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Entre bits e bytes: o direito real e a propriedade no mundo virtual

Entre bits e bytes: o direito real e a propriedade no mundo virtual

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Objetos virtuais só existem numa simulação de computador. Como classificá-los juridicamente?

Resumo: O termo Objetos Virtuais se refere à classe de objetos que existem a partir da uma simulação de computador, ou seja, dentro do mundo virtual. Com a popularização dos mesmos e a sua valoração, se torna pertinente ao Direito classificá-los e tutelá-los. Esse trabalho será realizado através de revisão bibliográfica. Considerando o estado de novidade do assunto, existem poucas disposições doutrinárias, legislativas e jurisprudenciais sobre o tema. Desse modo, a elaboração de novos textos legislativos e de estudos se mostra importante. De todo modo, esse trabalho permite concluir que a propriedade de objetos virtuais já é uma realidade e que a tutela do direito em relação aos mesmos com isso em voga se faz necessária, assim como a que se faça a classificação desses objetos como coisas, o que é pertinente e plausível.

Palavras-Chave: Direito das Coisas. Criptomoeda. Criptoativo. Objeto Virtual.

Sumário: 1 INTRODUÇÃO. 2 OBJETOS VIRTUAIS. 2.1 Block Chain e o Experimento Bitcoin. 2.2 NFT E Smart Contract. 2.3 Formas Simples de Objeto Virtual e Negociações de Licenças de Ambiente Virtual. 3 OS IMPACTOS DOS OBJETOS VIRTUAIS NO MUNDO JURÍDICO . 3.1 Os Impactos do Mundo Virtual nos Outros Ramos do Direito . 3.1.1 Direito Administrativo. 3.1.2 Direito Tributário. 3.1.3 Direito Penal. 3.2 Direito das Coisas. 3.2.1 Da coisa. 3.2.2 Da Posse. 3.2.3 Da Propriedade. 4 AS COLOCAÇÕES SOBRE OS OBJETOS VIRTUAIS NA LEGISLAÇÃO E JURISPRUDÊNCIA PÁTRIA. 4.1 A Legislação. 4.1.1 Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil, Nº 1888, de 03 de maio de 2019. 4.1.2 Parecer de Orientação CVM nº 40, de 11 de outubro de 2022. 4.1.3 Projeto de lei nº 4401, de 2021 (nº 2.303/2015, na Câmara dos Deputados). 4.1.4 Comunicado BACEN Nº 25306 DE 19/02/2014. 4.2 A Jurisprudência. 5 CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.


1. INTRODUÇÃO

Objetos virtuais, isto é, objetos que existem por meio de simulação de computador, são atualmente umas das mais diversas facetas das relações de consumo e de negócios de toda uma geração que é familiarizada com a internet. Seja na forma de agregadores de valor ou de cosméticos dentro de jogos, muito dinheiro é gasto em relação a uma classe de objetos que não é, sequer, tangível.

Tais objetos, principalmente as criptomoedas, se popularizaram a partir do ano de 2009, com a proposta inicial da Block Chain, feita por Satoshi Nakamoto, e, desde então, usuários em todo o mundo utilizam dos mesmos para realizar transações e negócios nos mais diversos tópicos.

O direito possui interesse em relação a esses objetos, uma vez que os direitos constituídos em relação a eles acabam por ser objetos de ações judiciais, cuja resolução fica condicionada a interpretação dos juizados, uma vez que ainda não se observa uma consolidação na classificação em relação a esses objetos, principalmente no que se fala das leis.

Com pouquíssimas leis versando sobre o tema e uma enxurrada de demandas relacionadas ao mesmo, além da necessidade do estado em relação a classificação desses objetos para fins relacionados a sua existência, se torna pertinente tentar explicar a natureza desses objetos, assim como compara-los aos objetos físicos.

Dessa forma, o presente trabalho busca informar o que vem a ser objetos virtual e suas diversas espécies, demonstrar as interações desses objetos em relação aos ramos do direito e apresentar as disposições legislativas e jurisprudenciais brasileiras em relação ao tema, fazendo-se através de pesquisa e revisão bibliográfica de material escrito e on-line.

No primeiro capítulo, será explicado o que vem a ser objeto virtual e sus espécies, de acordo com a interpretação fornecida nesse trabalho, tais sejam as criptomoedas, os NFT’s e os Smart Contracts e as licenças de uso dentro de ambiente virtual, assim como os mecanismos nos quais esses objetos são criados.

No segundo capitulo, serão demonstrados as interações entre os objetos virtuais e os ramos do direito, assim como os temas pertinentes no que se refere ao Direito das Coisas, tal como o conceito de coisa, propriedade e posse.

No terceiro capitulo, serão apresentadas as colocações legislativas relacionadas ao tema em questão, assim como algumas colocações de tribunais em ações relacionadas a esse tipo de objeto.

A partir disso, se extrai que a propriedade desse tipo de objeto já é um fato e que ele meramente deve ser tutelado pelo direito

Deste modo, conclui-se que a legislação brasileira ainda possui pouquíssimas entradas quando se trata de qualquer que seja o tipo de objeto virtual, assim como o fato de haver terminologias desencontradas entre essas disposições legais, dessa forma sendo necessário que sejam padronizados os termos e que seja elaborada lei pertinente ao tema que venha a sanar as dúvidas em questão. Ainda assim, as legislações, de todo modo, já servem o seu fim especifico.


2. OBJETOS VIRTUAIS

Vindo da obscuridade de um projeto que tinha como objetivo interligar os centros de pesquisa do Departamento de Defesa dos Estados Unidos, a Internet tem hoje um papel crucial nesse atual mundo globalizado. Quase tudo pode ser feito através dela, e o que ainda não é possível, logo será. Assim, não é incomum pensar que a internet passou a não só ser uma ferramenta estratégica, mas também uma fonte de renda para milhares de pessoas ao redor do globo: através da internet, é possível comprar e vender objetos, compartilhar e adquirir conhecimento, achar pessoas ou se esconder, etc., tudo através dos meandros de suas incontáveis conexões.

Por tal motivo, não é surpresa que a internet, de certo modo, criou um mundo que só existe dentro dela: o mundo virtual. Nele, as pessoas encontram aquilo que procuram quase que da mesma forma que no mundo real, ou seja, com endereço fixo e até CEP, basta apenas que você digite as palavras certas no lugar certo. Mesmo assim, esse mundo não existe de fato, pois ele é, por definição, virtual, ou seja, ele não está no plano físico, mas sim em uma realidade criada. Conforme definição do dicionário on-line Dicio, a palavra ‘virtual’ pode ser interpretada das seguintes formas: “Não real; simulado eletronicamente; [...] [Informática]: Que existe unicamente como resultado de uma demonstração ou simulação criada por um programa de computador [...]; teórico; sem consequência real; cuja existência ocorre em teoria. [...] (DICIO, 2022, não paginado) ”. Ou seja, para os efeitos deste trabalho, aquilo que é virtual não existe de fato, sendo uma criação de meio eletrônico, como a internet, por exemplo.

Ainda, o mundo virtual proporcionado pela internet vem evoluindo a cada dia, com ambientes de realidade virtual ou realidade aumentada se tornando cada vez mais comuns nos mais diversos locais da internet, como o Metaverso proposto por Mark Zuckerberg ou o jogo VRChat, da produtora de mesmo nome, VRChat. Neles, usando a internet, as pessoas misturam a realidade virtual e a aumentada e interagem com um mundo totalmente criado em computador.

Da mesma forma, já deixou de ser mera possibilidade que as coisas criadas nesse mundo virtual possam ser negociadas por aqueles interessados naquilo como uma forma de investimento, ocorrendo a especulação de valores em relação a àquilo que sequer existe no mundo físico.

Entretanto, conforme preceitua Ammous (2018, p. 170), “[...] The nature of digital objects, since the inception of computers, is that they are not scarce. They can be reproduced endlessly, and as such it was impossible to make a currency out of them, because sending them will only duplicate them. [...]1” Como se observa, os objetos virtuais são essencialmente infinitos, fazendo com que eles sejam péssimas escolhas quando se trata de atribuição de valor.

Assim, usando a definição de ‘virtual’ dada anteriormente, e conforme o Professor Ammous (2018) preceitua, os objetos virtuais podem ser definidos como criações feitas em computador, proporcionadas por um programa, cuja reprodução é ilimitada, não havendo empecilhos para a sua expansão numérica. Deste modo, precisava-se que os objetos virtuais se tornassem limitados, afim de atribuir existência única para cada um deles, da mesma forma que se atribuía valor, sem que tal existência e valoração não fosse mera especulação.

Destarte, se observará, a seguir, um breve resumo das tecnologias usadas para a criação de objetos virtuais e as formas em que os eles tomam quando assumem lugar no mundo virtual.

2.1 Block chain e o experimento bitcoin

Em outubro de 2008, Satoshi Nakamoto publicou, para um seleto grupo de entusiastas da criptografia, no domínio bitcoin.org, um ensaio, de nome “Bitcoin: A Peer-to-Peer Electronic Cash System”, cuja tradução é “Bitcoin: Um sistema de Dinheiro Eletrônico Par-à-Par”, onde detalhava sua proposta para um sistema de dinheiro eletrônico sem a validação de um terceiro de confiança. Vale destacar que, até hoje, Satoshi Nakamoto ainda permanece desconhecido, sendo tratado apenas como um pseudônimo de uma pessoa ou um grupo de pessoas que desenvolveu a ideia para a Block Chain.

No documento, Satoshi detalha como, usando um sistema complexo que utilizava conceitos de criptografia, era possível criar uma sequência (corrente, ou ‘chain’) de dados (bloco, ou ‘block’) que nunca se repetia e, com apenas o trabalho exercido para criar a corrente, era possível garantir sua autenticidade perante fraudes.

Mas como se pode perceber, o que viria a ser chamado de Block Chain estava atrelada ao Bitcoin quase que por um cordão umbilical, já que, sem esta tecnologia, o Bitcoin não poderia ter existido, ou seja, para suprir os interesses da criação de uma moeda digital, a Block Chain precisava surgir.

Deste modo, vale levar em consideração os motivos para que Satoshi viesse a criar o Bitcoin. Sua intenção era criar uma forma de dinheiro eletrônico puramente entre pares, que não requeresse terceiros para transação e que sua oferta não pudesse ser alterada por qualquer terceiro (AMMOUS, 2018, p. 171).

Vale lembrar que a maioria das transações atuais ocorrem com o intermédio de um terceiro, como um banco por exemplo, usando objetos virtuais reproduzidos indiscriminadamente, que representariam o dinheiro em questão, assim como, conforme discorre Nascimento (2021, p. 12) “[...]. Pode parecer estranho, mas não podemos esquecer que, em tese, uma boa parte do dinheiro em circulação simplesmente consiste em registros eletrônicos na base de dados de algum governo ou instituição bancária.”. Além disso, ainda existe a natureza intrínseca dos objetos virtuais, usados para a validação das transações nesse modelo, que são facilmente reproduzíveis devido impossibilidade de sua escassez (AMMOUS, 2018, p. 270).

Assim, observa-se que os interesses para a criação do Bitcoin estavam atrelados com a insatisfação de Satoshi com a forma em que os bancos e os diversos governos pelo mundo geriam o sistema monetário global, então, conforme continua Ammous (2018, p. 171), “[...] Nakamoto succeeded in achieving this through the utilization of a few important though not widely understood technologies: a distributed peer-to‐peer network with no single point of failure, hashing, digital signatures, and proof-of‐work.” 2

Para Satoshi, além disso, o problema era que quanto mais variáveis existissem no momento da transação, maior a possibilidade de fraude, e a forma mais segura de transação é aquela que envolve duas partes apenas, como no caso do dinheiro físico onde uma paga e o outra recebe, ou seja, a vantagem dessa modalidade de pagamento e de ser imediato e final, não requerendo confiança de nenhum dos lados, e não sendo possível intervir para impedir tal tipo de transação (AMMOUS, 2018, p. 169).

