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O caso Bombardier versus Embraer

análise crítica do emprego da retaliação no seio do sistema de solução de controvérsias da OMC

O caso Bombardier versus Embraer: análise crítica do emprego da retaliação no seio do sistema de solução de controvérsias da OMC

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A abertura comercial ajuda as nações a prosperar, mas a prosperidade das nações não é garantia de que a abertura se amplie, nem sequer de que se mantenha.

            À "indestrutibilidade do nosso ser-em-si"

            (remissivo a Arthur Schopenhauer)


RESUMO

            Com o surgimento da Organização Mundial do Comércio (OMC) a partir da entrada em vigor dos acordos da Rodada Uruguai, em 01/01/1995, o sistema multilateral de comércio iniciou uma nova era. Dentre os pilares da normativa daquela entidade, destaca-se o seu mecanismo de solução de controvérsias, profundamente reestruturado a partir do vigente à época do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio – GATT 1947. Em virtude das contendas envolverem nações desenvolvidas e, cada vez mais, nações em desenvolvimento, o presente estudo torna-se relevante uma vez que a equalização das medidas atende aos reclamos dos blocos econômicos e, por conseguinte, à comunidade internacional. O sistema de solução de controvérsias da OMC, previsto no Entendimento sobre Solução de Controvérsias (ESC), é um mecanismo de múltiplas etapas, que envolve: uma fase de consultas bilaterais; outra de submissão da disputa a um grupo especial; a eventual revisão da decisão dos grupos especiais por um órgão colegiado permanente; e, a subseqüente imposição, pelo membro vencedor, de sanções. Dentre estas, a retaliação comercial em resposta a violações cometidas por seus membros constitui recurso regulamentado através da necessidade do preenchimento de certos requisitos, bem como sujeito a limitações, de ordem qualitativa e quantitativa. Ainda, concebe-se a retaliação como sanção cujo objetivo principal é induzir o cumprimento das decisões do Órgão de Solução de Controvérsias (OSC). Todavia, devido à incapacidade para sua imposição, conclui-se a ineficácia de tal recurso na busca de seus objetivos – como no caso Bombardier versus Embraer – além de acarretar desvantagens, seja para o demandante ou para o sistema multilateral de comércio. Dessa forma, vez que o mero aperfeiçoamento da medida retaliatória hoje concebida manteria as desvantagens a ela associadas, o ESC deve sofrer uma revisão de forma a substituir o recurso à retaliação por outra forma de sanção. A adoção de tais medidas em substituição à retaliação, entretanto, hoje, soa improvável, devido à dificuldade de consenso entre os membros da OMC. Por outro lado, a relevância da discussão a respeito do tema é incontestável, uma vez que é a partir do debate de idéias, à primeira vista inconcebíveis, de integração internacional pelo comércio que se avançou dos preceitos políticos contidos no GATT para a extensiva e juridicizada normativa da OMC. Opta-se, nesta pesquisa, pela utilização do método de abordagem indutivo. Subsidiariamente, é utilizado o método de abordagem dialético. No tocante aos métodos de procedimento, empregam-se o histórico, o comparativo e o monográfico. As fontes utilizadas para a pesquisa são doutrinárias, legislativas e jurisprudenciais. A monografia é desenvolvida em dois capítulos, cada qual dividido em duas partes que, por sua vez, subdividem-se em outras duas. No capítulo inicial, são analisados os aspectos históricos que caracterizaram a contenda Bombardier versus Embraer; a multiplicidade de terminologias para designar a retaliação; os requisitos para autorização da mesma e a eficácia dos procedimentos do OSC para implementação do recurso (retaliação), no caso concreto, face aos objetivos pugnados. Superada esta etapa, o segundo capítulo trata da possibilidade de novos métodos para a equalização das medidas.

            Palavras-chaves: retaliação – OMC – sistema de solução de controvérsias


ABSTRACT

            The arrival of the World Trade Organization (WTO) in January 1st, 1995, when the Accords of the Uruguay Round came into force, marked the beginning of a new era for the multilateral system of commerce. Among its normative pillars, stands its mechanism to solve controversies which is vastly different from the one that had existed since 1947 when the General Agreement of Trade and Tariffs (GATT) was in force. Considering that international controversies involve both developed and developing nations, this study becomes all the more relevant since the equalization of measures addresses the aspirations of economic blocks and the international community in general. The WTO system, as established in the Dispute Settlement Understanding (DSU) has several stages, to wit: bilateral consultation; presentation to a special group; the possibility of revision by a permanent organ; and the imposition of sanctions. The sanctions are regulated by the need to meet requirements subjected to certain limits both qualitatively and quantitatively. In addition, retaliation, as a sanction, is considered a measure to force compliance to the Dispute Settlement Body (DSB) division. But, due to the impossibility for its application, the measure lacks efficacy and presents disadvantages – both for the plaintiff and for the multilateral system of commerce. Within this framework, considering that the mere improvement of the retaliatory measure, as it exists today, preserves these disadvantages, it is the opinion of the author that the DSU should undergo a revision and a different form of sanction should be established. However, it is improbable that new measures will be established to modify the current system in the foreseeable future, due to lack of consensus among members of the WTO. But the relevance of this issue is unquestionable since it is from the open debate of ideas that progress has been made on the issue of international integration through commerce. It is through this debate that many advances have been achieved in the political precepts of the GATT, which in turn have developed today into the juridical norms of the WTO. It is used in this work the inductive method of approach, and subsidiarily, the dialectic method. As the procedural methods, the author used the historical, the comparative and the monographic methods. The research was done by using doctrinal and legislative sources and court decisions. The monograph has two chapters, each divided into two parts which is turn are further divided into two more. The first chapter contains a historical analysis of the Bombardier/ Embraer issue; the terminology involved in the idea of retaliation; the requirements for its authorization, and the effectiveness of the DSB procedures to implement the legal resource (retaliation) in the case in question. The second chapter deals with the use of new methods towards the equalization of measures.

            Keywords: retaliation – WTO – dispute settlement system


RESUMEN

            Con el surgimiento de la Organización Mundial del Comercio (OMC) a partir de la entrada en vigor de los acuerdos de la Ronda Uruguay, del 01/01/1995, el sistema de comercio inició una nueva era. Entre los pilares de la normativa de aquella entidad, se destaca su mecanismo de solución de controversias, profundamente reestructurado a partir de lo vigente a la época del Acuerdo General sobre Aranceles Aduaneros y Comercio – GATT 1947. En virtud de que las contiendas involucran naciones desarrolladas y, cada vez más, naciones en desarrollo, el presente estudio se torna relevante ya que la ecualización de las medidas atiende a los reclamos de los bloques económicos y, por consiguiente, a la comunidad internacional. El sistema de solución de controversias de la OMC, previsto en el Entendimiento de Solución de Diferencias (ESD), es un mecanismo de múltiples etapas, que envuelve: una fase de consultas bilaterales; otra de sometimiento de la disputa a un grupo especial; la eventual revisión de la decisión de los grupos especiales por un órgano colegiado permanente; y la subsiguiente imposición, por el miembro vencedor, de sanciones. Entre estas, las retorsiones en respuesta a violaciones cometidas por sus miembros constituyen un recurso reglamentado a través de la necesidad del cumplimiento de ciertos requisitos, así como está sujeto a limitaciones, de orden cualitativo y cuantitativo. Además, se concibe la retorsión como una sanción cuyo objetivo principal es inducir al cumplimiento de las sanciones del Órgano de Solución de Diferencias (OSD). Sin embargo, debido a la incapacidad para su imposición, se concluye la ineficacia de tal medida en la búsqueda de sus objetivos – como en el caso Bombardier versus Embraer – además de acarrear desventajas, sea para el demandante o para el sistema multilateral de comercio. De esa manera, visto que el mero perfeccionamiento de la medida de retorsión hoy concebida mantendría las desventajas a ella asociadas, el ESD debe sufrir una revisión de forma que sustituya la retorsión por otra medida de sanción. La adopción de tales medidas en sustitución de la retorsión, sin embargo, hoy suena improbable, debido a la dificultad de consenso entre los miembros de la OMC. Por otro lado, la relevancia de la discusión en relación al tema es innegable, ya que es a partir del debate de ideas, a primera vista inconcebibles, de integración internacional por el comercio que se avanzó de los preceptos políticos contenidos en el GATT para la extensiva y juridicizada normativa de la OMC. Se opta, en esta investigación, por la utilización de métodos de abordaje inductivo. Subsidiariamente, es utilizado el método de abordaje dialéctico. En lo relativo a los métodos de procedimiento, se emplean el histórico, el comparativo y el monográfico. Las fuentes utilizadas para la investigación son doctrinarias, legislativas y jurisprudencias. La monografía está desarrollada en dos partes que, a su vez, se subdividen en otras dos. En el capítulo inicial, son analizados los aspectos históricos que caracterizan la contienda Bombardier versus Embraer; la multiplicidad de terminologías para designar la retorsión; los requisitos para autorización de la misma y la eficacia de los procedimientos del OSD para la implementación del recurso (retorsión), en el caso concreto, en vista a los objetivos pugnados. Superada esta etapa, el segundo capítulo trata de la posibilidad de nuevos métodos para la ecualización de las medidas.

            Palabras claves: retorsión – OMC – sistema de solución de diferencias


LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

            CIRRCommercial Interest Reference Rate – Taxa de Referência de Interesse Comercial

            EmbraerEmpresa Brasileira de Aeronáutica S.A.

            ESCEntendimento relativo às normas e procedimentos sobre Solução de Controvérsias – em inglês, DSU, Dispute Settlement Understanding; em espanhol, ESD, Entendimiento de Solución de Diferencias

            GATTGeneral Agreement on Tariff and Trade - em português, Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio

            OCDEOrganização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – em inglês, OECD, Organization for Economic Co-operation and Development

            OITOrganização Internacional do Comércio – em inglês, ITO, International Trade Organization

            OMCOrganização Mundial do Comércio – em inglês, WTO, World Trade Organization

            ONUOrganização das Nações Unidas

            OSCÓrgão de Solução de Controvérsias – em inglês, DSB, Dispute Settlement Body; em espanhol, OSD, Órgano de Solución de Diferencias

            PROEXPrograma de Financiamento às Exportações

            SCM AgreementAgreement on Subsidies and Countervailing Measures – em português, Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias

LISTA DE ANEXOS

            ANEXO A Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias..

            ANEXO B – Entendimento relativo às normas e procedimentos sobre Solução de Controvérsias..


SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1 O CASO BOMBARDIER VERSUS EMBRAER. 1.1 HISTÓRICO DOS FATOS. 1.1.1 Estopim da controvérsia: o subsídio proibido. 1.1.2 A Conclusão do Panel. 1.2 O RECURSO ÀS CONTRAMEDIDAS. 1.2.1 Autorização da retaliação – da conceituação às desvantagens. .1.2.2 Análise da eficácia face ao objetivo das contramedidas. . 2 NOVOS RUMOS PARA IMPLEMENTAÇÃO DA RETALIAÇÃO. 2.1 APERFEIÇOAMENTO DO RECURSO. 2.1.1 Do Tratamento Diferenciado à Retaliação Coletiva. 2.1.2 Da Cessão de Direitos Retaliatórios. 2.2 ALTERNATIVAS À RETALIAÇÃO EM FACE DA SOBERANIA. 2.2.1 A Compensação Compulsória. 2.2.2 A Suspensão de Direitos Políticos. CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS. OBRAS CONSULTADAS. ANEXOS


INTRODUÇÃO

            Só trazia a coragem e a cara

            Viajando num pau-de-arara

            ("Pau-de-Arara" - Luiz Gonzaga)

            O comércio internacional apresentou impressionante desenvolvimento no século XX, mais propriamente em sua segunda metade. Apesar da ininterrupta evolução, "[...] seu traço fundamental se manteve inalterado: a constante busca de novos mercados, a contínua tentativa de comercializar o excedente e, ao mesmo tempo, fomentar a produção interna, protegendo-a dos produtos externos, de modo a atender e conciliar os interesses de seus nacionais" [01]. Saber administrar a dualidade de posições, contraditórias em si mesmas, representa o desafio inerente ao mundo globalizado.

            Montesquieu, por exemplo, fala na relevância do doux commerce para amainar o ímpeto dos preconceitos e promover uma interdependência positiva entre as nações.

            Kant, no Projeto de Paz Perpétua, aponta que uma das suas garantias é o "espírito do comércio que não pode coexistir com a guerra". [02]

            Na maioria das tragédias vivenciadas pela humanidade, um dos combustíveis principais das guerras e conflitos sempre foi a disputa pela supremacia no comércio internacional, pelo domínio sobre os novos mercados e novas rotas comerciais etc., culminando, no último século, com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, e, posteriormente, da Segunda Guerra Mundial.

            As conseqüências das decisões de uma nação sobre o comércio exterior, obviamente, extrapolam os limites de seu território. Nesse sentido, verificou-se, no século XX, um acirramento das práticas protecionistas, muitas vezes desastrosas. A lógica dessas iniciativas sempre foi realista, de forma que nunca se pretendeu extinguir o protecionismo, até porque não existe consenso acerca da conveniência de tal prática [03].

            Um ambiente de cooperação no comércio internacional passou, portanto, a ser encarado como fator fundamental para a manutenção da estabilidade das relações internacionais. Curiosas, assim, as duas faces do comércio internacional: fomentador de conflitos, e, ao mesmo tempo, solução para a paz. Coube, então, e ainda cabe à comunidade internacional, buscar a fórmula que permita assegurar ao comércio internacional o seu papel de harmonizador pacífico das relações entre as nações.

            Essa visão positiva da relação entre comércio e paz está na origem do projeto da International Trade Organization (Organização Internacional do Comércio - OIC) e da Carta de Havana – e do seu desdobramento, o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT 1947) que, com base no sucesso da Rodada Uruguai (01/01/1995), levou à Organização Mundial do Comércio (OMC), que é a grande expressão do aprofundamento e alargamento da lógica da globalização econômica pós-Guerra Fria.

            O mais significativo resultado da Rodada Uruguai foi a adoção de um sistema de solução de controvérsias para os membros da OMC, com a possibilidade de aplicação de retaliações aos membros que adotassem medidas incompatíveis com as regras da Organização [04].

            Nesse sentido, o sistema de solução de controvérsias da OMC é o mecanismo estabelecido para solucionar as divergências que se apresentam entre dois ou mais países-membros, baseado em normas claras e prazos preestabelecidos que visam a garantir a eficaz solução do litígio. O sistema confere segurança e previsibilidade ao sistema multilateral, não apenas preservando direitos e obrigações estabelecidos nos Acordos, mas também elucidando os mesmos conforme a interpretação do Direito Internacional Público.

            El sistema se encuentra regulado normativamente por el ESD (Entendimiento de Solución de Diferencias). Su principal órgano decisor es el Consejo General (Órgano de Solución de Diferencias – OSD – cuando actúa bajo esta modalidad), el cual se conforma con la reunión de los representantes de todos los Estados Miembros de la OMC. El OSD ejerce la función de dirección de los procedimientos en la solución de conflictos entre países miembros; tiene la faculdad de establecer los Grupos Especiales, adoptar sus informes y los del Órgano de Apelación, vigilar la aplicación de los informes y autorizar la imposición de las medidas de retorsión en caso de incumplimiento del país demandado. El sistema promueve las soluciones mutuamente favorables entre las partes alcanzadas mediante negociación, antes que una resolución impuesta unilateralmente. [05]

            Dito sistema vem sendo entendido doutrinariamente como conseqüência da evolução de um sistema prementemente diplomático, ou power-oriented, no qual o peso político, e, principalmente, econômico, dos participantes influenciava direta e ostensivamente o desenrolar dos contenciosos, para um sistema predominantemente legalista, ou rule-oriented, regulado por normas processuais detalhadas e objetivas, cujo principal objetivo é o de garantir maior confiabilidade e previsibilidade ao resultado das disputas decididas sob sua égide, o que, em última instância, significa a garantia do maior grau possível de cumprimento das normas contidas nos acordos da OMC [06].

            No sistema anterior, do GATT, não havia previsão de criação de um órgão que fosse responsável pela resolução das controvérsias decorrentes da execução dos acordos firmados. Em casos de conflitos comerciais, era previsto um processo de consultas e depois o estabelecimento de painéis de especialistas, que elaboravam um relatório para a controvérsia. No entanto, o relatório tinha de ser aprovado pelo Conselho Geral, por consenso, dentro do antigo sistema decisório. Assim, bastava que a parte perdedora não aceitasse o relatório para que todo o processo fosse bloqueado.

