre os demais homens (seres humanos), a fim de que se viabilizem o convívio social e a produção de riquezas para atingir o bem comum.

Prefacialmente, e de uma forma rudimentar nas sociedades "primitivas", estabeleciam-se as "verdades" religiosas, o respeito à "moral eterna" advinda de crenças dos grupos humanos que davam apoio e base a certa segurança no convívio social existente, possibilitando a manutenção do grupo e não a sua destruição por brigas e supostas disputas. Havia, assim, o respeito às divindades (religião), aos usos, aos costumes, à moral, tudo no início misturado, formando padrões de normas éticas não-diferenciadas. Nesta esteia, surge posteriormente o direito, mas ainda mesclado à religião, aos costumes, à moral, sendo algo assim não diferenciado.

A diferenciação do direito das demais normas éticas é um fenômeno moderno que estabelece padrões de conduta coercitíveis, impostas pelo ente estatal em benefício supostamente de toda a coletividade. [1]

Claro que todas as normas éticas, como a moral, religião, direito, principalmente em épocas primitivas, eram impostas por uma minoria que dominava e controlava estas fontes normativas, seja por serem "enviados dos deuses", "profetas", "pajés", seja por serem os "próprios deuses" (faraós, monarcas absolutos), ou seja por serem "representantes da vontade do povo" (parlamentares, governantes).

O Direito Moderno passou a se basear em critérios próprios, elencados na chamada dogmática jurídica, auto-reproduzindo-se nas sociedades mais desenvolvidas com base em valores estabelecidos ao longo da história, visando precipuamente à manutenção da paz, segurança, ordem e harmonia social – tudo isto consubstanciado na vaga palavra: Justiça.

Aparece o direito, para a maioria dos juristas, como um fenômeno de poder, uma forma de controle social, um modo de estabelecer regras que devem ser seguidas obrigatoriamente por todos da sociedade sem análise do seu conteúdo moral, por exemplo, destacando a nota prefacial de conferência de estabilidade às relações sociais diante da previsibilidade de aplicação de sanções pelo descumprimento das regras/normas.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

O direito passou, assim, dentro das sociedades modernas a ter um papel fundamental na garantia da estabilidade social, tornando viável o convívio humano em sociedades altamente complexas, nas quais existem milhões de seres humanos desejosos de bens, valores e pretensões cada dia mais diferenciadas.

Entretanto, as crenças humanas, as ideologias, os valores humanos ao longo da história sofrerão imensas mutações e questionamentos. Quantas civilizações, filosofias, teorias perderão sua validade ou foram desconsideradas em face do suposto progresso da humanidade. Neste ponto, insere-se uma característica natural que é a tendência do homem a vivenciar crises no mais das vezes provocadas por ele mesmo dentro de sua perspectiva e forma de ser insaciável de querer continuamente mudar.

Ressalte-se que as crises não são negativas, ao contrário, denotam o suposto desenvolvimento de novas idéias e de novos fundamentos de justificação do poder.

A História neste ponto é riquíssima em exemplos, já que delineia a própria análise das crises, a superação das mesmas e a formação de novas sociedades/doutrinas/filosofias. Observem-se as quedas dos Impérios do Oriente (Egito, Mesopotâmia) na época das civilizações antigas; a criação do Império Romano e sua derrocada frente ao cristianismo; as Idades Média e Moderna com o poderio da Igreja Católica e as críticas formuladas pelos luteranos, calvinistas que conduziram ao fim dos Estados Monárquicos e a efetivação do Estado Contemporâneo, baseado em Cartas Fundamentais e na proteção dos direitos humanos.

Tais crises e quedas de regime, com a formulação de novas doutrinas/filosofias, formas de controle estatal, são próprias da evolução e busca de maior realização dos próprios seres humanos.

