Nesse caso, faço algumas considerações.
Em primeiro ponto, a fuga do condutor assaltado não representou legítima defesa, uma vez que não se praticou nenhum ato de repulsa diretamente contra os bandidos. A legítima defesa se caracteriza por uma ação que repele, que rebate, ou seja, uma reação dirigida diretamente contra o ofensor em razão de agressões injustas.
Ao se deparar com tentativa de assalto e empreender fuga acelerada, agiu o condutor, na verdade em, estado de necessidade, pois não praticou qualquer conduta direta contra os bandidos/ofensores, mas ao contrário acelerou o carro em direção oposta àquela a qual eles (bandidos) se encontravam. Em outras palavras, o motorista não repeliu uma agressão, mas dela fugiu. E o estado de necessidade, na órbita civil (dever de reparação), está assim prevista no CC:
"Art. 188. Não constituem atos ilícitos:
(...)
II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente."
Ao fugir acelerado e colidir em outro veículo, nada mais fez que deteriorar coisa alheia (o outro veículo no qual bateu) buscando remover um perigo iminente contra si (ser assaltado e até mesmo morto).
Embora expressamente consignado que "não constitui ato ilícito" o ato praticado em estado de necessidade, não se quer dizer que desapareça o dever de indenizar por parte de quem o praticou em favor de quem sofreu o dano. E o fundamento está no art. 929 também do CC:
"Art. 929. Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188, não forem culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que sofreram."
O outro motorista que teve o carro amassado não foi culpado pelo perigo de assalto/morte, de sorte que tem ele direito a ser indenizado por quem nele colidiu. E quem nele colidiu terá, em tese, direito regressivo contra aqueles que causaram a situação de perigo (os bandidos):
"Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado."
Quando leio o trecho trazido pelo colega ISS, no sentido de que "...o fato de terceiro assemelha-se à culpa exclusiva da vítima e ao caso fortuito e à força maior, pois, neles, a conduta do agente não é a causadora do dano...", tenho de entender que não se pode dizer, em princípio, que a colisão ocorreu por fato de terceiro (bandidos), mas do próprio condutor.
Embora a colisão tenha ocorrido em razão da reação natural de fuga a um assalto, não foram os bandidos que aceleraram o carro e entraram na rua onde ela ocorreu. Ainda que indiretamente tenham contribuído para a ocorrência da colisão, colocando alguém em fuga, não foram eles (terceiros) que a materializaram no mundo dos fatos. Ou seja, estamos diante de um fato próprio.
Veja que no trecho que você cita, o exemplo trazido é a do engavetamento de veículos. Nesse caso, o fato de terceiro ocorre justamente porque um motorista está totalmente parado no sinal (V1), atrás de outro veículo (V2) e aguardando o sinal abrir. Quando de repente vem um terceiro veículo (V3) a toda velocidade e colide na traseira do V2, que é violentamente projetado contra o V1, causando-lhe perda total.
Nesse caso, o motorista do V2 não praticou qualquer conduta. Simplesmente parou e esperava quando foi atingido. Não há conduta. Não há nexo causal. Não há dever de indenizar. Diferente do motorista em fuga, que embora estivesse fugindo desesperado dos bandidos (e com total razão) foi quem acelerou o veículo e ingressou na via onde houve a colisão.
Diferente situação é se, ao ser baleado, em razão da dor ou outro motivo, desmaiasse e viesse a perder o controle do veículo, pois nesse caso não teria tido qualquer conduta (culposa, dolosa, consciente, inconsciente etc).
CARLOS ROBERTO GONÇALVES (Direito Civil Brasileiro - 2012) traz exemplo próximo que ilustra:
"Se um motorista, por exemplo, atira o seu veículo contra um muro, derrubando-o, para não atropelar uma criança que, inesperadamente, surgiu-lhe à frente, o seu ato, embora lícito e mesmo nobilíssimo, não o exonera de pagar a reparação do muro. Com efeito, o art. 929 do Código Civil estatui que, se a pessoa lesada, ou o dono da coisa (o dono do muro)
destruída ou deteriorada “não forem culpados do perigo”, terão direito de ser indenizados."