            O novo sistema é mais forte não só porque reduz o recurso de resolução de conflitos, mas também devido ao advento do sistema de solução de controvérsias. Ainda, a inovação principal consiste no chamado consenso negativo e a conseqüente automaticidade/ obrigatoriedade das decisões: o novo Órgão de Solução de Controvérsias (OSC) necessita do consenso dos membros para derrubar o relatório do Panel [07].

            Conforme as novas regras implementadas pela Rodada Uruguai, foi criada ainda uma "segunda instância", o Appellate Body [08], viabilizando uma revisão das questões apenas de direito das decisões proferidas pelo Panel, o que reforça a "judicialização" [09] do sistema de solução de controvérsias. Ainda, no mesmo sentido do caráter conferido às decisões do Panel, as proferidas pelo Órgão de Recurso também possuem eficácia automática.

            Apesar desse caráter automático, as decisões não se equiparam à categoria de sentença judicial em virtude de não possuírem exeqüibilidade após sua prolação, sendo necessária a homologação pelo Conselho Geral do Dispute Settlement Body (DSB). De fato, segundo o embaixador Celso Lafer, as decisões do Panel são "pareceres com vis directiva, com um iter jurídico que pode ser interrompido a qualquer momento, para se tentar uma solução diplomaticamente negociada" [10].

            Concluída a análise da controvérsia e verificada a incompatibilidade das medidas com as normas da OMC, o membro demandado deve cumprir as decisões do órgão. Deve ser dada preferência a uma solução mutuamente aceitável pelas partes. Na sua ausência, a meta do mecanismo é o de assegurar a retirada das medidas se elas forem consideradas incompatíveis com os dispositivos de qualquer um dos acordos. Os dispositivos sobre compensações devem ser aplicados somente se a retirada imediata da medida for impraticável, e devem ser aplicadas como medidas temporárias, dependendo da retirada da medida inconsistente. O último recurso enseja o direito à imposição da retaliação pela parte demandante, na medida da autorização concedida pelo OSC.

            Em virtude das contendas envolverem nações desenvolvidas e, cada vez mais, nações em desenvolvimento, ressaltando-se o debate acerca do caso Canadá versus Brasil quanto ao PROEX [11], o presente estudo torna-se relevante uma vez que a equalização das medidas atende aos reclamos dos blocos econômicos e, por conseguinte, à comunidade internacional, uma vez que a retaliação, não raras vezes, incide em setores desconexos ao original, acarretando alto custo político-econômico às nações envolvidas.

            Nesse diapasão, em vista da multiplicidade de terminologias para designar a retaliação, imprescindível se torna identificar os termos utilizados, pugnando um conceito único a ser adotado. Por conseguinte, tendo como foco o caso Bombardier versus Embraer (DS – Dispute Settlement – 46) e as regras delineadas no Entendimento relativo às normas e procedimentos sobre Solução de Controvérsias (ESC), pretende-se analisar a eficácia do recurso, bem como destrinchar, paralela e criticamente, a sistemática de implementação do mesmo pelo Órgão de Solução de Controvérsias da OMC, primando pelo princípio da equivalência consubstanciado no artigo 22.4 do ESC, além de delinear quais procedimentos seriam capazes de garantir um menor desgaste diplomático frente à necessidade sancionatória.

            No intuito de analisar a pretensão de eficácia da retaliação, opta-se, nesta pesquisa, pela utilização do método de abordagem indutivo, para, partindo-se do estudo do caso concreto, chegar-se a uma conclusão. Subsidiariamente, será utilizado o método de abordagem dialético, no sentido de analisar as divergências existentes a respeito das condições para aplicação da sanção. No tocante aos métodos de procedimento, empregam-se o histórico, o comparativo e o monográfico. As fontes utilizadas para a pesquisa são doutrinárias, legislativas e jurisprudenciais. As traduções foram realizadas livremente.

            A monografia é desenvolvida em dois capítulos, cada qual dividido em duas partes que, por sua vez, subdividem-se em outras duas. No capítulo inicial, são analisados, num primeiro momento, os liames históricos que caracterizaram a contenda Bombardier versus Embraer. Posteriormente, analisam-se a multiplicidade de terminologias para designar a retaliação, os requisitos para autorização e a eficácia dos procedimentos do OSC para implementação da mesma, no caso concreto, face aos objetivos pugnados.

            Superada esta etapa, o segundo capítulo trata da possibilidade de serem estabelecidos novos métodos para a equalização das medidas. Por tal motivo, a primeira parte desse capítulo aborda as sugestões de aperfeiçoamento do recurso em debate, ao passo que a segunda tem por escopo discorrer acerca das alternativas à retaliação face à soberania.

            Para melhor compreensão do estudo, anexa-se, ao final desta monografia (i) o Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias; (ii) o Entendimento relativo às normas e procedimentos sobre Solução de Controvérsias.


1 O CASO BOMBARDIER VERSUS EMBRAER

            A concessão de subsídios [12] pelo governo brasileiro com vistas a estimular a exportação de jatos nacionais gerou elevados níveis de desgaste diplomático. Diante disso, o Dispute Settlement Body [13] ganhou notoriedade e repercussão no Brasil em virtude do acirramento das tensões envolvendo a empresa canadense Bombardier e a empresa brasileira Embraer (Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A.) na disputa comercial existente no segmento da indústria da aviação comercial.

            O caso original, que motivou o julgamento pelo DSB, será estudado sob a ótica dos princípios e tratados que compõem a Organização Mundial do Comércio com vistas a viabilizar um estudo crítico do instituto da retaliação como sanção no seio do sistema de solução de controvérsias, enfocando o processo de implementação e a análise da eficácia da mesma.

            1.1.HISTÓRICO DOS FATOS

            Haja vista a dificuldade e/ou impossibilidade de as empresas nacionais conseguirem obter taxas de juros equivalentes às praticadas internacionalmente, por força do "Risco Brasil", o governo brasileiro lançou um programa com a finalidade de estimular as exportações.

            O anseio de contestar o Programa de Financiamento às Exportações (PROEX) motivou a decisão do governo canadense de recorrer à OMC [14] em virtude da disputa comercial no setor de jatos, uma vez que, no entender do Canadá, o PROEX violaria frontalmente o Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias [15].

            1.1.1.Estopim da controvérsia: o subsídio proibido.

            O PROEX – criado no Brasil pela Lei nº 8.187/91, e, posteriormente alterado pelas Medidas Provisórias nos 1.629/98 e 1.892/99 – consiste num sistema de compensação das taxas de juros aplicáveis às exportações de aeronaves por meio do fornecimento de linhas de crédito aos exportadores brasileiros, através dos mesmos encargos financeiros utilizados no mercado internacional.

            Existem duas formas alternativas de utilizar o PROEX: a primeira, com financiamento direto do governo, com recursos do âmbito do próprio programa; ou, então, mediante a adoção de uma equalização de taxas, por meio da qual o Tesouro Nacional, através da emissão de bonds [16] no mercado internacional, assegura ao agente financiador a diferença entre a taxa que é aplicada e a taxa internacionalmente praticada, de modo a permitir que as empresas nacionais exportadoras façam uso da taxa internacional e, portanto, de melhores condições de financiamento.

            Ditas medidas visam a estimular as exportações em geral. Esse incentivo encaixava-se nas necessidades do mercado brasileiro de fabricação de jatos em razão das características do próprio segmento, como, por exemplo, os financiamentos longos e onerosos. Essa forma de financiamento governamental, por intermédio da equalização financeira, viabilizou à Embraer pactuar contratos de financiamento menos onerosos, e, conseqüentemente, oferecer seus produtos a preços e condições mais competitivas, o que veio a desencadear a reação da Bombardier e a iniciar toda a contenda envolvendo o governo brasileiro e o canadense.

            A empresa Bombardier pressionou o governo canadense a ingressar junto à OMC a fim de obter do DSB a confirmação de que a equalização financeira do PROEX constituía um subsídio ilegal, o qual se adequaria à definição de subsídio proibido contida no artigo 3, "1", "a", do Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias (SCM Agreement – Agreement on Subsidies and Countervailing Measures):

            Artigo 3

            Proibição

            1. Com exceção do disposto no Acordo sobre Agricultura, serão proibidos os seguintes subsídios, conforme definidos no Artigo 1:

            a)subsídios vinculados, de fato ou de direito, ao desempenho exportador, quer individualmente, quer como parte de um conjunto de condições, inclusive aqueles indicados a título de exemplo no Anexo I;

            De fato, o objetivo do SCM Agreement, originado do antigo GATT, tem sido inviabilizar "incentivos oficiais", promovendo a livre concorrência internacional e a liberalização das trocas comerciais como escopos fundamentais da OMC. [17] No entanto, paralelamente aos subsídios proibidos, o Acordo aborda, em seu Anexo I, uma exceção quanto à equalização de taxas financeiras.

            Sustentou o Brasil que, de acordo com o item "k" do Anexo I do Acordo, abaixo transcrito, a equalização financeira somente poderia ser considerada como subsídio à exportação quando a mesma fosse utilizada para "garantir vantagem de monta nas condições de créditos à exportação":

            k) a concessão pelo governo (ou por instituições especiais controladas pelas autoridades do governo e/ou agindo sob seu comando) de créditos à exportação a taxas inferiores àquelas pelas quais o governo obtém os recursos utilizados para estabelecer tais créditos (ou que teriam de pagar se tomassem emprestado nos mercados financeiros internacionais recursos com a mesma maturação, nas mesmas condições creditícias e na mesma moeda do crédito à exportação), ou o pagamento pelo governo da totalidade ou de parte dos custos em que incorrem exportadores ou instituições financeiras quando obtêm créditos, na medida em que sejam utilizados para garantir vantagem de monta nas condições dos créditos à exportação.

            Enfim, o Brasil não questionou o fato de o PROEX conceder um incentivo. No entanto, ressaltou que esse benefício não concedia à Embraer uma vantagem determinante nas exportações de jatos. Destacou, inclusive, que essa condicionante, "garantir vantagem de monta", encaixava-se na exceção prevista na nota de rodapé nº 5 do próprio artigo 3, "1" do SCM Agreement, que previa que as "medidas que estejam indicadas no Anexo I como não caracterizadoras de subsídios à exportação não serão proibidas por este Artigo ou nenhum outro deste Acordo."

            Caberia então analisar sob quais aspectos seria configurada uma "vantagem de monta". Uma vez que o termo não apresenta definição ao longo do Tratado, o mesmo deve ser compreendido segundo o significado comum, qual seja, real relevância e conseqüência determinante para conferir prevalência sobre vantagem equivalente. Assim, consoante as alegações brasileiras, dois aspectos deveriam ser considerados com o fim de averiguar se o PROEX concedia uma vantagem especial: i) o chamado "Risco Brasil", que onerava os financiamentos obtidos por empresas brasileiras; e ii) os benefícios concedidos pelo Canadá à Bombardier.

            Comprovada a coexistência dos fatores, o Brasil acreditava que o PROEX não seria justificado como uma "vantagem de monta", mas sim como medida necessária a equilibrar a disputa comercial, excluindo fatores estranhos ao produto comercial em si de influir na contenda.

            Dessa forma, o Brasil recorreu à elaboração de um parecer, por meio do qual sustentava que:

            a)a Bombardier era beneficiada por diversos programas patrocinados pelo governo canadense, além de ser pioneira na fabricação de jatos regionais, sendo inviável a competição em igualdade de condições para o Brasil e a Embraer sem o PROEX;

            b)mesmo com o advento do programa brasileiro, a Bombardier detinha 57% dos pedidos de encomenda de jatos de todo o mundo, não conferindo o PROEX presença monopolista à Embraer junto ao mercado internacional;

            c)ainda que o PROEX consistisse em subsídio proibido, segundo o artigo 3, "1", "a" do Acordo, o mesmo estaria em conformidade com as disposições dispensadas aos países em desenvolvimento no artigo 27 do próprio SCM Agreement:

            Artigo 27

            Tratamento Especial e Diferenciado aos Países em Desenvolvimento Membros

            1.Os Membros reconhecem que subsídios podem desempenhar papel importante em programas de desenvolvimento econômico de países em desenvolvimento Membros.

            2.A proibição do parágrafo 1 (a) do Artigo 3 não se aplicará:

            a)aos países em desenvolvimento Membros arrolados no Anexo VII;

            b)a outros países em desenvolvimento Membros pelo período de 8 anos a partir da data de entrada em vigor do Acordo Constitutivo da OMC, desde que obedecidas as disposições do parágrafo 4.

            [...]

            4. Os países em desenvolvimento Membros a que se refere o parágrafo 2 (b) eliminarão seus subsídios à exportação no período de 8 anos, preferivelmente de maneira progressiva. Os países em desenvolvimento Membros não elevarão, porém, o nível de subsídios à exportação e, sempre que a concessão de subsídios à exportação seja incompatível com suas necessidades de desenvolvimento, eliminá-los-ão em prazo inferior àquele previsto neste parágrafo. Caso estime necessário conceder tais subsídios além do prazo de 8 anos, um país em desenvolvimento Membro, até no máximo um ano antes do final desse prazo, iniciará consultas com o Comitê, que determinará se a prorrogação desse período se justifica, após exame de todas as necessidades econômicas, financeiras e de desenvolvimento pertinentes do país em desenvolvimento Membro em causa. Se o Comitê determinar que a prorrogação se justifica, o país em desenvolvimento Membro manterá consultas anuais com o Comitê para determinar a necessidade de manutenção dos subsídios. Se o Comitê não chega a tal conclusão, o país em desenvolvimento Membro eliminará os subsídios à exportação remanescentes no prazo de dois anos a contar do fim do último período autorizado.

            O Canadá, em réplica, rebateu todas a alegações do governo brasileiro, sustentando basicamente que: i) o PROEX consistia, de fato, em subsídio proibido, não havendo qualquer exceção à lista de ditos subsídios; ii) mesmo sendo consideradas exceções, a equalização financeira promovida pelo programa conferia uma "vantagem de monta" às exportações brasileiras; e iii) o Brasil não poderia se valer do tratamento especial concedido aos países em desenvolvimento, uma vez que não teria satisfeito as condições previstas – não só não teria demonstrado a necessidade da concessão de subsídios para assegurar o desenvolvimento econômico, como também não teria seguido a orientação da não majoração dos subsídios, o que teria sido proporcionado pelo PROEX.

            1.1.2.A Conclusão do Panel

            O relatório do Panel foi apresentado aos países-membros em 14 de abril de 1999. [18] Diante dos quesitos alegados por ambas as partes, o Panel procurou efetivar o julgamento por meio da análise, em separado, das principais linhas de argumentação que resumiam e abrangiam o tema.

            A primeira questão seria delimitar se a equalização financeira proporcionada pelo PROEX representaria um subsídio e, ainda, se estaria diretamente relacionado ao desempenho exportador. O Brasil, conforme dito anteriormente, não negou o fato de o PROEX encaixar-se na definição de subsídio, nem tampouco alegou não estar o programa relacionado ao desempenho exportador. Sendo assim, o relatório concluiu que o PROEX consistia em subsídio, uma vez que resultava, de fato, de prática governamental que promovia a transferência de fundos para as exportações brasileiras de jatos da aviação regional.

            Findo esse questionamento, caberia determinar se o programa encontrava respaldo junto às permissivas previstas no item "k", Anexo I do Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias. Pautava-se o Brasil no fato de que o PROEX não concedia vantagem de monta, mas consistia em mera formalidade na tentativa de igualar as possibilidades competitivas das empresas nacionais junto ao mercado internacional. O Panel não acolheu os argumentos brasileiros. Restou delimitado, pois, que o PROEX consistia em subsídio proibido, proporcionando vantagem de monta nas condições dos créditos à exportação.

            Segundo a decisão, não havia determinante no SCM Agreement que indicasse que a averiguação da vantagem de monta deveria se embasar na comparação entre o subsídio em questão e outros, ligados a produtos semelhantes de países competidores. A vantagem de monta seria determinada de forma objetiva e materialmente comprovada em relação ao próprio produto beneficiado pelo subsídio. Bastaria que a existência do subsídio fosse suficiente para conferir uma vantagem mais favorável àquele produto, o qual não possuiria tal favorecimento na ausência do mesmo. Ainda, o entendimento propagado pelo Brasil insurgia-se contra o objetivo principal do Acordo, qual seja, a redução ou limitação de subsídios, o que comprometia a razão de sua própria existência.

