Caro Marcus Barcelos.
Não sou formado em direito mas em economia.
Entretanto, sou um estudioso das relações entre a economia e o direito e dos contratos bancários em geral.
Não conheço a obra em que o nobre, conceituado e respeitado jurista Dr.Arnaldo Rizzardo afirmara o que o amigo diz, a respeito do VRG, nos contratos de arrendamento mercantil do tipo financeiro.
Peço licença para dizer que há alguma incorreção no que o amigo citou:
Ä função do VRG é repor ao arrendante o valor de mercado que o bem veio a perder emface de sua natural deterioração e desvalorização decorrente do uso.
Desculpe, mas essa definição é exatamente a do custo do bem a recuperar e não a do VRG.
O VRG é exatamente a parcela do bem ainda não paga pelo arrendatário, e que, tecnicamente, deve corresponder ao saldo ainda não depreciado ao final do periodo de arrendamento.
A contraprestação de um arrendamento mercantil do tipo financeiro é composta de duas parcelas, a saber:
a) o retorno de parte do investimento no período do arrendamento
b)os juros mensais do VRG para pagamento deste VRG ao final do prazo do arendamento, quando e se exercida a opção de compra.
Um exemplo numérico esclarecerá melhor o assunto.
Para um bem arrendado cujo valor seja de R$ 20.000,00 com um valor residual de R$ 2.000,00, prazo de 24 meses e taxade juros implícita de 2% ao mês, o valor da contraprestação calculado pela fórmula própria seria de R$ 991,68 ao mês.
No valor dessa contraprestação, estão incluidas duas parcelas, a saber:
a) o retorno do investimento relativo ao custo do bem a recuperar menos o VRG. No caso R$ 18.000,00 (R$ 20.000,00 - R$ 2.000,00), ou seja:
R$ 18.000,00 x 0,0528721 = R$ 951,68 (O coeficiente 0,0528721 corresponde ao FRC-Fator de Recuperação de Capital)
b) juros de 2% ao mês sobre o VRG de R$ 2.000,00, que o arrendatário vai pagando (o que é absolutamente correto, sob o ponto de vista financeiro) considerando que esse valor deve ser pago ao final do arendamento.
2% de R$ 2.000,00 = R$ 40,00.
c) somando as duas parcelas, teremos o valor da contraprestação mencionada, de R$ 991,68, como segue:
R$ 951,68 + R$ 40,00 = R$ 991,68.
Como o amigo pode ver, a "modelagem financeira"da operação estabelece (não só no Brasil, como mundialmente) como característica da operação, que o VRG seja pago ao final do arrendamento.
Talvez o amigo desconheça que há critérios técnicos para o estabelecimento do VRG, conforme o tipo do bem e o prazo do arrendamento, que é calculado em função do incentivo do imposto de renda dado à opração, da ordem de 30% (depreciação acelerada).
Por exemplo, um veículo tem o prazo normal de depreciação fiscal em cinco anos, ou sessenta meses.
Se o prazo do arrendamento for de 36 meses, o VRG garantido tecnicamente correto, ou ótimo, será de14%, como segue:
Prazo de arrendamento: 36 meses
Depreciação fiscal normal do bem: 60 meses
Cálculo do VRG ótimo, ou correto:
VRGo = 1 - (36/0,7x60) = 0,14
Se o prazo de arrendamento for de 24 meses, para o mesmo bem, o VRGo será de 0,43, ou 43%.
Isso quer dizer que terminado o prazo do arrendamento o bem ainda tem esse percentual a depreciar. Ou seja, ou seu saldo no imobilizado da companhia de arrendamento corresponde a esse percentual.
Ora, como a "modelagem financeira" da operação de leasing financeiro é feita prevendo o pagamento do VRG ao final do arrendamento, a entecipação desse valor implica em descaracterizar a operação, transformando-a em uma simples operação de compra e venda.
Ademais, essa cobrança antecipada constitui-se em um ardil financeiro, caviloso aliás, que modifica as condições contratuais ocasionando prejuizo financeiro ao arrendatário e locupletamento da arrendadora. Posso demonstrar o que afirma, numericamente.
Com a antecipação do VRG ocorre o seguinte:
a) a taxa interna de retorno da operação se eleva de forma consideravel, pelo modificação do fluxo de caixa impostra pelo arrendadora.
b)a companhia de arrendamento não considera como pagamento do bem arrendado as quantias do VRG antecipado, impondo ao arrendatário um custo adicional, pois sobre as parcelas que vão sendo pagas ela continua a cobrar juros, como já demonstrei.
c)no caso de pessoa juridica que elabora declaração de rendimentos pelo lucro real, a antecipação não é descontada para efeito do imposto de renda, proibição que se encontra na Portaria nº 140, do Ministério da Fazenda.
d)anula para o arrendatário a vantagemde não comprometer o seu capital de giro.
e)a arrendadora mantém o adiantamento em uma conta do passivo exigível, utilizando-o como "funding" não remunerado para outras operações (dinheiro de graça).
Agora, caro amigo, eu lhe proponho a seginte discussão:
A antecipação di VRG descaracteriza a operação de leasing fiaanceiro, como demonstrei em rápidas linhas por confiar na sua argúcia e inteligência, tornando-a uma operação de compra e venda,como tem entendido, acertadamente, o E.STJ.
Como não consta do objeto social das companhias de arrendamento realizar operações de compra e venda (as chamadas CDC), podem elas, nesses casos, aplicar taxas de juros superiores a 1% ao mês?
Confesso que não estou remetendo um estudo abrangente, o que tenho em mente elaborar quando tempo me permitir (possivelmente em janeiro/2001).
Mas me coloco à sua inteira disposição para qualquer esclarecimento a respeito.
Com um abraço cordial e amigo do
OZIEL CHAVES