Para viabilizar o Bitcoin, Satoshi então precisava de uma tecnologia que suprisse a necessidade da garantia de um terceiro enquanto trouxesse as características positivas do dinheiro físico (principalmente a falta de necessidade de um terceiro garantidor), sem ainda trazer os problemas e limitações do mesmo (como a necessidade de se efetuar pagamento em pessoa), e, para isso, ele propôs a tecnologia que viria a ser chamada de Block Chain, que nada mais é que uma rede compartilhada de capacidade de cálculo, onde se emprestava CPU para realização de cálculos matemáticos complicadíssimos, e, conforme se concluía os cálculos e a rede os verificava, era recebido uma recompensa pela apresentação da solução da prova de trabalho.

A partir disso, na Block Chain, cada Bitcoin carrega consigo todo o trabalho da rede para chegar à sua existência, ou seja, ele possui garantia de existência perante toda a rede, uma vez que, quando apresentado para qualquer parte da rede, esta pode solucionar o cálculo enquanto verifica os fatores da equação, mesmo sabendo o resultado, para que assim se garanta a autenticidade daquele bloco da corrente, permitindo que se possa adicionar blocos a partir daquele devido à sua autenticidade, conforme Ammous caracteriza em relação a Block Chain:

[...]. Every transaction has to be recorded by every member of the network so that they all share one common ledger of balances and transactions. Whenever a member of the network transfers a sum to another member, all network members can verify the sender has a sufficient balance, and nodes compete to be the first to update the ledger with a new block of transactions every ten minutes. In order for a node to commit a block of transactions to the ledger, it has to expend processing power on solving complicated mathematical problems that are hard to solve but whose correct solution is easy to verify. This is the proof-of‐work (PoW) system, [...]. Once a node solves the proof-of-work correctly and announces the transactions, other nodes on the network vote for its validity, and once a majority has voted to approve the block, nodes begin committing transactions to a new block to be amended to the previous one and solving the new proof-of‐work for it. [...] (AMMOUS, 2018, p. 171-172) 3

Então, Satoshi havia conseguido colocar em prática sua ideia e criou o que viria a ser a primeira forma de dinheiro eletrônico que em funcionava sem a garantia de terceiro, já que os usuários que emprestavam CPU para blockchain forneciam a garantia coletiva do Bitcoin, mas, mais do que isso, Satoshi havia criado, com sucesso, dois conceitos importantíssimos para a valorização de objeto virtual: a ‘escassez virtual’ e a ‘escassez absoluta’.

Em suma, a ‘escassez virtual’ está atrelada ao fato de que um Bitcoin não poderia existir em dois lugares ao mesmo tempo dentro do mundo virtual, diferente de todas as formas de objeto virtual anteriores, fazendo com que ele se torne escasso, conforme discorre Ammous (AMMOUS, 2018, p. 174) :

With this technological design, Nakamoto was able to invent digital scarcity. Bitcoin is the first example of a digital good that is scarce and cannot be reproduced infinitely. While it is trivial to send a digital object from one location to another in a digital network, [...], it is more accurate to describe these processes as copying rather than sending, because the digital objects remain with the sender and can be reproduced infinitely. Bitcoin is the first example of a digital good whose transfer stops it from being owned by the sender.4

Além disso, Bitcoin pode ser considerado a primeira forma de comódite ‘verdadeiramente escassa’, ou ‘absolutamente escassa’, considerando que seus números são invariavelmente limitados, uma vez que, conforme Ammous (AMMOUS, 2018, p. 174) continua em seu argumento:

[...], Bitcoin is also the first example of absolute scarcity, the only liquid commodity (digital or physical) with a set fixed quantity that cannot conceivably be increased. Until the invention of Bitcoin, scarcity was always relative, never absolute. It is a common misconception to imagine that any physical good is finite, or absolutely scarce, because the limit on the quantity we can produce of any good is never its prevalence in the planet, but the effort and time dedicated to producing it. 5

Assim, mesmo com o sucesso do experimento, o Bitcoin ainda tinha um bom percurso pela frente até deslanchar em um agregador de valor de sucesso como ele é hoje, já que ele precisava se tornar popular. Da mesma forma, a Block Chain demoraria o mesmo tanto para se tornar um popular método de garantia usada por para ciar a escassez de outras criptomoedas e objetos virtuais.

2.2 NFT e Smart Contract

A Block Chain, como dito anteriormente, é um registro comum e compartilhado que garante o Bitcoin. Nela, todas as informações relacionadas a existência e a transação de um Bitcoin estão contidas e são atualizadas por uma rede compartilhada de usuários, sendo que a base da tecnologia blockchain também é usada por diversas outras criptomoedas dentro do mundo virtual.

Mas, existe a possibilidade de, além das informações referentes a garantia de uma criptomoeda, a blockchain também carregar consigo outras informações, distintas da criptomoeda, que também são capazes de imputar garantia em relação a outros objetos virtuais, sejam eles arquivos de imagem ou um documento, como é o caso dos Smart Contracts e dos NFT.

No caso dos Smart Contracts, ou ‘contratos inteligentes’, conforme discorre Ammous (2018, p. 258) “[...] Smart contract cryptographic systems such as Ethereum encode contracts into a blockchain to make them self-executing, with no possibility for appeal or reversal and beyond the reach of courts and police. [...] 6 Nessa hipótese, o contrato fica limitado àquilo que constitui seu conteúdo e protegido em relação a interferência externa, não sendo possível alteração realizada por fora da blockchain.

Normalmente, conforme discorre Ammous (2018, p. 258) “[...] contracts are drafted by lawyers, judged by courts, and enforced by the police. [...]7 . No caso dos contratos civis realizados entre duas pessoas, o que garante a executabilidade do contrato é a anuência de ambas as partes em relação ao conteúdo e as cláusulas do contrato e a garantia que a lei proporciona caso haja descumprimento das cláusulas.

Nesse sentido, o código descrito na blockchain em que o contrato está é aquilo que dá garantia de executabilidade para ele, além da confiança das partes na blockchain, por esse motivo ele é auto executável, ou seja, o código de programação que codifica o contrato é aquilo que substitui a lei no caso dos Smart Contracts, conforme exemplifica Ammous (2018, p. 258), “[...]“Code is law” is a motto used by smart contract programmers. [...] 8 .

Os conteúdos dos Smart Contracts variam muito, podendo ser acordos entre os usuários da rede Ethereum que delimitam a transferência da criptomoeda, mas, essencialmente, como discorre Entriken, et al. (2018, não paginado):

There are many proposed uses of Ethereum smart contracts that depend on tracking distinguishable assets. Examples of existing or planned NFTs are LAND in Decentraland, the eponymous punks in CryptoPunks, and in-game items using systems like DMarket or EnjinCoin. Future uses include tracking real-world assets, like real-estate (as envisioned by companies like Ubitquity or Propy). [...] 9

Como se pode observar, os objetos dos contratos inteligentes podem ser desde ativos virtuais até mesmo ativos no mundo real, entretanto, eles dependem do rastreio dos ativos que são seus objetos, ou seja, eles precisam mostrar para quem assina o contrato aonde está o ativo, seja ele virtual ou real.

Assim, uma outra possibilidade de conteúdo dos Smart Contracts são os NFT’s, sigla em inglês para non-fungible token, ou ‘ficha não fungível’, sendo que essa ‘ficha’ existe apenas no mundo virtual. Além disso, conforme definição do dicionário on-line Dicio, na acepção jurídica da palavra ‘infungível’ (ou ‘não fungível’), “[Jurídico] Que é insubstituível; que não pode ser substituído por outro bem de mesma espécie (valor, quantidade e qualidade): uma obra de arte de Picasso é um bem infungível. “ (DICIO, 2022, não paginado)

A alcunha foi forjada para delimitar aqueles ativos digitais que passaram por um tratamento criptográfico afim de atribuir a eles um lugar para ir na blockchain do Ethereum, ou seja, a ficha aponta para quem a possui aonde ir na blockchain afim de reivindicar o ativo adquirido, ou conforme explica Entriken, et al. (2018, não paginado):

Every NFT is identified by a unique uint256 ID inside the ERC-721 smart contract. This identifying number SHALL NOT change for the life of the contract. The pair (contract address, uint256 tokenId) will then be a globally unique and fully-qualified identifier for a specific asset on an Ethereum chain. [...] 10

Nesse sentido, eles passam a ser únicos e adquirem a capacidade de representar não só ativos digitais ou físicos, mas também a propriedade dos mesmos, conforme propõe Entriken, et al. (2018, não paginado):

[...] We considered use cases of NFTs being owned and transacted by individuals as well as consignment to third party brokers/wallets/auctioneers (“operators”). NFTs can represent ownership over digital or physical assets. We considered a diverse universe of assets, and we know you will dream up many more:

Physical property — houses, unique artwork

Virtual collectables — unique pictures of kittens, collectable cards

“Negative value” assets — loans, burdens and other responsibilities

In general, all houses are distinct and no two kittens are alike. NFTs are distinguishable and you must track the ownership of each one separately. 11

Assim, pode-se considerar que contratos inteligentes são utilizados para delimitar um acordo entre duas partes que estão usando a blockchain da criptomoeda Ethereum, mas não só limitado a ela, afim de tornar esse acordo conhecido e auto executável perante os outros usuários, normalmente transferindo a propriedade de algum ativo do qual eles são donos, e as fichas são os endereços dos ativos a serem transferidos pelo contrato, ou seja, o objeto do contrato, sejam eles físicos ou virtuais.

2.3 Formas Simples de Objeto Virtual e Negociações de Licenças de Ambiente Virtual

Conforme preceituado anteriormente, objetos virtuais são objetos que existem puramente dentro de uma simulação de computador. Do mesmo, modo, se observa que é possível realizar tratamento em relação aos objetos virtuais e conferir a eles unicidade, como é o caso do Bitcoin, que deixa de ser apenas um aglomerado de dados e se transforma num agregador de valor escasso.

Ainda assim, os objetos virtuais que não passaram pelo tratamento de criptografia que confere a eles unicidade podem ser negociados ser prejuízos a parte que compra tais objetos. Normalmente, um objeto virtual, tal como um software, é comercializado com base em licença de uso. No caso do programa de computador, ou software, sua propriedade intelectual é regida pela Lei nº 9.609/98, e eles são caracterizados da seguinte forma:

Art. 1º Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados. (BRASIL, 1998, não paginado).

Ainda, o Art. 9º da mesma lei discorre “O uso de programa de computador no País será objeto de contrato de licença. (BRASIL, 1998, não paginado) ”. A partir dessa exposição, são muitas as modalidades possíveis de programas de computador. O Windows e suas variantes são sistemas operacionais, o Microsoft Word é um programa de processamento de texto, o League of Legends é um jogo eletrônico para computador e todos são software. Esse último, ao contrário dos dois primeiros, é gratuito, não havendo contraprestação para sua aquisição, porém é possível usar dinheiro real para ‘comprar’ itens dentro do jogo, e tais compras são regidas por um termo de serviço, que serão observados a título de exemplo.

Nos Termos de Serviço da Riot Games (2021, não paginado), em uma sessão reservada para as cláusulas mais importantes, nas quais os usuários devem prestar mais atenção, estão os dizeres:

[...] Conteúdo virtual. Quando você clica para comprar, ganhar ou receber um Conteúdo Virtual, você obtém apenas uma licença para acessar o Conteúdo Virtual. Você não possui a propriedade sobre nenhum Conteúdo Virtual que desbloquear e não poderá transferi-lo para outra pessoa. O Conteúdo Virtual não tem valor monetário, geralmente é específico do jogo e você não pode resgatar Conteúdo Virtual por qualquer tipo de dinheiro do “mundo real”. [...] (Grifo do autor)

Logo abaixo, em sua cláusula 4.1, a empresa define “4.1. O que é Conteúdo Virtual? (O Conteúdo Virtual inclui itens como moeda do jogo e produtos virtuais, como campeões, skins, emotes, acessórios etc) [...] (RIOT GAMES, 2021, não paginado, grifo do autor) ”. Conforme definido anteriormente, nesse caso, esse conteúdo virtual existe através do programa de computador que é o jogo, não sendo possível extrair qualquer que seja o objeto definido pela empresa como conteúdo virtual de dentro do programa, nem atribuir a ele um valor que não seja aquele conferido pela empresa, não podendo converte-lo em nenhum tipo de ‘dinheiro real’.

Vale destacar que a obtenção da licença normalmente está vinculada a uma contraprestação por parte do usuário, normalmente feita em dinheiro real, mas também poderá ocorrer de a mesma ser recebida ou ganhada sem esta contraprestação, conforme a empresa discorre na clausula 4.2:

[...]. Podemos oferecer a você várias oportunidades para adquirir uma licença limitada para acessar a Moeda do Jogo ou o Conteúdo Virtual, inclusive:

1. comprá-la (p. ex., com cartão de crédito);

2. ganhá-la (p. ex., cumprindo missões ou tarefas de jogo); ou

3. recebê-la (p. ex., de outro jogador como presente ou usar a funcionalidade de criação como Hextech®). (RIOT GAMES, 2021, não paginado)

Por fim, para encerrar a sessão que conceitua sobre o Conteúdo Virtual, a empresa continua:

4.4. Mais uma vez: não possuo meu Conteúdo Virtual? ("Não!", gritaram todos os advogados.)

Quando você obtém nosso Conteúdo Virtual, o que estamos realmente oferecendo a você é uma licença e um direito pessoal, não exclusivos, intransferíveis, não sublicenciáveis, revogáveis, limitados, para usar esse Conteúdo Virtual apenas em relação ao uso que você fizer dos Serviços da Riot em questão. [...] (RIOT GAMES, 2021, não paginado, grifo do autor)

Como se pode perceber, não há nenhum interesse por parte da empresa de transferir a propriedade do conteúdo virtual adquirido através dos serviços prestados pela empresa, sendo que o que a empresa faz é apenas ceder uma licença de uso limitada ao ambiente dentro do jogo e intransferível para outras pessoas, dentro ou fora do jogo.

Não só isso, a empresa afasta até mesmo direito de propriedade em relação a conta na qual você concordou com o serviço, assim discorrendo:

[...] Não obstante qualquer disposição em contrário neste documento, você reconhece e concorda que não terá nenhum direito de propriedade ou outro tipo de direito sobre sua conta, e que todos os direitos de sua conta são e sempre serão de propriedade da Riot Games e reverterão em benefício desta. [...] (RIOT GAMES, 2021, não paginado, grifo do autor)

Destarte, observa-se que, ao contrário do Bitcoin e dos NFT’s citados anteriormente, os objetos virtuais em questão, negociados através da concessão de licença a título de ‘Conteúdo Virtual’, são fungíveis e não escassos, uma vez que qualquer pessoa poderá obtê-los, contando que concorde com os termos de serviço, e que eles serão replicados para atingir a demanda de quem pagou pelo serviço.

O que se observa nesse caso é a tentativa da empresa de defender sua propriedade intelectual. É certo que a capacidade criativa do homem sempre existiu, mas a necessidade da proteção desta propriedade criativa só se tornou necessária depois que o homem se tornou capaz de reproduzi-las em grande escala (SILVEIRA, 2018, p. 10).

A proteção da propriedade imaterial visa garantir o direito do autor em relação a obra, já que:

[...]. O que se protege é o fruto dessa atividade, quando ela resulta em uma obra intelectual, ou seja, uma forma com unidade suficiente para ser reconhecida como ela mesma. O fundamento do direito sobre tais obras se explica pela própria origem da obra: o indivíduo. A obra lhe pertence originalmente pelo próprio processo de criação; só a ele compete decidir revelá-la pondo-a no mundo, e essa decisão não destrói a ligação original entre obra e autor. (SILVEIRA, 2018, p. 10).

Na mesma seara, os softwares constituem forma de criação intelectual que visa algo útil, ou, conforme discorre Silveira (2018, p. 12):

A criação no campo da indústria, ou invenção industrial, objetiva produzir efeitos no mundo material, obtendo um resultado utilitário. Em suma, o poder do homem sobre o mundo material que o cerca é aumentado pelo emprego da invenção, em termos de maior força, mais rapidez ou perfeição.

Assim, pode-se concluir que os objetos virtuais não possuem valor monetário, constituindo parte da propriedade intelectual da empresa, sendo que, através da licença negociada, a pessoa recebe autorização para utilizar tal conteúdo, ou seja, um direito pessoal. Da mesma forma, o dinheiro gasto com a aquisição da licença deixa de ter valor monetário quando a pessoa paga por ele, sendo impedida, a partir daquele ponto, de dispor daquele direito, já que ele diz respeito à propriedade da empresa, não do titular da licença.


3. OS IMPACTOS DOS OBJETOS VIRTUAIS NO MUNDO JURÍDICO

Como observado anteriormente, os objetos virtuais podem constituir uma forma de objeto sujeito a direito de propriedade. Também é certo que, como uma parte do mundo atual, eles também esbarram no mundo jurídico, já que este tenta constantemente regular a vida em sociedade. Um comportamento no mundo virtual pode vir a ser considerado crime para o Direito, da mesma forma que a compra de um bem no mundo virtual pode inferir tributo para o cidadão.

Antes disso, é importante conceituar o que é ‘mundo jurídico’. Separando a expressão, segundo o dicionário online Dicio (2022, não paginado), a palavra ‘mundo’ pode ser preceituada como “[...] Seção restrita de um âmbito do conhecimento ou atividade: mundo da música. [...]” e a palavra ‘jurídico’ como aquilo “Relacionado com o Direito, com as leis; legal, penal. Refere-se às normas sociais que buscam expressar ou alcançar um ideal justo, mantendo e regulando a vida em sociedade. [...]”

Portanto, entende-se como ‘mundo jurídico’ aquela parte do conhecimento reservada aos entendimentos das leis e as normas sociais que constituem o Direito de uma determinada multitude de codificações, e, dentro deste mundo, ainda existem os ramos especializados do Direito, como aqueles que se limitam a regular sobre punições, impostos, propriedade e o trabalho, por exemplo.

Dito isso, os objetos virtuais não são apenas limitados apenas a malefícios ou obrigações perante o mundo jurídico. Por exemplo, se algo for criado no mundo virtual e suas funcionalidades vierem a trazer benefícios para o Direito, é lógico que tal funcionalidade será aproveitada, uma vez que o mundo jurídico é vasto e qualquer ferramenta que ajude os agentes do direito a explorar tal vastidão é sempre bem-vinda.

Por esse motivo, será observado a seguir, alguns impactos e interações dos avanços tecnológicos e o Direito das Coisas, tema central desse trabalho, e alguns dos outros ramos do Direito.

3.1 Os Impactos do Mundo Virtual nos Outros Ramos do Direito

Uma vez que o escopo da discussão deste trabalho é o Direito das Coisas, irá ser exposto, primeiramente e de forma sucinta, alguns dos ramos do Direito que possuem pertinência para a elaboração dessa tese, uma vez que sua área de atuação também pode desbocar em algum ponto de interesse do Direito das Coisas.

Destarte, vale destacar que o Direito é vasto e essa é apenas uma amostra de como os avanços tecnológicos interagem com o mesmo, não só em relação aos objetos virtuais que são foco deste texto, mas também as novas interações trazidas pela informática.

3.1.1 Direito Administrativo

O Direito Administrativo, como seu próprio nome indica, visa preceituar a administração pública do Estado, e, por esse motivo, ele é um ramo do Direito Público. Através de princípios auto impostos, a administração pública atua e se limita de forma espontânea enquanto regula a forma de atuação dos membros do poder executivo. Em sua conceituação, José dos Santos Carvalho Filho (2022, p. 51) leciona:

Desse modo, sem abdicar dos conceitos dos estudiosos, parece-nos se possa conceituar o Direito Administrativo como sendo o conjunto de normas e princípios que, visando sempre ao interesse público, regem as relações jurídicas entre as pessoas e órgãos do Estado e entre este e as coletividades a que devem servir.

Dessa forma, não é estranho pensar que, considerando a magnitude da atuação da administração pública, essa busque facilitadores para o exercício dos poderes inerentes do estado.

Por exemplo, é função da administração pública, através das secretarias de segurança pública, a expedição de documentos que registram os cidadãos. Assim, conforme exemplifica Crespo (2011, p. 17):

Com relação ao Direito Administrativo, a informática também tem seus vínculos. É o que se nota com os serviços de E-CPF e E-CNPJ. Estes nada mais são que arquivos eletrônicos que identificam o usuário, constituindo verdadeiro documento eletrônico de identidade e fornecendo as garantias da privacidade, integridade, autenticidade e não repúdio.

Como se pode observar, a documentação digital é perfeito exemplo de objeto digital, uma vez que está atrelado a identificação das pessoas físicas e jurídicas, e os princípios explicados anteriormente, relacionados a dupla existência de uma mesma informação dentro de um banco de dados, por exemplo, volta a se mostrar pertinente, uma vez que seria extremamente danoso para o estado e para o cidadão a existência dupla de uma mesma documentação associada a uma pessoa.

Ainda, a administração pública municipal está encarregada do registro dos imóveis, realizado através dos cartórios, que tem por objetivo implicar a quem registra o pagamento de imposto em relação a propriedade daquele imóvel (será discutido um pouco mais sobre a relação próxima entre o Direito Administrativo, o Direito Tributário e o Direito das Coisas mais à frente). Dessa forma, é mais que importante que os cartórios municipais estejam conectados entre si e também em relação ao fisco de outros estados e da federação, a fim de que os impostos sejam imputados de forma devida. Assim, conforme continua em seu exemplo, Crespo (2011, p. 17):

Outra ferramenta prática é o SPED – Sistema Público de Escrituração Digital – que tem como objetivos, entre outros, a promoção da integração dos fiscos, mediante a padronização e o compartilhamento das informações contábeis e fiscais, respeitadas as restrições legais, a racionalização e uniformização das obrigações acessórias para os contribuintes, com o estabelecimento de transmissão única de distintas obrigações acessórias de diferentes órgãos fiscalizadores, facilitação da identificação de ilícitos tributários, com a melhoria do controle dos processos, a rapidez no acesso às informações e a fiscalização mais efetiva das operações com o cruzamento de dados e auditoria eletrônica. As principais vantagens do SPED são economia, celeridade e segurança: elimina-se o papel, não é preciso arquivar documentos físicos e faz-se uso da Certificação Digital.

Com a era da informática, seria um imenso desperdício de papel continuar a utilizar arquivamento físico nas repartições públicas, uma vez que esse método se mostra antiquado para alcançar os objetivos da administração quando comparado com um banco de dados virtual e compartilhado. Não só o papel ocupa um imenso e desnecessário espaço físico, como também afasta a celeridade judicial que tanto é necessária.

3.1.2 Direito Tributário

O Direito Tributário é, assim como o Direito Administrativo, um ramo do Direito Público dedicado ao estudo do fenômeno tributário estatal, ou seja, ele se debruça sobre os mais diversos tipos de tributos colocados como obrigação pelo estado em relação ao cidadão. Em uma conceituação mais definida, Hugo de Brito (2022, p. 24) preceitua o Tributário como:

Assim, e em síntese, pode-se dizer que o Direito Tributário é o conjunto de normas jurídicas que disciplina a atividade de tributação, levada a efeito pelo Estado e pelas entidades a ele relacionadas, de forma a que na cobrança de tributos e de penalidades pecuniárias decorrentes da infração a deveres tributários se observem critérios e limites pré-estabelecidos.[...]. Quanto à apontada finalidade, que não é a de “prover o Estado” mas a de fazer com que esse provimento se dê em respeito a limites pré-estabelecidos, como proteção dos pagadores de tributos, vale ressaltar que ela deve estar na consciência, também, de quem estuda esse sistema de normas, no âmbito do ramo do conhecimento que delas se ocupa.

Como vimos no caso do Direito Administrativo, é função deste registrar a posse de bens móveis e imóveis, a transmissão destes, a movimentação de mercadorias, a prestação de serviços, o acréscimo de renda, etc., e é função do Direito Tributário usar essas informações a fim de tributar de forma justa aqueles que realizam tais fatos. Entretanto, ainda se discute se os fenômenos tributáveis que são realizados no mundo virtual devem ou não ser tributados, ou seja, se devem ser tratados da mesma forma que no mundo real.

Nesse sentido, Crespo (2011, p. 17) discorre:

Há, ainda, problemas jurídico-tributários causados pelos novos meios eletrônicos, como é o caso do software e a mercadoria eletrônica ou virtual, que segundo o STF podem sofrer a incidência de ICMS. Em outras palavras, o que se discute é se tais produtos são mercadoria (como bem corpóreo) ou se deve prevalecer o caráter de bem incorpóreo. Também é muito discutida a questão sobre a tributação do “livro eletrônico”, já que a Constituição prevê imunidade para os livros, havendo decisões reconhecendo tal imunidade. E, como último exemplo dos novos paradigmas tributários, encontra-se a incidência de tributos sobre os provedores de acesso à internet.

Assim, é importante estabelecer limites entre o que é real e o que é virtual, assim como delimitar como deve ser realizada a tributação dentro destes ambientes virtuais ou quando se adquire um objeto virtual. Como uma exemplificação, um objeto virtual que não repercute no mundo real, ou seja, aquele que, uma vez que se se gaste dinheiro real com o objeto, ele só pode ser reembolsado, não podendo ser vendido ou transferido, deve ser tributado da mesma forma que um objeto físico que possui essas capacidades? São essas e outras perguntas que o direito tributário busca responder em relação aos usos dos avanços tecnológicos quando estes acabam por inferir na esfera do Direito.

3.1.3 Direito Penal

O Direito Penal é bem direto em relação a sua função e objetivos jurídicos: se você cometer um crime, ou seja, um ato tipificado como uma infração penal, você será punido. Em uma elucidação rápida, Cezar Roberto Bitencourt (2022, p. 43) discorre:

O Direito Penal apresenta-se, por um lado, como um conjunto de normas jurídicas que tem por objeto a determinação de infrações de natureza penal e suas sanções correspondentes — penas e medidas de segurança. Por outro lado, apresenta-se como um conjunto de valorações e princípios que orientam a própria aplicação e interpretação das normas penais. Esse conjunto de normas, valorações e princípios, devidamente sistematizados, tem a finalidade de tornar possível a convivência humana, ganhando aplicação prática nos casos ocorrentes, observando rigorosos princípios de justiça.

Ainda, ele é considerado ultima ratio, ou seja, ultima razão quando se trata de criar uma lei para a resolução de conflitos, então ele não deve ser usado levianamente seja qual for a situação, ou, como continua Bitencourt (2022, p. 45), o Direito Penal “[...] representa a ultima ratio do sistema para a prote­ção daqueles bens e interesses de maior importância para o indivíduo e a sociedade à qual pertence. [...]”

De todo caso, dentro do Direito, existem as infrações cíveis, penais, tributárias, administrativas, etc., com cada uma tendo sua conduta tipificada de uma forma especifica. Então, da mesma forma que os outros ramos do direito se modificam e se adaptam a novas artimanhas que os sujeitos do direito inovam, é certo que o Direito Penal também irá inovar quando se trata de tipificar e adaptar essas novas condutas como crime.

Assim, Crespo (2011, p. 17) finaliza:

Por fim, quanto ao Direito Penal, a relação com a informática também se faz clara na medida em que são discutidas questões como as do acesso não autorizado a sistemas, spam, engenharia social e estelionato, vírus, legítima defesa relativa a ataques em sistemas computacionais, lugar do crime, Direito de Intervenção e de Velocidades, harmonização internacional, entre outros.

É certo, também, que crimes já existentes também podem se relacionar com os objetos virtuais, como o roubo no seu sentido clássico de forma, já que apesar de todos os métodos de segurança citados no capítulo sobre o Bitcoin, ele ainda pode sofrer com ladrões especializados. É inegável, então, que esses ladrões sejam punidos de acordo com seus crimes e os danos por eles causados. Há, ainda, a questão do direito autoral, que, conforme as formas de compartilhamento de dados avançam, vem cada vez mais sendo exposto ao acaso e as malicias de quem utiliza os meios eletrônicos.

3.2 Direito das Coisas

Chegado ao ponto de foco deste trabalho, o Direito das Coisas está disposto no Código Civil, lei nº 10.406/2002, no Livro III, a partir do artigo 1.196 até o artigo 1510-E, enquanto que os temas do presente estudo, tais sejam, Posse e Propriedade, estão nos artigos 1.196 a 1.224 e 1.228 a 1369-F, respectivamente, onde o legislador busca regimentar os fundamentos relacionados com as possibilidades de interação do homem e objetos ao qual ele pode exercer vontade.

Primeiramente, vale olhar para a forma que os doutrinadores classificam o Direito das Coisas. Na visão compartilhada de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona (2022, p. 14, grifo do autor), eles discorrem suscintamente “Nesse contexto, temos que o Direito das Coisas ou os Direitos Reais, como ramificação do Direito Civil, consistem em um conjunto de princípios e normas regentes da relação jurídica referente às coisas suscetíveis de apropriação pelo homem, segundo uma finalidade social.”

Ainda, preleciona elaboradamente Flávio Tartuce (2022a, p. 887):

Direito das Coisas – é o ramo do Direito Civil que tem como conteúdo relações jurídicas estabelecidas entre pessoas e coisas determinadas ou determináveis. Como coisas, pode-se entender tudo aquilo que não é humano, [...], ou ainda os bens corpóreos, na linha da polêmica existente na doutrina. No âmbito do Direito das Coisas há uma relação de domínio exercida pela pessoa (sujeito ativo) sobre a coisa. Não há sujeito passivo determinado, sendo esse toda a coletividade. Segue-se a clássica conceituação de Clóvis Beviláqua citada, entre outros, por Carlos Roberto Gonçalves, para quem o Direito das Coisas representa um complexo de normas que regulamenta as relações dominiais existentes entre a pessoa humana e coisas apropriáveis.

Por fim, Paulo Lôbo (2022, p. 15) conceitua:

No Brasil, o direito das coisas abrange a disciplina normativa da posse, da propriedade e dos demais direitos reais. Como a posse é poder de fato sobre a coisa, ainda que tutelada pelo direito, a denominação mais adequada para a disciplina é “direito das coisas” e não direito sobre as coisas. Para os que entendem que a posse é direito sobre as coisas, tal como ocorre com o direito de propriedade, a denominação apropriada seria direitos reais. Contudo, direitos reais, propriamente ditos, são a propriedade e os direitos reais limitados. Estes e a posse têm as coisas como objetos de suas relações.

O CC/2002, na esteira da tradição brasileira, denomina de direito das coisas o conjunto normativo das relações de pertencimento pleno ou parcial de coisas, incluindo a posse, a propriedade e os direitos limitados sobre coisas alheias, a nosso ver corretamente.

Portanto, entende-se como Direito das Coisas como o Ramo do Direito Civil que consiste num conjunto de regras e princípios que regem a forma que o homem se apropria de coisas e os poderes que emanam a partir dessa relação, como usar, dispor ou fruir da coisa, essa podendo ser material ou imaterial, ou, ainda, é o ramo do Direito que estuda o domínio humano sobre a infindável multitude das coisas do mundo.

Com a conceituação sobre o que é o Direito das Coisas feita, passa-se então para a explicação dos conceitos principais pertinentes a esse trabalho, discutidos logo adiante.

3.2.1 Da coisa

Visto o que é ‘Direito das Coisas’, agora cabe-se estabelecer, então, o que é ‘coisa’. ‘Coisa’, como dito anteriormente, é uma multitude, podendo ser desde as conchas na praia, até uma casa, no seu todo, ou em parte. Entretanto, o interesse do Direito em relação a elas nasce a partir do interesse humano em relação a essa coisa, a sua individualização perante os seus pares e equivalentes. Nesse sentido, Paulo Lôbo (2022, p. 16) discorre:

Para o direito civil, coisa significa o que pode ser objeto de apreensão, uso, fruição e disposição, com natureza patrimonial e econômica. Por conseguinte, as ondas do mar, o ar, as estrelas, os dados de computador ou mídias portadoras de dados, o corpo da pessoa viva não são coisas (Schapp, 2010, p. 37). No sentido genérico, estão as coisas corpóreas ou materiais e as coisas incorpóreas ou imateriais. O conceito jurídico de coisa supõe que ela se individualize, ou se separe de outra coisa. Não há propriedade de coisas como um todo. [...]

Discorrem também, nesse sentido, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona (2022, p. 14)

Assim, é preciso deixar claro que, no campo dos Direitos Reais, o que se estuda é realmente a “coisa”, entendida como o bem suscetível de apropriação, valendo salientar que, segundo a linha filosófica que seguimos, “bem” é um conceito mais amplo do que o de “coisa”.

A possibilidade jurídica de apropriação é, portanto, o elemento distintivo essencial para que um determinado “bem” seja considerado uma “coisa” e, consequentemente, possa ser objeto da disciplina dos direitos reais.

Observe-se que, por isso, podemos falar de um processo de “coisificação” para que determinados direitos ou bens possam ser objeto de uma relação jurídica real.

Como é observado nessa lição, ‘coisa’ não pode ser o todo de uma classe de objetos, uma vez que ninguém pode ser dono de todo a água do mundo, mas alguém pode se declarar dono de uma garrafa de água e fazer negócios com ela, ou seja, usar, dispor ou fruir, uma vez que essa pessoa distinguiu tal água de todas as outras moléculas de água dentro da multitude, gerando, então, propriedade.

3.2.2 Da Posse

Posse, conforme sua descrição no Código Civil, é objeto do Direito das coisas, mas não é Direito Real, já que ela não se encontra na lista conferida pelo artigo 1.225 do referido Código. Entretanto, sua aquisição é caracterizada no artigo 1.204 como “Adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade.” (BRASIL, 2002, não paginado).

Observa-se que o código se limita a caracterizar os efeitos da posse, estipulando que quem tem a posse são aqueles que detém os poderes da propriedade, que, conforme dispõe o caput artigo 1228 do Código Civil, “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. ” (BRASIL, 2002, não paginado). Dessa forma, existe estipulação legal em relação à Posse, mas falta a caracterização de fato sobre o que é a Posse, que fica a cargo da doutrina.

Assim, a doutrina caracteriza Posse da seguinte forma:

As teorias jurídicas brasileiras sobre a posse inclinam-se, em grande maioria, para considerá-la estado de fato, ou poder de fato que o direito reconhece ao possuidor. Tito Fulgêncio, em obra dedicada à posse, na década de 1930, afirmou que a posse é “poder de fato, instaura-se pelo exercício de fato de algum poder do domínio”, razão por que o ladrão tem a posse, mas não a propriedade, que seria poder de direito adquirido por título justo (2008, p. 6). [...] (LÔBO, 2022, p. 50).

Ainda, Flávio Tartuce (2022b, p. 51) discorre:

A primeira dúvida que pode surgir quanto ao instituto refere-se à seguinte indagação: a posse é um fato ou um direito? Na visão clássica, muitos juristas enfrentaram muito bem a questão, como fez José Carlos Moreira Alves (Posse..., 1999, v. II, t. I, p. 69-137). Esse doutrinador aponta duas grandes correntes, a que afirma se tratar de um mero fato e outra pela qual a posse, realmente, constitui um direito. A segunda corrente, que prega o entendimento de que a posse é um direito é a que acaba prevalecendo na doutrina.

Nessa linha igualmente me posiciono doutrinariamente. Isso porque a posse pode ser conceituada como sendo o domínio fático que a pessoa exerce sobre a coisa. A partir dessa ideia, levando-se em conta a teoria tridimensional de Miguel Reale, pode-se afirmar que a posse constitui um direito, com natureza jurídica especial. Como dito no capítulo anterior, a posse é um conceito intermediário, entre os direitos pessoais e os direitos reais. Mas esse caráter híbrido não tem o condão de gerar a conclusão de que não constitui um direito propriamente dito.

Também, em lição sucinta, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona (2022, p. 25, grifo do autor) discorrem “Em nosso sentir, a posse é uma circunstância fática tutelada pelo Direito. Vale dizer, é um fato, do qual derivam efeitos de imensa importância jurídica e social.”

Portanto, pode-se dizer que a posse é um estado de fato, ao qual o Direito atribui direitos a quem possui de forma legitima e não violenta.

Ainda, quando se trata de um objeto virtual constituída a propriedade do dono em relação ao objeto virtual, posse também poderá ser constituída, uma vez que o proprietário poderá ceder o ativo ou a moeda a fim de salva guarda, como é o caso das carteiras virtuais, ou a fim de enriquecimento, como no caso dos fundos de investimento.

3.2.3 Da Propriedade

Propriedade é tratado nos termos do art. 5º da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988, não paginado) como “XXII - é garantido o direito de propriedade; XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;” e conforme sua inserção no artigo 1228 do Código Civil, “Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.” (BRASIL, 2002, não paginado).

Assim, conforme Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona (2022, p. 48, grifo do autor), “Em termos conceituais, portanto, o direito de propriedade consiste no direito real de usar, gozar ou fruir, dispor e reivindicar a coisa, nos limites da sua função social.

Em sua lição, Paulo Lôbo (2022, p. 99) conceitua em relação a disposição legal de propriedade como:

O direito de propriedade consiste, no Código Civil, na faculdade de usar, fruir e dispor da coisa e no direito de reavê-la de quem a detenha injustamente. Esse conteúdo amplo tem origem nas formulações dos glosadores medievais (jus utendi, fruendi et abutendi), que foram adaptadas para as finalidades da propriedade individual moderna. Progressivamente foi restringido, em virtude das metamorfoses havidas desde então na propriedade, que desembocaram em sua conformação à função social, na contemporaneidade.

E sobre a vinculação da Propriedade a sua Função Social, discorre Tratuce (2022b, p. 152):

Percebe-se, portanto, que a função social é íntima à própria construção do conceito. Como direito complexo que é, a propriedade não pode sobrelevar outros direitos, particularmente aqueles que estão em prol dos interesses da coletividade.

A propriedade deve ser entendida como um dos direitos basilares do ser humano. Basta lembrar que a expressão “é meu” constitui uma das primeiras locuções ditas pelo ser humano, nos seus primeiros anos de vida. Concretamente, é por meio da propriedade que a pessoa se sente realizada, principalmente quando tem um bem próprio para a sua residência.

Nesse ponto, vale destacar o que vem a ser ‘função social da propriedade’: tal expressão quer dizer que a propriedade, por ser um direito individual privado, tem de suprir o interesse do indivíduo sem que sem que esse viole a busca pela igualdade social, presente como princípio da Constituição Federal, ou seja, de forma simples, quem é proprietário tem direitos e deveres em relação a sua propriedade.

Desse modo, pode-se dizer sobre a Função social da propriedade que “Trata-se, portanto, de uma inequívoca característica do sistema constitucional contemporâneo o respeito à função social, como forma de legitimação do próprio direito de propriedade.” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2022, p. 53).

Portanto, conclui-se que a Propriedade é um direito basilar, associado ao bem-estar do ser humano, e que se constitui na possibilidade de usar, dispor e fruir de algum bem desde de que atendendo a Função Social da Propriedade, ou, conforme Paulo Lôbo (2022, p. 97), “[...]. Porém, a expressão “direito de propriedade” deve ser restrita a quem detenha titulação formal reconhecida pelo direito para aquisição da coisa. Assim, a acessão, a usucapião, a sucessão, o registro imobiliário.”

Assim, como observado anteriormente, as criptomoedas e os ativos virtuais são objetos que constituem dados e informações dentro de um registro público e compartilhado. Elas carregam consigo algarismos que as individualizam e outros que determinam quem as validou e quem as possui. Nesse caso, a Blockchain garante a existência e diz quem garante e quem possui, assim como as transferências que ocorrem dentro do ambiente de trocas.

Desse modo, é observável, então, o domínio fático que quem é dono da criptomoeda ou do ativo virtual exerce sobre eles, uma vez que eles estão registrados e aprovados perante a rede, ou seja, o título ou registro, além de que o dono pode então usar, dispor e fruir do objeto sem impedimentos perante aqueles que pertencem a rede compartilhada.


4 AS COLOCAÇÕES SOBRE OS OBJETOS VIRTUAIS NA LEGISLAÇÃO E JURISPRUDÊNCIA PÁTRIA

Observado no capítulo anterior como é a interação dos objetos virtuais com as denominações doutrinárias do Direito das Coisas, cabe agora discorrer sobre a forma que o legislador e os tribunais caracterizam os objetos virtuais.

4.1 A Legislação

Na legislação pátria, leis relacionadas aos criptoativos podem ser caracterizadas como quase inexistentes, apesar de que existem projetos de lei aguardando votação e aprovação que podem vir a suprir parcialmente essa necessidade legislativa.

Normativamente, os órgãos financeiros e tributários são os que mais se destacam quanto à disposição em relação aos objetos virtuais e a prevenção de ilegalidades referentes a atuação com os mesmos.

4.1.1 Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil, Nº 1888, de 03 de maio de 2019

Primeiramente, tem-se a Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil, Nº 1888, de 03 de maio de 2019. Tal instrução “Institui e disciplina a obrigatoriedade de prestação de informações relativas às operações realizadas com criptoativos à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB). ” (BRASIL, 2019, não paginado). Ainda, ela traz Definições (Capitulo II, art. 5º), a Obrigatoriedade de Prestação de Informações (Capítulo III, art. 6º), as Informações sobre Operações com Criptoativos (a serem compartilhadas) (Capitulo IV, art. 7º), o Prazo para Prestação das Informações (Capitulo V, art. 8º) e as Penalidades (Capitulo VI, art. 10).

Em tal Instrução Normativa, a Receita Federal (Brasil, 2019, não paginado) caracteriza

Art. 5º Para fins do disposto nesta Instrução Normativa, considera-se:

I - criptoativo: a representação digital de valor denominada em sua própria unidade de conta, cujo preço pode ser expresso em moeda soberana local ou estrangeira, transacionado eletronicamente com a utilização de criptografia e de tecnologias de registros distribuídos, que pode ser utilizado como forma de investimento, instrumento de transferência de valores ou acesso a serviços, e que não constitui moeda de curso legal; e

II - exchange de criptoativo: a pessoa jurídica, ainda que não financeira, que oferece serviços referentes a operações realizadas com criptoativos, inclusive intermediação, negociação ou custódia, e que pode aceitar quaisquer meios de pagamento, inclusive outros criptoativos.

Parágrafo único. Incluem-se no conceito de intermediação de operações realizadas com criptoativos, a disponibilização de ambientes para a realização das operações de compra e venda de criptoativo realizadas entre os próprios usuários de seus serviços.

Observa-se que, a Receita Federal generaliza os ativos virtuais e as criptomoedas para fazer tal definição de criptoativos, e, ainda, conforme o parágrafo único, ela ainda considera passível de fiscalização os ambientes virtuais nos quais é possível realizar compra e venda de criptoativos.

Como conceituado no Capítulo 2 deste trabalho, existem objetos virtuais que não sofrem tratamento criptográfico para a sua atribuição de valor, e a Receita Federal está de olho nesses objetos afim de tributa-los, além dos ambientes virtuais, cuja negociação também está abarcada nesse sentido.

Ainda, como observado no inciso I do art. 5º, a Receita Federal não considera criptoativo moeda que seja de curso legal, ou, conforme o dicionário jurídico do site Vade Mecum Brasil (2022, não paginado), “Modalidade que, por força de lei, não pode ser recusada como meio de pagamento. Caracteriza contravenção penal recusar-se a receber, pelo seu valor, moeda de curso legal no país. ” Nesse sentido, a Receita não abarca os criptoativos que são reconhecidos legalmente, uma vez que a legislação tributária nesse caso é a já existente. Observa-se, então, a intenção do órgão de tributar mesmo aquilo que está à margem da lei.

No art. 6º, a Receita (BRASIL, 2019, não paginado) estabelece quando as informações sobre as operações deverão ser prestadas

Art. 6º Fica obrigada à prestação das informações a que se refere o art. 1º:

I - a exchange de criptoativos domiciliada para fins tributários no Brasil;

II - a pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no Brasil quando:

a) as operações forem realizadas em exchange domiciliada no exterior; ou

b) as operações não forem realizadas em exchange.

§ 1º No caso previsto no inciso II do caput, as informações deverão ser prestadas sempre que o valor mensal das operações, isolado ou conjuntamente, ultrapassar R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

§ 2º A obrigatoriedade de prestar informações aplica-se à pessoa física ou jurídica que realizar quaisquer das operações com criptoativos relacionadas a seguir:

I - compra e venda;

II - permuta;

III - doação;

IV - transferência de criptoativo para a exchange;

V - retirada de criptoativo da exchange;

VI - cessão temporária (aluguel);

VII - dação em pagamento;

VIII - emissão; e

IX - outras operações que impliquem em transferência de criptoativos.

Nesse caso, observa-se no §2º que a Receita estabeleceu um rol exemplificativo em relação as formas de transferência dos criptoativos, uma vez que a tentativa de exaurir todas as possibilidades de transferência dos mesmos é infrutífera e praticamente irreal, uma vez que se leva em conta a natureza mutável e o grande número de criptoativos e métodos de transferência que se cria para tais objetos virtuais.

Em relação as informações pertinentes, a Receita Federal (BRASIL, 2019, não paginado) dispõe

Art. 7º Deverão ser informados para cada operação:

I - nos casos previstos no inciso I e na alínea “b” do inciso II do caput do art. 6º:

a) a data da operação;

b) o tipo da operação, conforme o § 2º do art. 6º;

c) os titulares da operação;

d) os criptoativos usados na operação;

e) a quantidade de criptoativos negociados, em unidades, até a décima casa decimal;

f) o valor da operação, em reais, excluídas as taxas de serviço cobradas para a execução da operação, quando houver;

g) o valor das taxas de serviços cobradas para a execução da operação, em reais, quando houver; e [...]

Observa-se, assim, que o órgão tributário e aduaneiro se preocupa principalmente, com o valor exato da operação e quem a realiza.

Deixando de lado os outros tópicos da instrução normativa, a mesma é robusta em relação ao que busca alcançar, que é a garantia da tributação em relação as operações com criptoativos, uma vez que este é a função da Receita Federal. Entretanto, apesar de dispor sobre o que vem a ser criptoativo, tal disposição não classifica o que vem a ser objeto virtual para outros fins e, portanto, não contribui para encerrar o silencio legislativo em relação ao tema.

4.1.2 Parecer de Orientação CVM nº 40, de 11 de outubro de 2022

Nesse Parecer, a Comissão de Valores Mobiliários (BRASIL, 2022, pág. 2) estabelece

Este Parecer de Orientação consolida4 o entendimento da CVM sobre as normas aplicáveis aos criptoativos que forem valores mobiliários. Desse modo, este trabalho esclarece os limites de atuação da Autarquia e a forma como a CVM pode e deve exercer seus poderes para normatizar, fiscalizar e disciplinar a atuação dos integrantes do mercado de capitais.

Nesse sentido, a Comissão de Valores Mobiliários busca estabelecer regras sobre os criptoativos que se caracterizam pelo seu valor mobiliário. Ainda, eles estabelecem o que vem a ser criptoativo conforme o entendimento da Comissão. Dessa forma, a CVM (BRASIL, 2022, pág. 1) esclarece

Criptoativos são ativos representados digitalmente, protegidos por criptografia, que podem ser objeto de transações executadas e armazenadas por meio de tecnologias de registro distribuído (Distributed Ledger Technologies – DLTs)1. Usualmente, os criptoativos (ou a sua propriedade) são representados por tokens, que são títulos digitais intangíveis.

Desse modo, observa-se a tentativa da Comissão de Valores Mobiliários de estabelecer regulamentação especifica em relação aos tokens, ou, como estabelecido no Capitulo 2, especialmente aos tokens que referenciam ativos tanto no mundo virtual, quanto do mundo real, uma vez que estes podem ter objeto referenciado ao qual a Comissão possui a função de regulamentar.

Entretanto, ainda nesse quesito, a Comissão (BRASIL, 2022) “entende que o ativo pode ou não possuir valor mobiliário, uma vez que isso dependerá da essência econômica dos direitos transferidos e as funções conferidas aos titulares dos mesmos”.