Hoje, existem fatores variados que questionam, todavia, a legitimidade deste direito e das normas jurídicas como um todo, procurando demonstrar a inoperância do sistema jurídico para atender aos reclamos sociais e manter a estabilidade jurídico-social. Bem ressalta David Wilson de Abreu a complexificação adquirida pelas sociedades atuais em desconexão com as normas do ordenamento jurídico. Veja-se a análise na órbita da crise constitucional: " Neste sentido, devemos levar em consideração vários fatores: a questão do pluralismo social, que perturbar decisivamente a função de unidade e integração da lei constitucional; o problema da criação de ordens jurídicas supranacionais, tornando a constituição um anacronismo; ainda o fenômeno da personalização do poder (legitimidade pessoal – e não constitucional); o mito da revolução através da lei, que aponta para a diminuição da força ordenadora da constituição perante a meta da revolução e, finalmente, a progressiva ideologização das constituições, ameaçando convertê-las em ‘programas partidários’. Teríamos, como resultados desses sintomas, a perda do sentimento constitucional e da cedência da força normativa da constituição ante a normalidade social." [2]

Outro exemplo de crise é a conhecida decepção provocada pela inefetividade do direito diante da suposta decadência do constitucionalismo social. A figura da Constituição Dirigente, que conduziria supostamente à efetivação/concretização dos direitos sociais, econômicos e culturais, não vem apresentando o resultado esperado por falta de atuação efetiva do grupo social, gerando uma crise evidente de perda de legitimidade dos sistemas jurídicos atuais. Esta crítica é feita de forma surpreendente pelo próprio fundador da tese da Constituição Dirigente, J.J. Gomes Canotilho: " As constituições dirigentes, entendidas como constituições programático-estatais não padecem apenas de um pecado original – o da má utopia do sujeito projectante, como dissemos; elas ergueram o Estado a ‘homem de direcção’ exclusiva ou quase exclusiva da sociedade e converteram o direito em instrumento funcional dessa direcção. Deste modo, o Estado e o direito são ambos arrastados para a crise da política regulativa. Por outro lado, erguer o Estado a ‘homem de direcção’ implica o desconhecimento do alto grau de diferenciação da estatalidade pluralistamente organizada. Por outro lado, confiar ao direito o encargo de regular – e de regular autoritária e intervencionisticamente – equivale a desconhecer outras formas de direcção política que vão desde modelos regulativos típicos da subsidiariedade(....)." [3]

Assevera o autor referido que a crise da Constituição Dirigente (constitucionalismo social) ocorre porque o ente estatal não pode ser responsável pela concretização de todos os direitos sociais, econômicos e culturais, etc..., deve se fundar o pacto constitucional na cooperação efetiva de todos na busca da densificação das normas e valores constitucionais essenciais. Bem fala o autor sobre esta teoria da constituição moralmente reflexiva com a necessidade de participação ativa de toda a sociedade: " Nesta perspectiva, certas formas já apontadas de ‘eficácia reflexiva’ ou de ‘direcção indireta’ – subsidiraridade, neocorporativismo, delegação – podem apontar para o desenvolvimento de instrumentos cooperativos que reforçando a eficácia, recuperem as dimensões justas do princípio da responsabilidade apoiando e encorajando a dinâmica da sociedade civil. Além disso, devem considerar-se superadas as formas totalizantes e planificadoras globais abrindo o caminho para acções e experiências locais (princípio da relevância) e dando guarida à diversidade cultural (princípio da tolerância)." [4]

Passa dentro desta crise no Direito a ocorrer, então, a busca incessante por um novo paradigma que informe as normas jurídicas e o fenômeno jurídico como um todo, viabilizando a realização das expectativas populares, concretizando os enunciados normativos postos nas Cartas Fundamentais e no ordenamento jurídico como um todo, garantindo a preservação da ordem e segurança com a paz social, buscando criar uma Teoria Geral do Direito renovada. De forma até certo ponto dramática, conclui David Wilson de Abreu: " De fato, não se desconhece a profunda fragmentação da realidade social. Esse é um ponto a ser considerado na crítica pós-moderna: a hiper-complexificação do mundo em que vivemos (...) Dessa forma, um novo conceito jurídico de Constituição que apreenda aquela tensão referida se faz necessário. Ao mesmo tempo em que se faz presente a força normativa da legalidade dos poderes públicos, o estatuto daí resultante deve se abrir a um diálogo com as regras extra-legais do meio societário. Como diz Canotilho, não se trata da dissolução da constituição formal na velha ‘constituição real’, nos ‘fatos políticos’." [5]

Como se atestou, o ser humano ao longo da História viveu e continua vivendo crises e tenta superá-las, a fim de estabelecer melhores condições de vida com maior harmonia social.