            Restava ainda examinar a última alegação da defesa brasileira, qual seja, o fato de que, por ser o Brasil um país em desenvolvimento, o PROEX, mesmo sendo considerado subsídio proibido, seria válido, uma vez que o artigo 27 do SCM Agreement – anteriormente transcrito – dispensa tratamento especial aos países em desenvolvimento.

            Não havendo divergência acerca do status do Brasil de país em desenvolvimento, a contrariedade versava a respeito do alcance da expressão "obedecidas as condições do parágrafo 4" presente no artigo 27, "2", "b" do Acordo. De fato, o governo canadense procurou demonstrar que não se poderia invocar a referida proteção no caso concreto uma vez que o Brasil não havia atendido a nenhuma daquelas condições, quais sejam:

            a)não aumentar o volume de subsídios já existentes;

            b)eliminar, de preferência, gradativamente, os subsídios existentes até o período máximo de oito anos a contar da celebração do Acordo;

            c)eliminar subsídios porventura existentes antes do referido prazo de oito anos, caso os mesmos não sejam mais compatíveis com a sua necessidade de desenvolvimento.

            O Panel concluiu que o PROEX, uma vez confrontado com o BEFIEX – antigo programa de estímulo às exportações, mediante a concessão de créditos aos exportadores – representava, de fato, um incremento no volume de subsídios concedidos. Ademais, mesmo não havendo expirado o prazo de oito anos, considerou o relatório que restou violada a segunda condição, já que havia cartas de compromisso emitidas pela Embraer prevendo emissão de bônus para depois da data limite. Diante desse contexto, de nada adiantou o afastamento da acusação de que o Brasil não mais necessitava de subsídios.

            Baseado nos argumentos expostos, o Panel reconheceu o pleito canadense, decidindo que o PROEX, aplicado ao segmento de venda de jatos regionais, representou um subsídio proibido, tendo violado o disposto no artigo 3 do SCM Agreement, determinando, ainda, que o Brasil interrompesse a concessão desse subsídio proibido no prazo máximo de 90 dias, a contar da prolação da decisão.

            O Brasil recorreu, sem sucesso. [19] O Appellate Body do DSB manteve as conclusões básicas do Panel no sentido de classificar as medidas adotadas com base no PROEX como verdadeiros subsídios proibidos frente ao SCM Agreement.

            Ante a decisão, o Brasil submeteu ao DSB, em 19/11/1999, conforme determina o seu procedimento, as medidas a fim de satisfazer o adequamento do PROEX ao Acordo. As medidas implementadas consistiam na edição da Resolução nº 2.667/99, do Conselho Monetário Nacional, e da Carta-Circular nº 2.881/99, do Banco Central do Brasil que, basicamente, apenas modificavam o critério para a "equalização financeira", limitando as taxas praticadas no PROEX às taxas internacionalmente praticadas.

            O Canadá, entretanto, insatisfeito com as medidas, requereu a realização de novo Panel em 23/11/1999 com o fito específico de avaliar se tais medidas compensatórias estariam ou não em conformidade com o Acordo e, sobretudo, com a decisão proferida anteriormente. Conforme assertivas do governo canadense, o Brasil estaria violando a decisão em virtude de (i) não ter cessado o pagamento dos subsídios tidos como proibidos, em razão de permanecer emitindo bonds para os contratos firmados antes da contenda, e (ii) a nova sistemática do PROEX II ter preservado a característica inicial, uma vez que ainda assegurava uma vantagem de monta às exportações da Embraer.

            O governo brasileiro, em defesa, alegou que (i) uma vez obrigado perante terceiros, em respeito à ordem jurídica e aos direitos adquiridos, a emissão de títulos pela Embraer em atendimento a compromissos já firmados não representaria a concessão de novos subsídios, mas sim a concretização de subsídios já outorgados, e (ii) as novas medidas não asseguravam uma vantagem de monta às exportações brasileiras, uma vez fixado limite internacional compatível com a equalização das taxas de juros.

            De início, em decisão acerca da nova contenda, o Panel ratificou a antiga decisão que determinava que o Brasil retirasse imediatamente os subsídios concedidos por meio do PROEX I, o que englobava a emissão dos bonds mencionados, uma vez que corporificava a noção de pagamentos de subsídios. Ressaltou, quanto à alegação de direitos adquiridos, que o momento inicial da concessão do subsídio proibido era, de fato, o instante em que se realizava a emissão dos títulos e não a celebração das cartas de compromisso. Assim, não se estava determinando o resgate de títulos já emitidos, mas apenas a interrupção de novas emissões. Via de conseqüência, a emissão posterior dos títulos configurava violação ao artigo 3, "2" do Acordo de Subsídios e Medidas Compensatórias: "O Membro deste Acordo não concederá ou manterá os subsídios mencionados no parágrafo 1."

            Esse entendimento insurgia-se contra o princípio constitucional brasileiro previsto no artigo 5º, inciso XXXVI da Constituição Federal de 1988 e, por tal razão, colocava o Brasil em situação delicada quanto à aplicabilidade do mesmo no Direito Interno Brasileiro, uma vez que ignorava os valores fundamentais relacionados ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito. No entanto, essa postura revelava-se coerente com os princípios que norteiam o funcionamento do DSB, bem como com aqueles que devem permear a análise dos tratados que compõem a OMC.

            Finda a análise inicial, o Panel passou ao exame das modificações implementadas ao PROEX I. O debate teve por base a nova referência utilizada pelo Brasil para delimitar a equalização financeira das taxas de juros. O Canadá se insurgiu contra os Treasury Bonds do governo americano, afirmando que os mesmos não refletiam os valores praticados no mercado internacional e, portanto, estariam permitindo ao Brasil ofertar uma vantagem relevante em relação ao mercado internacional. O Brasil, por sua vez, não conseguiu comprovar que o parâmetro adotado deveria servir de referência. Nesse sentido, o Panel pugnou o entendimento de que as mudanças implementadas ao PROEX I não foram suficientes e que, portanto, o Brasil não havia atendido à decisão anteriormente prolatada.

            O posicionamento veio a ser ratificado pelo Appellate Body, o qual indeferiu o recurso apresentado pelo Brasil, mantendo a decisão recorrida pelos seus fundamentos. Diante da decisão, o governo canadense pleiteou a permissão para retaliar comercialmente o Brasil.

            Antes, entretanto, de iniciar a análise acerca da retaliação, cumpre destacar que, ante a negativa do Panel frente à proposta trazida pelo PROEX II e à iminente ameaça de retaliação, o Brasil apresentou ao DSB novas modificações, por meio da Resolução nº 2.799/00, instituindo o PROEX III. A principal mudança implementada residia na substituição da referência utilizada como limite para a equalização financeira das taxas de juros pelo PROEX. NO PROEX III, o governo brasileiro adotou como parâmetro a taxa CIRR – Commercial Interest Reference Rate, divulgada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o que colocava o Brasil na mesma situação aceita para os países da OCDE e permitida no parágrafo 2º, item "k" do Anexo I do SCM Agreement.

            Em relatório, em 26/07/2001, o Panel determinou que, embora a nova legislação não considerar o PROEX III um programa de incentivo à exportação totalmente isento de suspeitas quanto à concessão de "benefícios proibidos", conferia ao governo brasileiro discricionariedade suficiente para não conferir subsídios proibidos. Dessa forma, o Panel decidiu que o Canadá não obteve sucesso em demonstrar que o PROEX III conferia, efetiva e obrigatoriamente, um benefício proibido para a Embraer. Ainda, mesmo que fosse considerado subsídio proibido, o mesmo estaria referendado pela exceção dispensada pelo parágrafo 2º, item "k" do Anexo I do Acordo. Em 23/08/2001, o DSB adotou o relatório do Panel.

            Todavia, urge ressaltar que o êxito brasileiro somente sobreveio após a terceira edição do PROEX e que, durante todo o percurso, a discussão em torno do referido programa deu margem a diversos incidentes diplomáticos, os quais resultaram em significativos prejuízos comerciais envolvendo Brasil e Canadá. De fato, quando do julgamento do PROEX II, o DSB considerou que o Brasil não havia se enquadrado nas normas do SCM Agreement, nem tampouco havia atendido aos termos da decisão prolatada por força do julgamento do PROEX I.

            1.2.O RECURSO ÀS CONTRAMEDIDAS

            Em 10/05/2000, o Canadá requereu autorização ao Dispute Settlement Body para proceder às contramedidas, com fundamento no artigo 4, "10" do SCM Agreement e no artigo 22, "2" do Entendimento relativo às normas e procedimentos sobre Solução de Controvérsias, no montante de C$ 700 (setecentos milhões de dólares canadenses) por ano.

            Na reunião do DSB de 22/05/2000, o Brasil requereu arbitragem [20], com base no artigo 22, "6" do ESC e no artigo 4, "11" do Acordo de Subsídios e Medidas Compensatórias, com vistas a avaliar o montante estipulado pelo Canadá. O relatório da arbitragem, de 28/08/2000, determinou que a retaliação, no caso concreto, deveria ser estipulada em, no máximo, C$ 344,2 (trezentos e quarenta e quatro milhões e duzentos mil dólares canadenses) por ano.

            Em 12/12/2000, o Canadá recebeu autorização do DSB, consoante o artigo 22, "7" do ESC e o artigo 4, "10" do SCM Agreement, a adotar medidas de restrição comercial (suspensão de benefícios, sobretarifas, etc.) ao Brasil, até aquele limite fixado. Todavia, o Canadá não fez uso da autorização para retaliar o Brasil. A análise acerca da não implementação da retaliação será feita posteriormente, quando do estudo da eficácia do instituto.

            1.2.1..Autorização da retaliação – da conceituação às desvantagens.

            Determinada a incompatibilidade de certa medida com as normas da OMC, o membro demandado deverá cumprir as decisões do OSC ou, alternativa e temporariamente, oferecer compensações ao demandante, neste último caso observada a cláusula de nação mais favorecida. A inobservância pelo demandado das medidas acima pode ensejar o direito à imposição de contramedidas pela parte demandante.

            A retaliação é, atualmente, o último recurso disponível no ESC à parte demandante vencedora em uma controvérsia no âmbito da OMC e, conforme se depreende do texto do art. 22 do ESC, significa a suspensão de concessões ou outras obrigações assumidas pelo demandante perante o demandado sob os acordos administrados pela organização.

            1.2.1.1.Conceituação

            Preliminarmente, cabem, entretanto, algumas considerações acerca da terminologia utilizada pelo ESC, pela jurisprudência do Órgão de Recurso e pela doutrina. Inicialmente, cumpre destacar que, acerca da terminologia utilizada para designar a citada sanção, o ESC não faz menção alguma ao termo "retaliação", utilizando-se sempre da expressão "suspensão de concessões ou outras obrigações" [21]. Paralelamente, a jurisprudência do ESC faz uso contínuo do termo "contramedidas" [22], no que é seguido pelo Órgão de Recurso e pelo Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias.

            A doutrina, por sua vez, encontra-se dividida quanto à terminologia preferida: "contramedidas", "retaliação", "sanção" ou "sanção comercial". Steve Charnovitz, professor da Georgetown University assegura que quando uma medida comercial é utilizada contra um país para induzir o cumprimento de suas obrigações internacionais, tal medida é denominada "sanção", prevalecendo este termo para o referido doutrinador. Autores há que não se prendem a uma ou outra denominação. No Brasil, Celso Lafer utiliza o termo "sanções", ao passo que Ana Cristina Paulo Pereira se refere invariavelmente à "retaliação" e "contramedidas". Regina Maria de Souza Pereira, Durval e Noronha Goyos Jr. e Tatiana Lacerda Prazeres utilizam a expressão "suspensão de concessões".

            No presente estudo, far-se-á uso indistintamente dos vários termos ora apresentados. No que tange à conceituação, raros são os autores que dispõem de um conceito acerca do que sejam as contramedidas no âmbito da OMC. Dentre aqueles que o determinam, muitos acabam por embutir elementos estranhos, como objetivo, propósito, finalidade, etc., os quais podem variam significativamente.

            A primeira definição de contramedidas, como medidas que seriam de outra forma contrárias às obrigações internacionais de um Estado prejudicado perante o Estado responsável, é encontrada no Direito Internacional nos relatórios da Organização das Nações Unidas (ONU).

            O que hoje se designa "contramedidas" era, tradicionalmente, conhecido por "represálias não beligerantes", subespécie de "represálias", que englobava toda ação ilícita, inclusive o uso da força, praticada em resposta unilateral a uma violação por outrem. Recentemente, todavia, o termo "represálias" foi limitado às ações praticadas em tempos de guerra, enquanto "contramedidas" corresponderiam às demais formas de ação. O termo "contramedidas" deve ser também diferenciado de "retorsão", que denota uma ação que, embora não amistosa, não chega a ser um ato ilícito.

            No Dictionary of Trade Policy Terms (Dicionário de Termos de Política Comercial) da OMC, conceitua-se "contramedidas" como a suspensão de concessões ou obrigações tomadas a partir da autorização do Órgão de Solução de Controvérsias [23], ao passo que "retaliação" é a ação tomada por um país no intuito de restringir importações, pelo mesmo, de mercadorias de um outro país, o qual elevou tarifas ou impôs outras medidas adversamente, afetando as exportações do primeiro.

            Nesse sentido, será adotado o conceito formulado por Mario Sergio Araujo Braz. Consoante referido autor, a retaliação pode ser conceituada "como uma violação da normativa da OMC, autorizada pelo OSC como reação a uma violação prévia do mesmo ordenamento jurídico pelo país alvo" [24], visto que a sua fundamentação está não apenas nas regras inter partes do caso específico, mas também nos acordos e tratados internacionais aprovados no âmbito da OMC.

            1.2.1.2.Características

            O direito de impor a retaliação é balizado por diversos requisitos ou condições de imposição, bem como pelo direito da parte demandada contestar o montante das contramedidas requeridas. No que tange às características da retaliação, cumpre destacar que consistem em três: unilateralidade, temporariedade e exceção em relação à cláusula de nação mais favorecida.

            A unilateralidade constitui elemento fundamental, uma vez que inova o contexto da solução de controvérsias em matéria de Direito Internacional Público, onde se privilegiam as soluções mutuamente aceitáveis. Consoante tal característica, diversamente da compensação, a qual requerer anuência bilateral, a retaliação é auto-implementável. A unilateralidade expressa a soma da virtual automaticidade da aplicação das contramedidas, almejada pela regra do consenso negativo [25], à desnecessidade de aprovação ou anuência do demandado. Em tempo, uma vez constatado o descumprimento da decisão do OSC e não oferecida compensação satisfatória pelo membro vencido, cabe ao próprio demandante impor as contramedidas, desde que obtida autorização para tanto junto ao OSC, o qual somente pode negá-la por consenso. [26]

            Outra característica é o caráter temporário das contramedidas. O artigo 22, "8" do ESC determina que a suspensão de concessões ou outras obrigações será temporária, sendo aplicável: (i) até a remoção da medida julgada inconsistente com determinado acordo coberto pelo ESC; (ii) até que o membro demandado tenha oferecido uma solução para a anulação ou redução de benefícios sofrida pelo demandante; ou (iii) até que uma solução mutuamente satisfatória tenha sido alcançada.

            A terceira característica configura-se em exceção à cláusula de nação mais favorecida [27]. Dita cláusula prevê que o oferecimento, por exemplo de compensação, pelo demandado ao demandante, deve ser estendido imediata e eqüitativamente aos demais 147 membros da OMC. A suspensão de concessões ou outras obrigações, como forma de retaliação, diversamente do oferecimento de compensações, encontra-se imune a tal princípio [28]. Tal fato se verifica por motivos óbvios: ao passo que o oferecimento de compensação é uma medida que visa a incrementar o acesso, pelos produtos originados da parte demandante, ao mercado da parte demandada, as contramedidas, por sua vez, têm por objetivo dificultar (não raro, vedar) o ingresso dos produtos provenientes do membro demandado no mercado demandante.

            1.2.1.3.Condições para Imposição

            Apesar da unilateralidade inerente à retaliação, esta não é discricionária. Sua imposição é regulada por diversas normas, as quais visam a primar por um dos principais objetivos da revisão do mecanismo de solução de controvérsias quando da elaboração do ESC, qual seja, impedir a arbitrariedade na utilização do recurso pelo membro demandante. Nesse sentido, devem ser observadas condições necessárias para a validade das contramedidas, quais sejam, a necessidade de solicitação formal de autorização para retaliar, a limitação temporal (irretroatividade) e as limitações qualitativas e quantitativas.

            A formalidade de solicitação de aprovação pelo OSC é reflexo da natureza legalista do mecanismo de solução de controvérsias da OMC, o qual privilegia a norma jurídica em detrimento da diplomacia do mais forte. Segundo tal requisito, uma vez expirado o prazo para que as partes acordem medidas compensatórias mutuamente favoráveis, o demandante deverá solicitar, formal e expressamente, autorização para suspender concessões ou outros benefícios por ele concedidos ao demandado sob os acordos da OMC. Deverão ser informados, na solicitação, os valores (ou critérios para apuração periódica de tais valores) representados pelas contramedidas propostas e a lista de concessões e/ou benefícios a serem suspensos (bens ou serviços afetados), os quais servirão de base para eventual questionamento pelo demandado.

            No tocante à limitação temporal, ainda há controvérsia quanto à retroatividade das contramedidas. O princípio geral de que as sanções na normativa da OMC não podem ser retroativas é consistente com o próprio objeto e propósito do sistema multilateral de comércio, bem como com o mecanismo de solução de controvérsias da organização, qual seja, preservar as oportunidades comerciais futuras ao invés de remediar prejuízos passados. Segundo esse entendimento, a vasta maioria da doutrina, segundo Braz (2006), entende que a imposição de contramedidas no âmbito dos acordos da OMC encontra-se limitada no tempo pelos prejuízos em que efetivamente incorreu a parte demandante posteriormente ao término do prazo razoável para implementação da decisão do OSC.

            A solicitação de autorização para impor a retaliação sujeita-se, também, a limitações de natureza qualitativa. Consistem as mesmas em restrições aos tipos de medidas que podem ser impostas, ou seja, quais concessões ou outras obrigações poderão ser suspensas. A principal limitação encontra-se inserida no artigo 22, "3" do ESC, o qual determina que o demandante deverá observar princípios e procedimentos que constituem normas de limitação setorial. Inicialmente, deverá ser observado o princípio geral, segundo o qual, as contramedidas impostas deverão adstringir-se à suspensão de concessões ou outras obrigações referentes ao mesmo setor (a determinação da limitação setorial encontra-se no artigo 22, "3", "f" do ESC) em que se enquadrem as medidas julgadas inconsistentes com a normativa da OMC, primando por menores desvios de padrões comerciais e menores efeitos negativos da retaliação.

            Muitas vezes, porém, é economicamente ineficaz ou impraticável para o demandante impor contramedidas no mesmo setor em que ocorreu a violação. Nesses casos, o demandado poderá solicitar a suspensão de concessões ou obrigações em outro setor incluído no mesmo acordo comercial, restando delimitada a expressão "mesmo acordo comercial" no artigo 22, "3", "g" do ESC.

            Ainda assim, o membro demandante pode encontrar dificuldades para implementar a retaliação, mormente quando tal membro for comercialmente dependente do demandado, hipótese em que qualquer restrição às importações provenientes deste país causará prejuízos maiores ao próprio demandante que aqueles incorridos pelo demandado. Em tais casos de ineficácia ou impraticabilidade da suspensão de concessões ou outras obrigações sob o mesmo acordo comercial, poderão ser autorizadas contramedidas referentes a um acordo totalmente desvinculado daquele sob o qual as medidas tomadas pelo membro demandado foram consideradas inconsistentes.

            Cumpre ressaltar que a determinação do "mesmo setor" ou do "mesmo acordo" não se dará em função do setor ou acordo em que se verificou a anulação ou a redução de benefícios, mas em função do setor ou acordo em que se verificou a violação pelo demandado. Cabe, ainda, apontar uma peculiaridade da limitação setorial à imposição de contramedidas. Não obstante o adensamento da "juridicidade" [29] do mecanismo de solução de controvérsias da OMC, a avaliação da ineficácia e impraticabilidade das medidas a serem incluídas no esquema retaliatório não incumbe, em princípio, a um órgão da OMC ou a qualquer outro terceiro ou órgão institucional ou adjudicatório externo à controvérsia, mas ao próprio membro demandante.

            Resta ainda uma última forma de limitação aplicável à imposição de contramedidas no âmbito da OMC: o quantum que pode ser autorizado pelo OSC. Uma vez solicitada a autorização pelo demandante para impor contramedidas ao demandado, este poderá requerer a instauração de procedimento arbitral. A decisão dos árbitros, neste caso, deverá ter por base, como regra geral, o princípio da equivalência ou, em casos envolvendo subsídios proibidos, o princípio das contramedidas apropriadas. Trata-se, pois, da submissão do sistema de solução de controvérsias da OMC ao princípio do devido processo legal.

            Quanto ao princípio da equivalência, a regra geral, contida no artigo 22, "4" do ESC, limita o quantum das contramedidas ao dispor que "o nível da suspensão de concessões ou outras obrigações autorizada pelo OSC será equivalente ao nível da anulação ou redução de benefícios" [30], sendo a equivalência determinada pelos árbitros, conforme artigo 22, "6" do Entendimento. Contudo, em nenhum momento o ESC estabelece expressamente qual o critério a ser utilizado para que se chegue a tal equivalência. Neste ponto, a solução, mais freqüentemente adotada pelos árbitros e aceita pelos membros da OMC, tem sido a utilização das counterfactual situations [31] ou, simplesmente, counterfactuals. Tal método toma por base um estado hipotético que teria ocorrido caso o demandado tivesse cumprido suas obrigações, comparando-o com a realidade econômica que se observa a partir da não implementação da decisão do OSC pelo demandado.

            Ademais das regras gerais do ESC, alguns acordo multilaterais trazem em si regras processuais adicionais ou, quando conflitantes, detentoras de primazia em relação àquelas previstas no ESC, de acordo com o disposto no artigo 1, "2" deste. Dessa forma, torna-se essencial a análise particular de dispositivos do Acordo de Subsídios e Medidas Compensatórias que estabelecem os critérios para a limitação quantitativa das contramedidas propostas no âmbito de disputas envolvendo subsídios acionáveis e proibidos.

            No tocante aos subsídios acionáveis, valem os limites delineados no artigo 7, "9" e "10" do Acordo. Tais dispositivos parecem não dar margem a dúvidas quanto à adoção do princípio da equivalência entre as contramedidas e os efeitos adversos dos ditos subsídios sobre o demandante, uma vez que a jurisprudência internacional tem sido interpretada pela maioria da doutrina, segundo Braz (2006), de forma a apontar a identidade de significado entre os termos equivalent [32] do artigo 22, "6" do ESC e commensurate [33] do artigo 7, "9" e "10" do Acordo.

            No entanto, com relação aos subsídios proibidos, controvertida é a redação do artigo 4, "10" e "11" do SCM Agreement quanto ao termo appropriate [34], uma vez que as notas de rodapé nº 9 e 10 referentes ao citado termo dispõem, ambas, que essa expressão não tem o significado de permitir contramedidas que sejam desproporcionais à luz do fato de que os subsídios com os quais se lida, sob tais dispositivos, são proibidos. Diante desse significado, coube à doutrina e à jurisprudência, segundo Braz (2006), estabelecer a relação existente entre as expressões equivalent e appropriate.

            A primeira decisão sobre a matéria de subsídios proibidos ocorreu no caso dissecado no presente estudo, o caso Bombardier versus Embraer. Diante da visão propugnada pela Rodada Uruguai e pelo ESC de que o objetivo principal das contramedidas é induzir o cumprimento das decisões do OSC, a conclusão a que a jurisprudência chegou foi a de que, em casos envolvendo subsídios proibidos, não se pode interpretar o artigo 4, "11" do Acordo de forma a limitar, como regra geral, o valor das contramedidas ao valor da anulação ou redução de benefícios efetivamente sofrida pela parte demandante, bem como não deve haver, necessariamente, qualquer relação (de igualdade, proporção ou qualquer outra) entre esses dois níveis, podendo o valor das contramedidas se relacionar a outro valor, como o valor dos subsídios proibidos pagos pelo demandado à sua indústria –alternativa esta verificada no caso Bombardier versus Embraer [35].

            Nesse diapasão, o princípio da equivalência deixa de ser aplicado, dando lugar à regra especial das "contramedidas apropriadas" prevista no artigo 4, "10" e "11" do SCM Agreement. Em cada caso, pois, as contramedidas propostas deverão ajustar-se adequadamente à respectiva situação fática, de acordo com a melhor análise dos árbitros do caso, e, quando o valor da anulação ou redução dos benefícios sofrida pelo demandante for substancialmente menor do que o valor apropriado para induzir o cumprimento das determinações do OSC, ou seja, a retirada dos subsídios ilegais, o valor de tal anulação ou redução de benefícios não será considerado como apropriado para as contramedidas, sendo o valor dos subsídios pagos pelo demandado um dos valores apropriados para substituí-lo. [36]

            1.2.1.3.Vantagens e Desvantagens

            Delineadas as linhas gerais do recurso à retaliação na normativa da OMC e visando à análise da sua eficácia, cabe ainda um exame específico acerca das vantagens e desvantagens na utilização da mesma [37].

            As vantagens da disponibilidade da retaliação pelo descumprimento de uma decisão do OSC podem ser divididas em duas categorias: sob o ponto de vista da parte demandante e sob a ótica da parte demandada. Para o membro da OMC que figura no pólo ativo da disputa e sagra-se vitorioso, a disponibilidade e a efetiva imposição de contramedidas traz as seguintes vantagens: a agilidade na imposição da sanção; os benefícios políticos internos, uma vez que o governo do demandante demonstra zelo pelo interesse dos seus nacionais; e o efeito moral da notoriedade da violação, o que faz com que a ação passe a ser vista com reprovação pela sociedade internacional.

            Quanto ao demandado, apesar da cautela em discorrer sobre vantagens para o réu condenado, são vantagens juridicamente consideradas: o controle institucional do OSC, bloqueando ações verdadeiramente unilaterais; o apoio político interno para cumprir a decisão, já que o cumprimento revela-se favorável e proveitoso no contexto da política externa; e a salvaguarda política, ou seja, a utilização da retaliação é vista como forma de manter, licitamente, a violação de norma da OMC e o descumprimento da decisão do OSC condenando tal violação.

            No que tange às desvantagens, a doutrina não identifica qualquer que seja para o demandado, identificando, por outro lado, diversas para o demandante e para o sistema multilateral de comércio.

            Ao demandante cumpre suportar: prejuízos econômicos; efeito discriminatório, devido à redução da concorrência e ao conseqüente aumento dos preços dos produtos e dos custos de produção; e discriminação internacional, uma vez que os países desenvolvidos têm mais possibilidades práticas de impor contramedidas contra países menores e cujas economias sejam dependentes de importações.

            Por sua vez, o sistema multilateral de comércio tem de sustentar as seguintes desvantagens: contrariedade ao princípio do livre comércio; violação dos direitos fundamentais de partes privadas, uma vez que a retaliação atinge os interesses particulares envolvidos no comércio internacional; e incentivo ao protecionismo.

            1.2.2.Análise da eficácia face ao objetivo das contramedidas

            Findas as considerações acerca da autorização e implementação da retaliação, cabe determinar o principal propósito da mesma na OMC, por tratar-se de questão preliminar à análise da eficácia. De fato, segundo o significado ordinário do termo, algo é eficaz quando produz o efeito desejado, ou seja, somente se pode afirmar se a retaliação é ou não eficaz se possível a verificação da consecução ou não do seu objetivo. Em Direito Internacional Econômico, sobretudo no seio do sistema de solução de controvérsias da OMC, as contramedidas são, em princípio, capazes de desempenhar, concomitantemente, em maior ou menor grau, diversas funções.

            Inicialmente, verifica-se o efeito de indução do cumprimento, segundo o qual, a imposição de medidas retaliatórias é capaz de propiciar um estímulo para que a parte julgada em violação cumpra a decisão do Órgão de Solução de Controvérsias. Em seguida, muito embora nenhum dos termos soe apropriado, uma vez que, na prática, a indústria beneficiada é distinta daquela que efetivamente sofreu os prejuízos, bem como a retaliação encontra-se limitada no tempo, não sendo possível ao demandante a indenização retroativa, apresenta-se a função reparadora ou indenizatória, que permite um certo grau de reparação pela anulação ou redução de benefícios sofrida pelo demandante em decorrência da conduta do membro em violação.

            Ademais, configura-se a função de "violação eficiente", já que possibilita aos membros da OMC descumprir suas obrigações quando circunstâncias graves o suficiente se apresentem. Por fim, a retaliação pode, ainda, cumprir a função de garantir a reciprocidade exigida pelos acordos da OMC através do restabelecimento do equilíbrio entre as concessões feitas por uma parte da disputa à outra.

            Nesse sentido, o estudo do real propósito das contramedidas no âmbito da OMC adquire importância para dois fins específicos: (i) a determinação dos parâmetros que devem limitar quantitativamente o recurso à retaliação; (ii) a definição dos rumos da evolução das sanções disponíveis na OMC, uma vez avaliada a eficácia na consecução do seu objetivo.

            Quanto à jurisprudência da OMC, o entendimento das arbitragens instauradas com base no artigo 22, "6" do ESC, sem maiores considerações, era o de que o principal objetivo da retaliação seria induzir o cumprimento da decisão do grupo especial ou do Órgão de Recurso pelo demandado. O principal argumento para a decisão, nos casos EC-Bananas (US), EC-Hormones (US), EC-Hormones (Canada) e EC-Bananas (Ecuador), decorria da temporariedade das contramedidas.

            No entanto, a partir do caso Bombardier versus Embraer (Brazil-Aircraft), houve uma maior elaboração dos argumentos, sobretudo porque aquele caso era o primeiro a tratar da imposição de contramedidas em resposta a subsídios proibidos pelo SCM Agreement. Dessa forma, os árbitros decidiram que, em tais casos, o princípio da equivalência não se aplicaria, sendo substituído pelo princípio das contramedidas apropriadas, que, por sua vez, autorizaria a retaliação em níveis superiores aos benefícios do demandante anulados ou diminuídos pelas medidas ilegais. A conclusão dos árbitros foi a de que as "contramedidas apropriadas" seriam aquelas necessárias para induzir o demandado ao cumprimento da decisão do OSC.

            Paralelamente, no caso US-Anti-Dumping Act, decidido em fevereiro de 2004, pela primeira vez houve o reconhecimento da função de restabelecimento do equilíbrio entre as concessões mútuas aplicadas pelas partes.

            Em agosto de 2004, os árbitros no caso US-Byrd Amendment indicaram uma possível transição do tradicional paradigma da indução ao cumprimento para uma posição mais flexível, capaz de acomodar as demais funções das contramedidas como objetivos igualmente perseguidos. O relatório deixou claro que a previsão expressa no princípio da equivalência no ESC consistia em indício da coexistência – talvez até da prevalência – do objetivo de restabelecer o equilíbrio entre as partes da disputa com o de induzir o cumprimento das decisões.

            Diante do exposto, as duas funções que dividem a doutrina acerca de seu principal objetivo são: a indução do cumprimento das decisões pelo demandado e o restabelecimento do equilíbrio entre as concessões recíprocas efetuadas pelas partes. A questão da divergência do objetivo principal das contramedidas reside, precipuamente, no fato de que o propósito de induzir o cumprimento, apesar do princípio da equivalência previsto expressamente no ESC, provavelmente levará, segundo David Palmeter [38], "a clamores por sanções mais severas quando as contramedidas não resultarem em cumprimento", violando, pois, o paradigma da reciprocidade.

            Tal receio não procede. Primeiramente porque, ao induzir o cumprimento das decisões, a retaliação certamente manteria o equilíbrio original das concessões recíprocas feitas pelas partes da disputa. Em segundo lugar, porque nenhum dos autores que defende a teoria da indução do cumprimento pretende afastar as limitações quantitativas impostas à retaliação, em especial o princípio da equivalência.

            De fato, a tese da indução do cumprimento não só impede a perda da credibilidade do sistema de solução de controvérsias, como também inviabiliza práticas protecionistas, sobretudo porque um dos principais objetivos da OMC é a liberalização comercial através da redução de barreiras e da eliminação de qualquer tratamento discriminatório nas relações comerciais internacionais.

            Cabe, ainda, uma crítica à tese do restabelecimento do equilíbrio. Em termos econômicos, tal restauração do equilíbrio se dá apenas em termos aproximados, pois enquanto a suspensão de concessões e outras obrigações é medida bilateral (ou, no máximo, plurilateral), as negociações para liberalização comercial e as próprias relações comerciais internacionais são necessariamente multilaterais, o que faz com que oportunidades de terceiros países sejam afetadas, em seu prejuízo ou benefício, cada vez que contramedidas são autorizadas e efetivamente implementadas como resultado final de uma controvérsia.

            Desta forma, a utilização de contramedidas no âmbito da OMC, também segundo interpretação mais fiel do texto do ESC, só faz sentido se tiver por objetivo – e efetivamente atingi-lo, mesmo que tal objetivo torne a retaliação fadada ao insucesso, devido ao princípio da equivalência – induzir o cumprimento das decisões pelo demandado, uma vez que a solução encontrada tornar-se-ia coerente tanto com a exigência de que as contramedidas fossem temporárias, como com a necessidade de se minimizar a permanência dos seus efeitos negativos sobre o demandante e, sobretudo, sobre o sistema multilateral de comércio como um todo.

            Traçados os objetivos e tecidas as considerações acerca da relevância dos mesmos, cabe análise acerca da eficácia da retaliação. Note-se que o que se pretende é apenas a verificação dos fins almejados pela referida sanção. Afastam-se, pois, os possíveis questionamentos acerca da efetividade da mesma – o que seria a conjunção entre a eficácia (consecução dos objetivos) e a eficiência (desempenho otimizado na consecução dos objetivos) – visto que demonstrado foi que a retaliação imprime, concomitantemente, vantagens e desvantagens às partes envolvidas e ao próprio sistema de solução de controvérsias.

            Diante da conclusão de que o principal objetivo da suspensão de concessões ou outras obrigações, prevista no ESC, seria induzir o demandado a cumprir a decisão do OSC, cumpre ressaltar, inicialmente, que a doutrina é praticamente unânime ao considerar alto o índice de cumprimento voluntário das normas das decisões finais no âmbito da OMC. Mesmo na era do GATT, o índice de cumprimento já era bastante respeitável, superior inclusive ao da Corte Internacional de Justiça.

            Quanto à implementação da retaliação, desde o início do funcionamento do GATT (entre 1948 e 1994), o seu Conselho Geral somente aprovou a imposição de contramedidas em uma ocasião. Todavia, a retaliação nunca chegou a ser aplicada. Atualmente, com a Organização Mundial do Comércio, o sistema de solução de controvérsias é o mecanismo mais eficaz dentre aqueles disponíveis nas relações econômicas internacionais. Torna-se apropriada, pois, uma breve retrospectiva de algumas das disputas em que houve autorização para retaliar.

            No caso EC-Bananas, o primeiro a lidar com a questão da suspensão de concessões ou outras obrigações, os Estados Unidos e o Equador solicitaram, e obtiveram, autorização para retaliar a Comunidade Européia. Todavia, o Equador nunca impôs as contramedidas autorizadas e os EUA, muito embora manterem suas próprias contramedidas em vigor por mais de dois anos, não puderam obter o cumprimento, pela Comunidade Européia, da decisão do Órgão de Recurso que condenara o regime europeu de importação, venda e distribuição de bananas.

            Por sua vez, no caso EC-Hormones, tanto os Estados Unidos como o Canadá obtiveram autorização para retaliar, e o fizeram. No entanto, mesmo com a imposição das contramedidas, a Comunidade Européia mantém até hoje o embargo às importações de carne tratada com hormônios, medida esta considerada inconsistente com a normativa da OMC.

            Por fim, nos casos Brazil-Aircraft e Canada-Aircraft, apesar de a imposição de contramedidas ter sido autorizada, respectivamente, ao Canadá e ao Brasil e ao Japão, tais membros ainda não se utilizaram, até a presente data, de tal prerrogativa. [39]

            Cumpre ressaltar, ainda, que muitas vezes os demandantes, vencedores de uma disputa, simplesmente se abstêm de buscar autorização para retaliar. Tal fato ocorreu, por exemplo, com a Guatemala, Honduras e México, no caso EC-Bananas, assim como com a Austrália, a Indonésia e a Tailândia no caso US-Byrd Amendment.

            Dessa forma, autores argumentam que o baixo número de solicitações de autorização para a implementação de contramedidas e o conseqüente baixo número de arbitragens com base no artigo 22, "6" do ESC são, em parte, reflexo do efeito indutivo da retaliação, ou seja, muitas controvérsias são extintas pelo acordo entre as partes devido ao medo de que o demandante venha a impor contramedidas ao final do procedimento [40]. Segundo tal entendimento, conclui-se que a previsão da imposição de contramedidas é extremamente eficaz, já que um baixo percentual de casos chega à fase de solicitação de autorização para retaliar.

            Todavia, tal enfoque recebe contra-argumentações. A doutrina reconhece a existência de inúmeros fatores para o cumprimento voluntário das normas contidas nos acordos da OMC, assim como para soluções mutuamente acordadas: (a) o cumprimento aumenta a eficiência dos acordos, pois reduz os custos de transação; (b) as obrigações a seres adimplidas são inseridas no acordo pelo fato de serem do interesse de todas as partes ratificantes; (c) a ampla difusão da noção social de cumprimento das obrigações internacionais; (d) o alto custo que o descumprimento representa para a reputação do membro em violação; (e) a pressão de grupos internos, como exportadores, consumidores e distribuidores de produtos importados, sobre o governo do membro demandado.

            No mesmo sentido, a fragilidade do recurso à suspensão de concessões e outras obrigações é demonstrada (i) pela opção de não retaliar, mesmo quando há autorização para tanto e (ii) pela não pretensão da consecução da retaliação pelos demandantes, mesmo vencida a disputa, após o não cumprimento das determinações dos órgãos adjudicatórios da OMC pelo demandado.

            Tal situação se verifica pela incapacidade da vasta maioria dos membros da OMC de impor contramedidas, seja em virtude de reconhecerem que a medida não surtirá efeitos, ou pelo fato de que os prejuízos causados pela retaliação ao próprio demandante – e com os quais os países menores, sejam desenvolvidos ou em desenvolvimento, não conseguem arcar – serem muito altos, em razão da dependência do país alvo.

            Cabe ressaltar, ainda, que, considerada a limitação da capacidade de retaliar, a retaliação parece condenada ao insucesso, mesmo que se considere como objetivo o mero restabelecimento do equilíbrio. Isto porque, se na maior parte das vezes, não há sequer a imposição das contramedidas autorizadas, o que ocorre é a manutenção da medida ilegal sem qualquer contraprestação pelo demandado.

            Por outro lado, ainda quando houve a efetiva imposição das contramedidas, estas foram incapazes de atingir seu objetivo, qual seja, a indução do cumprimento da decisão do Órgão de Recurso. A explicação encontra-se na limitação ao quantum da retaliação pelo princípio da equivalência: sempre que o demandado obtiver mais vantagens com a conduta ilícita do que os prejuízos causados aos demandantes, ele terá um incentivo a manter a violação e, em contrapartida, suportar a retaliação. De fato, enquanto os ganhos com a medida ilegal são concentrados no próprio demandado apenas, os prejuízos causados pela mesma medida são difusos, sentidos por diversos membros da OMC, sendo que, para a maioria deles, a retaliação não é, de fato, uma opção.

            The WTO DSB simply does not know the economic consequences of its retaliatory practice in all details. However, the WTO dispute settlement system does not work on its own interest, but on behalf of the complainant and defendant parties. This calls for a reform of the present system [...]. [41]

            Diante de todo o exposto, a doutrina majoritária, segundo Braz (2006), atesta a ineficácia das contramedidas, no que é reforçada pelas opiniões da maioria dos membros da OMC, representados por suas delegações junto à entidade.


2.NOVOS RUMOS PARA IMPLEMENTAÇÃO DA RETALIAÇÃO

            Em virtude do alto grau de descontentamento dos membros da OMC em geral, em especial dos países em desenvolvimento, com o recurso à suspensão de concessões ou outras obrigações, os membros decidiram incluir propostas de reformulação do instituto por ocasião do processo de revisão dos dispositivos do ESC atualmente em curso.

            The complexity of WTO dispute settlement proceedings is underlined by the fact that [...] numerous proposals for improving and clarifying the DSU have been made and discussed in WTO bodies [...]. Most of these proposals refer to institutional and/ or procedural changes; rarely do they touch intrinsic economic problems with the DS system. The reason for the lack of proposals to improve the WTO DS system from an economic point of view may be due to the fact that WTO issues are primarily a playground for lawyers. [42]

            Dentre as propostas de alteração do ESC, notadamente de autoria de países em desenvolvimento ou daqueles denominados "menos desenvolvidos", algumas possuem aplicabilidade prática questionável. De qualquer forma, característica comum a todas as propostas é a expectativa de que garantam maior cumprimento das decisões dos órgãos adjudicatórios da OMC pelos membros demandados e vencidos, sobretudo em casos envolvendo demandantes economicamente fracos contra grandes economias.

            2.1.APERFEIÇOAMENTO DO RECURSO

            Com o intuito de promover a eficácia da retaliação na indução do cumprimento das obrigações, o primeiro grupo de propostas consiste em sugestões para aperfeiçoar a medida. Preliminarmente, tais propostas podem parecer facilmente negociáveis, uma vez que, em princípio, os fundamentos do mecanismo de solução de controvérsias, como um todo, permaneceriam inalterados, ou ao menos pouco alterados, já que a gama de recursos disponíveis em caso de descumprimento das decisões não seriam alteradas. Todavia, o que se pretende demonstrar é que tais propostas podem ser tão radicais quanto aquelas que substituem, por completo, a imposição de contramedidas.

            2.1.1.Do Tratamento Diferenciado à Retaliação Coletiva

            O Entendimento relativo às normas e procedimentos sobre Solução de Controvérsias, em seu artigo 21, "8" dispõe acerca do tratamento especial e diferenciado dispensado aos países em desenvolvimento.

            A primeira proposta, feita pela delegação do Equador, consiste em expandir o escopo de aplicação desse tratamento, determinando que, em casos de disputa envolvendo um país em desenvolvimento como demandante, a análise da limitação quantitativa das contramedidas, a serem aplicadas pelo mesmo, deveria levar em consideração não apenas o volume de comércio afetado, como também o impacto de tais medidas sobre a economia daquele país. Dessa forma, através da mitigação do princípio da equivalência, o nível das contramedidas deveria ser equivalente a, pelo menos, o dobro dos prejuízos experimentados pelo demandante.

            Via de conseqüência, o objetivo único e exclusivo da proposta de tratamento especial e diferenciado parece ser aumentar o poder retaliatório dos países em desenvolvimento, com vistas a tornar eventuais contramedidas, impostas por estes, mais eficazes contra países desenvolvidos, em termos de indução ao cumprimento das decisões do OSC.

            Todavia, dita proposta comporta contradições em determinados aspectos: (i) a simples autorização da retaliação em níveis mais elevados não eliminaria a problemática da sua não aplicação pelos demandantes, uma vez que tal solução não expurgaria os efeitos que a suspensão de concessões teria sobre a economia do próprio membro que as impõe; (ii) segundo levantado por membros como a Comunidade Européia e a Noruega, a proposta equatoriana não estaria de fato amparada pelo princípio do tratamento especial e diferenciado dispensado a países em desenvolvimento, pois tal medida violaria o princípio da nação mais favorecida.

            Tal posicionamento merece críticas: (i) os acordos da OMC são um conjunto de regras permeado por infindáveis exceções, o que torna a resistência à criação de mais uma exceção à cláusula de nação mais favorecida exagerada, em especial se analisado o aspecto de que a proposta equatoriana visa a eliminar o problema da disparidade de forças entre países desenvolvidos e em desenvolvimento; (ii) há muito o tratamento especial e diferenciado dispensado aos países em desenvolvimento e menos desenvolvidos encontra-se arraigado nas normas reguladoras do comércio internacional, sendo inclusive prevista no GATT.

            De qualquer forma, a mera autorização de contramedidas em valor mais elevado, quando se tratar de países em desenvolvimento ou menos desenvolvidos, não corrige o problema da incapacidade da imposição das contramedidas e da consecução do seu principal objetivo, qual seja, a indução do cumprimento das decisões, devido aos prejuízos que a retaliação causaria às suas próprias economias.

            A delegação do Equador, entretanto, voltou a incluir a proposta no documento disponibilizado aos demais membros do OSC em 23 de janeiro de 2003, contendo o texto específico do novo dispositivo a ser acrescentado ao ESC. Apesar de o referido texto não ter sido incluído no relatório do presidente do OSC, ainda se pode dizer que as negociações permanecem abertas quanto à questão.

            Diante do exposto, com o objetivo de manter os efeitos adversos da retaliação sobre a economia do membro demandado, minimizando, contudo, tais efeitos sobre a economia do demandante, foi elaborada por diversos membros – tais como representações do Grupo dos Países Menos Desenvolvidos e do Grupo Africano e contando com o apoio de vários países em desenvolvimento, entre eles, Cuba, Honduras, Índia, Malásia, Paquistão, Sri Lanka, Tanzânia e Zimbábue – uma proposta de aperfeiçoamento do instrumento da retaliação com base na aplicação coletiva das contramedidas. [43]

            Consoante esta proposta de retaliação coletiva, na impossibilidade de imposição, pelo demandante, das contramedidas autorizadas pelos árbitros na forma do artigo 22 do ESC (o que ocorreria quase obrigatoriamente no caso de países em desenvolvimento ou país menos desenvolvidos), o OSC poderia, ou deveria, autorizar a retaliação coletiva por todos os demais membros da OMC. Nesta proposta, assim como a primeira, o nível autorizado para a retaliação não deveria observar, necessariamente, o princípio da equivalência, ou seja, este poderia ser substituído pelo princípio das contramedidas apropriadas, aplicada às disputas envolvendo subsídios proibidos.

            A principal contra-argumentação a esta proposta, segundo alguns autores, reside no fato de que, apesar de a OMC cuidar do sistema multilateral de comércio, e de as obrigações assumidas por seus membros estarem sujeitas ao tratamento da nação mais favorecida, a natureza das obrigações assumidas no âmbito da OMC e passíveis de questionamento perante o ESC é bilateral, e não multilateral, não sendo assumida perante a totalidade dos membros da OMC e nem perante toda a humanidade.

            De qualquer forma, a adoção da retaliação coletiva significaria uma profunda alteração nas bases da sistemática do mecanismo de solução de controvérsias da OMC, pois há o risco de nomear-se, efetivamente, um certo número de membros como detentores de poderes policiais, cuja conseqüência seria a priorização da fiscalização daquelas obrigações de interesse particular de tais potências, até mesmo em detrimento de todas as outras.

            Outra crítica, consistente numa abordagem pragmática, adverte que um membro que já tenha retaliado (como terceiro) com base em autorização de retaliação coletiva em determinada disputa, pode vir, no futuro, a ser prejudicado pelas mesmas medidas inconsistentes praticadas pelo membro demandado. Assim, a participação do novo demandado na retaliação coletiva anterior poderá ser um impedimento à nova autorização para a imposição de contramedidas adicionais. Neste caso, uma alternativa seria limitar o valor da nova autorização das contramedidas, deduzindo-se o montante imposto por tal membro na retaliação coletiva. Todavia, por implicar a não aplicação do princípio da equivalência, a proposta em questão possibilitaria a retaliação, coletivamente, em montante superior e desvinculado dos prejuízos decorrentes das medidas inconsistentes.

            Demais questões permanecem controvertidas, tais como quais os critérios adequados para a definição da proporção dos direitos retaliatórios a cada um dos demandantes, a cada um dos terceiros interessados, ou ainda, a cada um dos terceiros não participantes da demanda, observando-se que a retaliação por terceiros não seria obrigatória, o que causaria sua implementação apenas quando fosse de seu interesse político. Ademais, como praticamente apenas as grandes potências têm sido capazes de retaliar, tal mecanismo acabaria por concentrar tal recurso nas mãos dos Estados Unidos e da Comunidade Européia.

            Em razão dos questionamentos aduzidos e com base no prognóstico de aceitação da medida pelos membros da OMC, o presidente do OSC, em junho de 2003, declarou o entendimento de que a retaliação coletiva não goza de consenso suficiente para que venha a ser discutida em maior grau e, posteriormente, inclusa no texto do ESC.

            2.1.2Da Cessão de Direitos Retaliatórios

            Outra alternativa de aperfeiçoamento é encontrada em parte da proposta mexicana de alteração do ESC: a criação, no bojo do ESC, de um mecanismo de cessão de direitos retaliatórios, o qual permaneceria disponível àqueles países que, uma vez vencedores em sua disputa, enfrentassem a impossibilidade de imposição das contramedidas autorizadas. Nesses casos, o membro em questão seria autorizado a negociar seu direito de suspender concessões ou outras obrigações perante o demandado junto a um terceiro, em troca de certas vantagens. [44]

            Um exemplo concreto que ilustra a questão é o caso Bombardier versus Embraer. Neste caso, o Canadá, país desenvolvido, foi incapaz de impor as contramedidas autorizadas pelo OSC frente ao Brasil. Sob o modelo de cessão de direitos retaliatórios, o Canadá poderia então negociar o direito de retaliar o Brasil a quem estivesse disposto e tivesse condições de retaliar o Brasil, possivelmente Estados Unidos ou Comunidade Européia.

            A proposta defende que a livre negociação dos direitos retaliatórios não só traria um incentivo ao cumprimento das decisões do OSC, como também permitiria ao membro afetado obter um benefício mais tangível. Ainda, segundo argumentação mexicana, apesar da proposta parecer nova ao ordenamento da OMC, a idéia de direitos negociáveis já era aplicada com sucesso pela legislação interna da maioria dos membros e em outros ramos do Direito Internacional.

            Eis, entretanto, a crítica: a autorização de negociação de direitos retaliatórios transformaria a OMC em um mercado livre onde os referidos direitos seriam "traficados". Embora a contrapartida financeira experimentada pelo demandante, o mecanismo concentraria a retaliação nas mãos das grandes potências, as quais exerceriam tais direitos meramente para atingir suas finalidades, unilateralmente consideradas.

            Por outro lado, a existência em si da possibilidade da cessão onerosa de direitos retaliatórios poderia inibir a solução diplomática das disputas, o que contraria os objetivos do mecanismo de solução de controvérsias em si, conforme disposto no artigo 3, "7" do ESC. Tal comportamento prejudicaria seriamente o disposto nos artigos 4 e 5 do ESC, além de que a insuficiente transparência do mecanismo de supervisão do cumprimento das decisões do OSC, previsto no ESC, seria substituída pela obscuridade de um mercado, não regulado, de direitos retaliatórios.

            Ainda, segundo aspecto levantado pela delegação do Canadá na reunião de novembro de 2002, além de o "mercado", que seria criado a partir da alteração sugerida, ser por si só prejudicial do ponto de vista distributivo, uma vez que o mecanismo proposto acabaria concentrando os direitos retaliatórios nas mãos das grandes potências, deve-se atentar para o fato de que os direitos negociados sob tal mercado seriam medidas inerentemente restritivas ao comércio multilateral, contrariando os objetivos e propósitos da própria OMC.

            Note-se, porém, que, afora os comentários da representação canadense, os países desenvolvidos não criticaram (contudo também não exaltaram) a proposta mexicana, preferindo adotar uma postura, talvez mais política, de solicitar maiores comentários e sugerir maiores estudos sobre a proposta.

            2.2.ALTERNATIVAS À RETALIAÇÃO EM FACE DA SOBERANIA

            Existe praticamente unanimidade em relação ao entendimento de que a OMC, como conjunto de regras contidas em acordos e no mecanismo de solução de controvérsias, representa, de qualquer forma, limitação à soberania dos membros. De fato, apesar da submissão voluntária a tais normas, a interdependência econômica entre os países, inviabiliza o sucesso na promoção e implementação de políticas de comércio exterior consistentes por países excluídos da Organização.

            Realista também a argumentação de que ditas regras não instituem um Direito uniforme, sendo permeadas por inúmeras exceções. Todavia, inegável é que grande parte da competência legislativa dos membros, em matérias relacionadas ao comércio exterior, foi transferida para a Conferência Ministerial e para os demais órgãos da OMC.

            Com base nessa transferência de competência legislativa, somada à submissão a um mecanismo de solução de controvérsias entre Estados soberanos, capaz de aplicar medidas coercitivas contra eles, inúmeros governos nacionais expressaram preocupação com o estabelecimento da OMC e a entrada em vigor dos acordos da Rodada Uruguai, enquanto ainda eram discutidos seus termos.

            Tais preocupações em torno da soberania não exprimiam desejo de descumprimento das normas da OMC, mas eram plausíveis, uma vez que é necessária certa flexibilidade para minimizar eventuais conseqüências adversas a determinados objetivos nacionais julgados essenciais (e somente nestes casos), oriundas de irregularidades procedimentais ou de abuso de poder jurisdicional pelos grupos especiais, bem como de possíveis ambigüidades encontradas em dispositivos dos acordos da Rodada Uruguai.

            O posicionamento geral foi o de que os acordos da OMC eram de vital importância para o aperfeiçoamento de um sistema econômico internacional legalista, visando a oferecer maior segurança e certeza jurídica aos países ou demais sujeitos de Direito Internacional cujos elementos culturais e estruturas governamentais diferiam fundamentalmente.

            Nesse sentido, muito embora o poder de mitigar ainda mais a soberania estatal – já que, ao sugerirem tornar o mecanismo de solução de controvérsias mais eficaz, necessariamente aumentarão sua ingerência sobre os assuntos dos seus membros, uma vez que têm o intuito de virtualmente obrigá-los a cumprir as decisões do OSC – o segundo grupo de propostas de alteração do ESC com vistas a torná-lo mais eficaz tem como objetivo substituir a retaliação, como último recurso disponível ao demandante para induzir o demandado ao cumprimento da decisão do OSC.

            2.2.1.A Compensação Compulsória

            A primeira alternativa à retaliação, de autoria da representação do Equador e, posteriormente, do chamado Grupo dos Países Menos Desenvolvidos, consiste na possibilidade de o OSC determinar o oferecimento obrigatório de compensação pelo demandado, como passo seguinte à compensação atualmente prevista no art. 22, "2" do ESC, de caráter voluntário. O intuito é fazer da compensação uma sanção imposta pelo sistema multilateral aos membros que descumpram suas obrigações assumidas em acordos comerciais.

            Uma das formas de compensação, obrigatória e automática, previa que, uma vez exauridas as tentativas de cumprimento voluntário da decisão e o igualmente voluntário oferecimento de compensação aceitável pelo demandante, o Órgão de Solução de Controvérsias deveria compelir a parte demandada a apresentar um pacote de medidas compensatórias em valor equivalente ao valor da anulação ou redução de benefícios sofrida pelo demandante. Tal pacote seria analisado pela sessão do OSC imediatamente posterior e, sendo aprovado, seria executado pelo membro demandado.

            Paralelamente, como segunda forma de compensação, caso o membro demandado não oferecesse qualquer pacote compensatório no prazo estipulado, o OSC deveria entender tal fato como sendo uma opção, de tal membro, pelo pagamento de compensação pecuniária ao demandante, tornando a compensação uma sanção com poder de restaurar o equilíbrio comercial entre as partes.

            Diante do exposto, cumpre ressaltar que a doutrina internacional especializada já sugeria a aplicação de ambas formas de compensação no âmbito do ESC. De fato, a compensação pecuniária evitaria várias das desvantagens da suspensão de concessões, em especial a existência de prejuízos econômicos para o demandante, a discriminação internacional causada pela impossibilidade de países menores retaliarem os maiores, a incompatibilidade com o princípio do livre comércio e o incentivo ao protecionismo.

            Muito embora, conforme a jurisprudência do ESC, a compensação a ser oferecida pelo demandado ao demandante, diferentemente da retaliação, sujeita-se à cláusula de nação mais favorecida. Assim, uma vez concedida à parte demandante, a compensação consistente em vantagens comerciais (ou mesmo a compensação pecuniária) deveria ser estendida a todos os demais membros da OMC, o que tornaria o seu custo virtualmente proibitivo.

            Contudo, o que se espera é justamente que a compensação pecuniária venha a restaurar somente as perdas da indústria do membro demandante efetivamente prejudicada pelas medidas julgadas inconsistentes, o que mitigaria a essencialidade da observância do tratamento de nação mais favorecida. Dessa forma, uma vez que o pacote compensatório compulsório configuraria mais uma exceção à cláusula citada, verifica-se forte resistência a tal modalidade de alternativa à retaliação.

            Uma terceira modalidade de compensação proposta pelo Equador prevê que, no caso de o pacote compensatório vir a causar distorções nos padrões do comércio internacional, deveria ser aplicada obrigatoriamente a compensação pecuniária.

            Verifica-se, todavia, uma lacuna da proposta equatoriana quanto ao oferecimento de pacote compensatório em montante inferior ao da anulação ou redução de benefícios experimentada pelo demandante. Uma possível interpretação seria a de haver a homologação do referido pacote, contudo sujeita ao pagamento de compensação pecuniária equivalente à diferença entre o valor coberto pelo pacote compensatório e o efetivo valor dos prejuízos.

            Ademais, alerta-se quanto à opção de descumprimento. Sob o sistema proposto, o país demandado detentor de abundantes recursos poderá, efetivamente, pagar, eternamente, o demandante para manter as medidas inconsistentes em vigor, o que tornaria o problema ainda maior. A proposta tenta evitar a questão estabelecendo que o demandado só poderá se submeter à compensação pecuniária por um dado período (no caso, seis meses), sendo, então, obrigado a adotar as decisões do OSC. Contudo, não há qualquer indicação de como tal país seria obrigado a tanto, mencionando-se apenas a adoção de "medidas extremas", como a suspensão do direito de tal membro figurar como demandante em procedimentos sob o ESC, ou mesmo a autorização de "retaliação em larga escala", que não restou esclarecida.

            Como resultado das críticas, o Equador não voltou a mencionar a proposta em seus documentos mais recentes, submetidos à apreciação dos demais membros do OSC em 26 de novembro de 2002 e 23 de janeiro de 2003. Uma variação da proposta, sugerida pela Comunidade Européia e pela Suíça, seria a autorização de compensação pecuniária limitada, aplicável a situações excepcionais, como a reparação de danos causados a membros que não sejam partes na disputa. Outra alternativa seria a adoção da compensação compulsória, contudo sujeita ao princípio da nação mais favorecida, excepcionada a observância desta somente nos casos de compensação pecuniária. Ambas são inegavelmente mais brandas, sendo, portanto, de maior aceitação pelos membros, já que não alteram fundamentalmente o ESC.

            2.2.2A Suspensão de Direitos Políticos

            Outra proposta consiste na suspensão do direito de voto do membro demandado, em todas ou em determinadas deliberações do OSC ou da própria Conferência Ministerial, como alternativa à imposição de contramedidas e ao próprio mecanismo de compensação obrigatória. [45]

            Dessa forma, a alternativa vislumbrada seria a suspensão, pelo OSC, de determinados direitos políticos – o direito de voto e/ ou o de obter assitência financeira ou técnica – do membro demandado, até que este cumprisse as determinações daquele órgão.

            A principal crítica concerne ao fato de que as oportunidades efetivas de votação no âmbito da OMC seriam bastante restritas, assim como a assistência técnico-financeira ainda se encontra em estágio bastante incipiente. Como alternativa, foi apontada a suspensão do direito de demandar com base no ESC.

            De qualquer forma, seria necessária uma alteração nos fundamentos do ESC, uma vez que, segundo o texto atual, nem mesmo a imposição de contramedidas pode tomar a forma de suspensão de direitos políticos, pois a retaliação por ora prevista no ESC não pode versar sobre obrigações contidas nos acordos que proíbam a suspensão de concessões ou outras obrigações, entre eles aqueles que incluem os direitos políticos dos membros, como o ESC e o Acordo Constitutivo da OMC. Tal necessidade torna dúbia a possibilidade prática de se incluir a questão nas negociações referentes à revisão do ESC.

            Uma alternativa seria o acionamento da suspensão dos direitos políticos apenas após certo número de condenações não cumpridas por um mesmo membro. No entanto, algumas críticas ainda seriam cabíveis: (i) seria árduo obter um consenso acerca do número de violações que poderiam ser mantidas antes da perda dos direitos políticos pelo membro; (ii) ocorreria o revezamento das medidas ilegais em vigor; (iii) muito embora a permissão de violações até certo limite não ser considerada uma permissão propriamente dita, uma vez que as demais sanções (compensação e retaliação) já seriam aplicáveis, ela possivelmente enfraqueceria, politicamente, o sistema de solução de controvérsias da OMC, já que traduziria uma idéia de permissividade de violação bastante perigosa em um ambiente que, apesar de crescentemente legalista, ainda possui forte componente político nas suas interações.

            Uma outra variação do mecanismo de suspensão de direitos políticos prevê a suspensão gradual de direitos políticos, começando com o direito de participar de comitês menores, progredindo para direitos mais substanciais, culminando com o direito de demandar perante o OSC. Contudo, a proposta não esclarece qual o critério para a progressão da sanção: a gravidade do descumprimento, a reincidência ou qualquer outro.

            De qualquer forma, alguma modalidade de suspensão de direitos políticos tem sido proposta recorrentemente pela doutrina, dividindo a preferência dos internacionalistas com a imposição de multas pecuniárias.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

            Eu penei, mas aqui cheguei

            ("Pau-de-Arara" - Luiz Gonzaga)

            O sistema internacional passa por um momento de profundas mudanças que se refletem, principalmente, nas relações dos atores envolvidos nos processos negociais e na estruturação de sua base de poder. A hegemonia, entretanto, não pode ser exercida somente através de meios materiais, financeiros e tecnológicos. É imprescindível que ela atue igualmente no campo dos valores, ou seja, da ideologia – uma concepção do intelecto que elabora uma teoria acerca da situação segundo seus interesses, valores e atitudes.

            O desenvolvimento dos meios de comunicação e o fim dos antigos sistemas políticos, associados ao aumento e diversificação dos fluxos econômicos, sociais e culturais, implicaram em uma nova configuração do cenário mundial. Essa integração organizada, entre uma multiplicidade de economias nacionais, requer um mecanismo de interface de mediação, inclusive porque o comércio entre os países tem como uma de suas bases as diferenças de vantagens comparativas entre as economias. A OMC é esse mecanismo.

            Tal mecanismo é fundamental porque o mercado nunca é perfeito e não opera no vazio. Requer uma moldura jurídica que exprime realidades políticas e econômicas. Além disso, se o mercado e a competição podem ser vistos como uma luta de todos por todos – é a tese do doux commerce – é também, simultaneamente, a luta de todos contra todos. Imprescindível é que o comércio internacional transforme-se numa alavanca do desenvolvimento e da redução das desigualdades sociais e, portanto, que a liberalização não se faça a qualquer preço.

            A idéia diretiva da OMC é a de que a gestão dessa relação, de conflito e cooperação, deve ser um jogo que tem normas, compartilhadas por todos que dele participam e vistas por todos como as de um fair play. Nesse sentido, o patrimônio da OMC não são recursos, mas sim a credibilidade, a aceitabilidade e a observância de suas normas.

            Nesse sentido, o campo das soluções pacíficas de controvérsias internacionais sempre ocupou um lugar de destaque no Direito Internacional Público, pois representam um duplo papel nas relações internacionais: solucionar questões controvertidas entre Estados, e, ao mesmo tempo, servir de prevenção a que estes recorram a medidas extremas, que importam na própria negação do Direito Internacional, como o uso de represálias econômicas ilegítimas, de ameaça ou uso de represálias militares, até uma situação de guerra declarada.

            Cabe, pois, uma avaliação – tendo em vista a evolução histórica – da perspectiva acerca da possibilidade da promoção de alterações no ESC, de forma a se reformular o rol de sanções disponíveis no sistema de solução de controvérsias da OMC.

            No ponto de partida do GATT, os governos das partes contratantes tinham como cara a liberdade para desobedecer as suas regras, o que gerou, em meio a alguns sucessos, uma grande lista de fracassos do sistema que antecedeu ao hoje vigente na OMC. Acreditava-se que o sistema de solução de controvérsias funcionaria melhor se o membro demandado participasse de forma estritamente voluntária, sendo contraproducente tentar forças os governos a adotar decisões que eles não estariam aptos a cumprir voluntariamente.

