Dr. Herbert C. Turbuk - Inclusão de Sobrenome do Padrasto no Enteado
LEI Nº 11.924, DE 17 DE ABRIL DE 2009. Altera o art. 57 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para autorizar o enteado ou a enteada a adotar o nome da família do padrasto ou da madrasta. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o Esta Lei modifica a Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973 – Lei de Registros Públicos, para autorizar o enteado ou a enteada a adotar o nome de família do padrasto ou da madrasta, em todo o território nacional.
Art. 2o O art 57 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973, passa a vigorar acrescido do seguinte § 8o: “Art. 57. ... § 8o O enteado ou a enteada, havendo motivo ponderável e na forma dos §§ 2o e 7o deste artigo, poderá requerer ao juiz competente que, no registro de nascimento, seja averbado o nome de família de seu padrasto ou de sua madrasta, desde que haja expressa concordância destes, sem prejuízo de seus apelidos de família.”
Art. 3o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 17 de abril de 2009. LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
A LEI Nº 11924/09 E SEUS REFLEXOS NA ÁRVORE GENEALÓGICA FAMILIAR. No dia 17 de abril de 2009, entrou em vigor a Lei nº 11.924, de autoria do já falecido Deputado Federal Clodovil Hernandes, conhecida como “Lei Clodovil”, que alterou o art. 57 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973 (Lei de Registros Públicos), para autorizar o enteado ou a enteada a adotar o nome da família do padrasto ou da madrasta, desde que obtida a devida aquiescência expressa.
A referida Lei é composta de três artigos. O art. 1º informa o objetivo da norma, que é a de autorizar o enteado ou a enteada a adotar o nome de família do padrasto ou da madrasta, em todo o território nacional. O art. 2º, ao seu turno, traz o conteúdo da norma, esclarecendo que o art. 57 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, passa a vigorar acrescido do § 8º, nos termos do qual “o enteado ou a enteada poderá requerer ao juiz competente que seja averbado no registro de nascimento o nome de família de seu padrasto ou de sua madrasta, sem prejuízo de seus apelidos de família, desde que se verifiquem os seguintes requisitos:
a) concordância do padrasto ou madrasta de forma expressa; b) motivo ponderável; c) observação dos procedimentos legais para a averbação do nome de família do padrasto ou madrasta na certidão de nascimento, na forma dos parágrafos 2º e 7º do art. 57 da Lei dos Registros Públicos, que disciplinam o acréscimo do patronímico.
A Lei nº 11.924/09 autoriza a alteração da Lei de Registros Públicos para permitir ao enteado ou enteada adotar o nome de família do padrasto ou madrasta, tendo em vista que, muitas vezes, a relação entre eles é semelhante à de pai e filho, seguindo a mesma justificativa que levou à inserção, pela Lei nº 6.216, de 30 de junho de 1975, do acréscimo do patronímico do companheiro ao nome da mulher solteira.
Agora esse direito ao acréscimo do patronímico foi estendido ao enteado ou enteada, que, por meio da aplicação do princípio constitucional da igualdade, pode adotar não apenas o nome da família do padrasto, mas, também, o da madrasta. O principal argumento justificante desse texto normativo está na constatação fática usual de que muitas vezes o relacionamento do enteado com seu padrasto é mais próximo da relação de pai e filho do que com o pai biológico.
A Lei em comento vem em socorro daqueles casos de pessoas que, estando em seu segundo ou terceiro casamento, criam os filhos de sua companheira ou companheiro como se seus próprios filhos fossem. E também dos filhos que manifestam o desejo de trazer o nome de família do padrasto ou da madrasta.
Esse dispositivo legal coaduna-se com o novo conceito de família, que deixou de ser considerada apenas a família nuclear (pais e filhos) para ser compreendida como família estendida, normalmente composta por uma combinação de famílias nucleares. A pretensão é tutelar as relações familiares baseadas no afeto, superando a situação simplista da paternidade apenas biológica.
É preciso destacar que a “aquisição do nome do padrasto ou madrasta na certidão de nascimento não tem nenhuma eficácia no campo patrimonial”. Nas palavras de Carlos Eduardo Lamas1, “a possibilidade de inserção do nome do padrasto ou madrasta na certidão de nascimento do enteado ou enteada traduz-se num significativo avanço no campo do Direito de Família”, pois “dá-se o direito de integração de comunidades familiares que existiam somente no plano afetivo e não no plano registral, emprestando ao indivíduo o reconhecimento como partícipe do grupo familiar”. Ademais, contribui para amenizar constrangimentos das crianças relacionadas ao preconceito e, inclusive, ao bullying.
A LEI Nº 11.924/09 E SEUS REFLEXOS NA ÁRVORE GENEALÓGICA FAMILIAR – Como visto, a “Lei Clodovil” não trata da retirada do nome de família biológico, mas do simples acréscimo de outro nome do padrasto ou da madrasta. Destarte, nenhum reflexo trará tais mudanças na questão da árvore genealógica familiar.
