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A utilização da escala Likert na formulação dos quesitos do tribunal do júri.

A utilização da escala Likert na formulação dos quesitos do tribunal do júri.

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Propõe-se um método para identificação do quantum de pena a ser aplicado caso ocorra o reconhecimento de tentativa de crime pelo conselho de sentença.

Resumo: A Constituição Federal do Brasil de 1988 estabelece em seu artigo 5º, inciso XXXVIII, a competência do Tribunal do Júri para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Entretanto, em um caso concreto, pode ocorrer o reconhecimento por parte do Conselho de Sentença do instituto da tentativa e, neste caso, deve ser aplicado pelo juiz-presidente do tribunal a fração de diminuição de pena no quantitativo de ⅓ (um terço) a ⅔ (dois terços) prevista pelo artigo 14, inciso II, do Código Penal. Sabe-se que o Supremo Tribunal Federal, por meio do HC 95.960, tem o entendimento firmado de que a fração de diminuição a ser aplicada no caso de reconhecimento de um crime tentado, deve ser fixada com base no percurso trilhado pelo autor até o momento da interrupção por circunstâncias alheias à sua vontade. Tendo como premissa de que a decisão do quão próximo o autor chegou a concluir a sua ação deveria ser, no caso específico do Tribunal do Júri, avaliada por seus julgadores, ou seja, pelo Conselho de Sentença, cabendo ao magistrado a tarefa exclusiva de realizar o cálculo relativo à diminuição da pena, e não definir o seu valor, este trabalho propõe a inserção de um quesito para caso ocorra o reconhecimento do instituto da tentativa pelo Conselho de Sentença, este seja responsável por definir o quanto de diminuição deve ser aplicado, fazendo-se assim prevalecer o Princípio da Soberania dos Veredictos. Neste sentido, este trabalho apresenta todo o método de construção para identificação dos Coeficientes de Diminuição e de como o Conselho de Sentença, mesmo sem aparente conhecimento técnico relacionado ao cálculo da pena, pode identificar qual fração deve ser aplicada no caso concreto pelo juiz-presidente. Como resultados, são apresentados cada um dos 5 (cinco) momentos fracionados no caso do reconhecimento da tentativa construídos por meio da utilização da Escala Likert do tipo (positively-packed) e os Coeficientes de Diminuição a cada um deles relacionados. Finalmente, é apresentada uma reflexão sobre o potencial para aplicação do método proposto, utilizando-se exemplos extraídos de casos concretos adaptados e a possível utilização dos Coeficientes de Diminuição para as hipóteses diversas do recorte por este estudo apresentado.

Palavras-chave: Tribunal do Júri, Conselho de Sentença, Coeficientes de Diminuição, Proposta e Redução para Cálculo da Tentativa.

Sumário: 1. Introdução e Problematização. 2. O Reconhecimento do Instituto da Tentativa: Um Aprofundamento sobre a Temática. 3. Do Método Utilizado. 4. Aplicação Concreta e Resultados. 5. Considerações finais. 6. Referências bibliográficas.


1. INTRODUÇÃO E PROBLEMATIZAÇÃO

1.1 Tribunal do Júri: Contextualização Histórica

Segundo Costa (2005), o Tribunal do Júri é uma instituição com mais de 180 (cento e oitenta) anos de história no Brasil e sua evolução histórico-legislativa reflete, sobretudo, a transformação do país em diferentes períodos históricos.

Sua instauração foi realizada no ano de 1822 durante o Regime de Governo conhecido como Império Constitucional, mas sua regulamentação só foi estabelecida em 1832. Em 1924, foi promulgada a primeira lei específica sobre o Tribunal do Júri, a Lei nº 221 de 20 de novembro de 1924, norma esta responsável pelo estabelecimento das bases legais para a constituição do Tribunal do Júri nos moldes de como o conhecemos atualmente. Dentre outros aspectos, destaca-se para este estudo, que a referida norma foi responsável por definir a competência do júri para julgar crimes dolosos contra a vida e estabeleceu as regras para a escolha dos jurados (SILVA, 2017).