Ainda assim, a Comissão (BRASIL, 2022, pág. 5) discorre

Nesse sentido, vale mencionar que a prática de mercado vem demonstrando que um token pode representar não só ativos, como também direitos de remuneração por empreendimento, direito a receber relacionado a estruturas assemelhadas às de securitização, ou, ainda, direito de voto13. A esse respeito, notamos que alguns desses modelos aproximam os tokens emitidos do conceito de valor mobiliário e, tendo isso em vista, reforçamos que referida taxonomia não se propõe a consolidar uma definição taxativa de cada classificação, tampouco a limitar o alcance desta Autarquia, cuja atuação dependerá da análise dos casos em concreto.

Vale lembrar que a classificação de valores mobiliários está elencada no art. 2º da Lei nº 6.385/76, e, conforme discorre a Comissão (BRASIL, 2022, pág. 6)

Ainda que os criptoativos não estejam expressamente incluídos entre os valores mobiliários citados nos incisos do art. 2º da Lei nº 6.385/76, os agentes de mercado devem analisar as características de cada criptoativo com o objetivo de determinar se é valor mobiliário, o que ocorre quando:

(i) é a representação digital de algum dos valores mobiliários previstos taxativamente nos incisos I a VIII do art. 2º da Lei nº 6.385/76 e/ou previstos na Lei nº 14.430/2022 (i.e., certificados de recebíveis em geral); ou

(ii) enquadra-se no conceito aberto de valor mobiliário do inciso IX do art. 2º da Lei nº 6.385/76, na medida em que seja contrato de investimento coletivo

Neste diapasão, observa-se que a Comissão de Valores Mobiliários não tenta classificar nem os objetos virtuais, nem os criptoativos, mas sim busca trazer à luz tal assunto e tenta trazer atenção legislativa em relação ao assunto, uma vez que a Comissão (BRASIL, 2022) acredita que “a luz do sol é um dos melhores desinfetantes; e a luz elétrica é um dos melhores policiais”.

Deste modo, a Autarquia demonstra sua preocupação em evitar fraudes e trazer segurança para o investidor que pretende ou já está investindo em tokens que podem gerar ao mesmo consequências referentes a sua propriedade.

4.1.3 Projeto de lei nº 4401, de 2021 (nº 2.303/2015, na Câmara dos Deputados)

Conforme o texto deste dispositivo, o legislador afirma “Art. 1º Esta Lei dispõe sobre as diretrizes a serem observadas na prestação de serviços de ativos virtuais e na sua regulamentação. ” (BRASIL, 2021, pág. 2). Novamente se percebe que a intenção legislativa não é abarcar diretamente sobre o que são os objetos virtuais nem os criptoativos, mas sim regular a atuação de quem negocia e transfere tais objetos. Desse modo, o silêncio legislativo perdura.

Tal projeto de lei também abarca modificações sobre crimes quando praticados durante a atuação com criptoativo e enquadra as prestadoras de serviços relacionados com criptoativos como sujeitas a aplicação das leis n. º 7.492, de 16 de junho de 1986 (que define os crimes contra o sistema financeiro nacional), e 9.613, de 3 de março de 1998 (que dispõe sobre os crimes de "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores).

Deste modo, tem-se a classificação utilizada para essa lei em relação ao que vem a ser ativo virtual, sendo

Art. 3º Para os efeitos desta Lei, considera-se ativo virtual a representação digital de valor que pode ser negociada ou transferida por meios eletrônicos e utilizada para a realização de pagamentos ou com o propósito de investimento, não incluídos:

I - moeda nacional e moedas estrangeiras;

II - moeda eletrônica, nos termos da Lei nº 12.865, de 9 de outubro de 2013;

III - instrumentos que provejam ao seu titular acesso a produtos ou serviços especificados ou a benefício proveniente desses produtos ou serviços, a exemplo de pontos e recompensas de programas de fidelidade; e

IV - representações de ativos cuja emissão, escrituração, negociação ou liquidação esteja prevista em lei ou regulamento, a exemplo de valores mobiliários e de ativos financeiros.

Parágrafo único. Competirá ao órgão ou à entidade da administração pública federal indicada em ato do Poder Executivo estabelecer quais serão os ativos financeiros regulados, para fins desta Lei. (BRASIL, 2021, pág. 2-3)

Observa-se, então, que tal dispositivo utiliza terminologia diferente da usada nos outros dispositivos citados neste trabalho, tal seja ‘ativo virtual’ e não ‘criptoativo’, além de que faz uso de uma exemplificação exclusiva, onde o legislador somente se dá ao trabalho de tentar retirar do arcabouço do termo ‘ativo virtual’ aquelas possibilidades incluídas em seus incisos.

Assim sendo, tal legislação possui o intuito de esclarecer minimamente em relação ao tema em questão e propõe modificações na lei punitiva em relação a atuação referente a tal tipo de objeto.

4.1.4 Comunicado BACEN Nº 25306 DE 19/02/2014

Inicialmente, temos os dizeres em relação ao objetivo de tal comunicado, tendo o Banco Central (COMUNICADO, 2014, não paginado) dito: “Esclarece sobre os riscos decorrentes da aquisição das chamadas "moedas virtuais" ou "moedas criptografadas" e da realização de transações com elas. ” Nesse sentido, observa-se que a autarquia olhava para as moedas virtuais com olhos atentos, alertando para os riscos aparentes em relação a negociação de tais objetos.

Assim, eles caracterizam primeiramente em relação a visão da autarquia em relação a caracterização em relação as moedas virtuais

O Banco Central do Brasil esclarece, inicialmente, que as chamadas moedas virtuais não se confundem com a "moeda eletrônica" de que tratam a Lei nº 12.865, de 9 de outubro de 2013, e sua regulamentação infralegal. Moedas eletrônicas, conforme disciplinadas por esses atos normativos, são recursos armazenados em dispositivo ou sistema eletrônico que permitem ao usuário final efetuar transação de pagamento denominada em moeda nacional. Por sua vez, as chamadas moedas virtuais possuem forma própria de denominação, ou seja, são denominadas em unidade de conta distinta das moedas emitidas por governos soberanos, e não se caracterizam dispositivo ou sistema eletrônico para armazenamento em reais. (COMUNICADO, 2014, não paginado)

Deste modo, observa-se a crítica do Bacen as moedas virtuais quando se trata da falta de regulação por parte de governos soberanos sobre esses objetos, devido ao fato de que elas se caracterizam, principalmente, por suas denominadoras próprias de emissão. Além disso, o Bacen não considera as moedas virtuais como dispositivo de armazenamento de reais, ou seja, eles não são reconhecidos como forma eletrônica de dinheiro, discorrendo

3. As chamadas moedas virtuais não são emitidas nem garantidas por uma autoridade monetária. Algumas são emitidas e intermediadas por entidades não financeiras e outras não têm sequer uma entidade responsável por sua emissão. Em ambos os casos, as entidades e pessoas que emitem ou fazem a intermediação desses ativos virtuais não são reguladas nem supervisionadas por autoridades monetárias de qualquer país. (COMUNICADO, 2014, não paginado)

Nesse sentido, vale ainda destacar o dispositivo mencionado pela autarquia, tal seja a Lei nº 12.865, onde

Art. 6º Para os efeitos das normas aplicáveis aos arranjos e às instituições de pagamento que passam a integrar o Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB), nos termos desta Lei, considera-se:

[...]

VI - moeda eletrônica - recursos armazenados em dispositivo ou sistema eletrônico que permitem ao usuário final efetuar transação de pagamento.

[...] (BRASIL, 2013, não paginado)

Deste modo, o Banco Central não considera as moedas virtuais como forma de armazenamento de reais, nem como forma de moeda eletrônica, dessa forma descaracterizando as mesmas como forma de dinheiro, nesse sentido discorrendo

4. Essas chamadas moedas virtuais não têm garantia de conversão para a moeda oficial, tampouco são garantidos por ativo real de qualquer espécie. O valor de conversão de um ativo conhecido como moeda virtual para moedas emitidas por autoridades monetárias depende da credibilidade e da confiança que os agentes de mercado possuam na aceitação da chamada moeda virtual como meio de troca e das expectativas de sua valorização. Não há, portanto, nenhum mecanismo governamental que garanta o valor em moeda oficial dos instrumentos conhecidos como moedas virtuais, ficando todo o risco de sua aceitação nas mãos dos usuários. (COMUNICADO, 2014, não paginado)

Observa-se, então, que o Banco Central busca alertar os usuários em relação aos riscos das transações realizadas com as moedas virtuais, mas “acompanha as discussões sobre sua natureza, propriedade e funcionamento para os foros internacionais” (COMUNICADO, 2014), de onde tiram seu embasamento. Vale lembra, também, que a autarquia reiterou esse entendimento através do VOTO 246/2017-BCB, de 14 de novembro de 2017.

Deste modo, o Banco Central não busca caracterizar as moedas virtuais, muito menos os objetos virtuais, mas busca aumentar o alerta em relação a esse tipo de objeto e dissuadir usuários que buscam começar a investir nesse segmento.

Conclui-se então a falta de normatização concreta em relação ao tema além da falta de uniformização dos termos utilizados para a denominação por parte de cada uma das autarquias que dispuseram normas em relação ao tema proposto. Também se observa que tais entidades veem os objetos tratados nesse tema com maus olhos, alertando para os riscos relacionados aos investimentos e transações realizadas com tais ativos.

4.2 A Jurisprudência

Estabelecidas quais são as colocações da legislação pátria em relação aos objetos virtuais, cabe agora esclarecer as posições dos tribunais em relação aos mesmos. Considerando que as jurisprudências pertinentes são esparsas, discorre-se.

Em relação aos objetos virtuais, tem-se a decisão Apelação Cível número 0043319-12.2010.8.24.0038, onde, entre outras demandas, o apelante requer

[...] REQUERIMENTO DE DEVOLUÇÃO DE MATERIAIS ENTREGUES AO FRANQUEADO. DESPROVIMENTO. BENS ESTES QUE SE TRATAM DE OBJETOS VIRTUAIS (LOGOTIPO, SISTEMA OPERACIONAL). AUSÊNCIA DE PROVA DE QUE ITENS FÍSICOS TENHAM SIDO ENTREGUES AO RECORRIDO. [...] (SANTA CATARINA, Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 0043319-12.2010.8.24.0038. Relatora: Desembargadora Rejane Andersen. Joinville. 19 de março de 2019. Não paginado)

Observa-se então que, uma vez rescindindo o contrato entre o apelante e o apelado, aquele requereu a devolução dos objetos ao qual o contrato se referia, tal seja o acesso à intranet da empresa Recursos Humanos do Brasil Ltda., além dos logotipos e do sistema operacional da mesma, alegando que ocorreu a entrega de material relacionado que permitia o acesso do apelado ao objeto do contrato.

Em relação a esse argumento, a Relatora discorre

Outrossim, conforme se depreende do pactuado entre os litigantes, vê-se que o franqueado recebeu senha de acesso à intranet, onde estariam localizados os manuais de procedimentos, modelos de contrato, entre outros.

Desta forma, infere-se que, embora tenha existido a disponibilização para acesso a tais materiais, tem-se que estes se tratam de documentos virtuais e não físicos, tanto é que, no parágrafo primeiro da cláusula quarta do contrato primitivo de franquia, fica clara a recomendação de devolução dos materiais recebidos e apagamento de arquivos.

Ou seja, no presente caso, se torna totalmente inócuo o pedido de devolução de materiais eletrônicos (tais como logotipo, sistema operacional, entre outros), isso porque não há prova de que a parte requerida esteja se utilizando de tais objetos, inexistindo substrato probatório, inclusive, no sentido de que existam objetos físicos para serem devolvidos aos recorrentes. (SANTA CATARINA, Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 0043319-12.2010.8.24.0038. Relatora: Desembargadora Rejane Andersen. Joinville. 19 de março de 2019. Não paginado)

Deste modo, observa-se a interpretação da relatora em relação ao fato de que, a não ser que o contratante esteja utilizando injustamente o objeto virtual contratado, não há sentido na devolução dos materiais eletrônicos, já que, seguindo essa interpretação, o usuário contratante estaria cumprindo uma obrigação de não fazer uso dos objetos virtuais uma vez que o contrato fosse rescindido, nesse sentido sendo impedido de utilizar a intranet da contratada, além da impossibilidade da devolução dos objetos virtuais, visto sua intangibilidade.

