Cobrança indevida da CONDECINE de empresas de fabricação, comercialização e instalação produtos de telecomunicações

17/08/2017 às 17:10
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a emissão, utilização ou fornecimentos de dados para acesso à rede de telecomunicações.

INTRODUÇÃO

As empresas que atuam no ramo de fabricação de equipamentos transmissores de comunicação, peças e acessórios, não têm como suas atividades a emissão, utilização ou fornecimentos de dados para acesso à rede de telecomunicações.

Não obstante, todas as atividades exercidas por essas empresas são estritamente relacionadas à, tão somente, fabricação, instalação e comercialização de equipamentos transmissores de comunicação, desde já demostrada a inexistência de atividade que incorra no fato gerador do tributo conhecido por CONDECINE.

Portanto, não cabe, por parte da Administração Pública, através de sua autarquia (ANCINE), a cobrança de tal contribuição dessas empresas. Será demonstrado com fundamentos legais e jurisprudenciais que a exação aqui exposta não possui supedâneo para se prolongar, devendo haver os devidos cuidados, para que não incorra em cobrança indevida.


DA NATUREZA JURÍDICA DO CONDECINE – CARACTERÍSTICAS DA CIDE

Ressalte-se que o tributo cobrado pela ANCINE, a CONDECINE, possui natureza de contribuição, de forma mais específica, uma CIDE (CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO), sendo assim, possui, de fato, características próprias para sua incidência.

Ademais, sua definição de tributo é indubitável, visto que preenche todos os requisitos elencados no Código Tributário Nacional, em seu art. 3º:

Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

Em conformidade com a ilustre afirmação de AMARO[1]:

“As contribuições são tributos por constituírem receitas públicas derivadas, compulsórias, previstas em lei e devidas de conformidade com as materialidades, destinações e respectivas competências constitucionais, sendo pautadas por princípios conformadores de peculiar regime jurídico.”.

Denota-se que essa subespécie de tributo possui função extrafiscal, como assim bem afirma MACHADO[2]:

“As contribuições de intervenção no domínio econômico, por seu turno, vinculam-se ao órgão do Poder Público incumbido de desenvolver ações intervencionistas, ou de administrar fundos decorrentes da intervenção estatal na economia. [...] A finalidade da intervenção no domínio econômico caracteriza essa espécie de contribuição como tributo de função nitidamente extrafiscal.”.

Destaca-se, porém, que a principal característica do tributo aqui tratado é a sua finalidade, uma vez que tal definição é fundamental para a validade do tributo, visto que, sem o mesmo, não teria como caracterizarmos a Contribuição como um tributo.

Eis que assim enfatiza MELO[3]:

“A característica peculiar do regime jurídico deste terceiro grupo de exações está na destinação a determinada atividade, exercitável por entidade estatal ou paraestatal, ou por entidade não estatal reconhecida pelo Estado como necessária ou útil à realização de uma função de interesse público. Nesse grupo se incluem as exações previstas no art. 149 da Constituição, ou seja, as contribuições sociais, as contribuições de intervenção no domínio econômico e as contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas, bem como a contribuição referida no art. 149-A da Constituição (acrescido pela EC n. 39/2002), destinada ao custeio do serviço de iluminação pública.”.

Não obstante, a própria finalidade dessa contribuição em nada corresponde às atividades realizadas pelas empresas de instalações e vendas de cabos que transmitem sinais de telecomunicações.

Esse tipo de empresa não exerce nenhuma função prevista na MEDIDA PROVISÓRIA N.º 2221-8/01, razão pela qual não existe base legal que justifique a exação do tributo.

Deve-se, após exposição de todos esses conceitos aqui trazidos, demonstrar, de maneira clara, que essas atividades exercidas por essas empresas fazem com que, de fato, não se preencham as características do sujeito passivo dessa contribuição, pois não há relação com as atividades que incidem na descrição da norma hipotética do fato gerador no antecedente tributário.

Posto isto e diante das características dessa contribuição, torna-se claro e evidente que empresas que comercializam esses produtos e praticam suas instalações não pertencem ao grupo econômico, nem exercem atividade correspondente ao fato gerador do tributo, uma vez que o fato gerador não fora realizado e inexiste o sujeito passivo legal para a cobrança dessa contribuição.


DA NÃO INCIDÊNCIA DO TRIBUTO – ATIVIDADE DA EMPRESA DIVERGENTE DO SEGMENTO ECONÔMICO DA CONTRIBUIÇÃO

As empresas que exercem atividades mencionadas anteriormente não realizam ato configurado como o fato gerador do referente tributo, utilizando-se do art. 32, II e art. 36, VII, da Medida Provisória nº 2221-8/01 que prediz o seguinte:

Art. 32.  A Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional - Condecine terá por fato gerador: 

II - a prestação de serviços que se utilizem de meios que possam, efetiva ou potencialmente, distribuir conteúdos audiovisuais nos termos da lei que dispõe sobre a comunicação audiovisual de acesso condicionado, listados no Anexo I desta Medida Provisória;

Art. 36. A CONDECINE deverá ser recolhida à ANCINE, na forma do regulamento: 

 VII - anualmente, até o dia 31 de março, para os serviços de que trata o inciso II do art. 32 desta Medida Provisória.

Pois, no tocante ao critério material da regra matriz de incidência, verifica-se que o núcleo, somado ao complemento do respectivo tributo, é o verbo prestar, acompanhado do serviço que possam eventualmente distribuir conteúdo audiovisual.

Observa-se que essas empresas têm, como SERVIÇO, a INSTALAÇÃO e COMERCIALIZAÇÃO, de peças e equipamentos de comunicação, o que não é uma prestação de serviços referente à distribuição de conteúdo audiovisual.