Ainda segundo Costa (2005), na década de 1960, o Tribunal do Júri foi alvo de críticas que culminaram em várias tentativas concretas de acabar com o instituto no país, especialmente durante o período da Ditadura Militar. Segundo Bandeira (2000), o regime militar buscava reprimir a participação popular na justiça e controlar as decisões judiciais, neste sentido, a participação da população em decisões judiciais não era do interesse do regime militar. Com a suspensão das garantias constitucionais, o júri foi extinto por um período.

Em 1975, com a promulgação da nova Constituição, o júri popular foi restabelecido como uma das formas de julgamento no Brasil, demonstrando a importância da participação popular na justiça e a necessidade de se garantir a imparcialidade e a transparência nos julgamentos. Desde então, o júri popular tem sido uma importante ferramenta para a garantia dos direitos e a justiça no país (SILVA, 2010).

Atualmente, a Constituição de 1988, de forma expressa, garantiu a manutenção do Tribunal do Júri como uma instituição essencial para a garantia da justiça no país, inclusive solidificando o princípio da Soberania dos Veredictos dos membros do Conselho de Sentença em seu artigo 5º, inciso XXXVIII e a sua competência para julgar os crimes dolosos contra a vida.

Desde então, o Tribunal do Júri tem passado por diversas alterações legislativas, como a Lei nº 11.689/2008, que introduziu a figura do juiz presidente e outras medidas para aprimorar o julgamento pelo júri. Neste norte, em 2019, foi promulgada a Lei nº 13.964, conhecida como "Pacote Anticrime", que alterou as regras de funcionamento do Tribunal do Júri em alguns aspectos (BRASIL, 2019), como, por exemplo, a possibilidade de o juiz-presidente, quando entender que há prova de que o réu é autor de crime doloso contra a vida, pronunciá-lo independentemente do pedido do Ministério Público ou da defesa e a criação do juiz de garantias, que seria responsável por conduzir a fase da investigação criminal, mas não participaria do julgamento. No entanto, a implementação do juiz de garantias foi suspensa por tempo indeterminado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em janeiro de 2020.

Apesar das alterações legislativas, o Tribunal do Júri continua sendo uma das instituições mais importantes do Poder Judiciário brasileiro, tendo como objetivo permitir aos membros da sociedade a possibilidade de julgar crimes graves de forma justa e imparcial. A evolução legislativa do Tribunal do Júri no Brasil explicitada reflete a importância e o compromisso do país com a instituição.

1.2 Do Conselho de Sentença e Quesitos

O Conselho de Sentença pode ser entendido como um instituto que compõe o Tribunal do Júri cuja constituição está prevista pelo artigo 447 do Código de Processo Penal (CPP). Conforme disposição expressa, o Conselho de Sentença será formado por 7 (sete) jurados leigos membros da comunidade, escolhidos por meio de sorteio, dentre os 25 (vinte e cinco) jurados que estarão presentes em cada sessão de julgamento. Importante mencionar que para a formação do Conselho de Sentença, é necessário que no dia do julgamento estejam presentes, no mínimo, 15(quinze) jurados, conforme art. 463. do CPP. Apesar do nome que lhe é dado, o Conselho de Sentença não é de fato o responsável por prolatar a sentença ao final do julgamento, entretanto, cabe a ele, de fato, julgar o caso concreto de que lhe é competente o Tribunal do Júri.

A sentença será elaborada de fato pelo presidente do Tribunal do Júri, ou seja, pelo juiz togado, que deve utilizar-se de um documento contendo os chamados quesitos, estes utilizados para condenar, absolver e cominar a pena para o caso julgado, conforme exige a regra processual dos artigos. 482. e seguintes do atual Código de Processo Penal.

Os quesitos são questionamentos elaborados pelo Presidente do Tribunal do Júri ao Conselho de Sentença e visam promover a orientação deste sobre a possível materialidade do delito, autoria, absolvição, diminuição de pena, qualificadora(s) ou aumento de pena. Será por meio dos quesitos que o juiz presidente deverá extrair do Conselho de Sentença todos os aspectos que permeiam o crime em julgamento.