Neste momento, conforme deveras salientado, vive-se no direito uma destas enormes crises, fruto principalmente de uma inaptidão efetiva de concretização de direitos fundamentais, sociais, econômicos. Esta crise urge por uma superação que, salvo melhor juízo, só será obtida pelo estabelecimento de um novo pacto social e pela implementação de uma Teoria Geral do Direito baseada em dados de ciência. [6]

Dentro deste contexto, perceber-se-á quão difícil é dar garantia e proteção a valores, direitos e preservar o próprio ser humano. O próprio conteúdo do direito e sua estrutura dogmático-positivista vêm sendo questionados, criticados e postos em xeque. O direito oficial, salvo melhor juízo, parece não conseguir dar respostas sociais efetivas aos problemas postos, acabando por surgir movimentos alternativos que questionam a própria legitimidade os sistema jurídico-político vigente, tentando estabelecer novos paradigmas de atuação, de conteúdo e de valor para o direito.

Esta crise jurídica está envolvida com a criação de um ambiente supostamente de globalização econômica, de pluralismo social e de avanço das idéias filosóficas, mas também de exclusão social, pobreza, marginalização, ignorância e tirania. Tal embate de valores positivos e negativos acaba por fragilizar a democracia, devendo o ser humano aprender a necessidade da solidariedade social com atuação conjunta do ente estatal e da sociedade organizada para dar oportunidade aos menos assistidos, fazendo prevalecer e se realizar os direitos fundamentais para garantia da dignidade da pessoa humana. Habermans mostra que é melhor cultivar a solidariedade humana: " Para quebrar as correntes de uma universalidade falsa, meramente presumida, de princípios universalistas criados seletivamente e aplicados de maneira sensível ao contexto, sempre se precisou, e se precisa até hoje, de movimentos sociais e de lutas políticas no sentido de aprender das experiências dolorosas e dos sofrimentos irreparáveis dos humilhados e ultrajados e dos mortos, que ninguém pode ser excluído em nome do universalismo moral nem as classes subprivilegiadas nem as nações exploradas nem as mulheres tornadas domésticas nem as minorias marginalizadas. Quem exclui o outro, que lhe permanece um estranho, em nome do universalismo, trai sua própria idéia. O universalismo do respeito igual em relação a todos e da solidariedade com tudo o que tenha semblante humano se comprova apenas na libertação radical de histórias individuais e de formas particulares de vida." [7]

Enfim, o ser humano em sua complexidade é formado por sentimentos cambiantes que se externam no plano do amor e do ódio, que podem conduzi-lo a belas atitudes de solidariedade, mas também podem gerar guerras e destruições massissas. Neste contexto, para freiar os ímpetos dos seres humanos, tornando possível o convívio social surgem as formas de controle, como é o direito. Este direito, baseado em normas e regras coercíveis na modernidade, encontra-se em crise, por já não atender aos anseios do homem, necessitando de urgente reformulação em toda sua contextura e na sua Teoria Geral, principalmente na busca de um conteúdo específico, para manter a ordem, a estabilidade, protegendo o ser humano em toda a sua magnitude.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Marcos André Couto Santos

procurador federal junto ao INSS em Recife (PE), mestre em Direito Público pela UFPE, professor universitário

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Marcos André Couto. A delimitação de um conteúdo para o Direito.: Em busca de uma renovada teoria geral com base na proteção da dignidade da pessoa humana. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 172, 25 dez. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4605. Acesso em: 28 mar. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos