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Critérios para a valoração das circunstâncias judiciais (art. 59, do CP) na dosimetria da pena

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30/01/2005 às 00:00
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A aplicação da pena é a parte da sentença penal condenatória mais corrigida pelos Tribunais. Esse fato se deve, basicamente, à inobservância – ou ao desconhecimento – de critérios limitadores e garantistas, previstos, principalmente, pela Constituição Federal.

A aplicação da pena é, certamente, a parte da sentença penal condenatória mais corrigida pelos Tribunais, por ocasião dos julgamentos recursais. Esse fato se deve, basicamente, à inobservância – ou ao desconhecimento – de critérios limitadores e garantistas, previstos, principalmente, pela Constituição Federal. São inúmeros os casos em que o decreto condenatório apresenta erros na dosimetria da pena. O maior prejudicado é sempre o condenado: os erros dosimétricos na decisão penal significam, em regra, acréscimo em anos de cumprimento de pena. Esse plus não só aumenta a justa quantidade de pena que deveria ser aplicada, mas, ainda, pode vir a impossibilitar: a fixação de regime prisional menos gravoso; a substituição, prevista no artigo 44, do Código Penal; a concessão de suspensão condicional da pena; ou, até mesmo, a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva estatal. Na execução da pena exageradamente aplicada, maior também será seu tempo de cumprimento efetivo, para a obtenção de progressão de regime, de livramento condicional, de comutação.

A maior concentração de erros, neste tocante, ocorre na primeira etapa do sistema dosimétrico, onde o Juiz prolator da condenação deve analisar, criteriosamente, cada uma das oito circunstâncias judiciais constantes do artigo 59 do Código Penal, individualizando-a para cada réu e para cada infração penal praticada.

Visando a indicar um critério justo de análise dessas circunstâncias judiciais, que possibilite ao acadêmico e ao profissional do Direito conhecer os limites dessa valoração, de forma prática e objetiva, tendo como norte os princípios constitucionais, apresenta-se o presente escrito, sem, contudo, objetivar-se o exaurimento do assunto.

É bem verdade que a lei traz, expressamente, os passos para calcular a reprimenda. Contudo, fica a critério do magistrado estabelecer os critérios de valoração dessas diretrizes. Essa subjetividade que possui o julgador, no momento do cálculo da pena, poderia até converter-se em arbitrariedade, se não houvesse parâmetros de interpretação e aplicação da lei. Felizmente, a Constituição Federal não se omitiu de trazê-los.


Do Sistema Trifásico

A aplicação da pena pelo Juiz ocorre, conforme determina o art. 68, do Código Penal (a partir de sua reforma, em 1984), em três etapas.

Na primeira delas, avaliam-se as circunstâncias chamadas "judiciais", constantes do caput, do artigo 59, do Código Penal: culpabilidade, antecedentes, conduta social e personalidade do sentenciado; motivos, circunstâncias e conseqüências da infração penal; e, ainda, comportamento da vítima. Fixa-se, assim, com alicerce nessa apreciação, a pena-base, que servirá de ponto de partida para a próxima fase.

Por ocasião da segunda etapa, o Juiz aumenta ou diminui a pena-base, conforme exista, in casu, alguma(s) circunstância(s) agravante(s), prevista(s) nos artigos 61 e 62 do Código Penal, ou atenuante(s), prenunciada(s) nos artigos 65 e 66 do mesmo codex, chegando, dessa forma, a uma pena provisória.

Finalmente, na terceira fase dosimétrica, partindo o Magistrado dessa pena provisória, aumenta-a ou a diminui, de acordo com a constatação da ocorrência de causa(s) especial(is) de aumento ou de diminuição da pena, previstas em diversos dispositivos da Parte Geral do Código Penal, e, ainda, nos próprios tipos penais. Determina, assim, a pena definitiva a ser cumprida pelo condenado.

Levando-se em conta que, no caso concreto, pode não haver circunstâncias agravantes ou atenuantes, nem causas especiais de aumento ou de diminuição; mas, que, em todas as sentenças penais condenatórias, sem exceções, haverá que se analisar cada uma das oito circunstâncias judiciais (sob pena de nulidade da decisão), urge estabelecer quais os melhores critérios para examiná-las e, por conseguinte, obter-se a pena-base da forma mais justa possível.


Da Fixação da Pena-Base

Constam expressamente do artigo 59 do CP (ao qual remete o artigo 68, caput, do mesmo diploma legal) as diretrizes para a fixação da chamada pena-base: "O Juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: I – as penas aplicáveis dentre as cominadas; II – a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos;…"

Assim, verificando o julgador que as circunstâncias judiciais do artigo 59 do CP são todas favoráveis ao agente, deve fixar a pena-base no mínimo legal, já que o próprio dispositivo em comento, em seu inciso II, enfatiza os limites da pena-base, dentro dos parâmetros legais. Dessa forma, à cada circunstância judicial valorada desfavoravelmente ao condenado, o magistrado acrescenta um quantum ao mínimo cominado no tipo penal, sem extrapolar, jamais, a pena máxima prevista para a infração.

A questão que se pretende solucionar é: quais critérios pode (e quais não pode) o Juiz utilizar para bem valorar uma circunstância judicial como desfavorável ou favorável ao agente, no caso concreto? É o que se busca, no presente trabalho, sem divagações históricas, responder nas próximas publicações, com fundamento em doutrina e jurisprudência; e, sempre, sob a ótica constitucional.


Da culpabilidade do sentenciado

A culpabilidade aparece no Direito Penal brasileiro como limitador à responsabilização criminal. Somente será censurado o indivíduo que praticar um injusto penal, possuindo a capacidade – ainda que genérica – de querer e de entender e a possibilidade de, nas circunstâncias do momento, agir de outra forma (lícita). Mais do que isso: a pena a ele aplicada ficará limitada ao grau de sua culpabilidade.

Assim, em um primeiro momento, depara-se o magistrado criminal com a verificação da ocorrência dos elementos da culpabilidade, para concluir se houve ou não prática delitiva. Após, quando da dosimetria da pena, necessita, mais uma vez, recorrer ao exame da culpabilidade, agora, como circunstância judicial. Dessa vez, a análise da culpabilidade exige maior esforço do julgador: não se trata mais de um estudo de constatação (haja vista já ter restado evidente, in casu, a sua presença) e, sim, de um exame de valoração, de graduação.

Portanto, deve o juiz, nessa oportunidade, dimensionar a culpabilidade pelo grau de intensidade da reprovação penal, expondo sempre os fundamentos que lhe formaram o convencimento.1

A graduação da reprovação da conduta sancionada pode auferir-se a partir de dois dos elementos da culpabilidade: o potencial conhecimento da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa. Exclui-se a análise do grau de imputabilidade, pois, quando reduzido, implicará a incidência de causa de diminuição da pena (art. 26, parágrafo único, do Código Penal), cujo cômputo dar-se-á na terceira etapa da dosimetria.

Já, quanto à análise da consciência ou do potencial conhecimento da ilicitude, impende destacar a ressalva de que, se o agente estiver prejudicado por um erro de proibição evitável (artigo 21, in fine, do Código Penal), este será sopesado somente na terceira etapa dosimétrica por constituir causa de diminuição.2 Nos demais casos, pode-se avaliar o grau de maior ou menor consciência ou potencial conhecimento do ilícito pelo agente, no caso concreto.

Ademais, o magistrado, na valoração da culpabilidade, deve dispensar especial atenção à verificação do maior ou menor grau de exigibilidade de outra conduta, considerando, neste tocante, as características pessoais do agente dentro do exato contexto de circunstâncias fáticas em que o crime ocorreu. Este é, sem dúvida, o melhor critério de exame da intensidade de reprovação do crime3. Quanto mais exigível a conduta diversa, maior é a reprovação do agir do sentenciado.

Para alguns, a apreciação da "intensidade do dolo" ou do "grau de culpa", expressões utilizadas na redação antiga da lei, seria plenamente cabível por constituírem ambos indicativos da censurabilidade da conduta sancionada4.