O nome é composto por um prenome e um sobrenome. O prenome é aquele peculiar ao indivíduo no trato diário e pode ser simples ou composto. O sobrenome ou patronímico é o nome da família (apelido de família ou nome de família), tanto paterna quanto materna em decorrência do princípio da igualdade e da substituição do princípio do pátrio poder pelo poder familiar.
O Código Civil de 2002 incluiu em seu texto o nome civil (prenome e sobrenome) como direito da personalidade. Assim, no capítulo que trata dos direitos da personalidade (arts. 11 a 21), o legislador civil fez constar que “toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome” (art. 16). O sobrenome será simples, quando existir apenas o sobrenome paterno ou materno, e composto quando constar os dois. Serve para indicar a procedência da pessoa.
Agora, com a Lei nº 11.924, de 17 de abril de 2009, acresce-se a possibilidade de no nome constar o sobrenome apenas da mãe ou pai e do padrasto ou madrasta; ou todos, dos pais biológicos e do padrasto ou madrasta. No entanto, é preciso deixar bem claro que a nova lei não teve a intenção de suprimir o patronímico biológico.
Antes dela, o Superior Tribunal de Justiça já havia permitido a supressão de patronímico paterno em decorrência de abandono, aplicando-se, para tanto, os métodos de interpretação sistemática e teleológica de forma integrada:
“Civil. Registro Público. Nome civil. Prenome. Retificação. Possibilidade. Motivação suficiente. Permissão legal. Lei nº 6.015, de 1973, art. 57. Hermenêutica. Evolução da doutrina e da jurisprudência. Recurso provido. I – O nome pode ser modificado desde que motivadamente justificado.
No caso, além do abandono pelo pai, o autor sempre foi conhecido por outro patronímico. II – A jurisprudência, como registrou Benedito Silvério Ribeiro, ao buscar a correta inteligência da lei, afinada com a ‘lógica do razoável’, tem sido sensível ao entendimento de que o que se pretende com o nome civil e a real individualização da pessoa perante a família e a sociedade.”6
Em caso similar, porém, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo não autorizou a exclusão do sobrenome paterno, sob a justificativa de que o nome de família não pertence exclusivamente ao detentor, mas a todo o grupo familiar, podendo ser alterado apenas em situações excepcionalíssimas:
“Registro civil. Assento de nascimento. Alteração. Prenome e patronímico. Inteligência da Lei nº 6.015, de 1973, em seu art. 58. O prenome é definitivo e somente poderá ser modificado em casos excepcionais. Supressão do patronímico. Impossibilidade. Princípios da imutabilidade e da indisponibilidade do sistema registral (arts. 56 e 57). Recurso improvido.7
De fato, o patronímico de família revela a procedência da pessoa, sua filiação e estirpe e, portanto, é considerado por lei como imutável e indisponível. Acerca da inclusão do nome do padrasto, para o Superior Tribunal de Justiça, a inclusão acabava implicando na supressão do nome do pai biológico.
“Nome. Alteração. Patronímico do padrasto. O nome pode ser alterado mesmo depois de esgotado o prazo de um ano, contado da maioridade, desde que presente razão suficiente para excepcionar a regra temporal prevista no art. 56, da Lei nº 6.015, de 1973, assim reconhecido em sentença (art. 57). Caracteriza essa hipótese o fato de a pessoa ter sido criada desde tenra idade pelo padrasto, querendo por isso se apresentar com o mesmo nome usado pela mãe e pelo marido dela. Recurso não conhecido.”8
Também o Tribunal de Justiça de São Paulo já vinha admitindo a adição no registro de nascimento do nome do padrasto: “Retificação. Adição de nome. Acréscimo do apelido de família do padrasto da autora. Possibilidade, não vedada pela lei. Relevantes motivos sociais e familiares invocados. Inteligência do art. 57 da Lei dos Registros Públicos. Deferimento do pedido, reformada a sentença. Apelo provido. Voto vencido. Se a lei não proíbe, mas, ao contrário, prevê a possibilidade de alteração do nome, em caráter excepcional e por motivos justificáveis, nada mais razoável do que acolher-se o pedido, principalmente quando relevantes os motivos sociais e familiares invocados.”9
Portanto, a Lei nº 11.924, de 17 de abril de 2009, só fez regulamentar entendimento já adotado pelos Tribunais brasileiros. Contudo, é preciso destacar com letras garrafais que a Lei não impõe a supressão do sobrenome de procedência biológica para substituí-lo pelo sobrenome do padrasto ou da madrasta. O que pretendeu o legislador é autorizar o acréscimo, apenas e tão somente, do sobrenome do padrasto ou da madrasta ao nome do enteado ou enteada. Por essas razões não existe qualquer reflexo ou prejuízo à árvore genealógica familiar
HERBERT C. TURBUK www.mudarnome.blogspot.com
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