            A mudança de atitude, que levou à aprovação do texto do ESC atualmente em vigor, operou-se em virtude da crescente utilização, pelos Estados Unidos, de mecanismos internos para adjudicar questões de descumprimento, por outras partes do GATT, de suas obrigações previstas naquele acordo, o que levava à imposição unilateral de sanções contra as partes tidas como em violação das normas do GATT. O atual texto do ESC nasceu nesse contexto, passando a servir, a partir de sua entrada em vigor em 1995, a uma clientela bastante relutante, que ainda tinha sérias reservas à obediência de decisões de órgãos adjudicatórios internacionais.

            Dessa forma, a conclusão é a de que o sistema de tomada decisões hoje vigente na OMC impede a realização de uma reforma do ESC que seja significativa a ponto de incluir inovações quanto às sanções previstas. Isto ocorre porque: (a) o Acordo Constitutivo da OMC prevê um quorum unânime para a alteração do texto de seu Anexo 2, o ESC; (b) os países desenvolvidos possuem constante aversão a submeter-se a qualquer tipo de votação em que estejam envolvidos países em desenvolvimento; (c) não há acordo entre os próprios países desenvolvidos quanto a diversas questões fundamentais referentes ao comércio mundial; (d) alguns congressistas norte-americanos possuem o pensamento de que a opção de descumprimento, hoje disponível aos países ricos, é indispensável à proteção mínima da soberania dos membros da OMC.

            Configura-se assim a forte resistência a qualquer tentativa de se conferir mais eficácia ao sistema de solução de controvérsias da OMC, através da indução de demandados ao cumprimento de decisões, não havendo qualquer avanço concreto no sentido de se alterar o atual regime das contramedidas.

            Não obstante, a questão continua na pauta de negociações, o que mantém aberta a possibilidade de, uma vez obtido o grau de consenso necessário, ser alterado o corrente sistema de retaliação no mecanismo de solução de controvérsias da entidade.

            No tocante ao sistema de solução de controvérsias adotado no âmbito da OMC – o Dispute Settlement Body – pode até restar a imagem de que tal sistema é ineficaz, uma vez que as decisões dele emanadas, por si só, não são capazes de conferir plena satisfação aos que recorrem ao mesmo, haja vista a duvidosa utilidade do poder de retaliar concedido ao vencedor.

            Essa imagem, todavia, não corresponde à realidade. Aos se analisar a forma como o DSB se encontra estruturado, verifica-se que o mesmo não foi efetivamente concebido para autorizar a aplicação de sanções – não se destinando a funcionar como uma espécie de "poder de polícia". Ao revés, em todos os seus termos, o Entendimento relativo às normas e procedimentos sobre Solução de Controvérsias prioriza a solução negociada e as consultas bilaterais entre as partes envolvidas, na tentativa de promover o entendimento e evitar que os conflitos comerciais evoluam para o quadro crítico de sanções e retaliações comerciais. Ressalte-se que, na medida do possível, o OSC vem obtendo êxito nesse campo.

            O fato de o sistema de solução de controvérsias da OMC conter imperfeições, e, sobretudo, de ainda não oferecer mecanismos que permitam conferir satisfação integral às partes prejudicadas por condutas contrárias aos acordos comerciais firmados, não retira a sua importância no cenário do comércio internacional, nem tampouco o coloca em uma situação sob suspeita. Sua atuação vem sendo pautada na estrita observância das normas contidas nos acordos firmados. Se tais acordos, contudo, não atendem às necessidades dos países em desenvolvimento, notadamente, quanto à questão dos subsídios, o foco deve ser a modificação desses acordos, e não a discussão em torno da importância e da lisura de um sistema de solução de controvérsias.

            O sistema não se encontra totalmente livre de pressões ou influências, principalmente na fase de implementação das decisões proferidas, mas essa situação é inerente à própria história da humanidade e, até mesmo, da própria natureza, em que o mais apto exerce o domínio sobre os menos preparados. O que se busca é o controle dessa situação, amenizando-a e enquadrando-a numa ótica de igualdade e interdependência, em que a condição de prevalência esteja indissociavelmente atada às regras previamente estabelecidas e, dessa forma, conseqüentemente neutralizada. Se um sistema de solução de controvérsias consegue, ao menos, reduzir e neutralizar, na medida do possível, esse desequilíbrio de forças, já está cumprindo boa parte de seus objetivos, contribuindo para uma certa organização e forma às relações comerciais internacionais, o que trará, inegavelmente, benefícios para a ordem política mundial.

            Em virtude dessa busca da equalização de medidas comerciais e forças políticas, se, de um lado, a globalização favorece a maioria, constitui, em oposição, perdedores que tendem a se organizar em blocos turbulentos. Existe ainda uma acirrada disputa por recursos naturais, que pode acarretar medidas protecionistas e até mesmo conflitos armados – foi o que desencadeou a Primeira Guerra Mundial e interrompeu um período de globalização capaz de rivalizar com o atual. Nesse viés, a história ensina um perigoso paradoxo: a abertura comercial ajuda as nações a prosperar, mas a prosperidade das nações não é garantia de que a abertura se amplie, nem sequer de que se mantenha. [46]


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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            ______. The Panel Process. Disponível em: <http://www.wto.org/english/thewto_e/whatis_e/tif_e/disp2_e.htm> Acesso: em 25 maio 2007.


OBRAS CONSULTADAS

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            FERNANDES, Francisco. LUFT, Celso Pedro. Dicionário de sinônimos e antônimos da língua português: de acordo com a ortografia oficial brasileira. 30.ed. Rio de Janeiro: Globo, 1989.

            FURASTÉ, Pedro Augusto. Normas Técnicas para o Trabalho Científico: elaboração e formatação. Explicitação das normas da ABNT. 14.ed. Porto Alegre: [S.ed.], 2006.

            MESQUITA, Roberto Melo. Gramática da língua portuguesa. 1.ed. São Paulo: Saraiva, 1994.

            RYAN, Maria Aparecida Florence Cerquera. Conjugação dos verbos em português – prático e eficiente. 5. ed. São Paulo: Ática, 1989.

            RUBIO, Paloma. Verbos españoles conjugados. 12.ed. Madrid: SGEL, 2002.

            SEINTENFUS, Ricardo. Legislação Internacional. Barueri: Manole, 2004.

            ______. Manual das organizações internacionais. 3.ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.

            UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA. Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa. Estrutura e apresentação de monografias, dissertações e teses: MDT. 6.ed. Santa Maria: Ed. da UFSM, 2006.

            VENTURA, Deisy. Monografia jurídica: uma visão prática. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000.

            ______. Las asimetrías entre el Mercosur y la Unión Europea: los desafíos de una asociación interregional. Montevidéu: Konrad Adenauer, 2005.

            Dissertações

            ZANOTO, Josianne. A funcionalidade do tribunal permanente de revisão do Mercosul: entre o órgão de apelação da Organização Mundial do Comércio e o tribunal de justiça das Comunidades Européias. Santa Maria: UFSM, 2006. Dissertação (Mestrado em Integração Latino-americana), Universidade Federal de Santa Maria, 2006.

            Capítulos de livros

            DINIZ, Arthur José de Almeida. Direito internacional: nova ordem ou velho caos? In: BRANT, Leonardo Nemer Caldeira (coord.). O Brasil e os novos desafios do direito internacional. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

            LASMAR, Jorge Mascarenhas. TAVARES, Rogério de Vasconcelos Faria. Desafios contemporâneos dos sistemas de solução de controvérsias. In: BRANT, Leonardo Nemer Caldeira (coord.). O Brasil e os novos desafios do direito internacional. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

            SOARES, Guido Fernando Silva. Os sujeitos em direito internacional público. In: ______. Curso de direito internacional público. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2004. v.1.

            ______. Responsabilidade internacional dos Estados: sanções. In: ______. ______. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2004. v.1.

            ______. Soluções pacíficas de controvérsias internacionais. In: ______. ______. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2004. v.1.

            Artigos e matérias de acesso em meio eletrônico

            BASSO, Maristela. BEAS, Edson. O acordo TRIPS como instrumento de retaliação cruzada e as regras da OMC – alternativa para o Brasil em caso de descumprimento dos EUA da decisão do órgão de apelação na controvérsia do algodão. Disponível em: < www.ewg.org/issues/agriculture/20050609/pdf/trips.pdf> . Acesso em: 27 jan. 2007.

            CORRÊA, Luciane Amaral. A cláusula do tratamento nacional em matéria tributária do Gatt/94 e o Brasil: validade e responsabilidade internacional em face do artigo 151, III da Constituição Federal de 1988. Revista de Informação Legislativa, n.154, abr./jun. 2002. Disponível em: < http://www.senado.gov.br/web/cegraf/ril/Pdf/pdf_154/R154-11.pdf> . Acesso em: 04 fev. 2007.

            DECISÃO da comissão de 6 de janeiro de 2004 que encerra o processo de exame no que respeita ao programa brasileiro de financiamento das exportações , tal como aplicado ao sector da aeronáutica regional. Jornal Oficial da União Européia. Bruxelas, 8 jan. 2004. Disponível em: < http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/site/pt/oj/2004/l_004/l_00420040108pt00250026.pdf> . Acesso em: 30 jan. 2007.

            KECH, Alexander. MALASHEVICH, Bruce. GRAY, Ian. A ‘probabilistic’ approach to the use of econometric models in sunset reviews. Disponível em: < http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=901606> . Acesso em: 04 fev. 2007.

            LIMÃO, Nuno. SAGGI, Kamal. Tariff retaliation versus financial compensation in the enforcement of international trade agreements. Disponível em: < http://www-wds.worldbank.org/external/default/WDSContentServer/ IW3P/IB/2006/03/24/000160016_20060324163518/Rendered/PDF/wps3873.pdf> . Acesso em: 04 fev. 2007.

            SPAMANN, Holger. The myth of ‘rebalancing’ retaliation in WTO dispute settlement pratice. Disponível em: < http://jiel.oxfordjournals.org/cgi/content/abstract/jgi054v1> . Acesso em: 28 jan. 2007.

            Documentos em meio eletrônico

            Organização Mundial do Comério (http://www.wto.org)

            Acordo Constitutivo da Organização Mundial do Comércio

            Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias

            Ministério das Relações Exteriores (http://mre.gov.br)

            Entendimento relativo às normas e procedimentos sobre Solução de Controvérsias

            Sites

            www.bb.com.br

            www.brazil.ox.ac.uk

             www.commercialdiplomacy.org

            www.eiop.or.at

             www.eur-lex.europa.eu

            www.europa.eu.int

             www.ewg.org

             www.iconebrasil.com.br

             www.jiel.oxfordjournals.org

            www.mre.gov.br

            www.oecd.org

             www.programaici.com.uy

            www.senado.gov.br

            www.unctad.org

            www-wds.worldbank.org

            www.wto.org


NOTAS

            01 BECHARA, Carlos Henrique Tranjan; REDENSCHI, Ronaldo. A solução de controvérsias no Mercosul e na OMC: o litígio Brasil X Argentina no Mercosul – o caso Embraer na OMC – Brasil X Canadá. São Paulo: Aduaneiras, 2002, p. 61.

            02 LAFER, Celso. O Sistema de Solução de Controvérsias da Organização Mundial do Comércio. In: CASELLA, Paulo Borba (coord.); MERCADANTE, Araminta de Azevedo (coord.). Guerra Comercial ou Integração Mundial pelo Comércio? A OMC e o Brasil. São Paulo: LTr, 1998, p. 729-730.

            03 CARVALHO, Maria Auxiliadora de; SILVA, César Roberto Leite da. Economia internacional. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 85.

            04 THORSTENSEN, Vera. OMC: Organização Mundial do Comércio: as regras do comércio internacional e a nova rodada de negociações multilaterais. 2.ed. São Paulo: Aduaneiras, 2005, p. 371.

            05 PROGRAMA ICI. Sistema de Solución de Diferencias. Disponível em: <http://programaici.com.uy/pag_documento.php?documentoID=45> Acesso em: 25 maio 2007. Tradução livre: "O sistema se encontra regulado normativamente pelo ESC (Entendimento sobre Solução de Controvérsias). Seu órgão decisor principal é o Conselho Geral (Órgão de Solução de Controvérsias – OSC – quando atua nesta modalidade), o qual está de acordo com a reunião de todos os representantes de todos os Estados Membros da OMC. O OSC exerce a função de direção dos procedimentos na solução de conflitos entre países membros; tem a faculdade de estabelecer os Grupos Especiais, adotar seus informes e os do Órgão de Recurso, vigiar a aplicação dos informes e autorizar a imposição das medidas de retaliação em caso de não cumprimento do país demandado. O sistema busca promover soluções mutuamente favoráveis às partes mediante negociação, antes de buscar uma resolução imposta unilateralmente."

            06 BRAZ, Mario Sergio Araujo. Retaliação na OMC. Coleção Biblioteca de Direito Internacional. Curitiba: Juruá, 2006, p. 19.

            07 Panel significa o procedimento propriamente dito, instaurado perante a Organização Mundial do Comércio, que analisará o pleito da nação reclamante e as razões da nação reclamada sob a ótica das normas contidas nos tratados. É uma expressão em inglês que se encontra mencionada ao longo do tratado que constitui o Órgão de Solução de Controvérsias A tradução vulgar do termo é "painel", sendo que a mais apropriada é "comitê". Neste trabalho, utilizar-se-á a expressão em inglês. Cumpre tecer uma explicação mais detalhada: "[...] el espíritu del mecanismo radica en el alcance de una resolución de la controversia de forma negociada, instancia que se materializa en la celebración de consultas entre el consultante y el consultado. En el caso de que esta etapa fracase el país demandante puede exigir la constitución de un Panel." (PROGRAMA ICI. Sistema de Solución de Diferencias. Disponível em: <http://programaici.com.uy/pag_documento.php?documentoID=45> Acesso em: 25 maio 2007) Tradução livre: "o espírito do mecanismo consiste em buscar uma resolução da controvérsia de forma negociada, instância que se materializa na celebração de consultas entre o consultante e o consultado. Em cada de esta etapa fracassar, o país demandante pode exigir a constituição de um Panel." "Panels are like tribunals. But unlike in a normal tribunal, the panellists are usually chosen in consultation with the countries in dispute. Only if the two sides cannot agree does the WTO director-general appoint them. Panels consist of three (possibly five) experts from different countries who examine the evidence and decide who is right and who is wrong. The panel´s report is passed to the Dispute Settlement Body, which can only reject the report by consensus. Panellists for each case can be chosen from a permanent list of well-qualified candidates, or from elsewhere. They serve in their individual capacities. They cannot receive instructions from any government." (WORLD TRADE ORGANIZATION. The Panel Process. Disponível em: <http://www.wto.org/english/thewto_e/whatis_e/tif_e/disp2_e.htm> Acesso em: 25 maio 2007) Tradução livre: "Panels são como tribunais. Como em um tribunal, os membros são escolhidos, geralmente, em consulta aos países envolvidos na contenda. Apenas em caso de não haver consenso, o diretor-geral da OMC indica-os. Panels são formados por três (possivelmente cinco) especialistas de diferentes países que examinam as evidências e decidem quem está certo e quem está errado. O relatório do Panel é enviado ao DSB, o qual somente pode rejeitá-lo por consenso. Os membros podem ser selecionados a partir de uma lista permanente de candidatos qualificados ou a partir de algum outro modo. Eles auxiliam conforme suas capacidades individuais. Eles não podem receber instruções de nenhum governo."

            08 Tradução livre: Órgão de Recurso.

            09 Convém fazer breve comentário acerca do termo. A expressão "judicialização" pode ser conceituada como aquilo que se "judicializa", que se submete à esfera judicial. Judicial, por sua vez, indica aquilo que se processa segundo a ordem judiciária (Cf. NUNES, 1958, v. II, p. 110). Sendo assim, o atual sistema de solução de controvérsias da OMC adquire caracteres judiciais, uma vez que se processa perante um tribunal, segundo normativas preestabelecidas e detentoras de poder coator.

            10 LAFER, Celso, op. cit., p. 752.

            11O Brasil envolveu-se em três contenciosos com o governo canadense na OMC, a saber: (i) Canadá - Medidas Relativas a Exportações de Aeronaves Civis; (ii) Canadá - Créditos à Exportação e Garantias de Empréstimos para Aeronaves Regionais; e (iii) Brasil - Programa de Financiamento a Exportações de Aeronaves – PROEX.