Existe, ainda, o entendimento de que a culpabilidade não é critério para medir o juízo de reprovação e, sim, é o próprio juízo de reprovação. Defensor dessa corrente, o Professor Juarez Cirino dos Santos5, percebe que: "a inclusão da culpabilidade como elemento de orientação na formulação do juízo de reprovação (medido pela pena) representa uma impropriedade metodológica: constitui a conclusão do processo analítico fundado na metodologia jurídica do crime"

O magistrado paranaense Gilberto Ferreira6 reforça essa opinião, afirmando que o legislador deveria ter estabelecido que, para se determinar o grau de culpabilidade, examinar-se-iam os antecedentes, conduta social e personalidade do agente; os motivos, circunstâncias e conseqüências do crime e o comportamento da vítima, deixando que tais elementos indicassem o quanto mais ou menos culpável seria o agente.

Cezar Bitencourt7 alerta para o grave e bastante freqüente desacerto dos magistrados ao analisarem a circunstância judicial da culpabilidade afirmando que: "o agente agiu com culpabilidade, pois tinha a consciência da ilicitude do que fazia". Ora, se o agente não tivesse agido com culpabilidade não teria sido condenado; ou, da mesma forma, se não tivesse a consciência da ilicitude do que fazia. É errado, portanto, na dosimetria da pena, repetir-se o juízo de constatação da culpabilidade e de seus elementos. De igual forma, não se pode fundamentar o exame da culpabilidade na alegação de que o acusado tenha agido de forma livre e consciente, pois: "o fato de o acusado ter agido livre e conscientemente não pode fundamentar a exasperação da pena-base, pois, se a ação não fosse consciente e deliberada, inexistiria dolo".8

Cumpre relevar, ainda, que o exame da graduação da culpabilidade é trabalho complexo, sendo, por conseguinte, inadmissíveis "as afirmações monossilábicas que encontramos em algumas sentenças, do tipo ‘a culpabilidade é mínima’, ou ‘grave’, ‘intensa’, etc".9

Cabe registrar, também, a proibição ao Juiz de que avalie a culpabilidade como desfavorável com o(s) mesmo(s) fundamento(s) que alicerçará a análise negativa de outra(s) das sete circunstâncias seguintes. Tal incidência caracterizaria, sem dúvida, violação ao princípio "non bis in idem", que proíbe a consideração de uma mesma situação, por mais de uma vez, para o agravamento da pena que está sendo aplicada.

De igual modo, é vedado ao juiz que considere, na valoração da culpabilidade (e das demais circunstâncias judiciais) fatores que constituam ou qualifiquem o crime, ou, ainda, que caracterizem circunstância agravante ou causa especial de aumento de pena (a serem sopesadas nas etapas subseqüentes).

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Assim sendo, não pode ser considerado elevado o grau de culpabilidade, por exemplo, no delito de estelionato, pelo fato de "o agente ter agido de má-fé, sem importar-se com seu semelhante que sofreu o prejuízo", porque a má-fé do agente e o prejuízo (e a indiferença para com a vítima, por conseguinte) são circunstâncias que já constituem o próprio delito e que, portanto, já estão devidamente "sancionadas" pela pena abstrata, ainda que no mínimo legal.

Às vezes, a circunstância que se quer analisar não está expressa de forma "escancarada" no tipo penal. É preciso, neste tocante, fazer uma interpretação mais apurada do tipo e de suas freqüentes circunstâncias, para não incorrer em erro. Dessa forma, em se tratando da prática de crime de omissão de recolhimento de contribuições previdenciárias: "a condição de empresário revelada pelo acusado não pode acentuar a sua culpabilidade, exigindo-lhe maior consciência da ilicitude de sua conduta e fundamentando a exasperação da pena-base, tendo em vista que, no crime em exame, a responsabilidade normalmente recai sobre empresários. Nem mesmo o fato de centralizar as decisões da empresa pode ser considerada desfavorável, pois consiste em pressuposto para o reconhecimento da própria autoria delitiva".10

No mesmo entendimento equivocado encontram-se os que fundamentam a culpabilidade como "elevada" ao agente, em razão da "reiteração criminosa", quando, a seguir, aumentam a pena pela continuidade delitiva (art. 71, do CP). Esquecem-se de que "os atos delituosos de prolongarem no tempo, configurando a continuidade delitiva, não podem ser considerados também nas circunstâncias do art. 59, sob pena de incidir-se em ‘bis in idem’".11 Nesses casos, só se deve considerar o aumento do art. 71 do CP, pois "a continuação dimensiona a reiteração"12.