Ainda na questão de objetos virtuais, há a Apelação Cível número 1.0000.20.561817-6/002, onde observa-se o seguinte

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - BLOQUEIO DE CONTA DO AUTOR NO JOGO ELETRÔNICO "FREE FIRE" [...] PROVAS INDICATIVAS DA UTILIZAÇÃO DE VANTAGEM IRREGULAR (DENOMINADA "HACK") - AUTOR QUE DESISTIU EXPRESSAMENTE DA PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL - VIOLAÇÃO AOS TERMOS DE USO DO JOGO - AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE NA SUSPENSÃO DA CONTA - CIÊNCIA DOS TERMOS E CONDIÇÕES DE USO - REQUISITO PARA ACESSAR O JOGO DISPONIBILIZADO - PEDIDO DE DEVOLUÇÃO DE ITENS VIRTUAIS ADQUIRIDOS PELO AUTOR - DESCABIMENTO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO NÃO PROVIDO. (MINAS GERAIS, Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 1.0000.20.561817-6/002 Relator: Desembargadora Mariangela Meyer. Belo Horizonte. 15 de nov. de 2022. Não paginado.)

Neste caso, ocorre a insatisfação do usuário que teve sua conta bloqueada após denúncias de uso de vantagem indevida dentro do jogo, onde o mesmo requer o acesso à conta ou a devolução dos valores gastos com moedas do jogo que não foram utilizadas ao momento do banimento.

Nesse sentido, “O apelante, por sua vez, discorda de forma genérica da adoção de telas sistêmicas e denúncias de outros jogadores como meio de prova apto a embasar as alegações da requerida. [...]” (MINAS GERAIS, Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 1.0000.20.561817-6/002 Relator: Desembargadora Mariangela Meyer. Belo Horizonte. 15 de nov. de 2022. Não paginado.), além “[...] da abusividade na sua revogação unilateral [...]”.

Deste modo, a desembargadora discorre

- Sobre o uso de telas de sistema, deve ser levado em consideração que, no caso específico dos autos, e em se tratando de uma fraude virtual, os elementos de prova de sua ocorrência decorrem de mecanismos igualmente virtuais, desprovidos de um lastro documental como normalmente se verifica.

- O uso de softwares suspeitos/não autorizados dentro do jogo, ou seja, o hack, leva à vantagem desleal, em afronta à segurança ao ambiente virtual e ao direito de propriedade intelectual da empresa ré, configurando contrariedade aos termos de uso ao qual aderiu o autor.

- Portanto, não se mostrou abusiva a conduta das requeridas ao bloquearem o cadastro da conta por violação dos termos de serviço em questão, agindo no exercício regular de seu direito ao desativarem a possibilidade de utilização.

- A leitura efetiva dos termos de uso, ou não, é de responsabilidade de cada um, mas evidentemente que ao indicar que houve leitura e aceitação não pode pretender por questão verdadeiramente ética alegar desconhecer o regramento que acabou de mencionar conhecer. (MINAS GERAIS, Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 1.0000.20.561817-6/002 Relator: Desembargadora Mariangela Meyer. Belo Horizonte. 15 de nov. de 2022. Não paginado.)

Desta forma, observa-se que os tribunais reconhecem a natureza intangível dos objetos virtuais, além da sua existência como parte da propriedade intelectual ou industrial das empresas que dispõem os mesmos para o uso daqueles que concordam com os termos de uso, desta forma garantindo as mesmas o direito de revogação caso se comprove a violação dos mesmos. Ainda assim, a propriedade dos objetos virtuais vai depender da forma como seu uso é disponibilizado, não sendo possível afirmar com certeza que todas as empresas disponibilizam sua propriedade intelectual de forma não onerosa ou até mesmo com disposição em relação aos frutos adquiridos através das mesmas.

Em relação as criptomoedas, observa-se o Agravo de Instrumento n° 0026506-94.2020.8.16.0000, onde se discute a tutela de urgência em relação ao bloqueio de criptomoedas, ainda classificando sua natureza jurídica como controversa, discorrendo na ementa o seguinte

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA COM RESTITUIÇÃO DE VALORES. – TUTELA DE URGÊNCIA CAUTELAR. BLOQUEIO DE BITCOINS (CRIPTOMOEDA). ATIVO FINANCEIRO NÃO REGULAMENTADO POR LEI. NATUREZA JURÍDICA CONTROVERSA. CONCEITO PREVISTO NA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 1.888/2019 DA RECEITA FEDERAL. OBJETO PENHORÁVEL ANÁLOGO A TÍTULOS E VALORES MOBILIÁRIOS COM COTAÇÃO NO MERCADO (ART. 835, III, CPC). NECESSIDADE DE LIQUIDAÇÃO ANTECIPADA EM DE SUA VOLATILIDADE (ART. 852, I, CPC). – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (PARANÁ. TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento n° 0026506-94.2020.8.16.0000 Relator: Juiz Subst. 2ºGrau Rafael Vieira de Vasconcellos Pedroso. Arapoti. 13 de nov. de 2020. Não paginado)

Observa-se, nesse agravo, que a 9º Câmara Cível de Arapoti inclina sua interpretação em relação ao entendimento de que até mesmo as criptomoedas são consideradas criptoativos, uma vez que, invocando a Instrução Normativa nº 1888/2019 da Receita Federal, o Relator traz para a interpretação dada pela autarquia os objetos discutidos na demanda. Nesse sentido, ele ainda classifica a criptomoeda em questão, tal seja a Bitcoin, como valor mobiliário com cotação no mercado e, ainda, suscetível a penhora.

Ainda, em sua fundamentação, o Relator discorre

O receio manifestado pelo juízo a quo, porém, não é destituído de fundamento. Há grande incerteza quanto ao regime aplicável às criptomoedas, especialmente porque a doutrina diverge quanto à sua natureza jurídica e até o momento o Congresso Nacional não lhes deu disciplina legal. Um dos poucos instrumentos normativos que deles tratam é a Instrução Normativa nº 1.888/2019, expedida pela Receita Federal.

[...]

Uma vez que os criptoativos têm valor conversível em moeda corrente e são transacionáveis, parece possível equipará-los aos “títulos e valores mobiliários com cotação no mercado” mencionados pelo artigo 835, inciso III, do CPC.

Aliás, a competência da CVM para fiscalizar as corretoras de criptoativos se funda justamente na qualificação dos contratos de investimento coletivo que elas oferecem a seus clientes como valores mobiliários, nos termos do art. 2º, IX da Lei nº 6.385/1976. (PARANÁ. TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento n° 0026506-94.2020.8.16.0000 Relator: Juiz Subst. 2ºGrau Rafael Vieira de Vasconcellos Pedroso. Arapoti. 13 de nov. de 2020. Não paginado)

Ainda neste assunto, tem-se a Agravo de Instrumento n. 0046714-76.2021.8.21.7000, onde se discute o cumprimento de uma sentença de alimentos a partir de um oficio para corretoras de ativos digitais, tem-se o julgado

Inicialmente, esclareço que o mercado de criptomoedas não faz parte do Sistema Financeira Nacional, nesse sentido adoto trecho explicativo do parecer ministerial exarado pela ilustre Procuradora de Justiça Synara Jacques Buttelli Göelzer, a fim de evitar tautologia:

Por conta disso, as criptomoedas são operadas por corretoras conhecidas como Exchange, que não compõem o Sistema Financeiro Nacional. E apesar de a inexistência de regulação não ser empecilho para a constrição desses ativos digitais, tanto é que já existem precedentes sobre o tema, mostra-se temerário o deferimento do pedido formulado pelas agravantes.

[...] Ciente de que esse mercado poderia permitir a ocultação de patrimônio, a Receita Federal editou a Instrução Normativa nº 1.888, de 03 de maio de 2019, que obriga os operadores de ativos digitais a prestar informações sempre que o valor mensal das operações, isolado ou conjuntamente, ultrapassar R$ 30.000,001.

Dessa forma, considerando a ausência de regulamentação do nosso sistema financeiro, inviável o deferimento de expedição de ofícios para as corretoras de criptomoeda, visto que se trata de operações realizadas entre os usuários e de forma anônima.

No entanto, como bem elucidado pela Procuradora de Justiça, e considerando o débito alimentar, entendo ser possível a expedição de ofício para Receita Federal, para que informe dados relativos às operações realizadas com criptoativos em nome do agravado, consoante dispõe o art. 6º da INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 1.888, DE 3 DE MAIO DE 2019.

Logo, dou parcial provimento ao agravo de instrumento. (RIO GRANDE DO SUL, Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento n. 0046714-76.2021.8.21.7000. Relator: Dr. Mauro Caum Gonçalves. Porto Alegre. 07 de abr. de 2022. Não paginado)

Desse modo, novamente observa-se entendimento de que a propriedade dos criptoativos é visualizada através das movimentações percebidas pela Receita Federal, assim como a sua regulamentação se dá através das Instrução Normativa nº 1888 da mesma autarquia, nesse sentido ainda destacando a ausência de leis relacionadas ao tema.

Portanto, observa-se o entendimento dos tribunais em relação aos criptoativos e das criptomoedas quanto a sua classificação como ativos de valor mobiliário, ainda os considerando objetos possíveis de penhora, nesse sentido ainda concordando na classificação como visualização de patrimônio passível de tributação, atribuindo continência normativa aos dizeres disponibilizados pela Receita Federal. Deste modo, é plausível considerar os objetos virtuais em questão como um dos muitos objetos passiveis de apropriação na qual fala o Direito das Coisas, ou seja, propriedade.


5. CONCLUSÃO

Pode-se constatar, a partir da análise contida nesse trabalho, que existe uma expressiva lacuna legal, jurisprudencial e conceitual em relação ao tema dos objetos virtuais.

Foi observado que, a partir das análises de autores contemporâneos e das propostas dos idealizadores, que as criptomoedas foram criadas com o intuito de estabelecer uma nova modalidade de dinheiro eletrônico sem a validação de um organismo estatal, tal como bancos centrais, utilizando-se apenas da confiança dos usuários de uma rede de registros compartilhados para atribuir e gerar valor em relação à moeda criptográfica. Tal valoração se dá através da limitação da criação de tal objeto, deste modo criando, também, uma escassez virtual quase que absoluta em relação ao objeto.

Do mesmo modo, os criptoativos são criados da mesma forma que as criptomoedas, ou seja, a partir de uma rede de registros compartilhada, onde se registra a propriedade de um ativo, seja ele virtual ou real, e se anuncia para os outros usuários da rede tal fato, onde se obtém uma ficha infungível que representa tal propriedade. Nesse sentido, há ainda os contratos inteligentes, que demonstram a transferência de propriedade entre um usuário e outro, sem o intermédio de cortes e juízes, uma vez que eles são auto executáveis, sendo realizados dentro da rede de registros compartilhada.

Em discordância dessas duas possibilidades, existem ainda os objetos virtuais que são negociados através de licença de uso ou a partir de anuência de termos de serviço, constituído uma forma de direito pessoal. Nesse caso, não existe a comunicabilidade entre o valor gasto em relação aos objetos e um retorno monetário para o usuário, uma vez que eles constituem direito autoral da empresa ou entidade que os criou, sendo uma das muitas facetas da criação artística da pessoa jurídica e de seus empregados, constituindo objeto que a empresa dispõe, mas não aliena no momento da assinatura dos termos de uso, não sendo possível para o usuário obter propriedade nem dispor sobre aquele bem.

Mais adiante foi observado as mais diversas interações dos ramos do direito com os avanças tecnológicos e com os objetos virtuais. Nesse sentido, o Direito administrativo faz uso de registros eletrônicos públicos para identificar e registrar pessoas físicas e jurídicas, além de sistema de escrituração eletrônico que busca integralizar os mais diversos órgãos administrativos da federação afim de atingir uma atuação mais eficiente.