            12O subsídio, quando empregado como instrumento de política comercial, consiste em pagamentos, diretos ou indiretos, feitos pelo governo, para estimular exportações ou desencorajar importações. Em ambos os casos, equivale a um imposto negativo e representa, portanto, uma redução de custo para o produtor. A concessão de subsídios, via de regra, é efetuada por meio de pagamento em dinheiro, redução de impostos ou financiamentos a taxas de juros inferiores às de mercado. Casos há em que o governo compra do fornecedor e revende por valor inferior aos consumidores (Cf. CARVALHO; SILVA, op. cit., p. 65-66).

            13O Órgão de Solução de Controvérsias da OMC (Dispute Settlement Body) é fruto de uma concepção de cooperação organizada com vistas ao aprimoramento e à liberalização contínua do comércio internacional. Um dos fatores que permitiram a criação da OMC decorreu da mitigação da verificação de conflitos de concepção quanto à estrutura da ordem econômica mundial e quanto ao conceito de comércio internacional. Em razão do deslocamento da problemática para o âmbito dos conflitos de interesses, a solução dos problemas viabilizou-se através de um arcabouço de normas e regras. O sistema de resolução de conflitos da OMC, diversamente da origem do sistema do GATT, nasceu sob a égide de uma obrigação jurídica das partes contratantes, sendo parte do quadro constitutivo da própria Organização, previsto em anexo próprio e sob a denominação de Dispute Settlement Understanding (Cf. BECHARA; REDENSCHI, op. cit., p. 69-73). Importante notar a diferença existente entre os métodos de solução de controvérsias do Mercosul e da OMC, uma vez que, no âmbito do Mercosul, os particulares têm legitimidade para recorrer ao órgão de solução de controvérsias, a fim de instaurar litígios de cunho privado, enquanto que, no DSB, somente os países possuem legitimidade para tanto, atuando como representantes dos interesses das empresas nacionais. Tal diferença reside no âmago do projeto integracionista. O Mercosul pretende ser uma verdadeira comunidade política, econômica, social e cultural, ao passo que a Organização Mundial do Comércio funciona como gestora e fiscalizadora dos acordos comerciais firmados, além de buscar a crescente liberalização das barreiras comerciais (ZANOTO, 2006).

            14O comércio internacional, embora entendido pela OMC como um fluxo de bens e serviços entre seus membros, não é tipicamente conduzido pelos Estados, mas por entidades econômicas privadas. Nesse sentido, o objetivo central do DSB é fornecer segurança e previsibilidade ao sistema de comércio multilateral, pautando-se nos princípios de eqüitatividade, celeridade, eficiência e aceitação mútua. Necessárias, pois, estabilidade e previsão governamental quanto às regras que regem a atividade comercial, sobretudo quando a transação é baseada em longos prazos. "By reinforcing the rule of law, the dispute settlement system makes the trading system more secure and predictable. Where non-compliance with the WTO Agreement has been alleged by a WTO Member, the dispute settlement system provides for a relatively rapid resolution of the matter through an independent ruling that must be implemented promptly, or the non-implementing Member will face possible trade sanctions." (WORLD TRADE ORGANIZATION. Introduction to the WTO Dispute Settlement System. Disponível em: <http://www.wto.org/english/tratop_e/dispu_e/disp_settlement_cbt_e/c1s3p1_e.htm> Acesso em: 25 maio 2007) Tradução livre: "Reiterando a regra da lei, o sistema de solução de controvérsias torna o sistema comercial mais seguro e previsível. Quando o não cumprimento do Acordo da OMC é alegado por um Membro, o sistema de solução de controvérsias promove uma resolução relativamente rápida da contenda através de sistema independente que deve ser implementado imediatamente, ou o Membro transgressor irá, possivelmente, sofrer sanções comerciais."

            15O Acordo prevê a existência de subsídios proibidos, recorríveis e não-recorríveis. Dois critérios são utilizados para determinar a aplicação das disposições: a definição de subsídio e a especificidade do mesmo. Existe subsídio quando um governo faz uma "contribuição financeira" que dá uma vantagem a quem a recebe. São subsídios específicos – portanto recorríveis e sujeitos a direitos compensatórios – os programas governamentais que, por legislação expressa e comprovável, limitam seus alcance e benefícios. Proibidos são os concedidos às exportações e que condicionam sua concessão ao uso de produtos nacionais em detrimento dos importados. Não-recorríveis são os programas governamentais não específicos ou que, ainda que específicos, cumpram determinados critérios de seleção. O Acordo prevê que se um membro da OMC concede subsídios proibidos ou recorríveis, o país afetado pode pedir consultas e recorrer ao OSC. Se forem subsídios permitidos que causem dano à produção nacional, existe a possibilidade de iniciar consultar e pedir autorização ao comitê correspondente para a imposição de contramedidas (BAUMANN, Renato. CANUTO, Otaviano. GONÇALVES, Reinaldo. Economia internacional: teoria e experiência brasileira. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004, p. 149).

            16Acordo firmado por governo ou empresa para compensar o empréstimo realizado (Oxford Advanced Learner’s Dictionary. Oxford: Oxford, 2000).

            17Cumpre, no entanto, indagar o modo como vem sendo imposta essa tentativa de expurgo, sobretudo diante da realidade em que se encontra o estágio de desenvolvimento econômico mundial. Na realidade, a concessão de subsídios e a imposição de barreiras alfandegárias resumem a problemática de conciliar as noções de livre mercado e livre circulação de mercadorias com a necessidade específica de cada nação na adoção de medidas beneficentes (Cf. BECHARA; REDENSCHI, op. cit., p. 88). Nesse diapasão, parte expressiva das análises acerca do Acordo sob a ótica dos países em desenvolvimento dá ênfase ao fato de que, ao limitar uma série de iniciativas, o Acordo reduz a margem de manobra desses países, impossibilitando-os de repetir práticas utilizadas no passado de forma intensa pelos países hoje desenvolvidos e por alguns dos países em desenvolvimento de comportamento exportador mais agressivo, derivando daí uma desigualdade de oportunidades. Todavia, o fato é que avaliações diversas permitem considerar que esse Acordo conferiu mais transparência à prática de concessões de subsídios e que configura um estímulo à busca de novas formas de incentivo ao setor exportador (Cf. BAUMANN; CANUTO; GONÇALVES, op. cit., p. 150). Hodiernamente, as críticas tecidas ao Dispute Settlement Body não consideram o fato de que dito órgão encontra-se adstrito às normas contidas nos acordos firmados por seus países-membros, sendo o Brasil um dos seus subscritores. Trata-se, pois, de, na medida da ordem econômica mundial, pleitear-se a consecução dos interesses nacionais.

            18 WORLD TRADE ORGANIZATION. Brazil – Export Financing Programme for Aircraft. Disponível em: <http://www.wto.org/english/tratop_e/dispu_e/cases_e/ds46_e.htm> Acesso em: 25 maio 2007.

            19 "On 3 May 1999, Brazil notified its intention to appeal certain issues of law and legal interpretations developed by the Panel. The report of the Appellate Body was circulated to Members on 2 August 1999. The Appellate Body upheld all the findings of the Panel, but reversed and modified the Panel´s interpretation of the ‘material advantage’ clause in item (k) of the Illustrative List of Export Subsidies in Annex I of the SCM Agreement. The DSB adopted the Appellate Body Report and the Panel Report, as modified by the Appellate Body Report, on 20 August 1999." (WORLD TRADE ORGANIZATION. Brazil – Export Financing Programme for Aircraft. Disponível em: <http://www.wto.org/english/tratop_e/dispu_e/cases_e/ds46_e.htm> Acesso em: 25 maio 2007) Tradução livre: "Em 03 de maio de 1999, o Brasil notificou a intenção de recorrer certas questões de lei e interpretações legais do Panel. O relatório do Órgão de Recurso foi apresentado para os Membros em 2 de agosto de 1999. O Órgão de Recurso sustentou todas as determinações do Panel, mas reverteu e modificou a interpretação do Panel acerca da vantagem de monta prevista no item "k" da Lista Ilustrativa de Subsídios à Exportação no Anexo I do Acordo de Subsídios e Medidas Compensatórias. O DSB adotou o relatório do Órgão de Recurso e o relatório do Panel, modificado pelo relatório do Órgão de Recurso, em 20 de agosto de 1999."

            20O ESC propugna, em seu artigo 25, uma previsão genérica de submissão de controvérsias à arbitragem. Determina o referido artigo que, por ser a arbitragem um meio mais rápido de solução de controvérsias, o procedimento previsto no ESC, à exceção das etapas previstas nos arts. 21 e 22 – supervisão do cumprimento de decisões, oferecimento e compensações, autorização para retaliar e arbitragem sobre o montante da retaliação a ser autorizada, poderá ser substituído por uma arbitragem fora do âmbito do OSC, conforme procedimentos a serem acordados pelas partes envolvidas. Concluído o laudo arbitral, deverá o mesmo ser informado ao OSC e ao Conselho ou Comitê relevante, para que se possam adequar o resultado da arbitragem às regras dos acordos da OMC. O artigo 25 prevê ainda o controle sobre o cumprimento das decisões do laudo (art. 21) e a possibilidade de recurso (art. 22), pela parte favorecida pelo laudo, para que lhe seja proposta compensação ou garantido o direito de impor contramedidas (Cf. BRAZ, op. cit., p. 19).

            21No original em inglês, suspension of concessions or other obligations.

            22No original em inglês, countermeasures.

            23Cabe observar, quanto à forma para implementar as contramedidas, que não há obrigatoriedade, no Direito Internacional, para que se proceda à suspensão do cumprimento de obrigações, mesmo porque, não raras vezes, dita modalidade de contramedidas pode vir a ser altamente inadequada, dado o número elevado de variáveis que a permeiam. Todavia, embora não obrigatória, a limitação das contramedidas, pelos acordos da OMC, à suspensão de concessões ou outras obrigações sob os mesmos acordos – as "contramedidas recíprocas" – é, sempre que conveniente, recomendável. A justificativa está em que se torna mais provável a satisfação de requisitos, como necessidade e proporcionalidade, caso as contramedidas sejam tomadas em relação às mesmas obrigações violadas pelo país alvo, ou a obrigações estritamente relacionadas a elas. Invariavelmente, porém, a idéia subjacente é a adoção de uma medida que, ausente a violação prévia do país alvo, constituiria ato ilícito sob a normativa da OMC (Cf. BRAZ, op. cit., p. 91-93).

            24Cf. BRAZ, op. cit., p. 91.

            25Vide Introdução, p. 13-14.

            26O termo unilateralidade é raramente utilizado pelo fato de que pode ser associado a self-help, ou seja, represálias sem o respaldo legal próprio das instituições internacionais. No entanto, a unilateralidade ora referida não tem seu foco principal na desnecessidade de aprovação por um órgão institucional, mas sim na desnecessidade de anuência da parte contrária, bastando aprovação pelo OSC para que se torne eficaz. Ainda, cabe ao demandante a decisão final acerca da efetividade da imposição das contramedidas, sendo facultado a ele abrir mão de tal direito mesmo após a autorização do OSC.

            27Apesar de não expressa no ESC, tal exceção é aceita pela unanimidade da doutrina e da jurisprudência do OSC.

            28Enquanto a multilateralização do benefício concedido através da compensação é benefício ao sistema multilateral de comércio, além de facilmente implementável, o mesmo se torna impossível no que toca à retaliação, uma vez que a medida em si não consiste em benefício para o demandante, mas em sanção imposta do demandado.

            29Ver nota de rodapé nº 9.

            30Cumpre destacar que tal princípio não determina que o nível das contramedidas tenha que corresponder exatamente ao dos prejuízos, mas estabelece um teto acima do qual as contramedidas são consideradas ilegais e, abaixo do qual, perfeitamente legais. Em segundo lugar, de acordo com o Direito Internacional consuetudinário, julgamentos ultra petita são vedados, o que impede os árbitros de autorizar mais do que foi efetivamente solicitado, enquanto aqueles proferidos infra petita não o são. Os árbitros estabeleceram, ainda, que a regra do ônus da prova sobre a equivalência das contramedidas deveria ser atribuído ao membro demandado e condenado, que é o responsável pelo questionamento perante os árbitros.

            31Tradução livre: situações contrafactuais.

            32Tradução livre: equivalente.

            33Tradução livre: comensurável, proporcional.

            34Tradução livre: apropriado.

            35As bases observadas nesse caso foram aplicadas, subseqüentemente, aos casos US-Foreign Sales Corporations e Canada-Aircraft.

            36Desde a formulação desse entendimento, os doutrinadores apresentam críticas quanto à desvinculação entre o nível das contramedidas e os efeitos comerciais efetivamente sofridos pelo demandante. Os autores apontam que, simplesmente, desconsidera-se o que seria principal elemento de determinação da legalidade de uma contramedida, reconhecido no Direito Internacional geral: a proporcionalidade. Contudo, conforme observação dos árbitros do caso Bombardier versus Embraer, nem tudo que não é equivalente é desproporcional, uma vez que a noção de "contramedidas apropriadas" engloba a "equivalência ao nível da anulação ou redução de benefícios sofrida pelo demandante". Ainda, limitar a primeira à segunda é contrário ao princípio do efeito útil na interpretação dos tratados.

            37Cumpre ressaltar, todavia, que por tratar-se de questão do Direito Internacional Público, em especial do Direito Internacional Econômico, tais aspectos extrapolam os liames jurídicos, sendo permeados por considerações de cunho econômico de político.

            38 apud BRAZ, op. cit., p. 165.

            39Demais casos em que houve autorização para retaliar e que não foram analisados: US-Foreign Sales Corporations e US-Anti-Dumping Act.

            40Consoante Gavin Goh e Andreas Ziegler (apud BRAZ, 2006, p. 208) não se pode desconsiderar que a legitimidade de um sistema de solução de controvérsias advém não apenas da efetividade de seus remédios ex post, bem como da dissuasão das partes de adotar determinado comportamento ex ante. Nesse sentido, a função contínua da persuasão moral – refletida, por exemplo, no princípio costumeiro de Direito Internacional da boa-fé – na promoção da observância das obrigações sob o GATT e a OMC não deve ser subestimada.

            41BREUSS, Fritz. Economic Integration, EU-US Trade Conflicts and WTO Dispute Settlement. Disponível em <http://eiop.or.at/eiop/texte/2005-012a.htm> Acesso em 30 jan. 2007. Tradução livre: O DSB da OMC não conhece as conseqüências econômicas da prática retaliatória em todos os detalhes. De qualquer forma, o sistema de solução de controvérsias da OMC não trabalha em interesse próprio, mas no intuito de atender aos reclamos das partes reclamante e reclamada. Isto exige uma reforma no presente sistema [...].

            42BREUSS, Fritz. Economic Integration, EU-US Trade Conflicts and WTO Dispute Settlement. Disponível em: <http://eiop.or.at/eiop/texte/2005-012a.htm> Acesso em: 30 jan. 2007. Tradução livre: A complexidade dos procedimentos do sistema de solução de controvérsias da OMC é destacada pelo fato de que inúmeras propostas para aperfeiçoar e dar mais clareza ao sistema têm sido feitas e discutidas pelos órgãos da OMC. A maior parte dessas propostas referem-se a mudanças institucionais e/ ou de procedimento; raramente se referem a problemas econômicos intrínsecos ao sistema. A razão para a carência de propostas para aperfeiçoar o sistema sob o ponto de vista econômico deve estar relacionada ao fato de que as decisões da OMC são, primariamente, um foco de ação dos advogados.

            43O intuito desta proposta é análogo ao princípio da defesa coletiva previsto no artigo 45 da Carta da ONU, segundo o qual "no intuito de possibilitar às Nações Unidas a consecução de medidas militares urgentes, os Membros devem manter, prontamente disponível, contingentes de força aérea para missões internacionais combinadas".

            44A natureza de tais vantagens, embora não especificada pelo documento apresentado, seria a compensação pecuniária.

            45Cumpre ressaltar que a hipótese de expulsão do membro insistentemente descumpridor de suas obrigações não é sequer suposta por qualquer autor ou representação de qualquer membro, dado o seu extremismo.

            46 DUAILIBI, Julia. O Paradoxo da Prosperidade. Veja, São Paulo, n. 2014, p. 74-76, 27 jun. 2007.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALBUQUERQUE, Flávia Regina Costa Ramos. O caso Bombardier versus Embraer: análise crítica do emprego da retaliação no seio do sistema de solução de controvérsias da OMC. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1514, 24 ago. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10318. Acesso em: 18 maio 2024.