Dos antecedentes do condenado

No que tange à circunstância judicial que perquire a vita anteacta do sentenciado, cumpre verificar, preliminarmente, que a doutrina e a jurisprudência divergem quanto às situações que podem ser consideradas como "maus antecedentes". Contudo, é preciso lembrar que "a pena há de ter critérios e limites para a sua aplicação, em respeito mesmo à dignidade da pessoa humana" 13 e que, portanto, a valoração das circunstâncias judiciais não deve fugir à regra de que as leis, sobretudo as penais, devem ser interpretadas sob o prisma das garantias individuais asseguradas pela Carta Magna.

Inicialmente, há que se considerar que somente fatos anteriores14 à prática do delito que se está punindo podem caracterizar antecedentes, pois os demais configurariam impuníveis "conseqüentes". Superada esta questão, impende registrar que, por "antecedentes", devem entender-se apenas os judiciais. Caso exista, nos autos, notícia de antecedentes "desabonadores" que digam respeito à vida privada do condenado, poderá ela, quando pertinente, ser sopesada na análise da "conduta social15", ou, talvez, da "personalidade" do apenado; porém, nunca, dos antecedentes. Apesar disso, há os que confundem as circunstâncias, conforme alertam Salo de Carvalho16 e Fragoso17.

Não se pode sopesar, por ocasião da análise dos antecedentes, a condição de reincidente do sentenciado. Como é cediço, a reincidência deve ser sopesada na segunda etapa dosimétrica, por constituir circunstância agravante (art. 61, I, do CP). O Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Paraná alerta para esta distinção, verbis:"A reincidência não deve ser considerada na análise dos antecedentes do condenado na fase de individualização da pena, mas tão-somente como agravante." 18

Será reincidente aquele que, na data em que praticou o crime que se está julgando, já possuía condenação definitiva (transitada em julgado) por outro crime anterior (art.63, do CP). Todos aqueles em situação diversa desta podem ser considerados não reincidentes. Também serão não reincidentes aqueles que possuírem, na data do delito, condenação definitiva por crime militar próprio ou politico (art. 64, II, do CP) e aqueles em que decorreu lapso de tempo superior a cinco anos entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração que se está julgando (em razão do período qüinqüenal depurador da reincidência, art. 64, I, do CP).

Já sabendo que se excluem do conceito: os "antecedentes" não judiciais, os fatos subseqüentes ao delito e a condição de reincidente, cabe, agora, descobrir a quem se pode chamar "possuidor de maus antecedentes". Recorre-se, para tanto, ao processo de eliminação de possibilidades ensinado por Maria Fernanda Podval19, acrescentando-se, a ele, ainda, outras hipóteses de exclusão ao conceito.

Com muita propriedade, a autora percebe que, em respeito ao princípio constitucional da presunção de inocência20, não se podem considerar como maus antecedentes: a mera instauração de inquérito policial, nem a existência de ações penais em andamento, nem mesmo quando há sentença penal condenatória que ainda não transitou em julgado.

Esse entendimento, contudo, não é pacífico nos Tribunais, o que constitui fato lamentável. Se a própria Carta Magna estabelece que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, não pode o juiz, aumentar a pena de alguém com base na existência de uma ação penal que ainda não se concluiu, sob pena de um cidadão cumprir tempo maior de pena pela simples possibilidade de condenação (que também representa possibilidade de absolvição), em outro processo. Mais do que irracional, esse posicionamento é inconstitucional, violador das garantias individuais do cidadão. É realmente triste constatar que, mesmo o Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição Federal, tem violado esta garantia na maioria dos julgamentos que envolvem o tema, restando expresso, em alguns deles, sem qualquer pudor, o verdadeiro desprezo à Lei Maior, como no caso do RHC nº 80.071/RS, em que constou do voto do Min. Maurício Corrêa que "pouco importa se se cumpriu o inciso LVII do artigo 5º da Constituição, ou não, quer dizer, aguardar-se o trânsito em julgado da decisão para que se levassem em conta os maus antecedentes"21. A ordem para reformar a pena, naquela ocasião, só foi concedida, por empate, constando do brilhante voto do Min. Celso de Mello que:"o ato judicial de fixação da pena não poderá emprestar relevo jurídico-legal a circunstancias que meramente evidenciem haver sido, o réu, submetido a procedimento penal-persecutório, sem que deste haja resultado, com definitivo trânsito em julgado, qualquer condenação de índole penal (…) Tolerar-se o contrário implicaria admitir grave e inaceitável lesão ao princípio constitucional que consagra a presunção juris tantum de não-culpabilidade dos réus ou dos indiciados".