Em uma problemática diferente, o Direito Tributário traz à tona questões em relação a tributação em relação aos objetos pertencentes ao mundo virtual, principalmente se eles devem ou não ser tributados da mesma forma que um objeto físico.

Ainda em relação aos ramos do Direito, o Direito Penal busca esclarecer se existe a necessidade da intervenção deste ramo em relação aos assuntos relacionados com os objetos virtuais, uma vez que esse ramo do direito é considerado a última razão em relação a interferência da lei nas relações interpessoais. Nesse sentido, o Direito Penal questiona também se os crimes já existentes deveriam ser adaptados a fim de abarcar as novas condutas cometidas em relação aos objetos virtuais.

Sendo o foco deste trabalho, foi concluído que o Direito das Coisas é o conjunto de regras e princípios que são utilizados para estabelecer a relação do homem e aqueles objetos que ele se apropria, assim como os direitos e deveres que emanam daquela relação jurídica.

Em relação as temáticas desse ramo do direito, tem-se que as Coisas são aqueles objetos, anteriormente pertencentes a uma multitude ou a um todo, que passam a constituir uma coisa individualizada em relação a essa multitude, e a partir dessa individualização é que se torna possível atribuir Posse e Propriedade em relação a tal coisa.

Neste diapasão, Posse é um estado de fato, abarcado e protegido pelo Direito, que é descrito legalmente como o exercício de alguma das atribuições em relação a propriedade, no sentido de que quem possui não é dono da coisa, estando apenas legitimamente no estado de posse aquele que não o faz de forma ilegítima e violenta.

Ainda nesse ponto, a Posse emana da Propriedade, que por sua vez é um direito basilar, associado ao bem-estar do ser humano, onde existe a possibilidade de usar, dispor e fruir da coisa apropriada, desde que nos limites da função social da propriedade, estabelecidos constitucionalmente, e ainda através do registro legalmente constituído e público em relação a quem a detém e o direito.

Observados esses posicionamentos, pode-se atribuir o estado de coisa para os objetos virtuais, desde que os mesmos passem por individualização e não constituam patrimônio intelectual ou industrial de alguma pessoa física ou jurídica.

Deste modo, é plenamente plausível que se exerça em relação a um objeto virtual o direito de propriedade, uma vez que a individualização do objeto virtual predispõe a associação do mesmo com a assinatura digital de um usuário, dessa forma mostrando aos outros usuários quem é o dono daquele objeto. Da mesma forma, a posse também pode ser exercida, uma vez que existe a possibilidade de disposição dos objetos sem que se perca a propriedade dos mesmos.

Quanto à legislação pertinente ao tema em questão, temos Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil, Nº 1888, de 03 de maio de 2019, que busca regulamentar a obrigatoriedade de prestação de contas por parte dos operadores de valores em criptoativos, uma vez que tais movimentações podem demonstrar aumento de capital, o que é tributável. Apesar de definir o que vem a ser criptoativo, tal Instrução Normativa não é capaz de suprir a necessidade legislativa em relação ao tema.

Tem-se também o Parecer de Orientação CVM nº 40, de 11 de outubro de 2022, da Comissão de Valores Mobiliários, que também busca regulamentar quanto aos criptoativos que podem vir a ser considerados valores mobiliários, estabelecendo a definição dos mesmos perante o entendimento da autarquia. Entretanto, da mesma forma que a Receita Federal, tal parecer só busca suprir as lacunas relacionadas a área de atuação da Comissão, assim como evitar fraudes e trazer mais ênfase em relação ao tema tratado.

Sendo um dos únicos projetos legislativos referentes ao tema, o Projeto de lei nº 4401, de 2021, propõe, quase que exclusivamente, modificações nas leis punitivas referentes a crimes contra o sistema financeiro e crimes de lavagem ou ocultação de valores e bens. Apesar de sua intenção ser boa e de classificar o que vem a ser criptoativos de uma forma genérica e excludente, o projeto de lei não esclarece sobre a natureza dos objetos em questão, além de usar terminologia divergente em relação a outros dispositivos.

Por último, ainda em relação as disposições feitas pelas autarquias federais, tem-se o Comunicado BACEN Nº 25306 DE 19/02/2014, que vem inicialmente como uma crítica e um alerta em relação as criptomoedas e sua falta de regulamentação estatal. Apesar de esclarecer alguns pontos no que se refere as criptomoedas, novamente não existe classificação quanto a sua natureza em tal dispositivo.

Deste modo, observa-se o silencio legislativo em relação ao tema em questão, o que obriga aos operadores do direito a buscar interpretações estrangeiras em relação ao tema a fim de suprir a necessidade contemporânea em relação propriedade desses objetos.

Esse fato se reflete nos julgamentos dos tribunais. Em relação aos objetos virtuais como um todo, é reconhecida a sua intangibilidade, porém, dependendo da forma como são dispostos, eles podem ser considerados partes integrantes do patrimônio intelectual e industrial de pessoas físicas e jurídicas, dessa forma, aplica-se a lei em relação ao direito autoral ou ao direito do consumidor quando se ocorre dúvidas ou litígios em relação a tal tema.

Entretanto, quando se trata de criptoativos e criptomoedas, os tribunais recorrem a Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil Nº 1888 para auxiliar na elucidação dos litígios, uma vez que é reconhecidamente a legislação infra legal mais robusta em relação a temática em questão, da mesma forma que a autarquia fiscal em questão se mostra eficiente quando se trata de fiscalizar os ganhos percebidos em relação a investimentos com tais tipos de ativos e rastrear seus donos.

Desse modo, percebe-se uma necessidade legislativa em relação ao tema, uma vez que o mundo virtual está se tornando cada vez mais uma parte integrante e vital do cotidiano humano. Dito isso, é necessário que se observe o comportamento de quem investe no mundo virtual, além de que se entenda de maneira correta a forma de constituição dos objetos virtuais.

Da mesma forma, se mostra pertinente caracterizar os objetos virtuais dentro da classificação de coisas, aos quais as criptomoedas e criptoativos podem se aproximar da forma que o ouro é tratado atualmente, ou seja, um objeto com valor mobiliário, onde também se observa registro em relação à posse do mesmo.

Sugere-se, ainda, que ocorra a padronização dos termos utilizados legislativamente em relação ao tema, uma vez que, durante a elaboração deste trabalho, pode-se perceber que os termos fornecidos pelos estudiosos do tema não são correspondentes com aqueles utilizados nas tentativas legislativas avaliadas, assim como entre os mesmos dispositivos em questão, que não são congruentes uns com os outros.

Portanto, a dinâmica perceptível da Internet mudou drasticamente ao longo dos anos, dessa forma é importantíssimo que se leve em consideração as mudanças que ocorrem nesse ambiente, apesar de sua incrível mutabilidade, uma vez que boa parte das vidas humanas que ainda estão por vir será vivida em contato com tal realidade virtual.


REFERÊNCIAS

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Notas

  1. [...] A natureza dos objetos virtuais, desde o princípio dos computadores, é que eles não são escassos. Eles podem ser reproduzidos infinitamente, e, deste modo, era impossível fazer uma moeda a partir deles, já que enviá-los só iria duplica-los. [...] (AMMOUS, 2018, p. 170, tradução nossa).

  2. [...] Nakamoto conseguiu alcançar isso através do uso de algumas importantes, porém não amplamente compreendidas, tecnologias: uma rede par-a-par distribuída sem nenhum ponto de falha, hashing, assinaturas digitais e prova de trabalho. (AMMOUS, p. 171, tradução nossa).

  3. [...]. Cada transação tem de ser registrada por todos os membros da rede para que eles compartilhem um registro comum dos saldos e transações. Toda vez que um membro da rede transfere uma quantia para outro membro, todos os membros da rede podem verificar se quem envia tem saldo suficiente, e os nós (da corrente) competem para ser o primeiro a atualizar o registro com um novo bloco de transações a cada dez minutos. Para que um nó apresente um bloco de transações para o registro, ele tem de gastar poder de processamento resolvendo complicados problemas matemáticos, que são difíceis de solucionar, mas cuja solução é fácil de verificar. Isto é o sistema de prova de trabalho, [...]. Uma vez que um nó resolve a prova de trabalho corretamente e anuncia as transações, outros nós da rede votam a sua validade, e, quando a maioria tenha votado para aprovar o bloco, os nós começam a apresentar transações para um novo bloco que será emendado ao anterior e resolvem a prova de trabalho para ele. [...] (AMMOUS, 2018, p. 171-172, tradução nossa).

  4. Com esse projeto tecnológico, Nakamoto foi capaz de inventar escassez virtual. Bitcoin foi o primeiro exemplo de um bem digital que é escasso e não pode ser reproduzido infinitamente. Enquanto é trivial enviar um objeto virtual de uma localização para a outra na rede digital, [...], é mais fácil descrever esses processos como copiar ao invés de enviar, por que os objetos digitais permanecem com quem envia e podem ser reproduzidos infinitamente. Bitcoin foi o primeiro exemplo de bem digital cuja transferência impede a sua posse por aquele que transfere. (AMMOUS, p. 174, tradução nossa).

  5. [...], Bitcoin é também o primeiro exemplo de escassez absoluta, a única comódite liquida (física ou digital) com uma quantidade fixada que não pode ser concebivelmente aumentada. Até a invenção do Bitcoin, escassez sempre foi relativa, nunca absoluta. É um equívoco comum imaginar que qualquer bem físico seja finito, ou absolutamente escasso, já que o limite na quantidade que podemos produzir de algum bem nunca é sua prevalência no planeta, mas o esforço e tempo dedicado na sua produção. (AMMOUS, 2018, p. 174, tradução nossa).

  6. [...] Sistemas criptográficos de contratos inteligentes como o Ethereum codificam contratos em uma blockchain para faze-los auto executáveis, sem possibilidade de apelação ou reversão e além do alcance de cortes e da polícia [...] (Tradução nossa)

  7. [...] Contratos são redigidos por advogados, julgados por tribunais e impostos pela polícia. [...] (Tradução nossa)

  8. [...] “Código é lei” é um lema usado por programadores de contratos inteligentes. [...] (Tradução nossa)

  9. Existem muitos usos propostos para os contratos inteligentes do Ethereum que dependem do rastreio de ativos distinguíveis. Exemplos de NFT’s existentes ou planejados são LAND em Decentraland, os epônimo punks em CryptoPunks e itens dentro de jogos usando sistemas como DMarket ou Enjincoin. Usos futuros incluem o rastreio de ativos no mundo real, como bens imóveis (como imaginado por companhias como Ubitquity ou Propy). [...] (Tradução nossa)

  10. Todo NFT é identificável por um único ID uint256 dentro dentro do contrato inteligente ERC-721. Este número identificador NÃO DEVE se alterar durante a vida do contrato. O par (endereço do contrato, uint256 tokenID) irá então ser globalmente único e um identificador completamente qualificado para um ativo especifico em uma corrente Ethereum. [...] (Tradução nossa)

  11. [...]. Nós consideramos casos de uso dos NFT’s sendo controlados e transacionados por indivíduos assim como consignados a corretores/carteiras/leiloeiros (“operadores”). NFT’s podem representar a propriedade em relação a ativos físicos ou digitais. Nós consideramos um universo diverso de ativos, e sabemos que você irá sonhar muitos outros: Propriedade física – casas, obras de arte únicas; Colecionáveis virtuais – fotos únicas de gatinhos, cartas colecionáveis; Ativos de “Valor Negativo” – empréstimos, encargos e outras responsabilidades. No geral, todas as casas são distintas e não há dois gatinhos iguais. NFT’s são distinguíveis e você deve acompanhar a propriedade de cada um separadamente. (Tradução nossa)



Informações sobre o texto

Monografia de conclusão de curso apresentada ao curso de Direito do Centro Universitário Presidente Antônio Carlos - UNIPAC, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Me. Joseane Pepino de Oliveira

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NASCIMENTO, Darlan Valente. Entre bits e bytes: o direito real e a propriedade no mundo virtual. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7154, 1 fev. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/101346. Acesso em: 17 maio 2024.