Ademais, visto que a administração pública deve-se ater à letra da lei, a menção ao anexo I, exposto na referida norma, em nenhum momento cita empresas fornecedoras de equipamentos, mas, sim, e tão somente, empresas que transmitem conteúdo audiovisual.

Afirma, ainda, o art. 35 que define o sujeito passivo da CONDECINE:

Art. 35.  A CONDECINE será devida pelos seguintes sujeitos passivos:

IV - as concessionárias, permissionárias e autorizadas de serviços de telecomunicações, relativamente ao disposto no inciso II do art. 32; 

Entretanto, essas empresas não detém nenhuma dessas qualificações no tocante a serviço de telecomunicação, apenas atuando como fabricante, instaladora e vendedora de peças e nada mais.

Ademais, novamente, para dar base à incidência tributária, a ANCINE menciona os serviços elencados no anexo I que, novamente, não trata em nenhum momento de empresas que exercem atividade de fabricação, venda ou somente instalação de equipamentos de comunicação, uma vez que essa atividade, por si, não gera o serviço audiovisual.

Salienta-se que, por razões desconhecidas, a entidade não menciona os seguimentos de mercado dos quais a CONDECINE deve se valer para a realização do tributo, conforme expressos no art. 33, III, pois, ao analisar o quadro demonstrativo, referido no anexo I, percebe-se que SERVIÇOS DE FABRICAÇÃO, INSTALAÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO não aparecem no quadro em exame, mas somente empresas que prestam serviços direitos transmissão de comunicação.

Art. 33.  A Condecine será devida para cada segmento de mercado, por:

III - prestadores dos serviços constantes do Anexo I desta Medida Provisória, a que se refere o inciso II do art. 32 desta Medida Provisória;

Com efeito, a Administração Pública deve observar os princípios que norteiam os tributos instituídos para o segmento que justifica sua finalidade.

Geraldo Ataliba[4] explica a relação das contribuições com o princípio da referibilidade afirmando que a “contribuição é o tributo vinculado cuja hipótese de incidência consiste numa atuação estatal indireta imediatamente (mediante uma circunstância intermediária) referida ao obrigado”.

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Demonstra-se que, com esta intervenção estatal no domínio econômico, o grupo que contribui compulsoriamente com esse tributo detém de uma reversão favorável, o que de fato não ocorre com essas empresas que, supostamente, devem contribuir com essa CIDE sem que, para o seu setor econômico, haja nenhuma situação favorável, o que, efetivamente, não justifica a cobrança desse tributo.

Observe-se, a propósito que, por argumento semelhante ao exposto, as empresas de telecomunicação, já não pertencem ao quadro de sujeito passivo da ANCINE, conforme decisão da Justiça Federal de Brasília, sob os autos de n.º 1000562-50.2016.4.01.3400 com a seguinte decisão:

“O Supremo Tribunal Federal já decidiu que ‘a sujeição passiva deve ser atribuída aos agentes que atuem no segmento econômico alcançado pela intervenção estatal’ (RE 595670 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 27/05/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-118 DIVULG 18- 06-2014 PUBLIC 20-06-2014). Muito embora não se exija uma contraprestação direta em favor do contribuinte (o que seria mais adequado à taxa), o princípio da referibilidade deve ser interpretado estritamente, ou seja, somente deve suportar o tributo quem for integrante do setor que demanda uma atuação efetiva no segmento sujeito à intervenção. No caso destes autos ainda que se vislumbre uma tênue vinculação entre os setores em questão, tal vinculação não se apresenta com caráter estrito, e isto justifica o afastamento da norma instituidora do tributo, ao menos em princípio. Assim, defiro o pedido de liminar para suspender a exigibilidade do crédito tributário relativo à ‘CONDECINE das teles’ em relação às empresas filiadas ao Impetrante” (grifos no original; pág. 57 do documento eletrônico 3).

Decisão extraída no Mandado de Segurança Coletivo (Processo 1000562- 50.2016.4.01.3400), em trâmite perante a 4ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, posteriormente confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região no julgamento do Agravo de Instrumento 1000600-77.2016.4.01.0000.

Destaque-se, ademais, que empresas que realizam essas atividades não se qualificam como empresa de telecomunicação, ou seja, não possuem relação com o que se transmite através das instalações realizadas por este.


CONCLUSÃO

Portanto, não existe razão, motivo ou circunstância que dê margem à cobrança de tal tributo a empresas que vendem e instalam aparelhos e cabos de telecomunicação, uma vez que suas atividades são apenas de instalação, fabricação e comercialização, e que somente a licença sem o efetivo exercício da atividade não ocorrem no fato gerador do tributo.

A cobrança desse tributo para essas empresas se mostra, definitivamente, conforme decisões dos E. Tribunais e a doutrina, infundadas, não podendo prevalecer, pois, caso contrário, estaríamos diante de uma insegurança jurídica, o que devastaria o meio científico, jurídico e social.


REFERENCIA

ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. 6. ed. 4. tir. São Paulo: Malheiros, 2002.

 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 12ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006.

MACHADO, Hugo de Brito. CURSO DE DIREITO TRIBUTÁRIO.16ª ed ver. e atual. São Paulo: MELHEIROS EDITORES LTDA, 1999.

MELO, José Eduardo Soares de. Contribuições no Sistema Tributário. In: As Contribuições no Sistema Tributário Nacional. Coord. Hugo de Brito Machado. São Paulo: Dialética / Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2003.

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Sobre o autor
Rafael Dantas Garcia

Especialista em Negociação Estratégica.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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