Não podem, ainda, ser consideradas como maus antecedentes as condenações anteriores por crimes militares próprios e por crimes políticos, porque a lei as exclui do conceito de reincidência, e não o fez por acaso. As excluiu ora porque puniam condutas administrativas, ora porque a motivação do agente o diferenciava do criminoso comum.

Não caracterizam, ainda, maus antecedentes os fatos ocorridos antes da maioridade penal do condenado22, por não poderem, graças à anterior inimputabilidade do agente, constituir qualquer gravame na culpabilidade. Exacerbar a pena por fatos praticados quando o agente estava fora do alcance da norma penal contraria a lógica e o bom senso23.

Também não se consideram maus antecedentes as condenações cuja pena foi cumprida ou extinta há mais de cinco anos da prática delitiva, decorrendo essa proibição, por lógica24, do prazo qüinqüenal depurador da reincidência, previsto no artigo 64, inciso I do Código Penal, garantidor de que o cidadão não será eternamente discriminado. A jurisprudência, no entanto, diverge: ora está neste sentido25, ora contra26.

Ainda, excluem-se dos maus antecedentes: as propostas aceitas de suspensão condicional do processo27 e de transação penal e, ainda, os acordos civis extintivos da punibilidade, pois todas essas medidas trazidas pela Lei nº 9099/95 não possuem natureza condenatória nem há, nelas, qualquer admissão de culpa pelo "beneficiado".

Finalmente, ao contrário do que prega parte da jurisprudência28, a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva do Estado, em outra ação penal, não pode gerar antecedentes29, por respeito também ao princípio da presunção de inocência, já que, tanto quando ocorre a prescrição pela pena em abstrato, quanto pela pena em concreto, resta prejudicada a análise do mérito (pelo Juízo sentenciante ou pelo Tribunal a quo, respectivamente).

Pelo processo de eliminação da Professora Podval (ao qual se acrescentaram mais algumas situações de não caracterização de maus antecedentes), "deve-se concluir que por maus antecedentes entendem-se apenas as condenações anteriores por contravenção e as condenações com trânsito em julgado após a segunda conduta30".

A primeira das hipóteses, deve-se ao fato de que, apesar de constituírem infrações penais, as contravenções (Decreto-Lei nº 3688/41) quando implicam condenação definitiva, não geram reincidência porque a lei se refere expressamente à condenação anterior por crime. Exceção a essa regra, é o caso do agente que está sendo julgado por prática de contravenção penal e que já possuía anterior condenação por contravenção: aí será considerado reincidente, como dispõe o artigo 7º da LCP.

Na segunda das situações, o agente, quando praticou a conduta que se está punindo, já havia praticado outro crime, contudo, só veio a ser condenado definitivamente por este após praticar aquele. Tal situação não se enquadra no conceito de reincidência, mas, por haver trânsito em julgado da condenação, é justo que se recrudesça a reprimenda ao agente, tendo em vista que, ao praticar o delito, já havia praticado outro, o que indica maior reprovação à conduta.

No que diz respeito à prova dos antecedentes, há que se considerar a certidão cartorária de antecedentes criminais, com explícita referência à data do trânsito em julgado da eventual condenação31. Portanto, o magistrado deve, sempre, indicar os elementos constantes dos autos que caracterizam os maus antecedentes, não podendo, simplesmente, afirmar que o acusado os possui, sob pena de nulidade.

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Sobre a autora
Juliana de Andrade Colle

advogada criminalista em Curitiba (PR), professora de Direito Penal na Faculdade de Direito de Curitiba e no Curso Jurídico

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COLLE, Juliana Andrade. Critérios para a valoração das circunstâncias judiciais (art. 59, do CP) na dosimetria da pena. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 572, 30 jan. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6232. Acesso em: 28 mar. 2024.

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