Imperioso faz-se perceber que o Conselho de Sentença não possui conhecimento técnico suficiente para a prolação de uma sentença, instituto esse de grande complexidade, mas é reconhecido constitucionalmente como competente para julgar os crimes dolosos contra a vida. Logo, caberá ao Presidente do Tribunal do Júri, conforme anteriormente mencionado, a confecção desses quesitos de forma clara e objetiva, de modo que mesmo diante da ausência da capacidade técnica do Conselho de Sentença, seja possível que este direcione o magistrado a correta interpretação acerca da visão dos julgadores sobre os fatos apresentados na sessão de julgamento.

1.3 A Formulação dos Quesitos e o Còdigo de Processo Penal: Artigos 482 e seguintes

Vários são os autores que apresentam em suas obras considerações sobre os quesitos formulados ao Conselho de Sentença. Dentre eles, destaca-se Lopes Jr. (2016, pág. 842-850) que explica, detalhadamente, a ordem que os quesitos devem ser apresentados e os seus possíveis desdobramentos. Neste trabalho, serão realizadas apenas breves considerações sobre o tema, com destaque para o quesito previsto pelo art. 483, inciso IV, que versa sobre a existência de causas de diminuição de pena alegada pela defesa, quesito este diretamente relacionado ao objetivo deste trabalho.

O Código de Processo Penal em seu Capítulo II intitulado: “ Do procedimento relativo aos processos da competência do Tribunal do Júri ”, na seção XIII, “do questionário e sua votação”, apresenta a forma e os procedimentos aos quais o juiz presidente deve se atentar ao questionar o Conselho de Sentença sobre aspectos relacionados ao caso concreto em julgamento. Conforme os ditames do art. 482, parágrafo único, os quesitos deverão ser redigidos e elaborados por meio de proposições afirmativas.

Entende-se por proposição uma frase do tipo declarativa que pode admitir apenas um valor lógico dentre as opções “verdadeiro” ou “falso”. Portanto, a primeira preocupação do legislador quanto à forma de elaboração dos quesitos está relacionada com a possibilidade de emergir do texto um espectro de incerteza de resposta com relação à pergunta. Neste sentido, veda-se ao magistrado a possibilidade de formular seus quesitos de maneira com que a frase correspondente possa induzir o Conselho de Sentença a uma possível dúvida ou a não realização de uma resposta concisa e direta. Logo, verifica-se que emerge da redação do artigo 482, do Código de Processo Penal, o chamado principium tertii exclusi ou tertium non datur, também denominado pela literatura jurídica como, princípio do terceiro excluído, cujo enunciado é amplamente propagado da seguinte forma: “para qualquer proposição, ou esta proposição é verdadeira, ou sua negação é verdadeira”, princípio basilar que integra o estudo de lógica jurídica.

Além da imposição do uso de proposições afirmativas, o legislador também impôs ao magistrado a obrigação de elaborar sentenças (frases) de modo simples, ou seja, as sentenças devem possuir apenas um sujeito e um predicado em sua oração, utilizando o conceito de sentença simples da língua portuguesa; além de sentenças distintas, o que significa que para cada quesito a ser analisado, apenas uma única sentença deverá ser formulada.

Neste sentido, entende-se que para um caso concreto em que ocorra a materialização do instituto do concursos de pessoas, a restrição imposta pelo legislador quanto a formulação de proposições simples torna obrigatório ao magistrado elaborar diferentes proposições relativas a cada um dos envolvidos na conduta. O conteúdo das proposições pode ser o mesmo, entretanto, para cada sujeito ativo, uma proposição específica deverá ser confeccionada. Por consequência, veda-se a formulação de um só quesito que tenha por finalidade analisar vários aspectos relacionados ao crime de uma única vez de vários sujeitos ativos.

Outra preocupação evidente do legislador está relacionada com a clareza e a precisão da elaboração da sentença utilizada pelo quesito, afinal, de nada adiantaria o legislador exigir as técnicas redacionais discutidas anteriormente e, mesmo assim, o Presidente do Tribunal, ao confeccionar uma sentença do tipo proposicional afirmativa simples, o fizesse de forma obscura ou de complicada interpretação.

Em continuidade ao tema, o artigo 483 apresenta a ordem obrigatória com que os quesitos devem ser apresentados ao Conselho de Sentença, dos quais nós autores destacamos para o desenvolvimento deste trabalho o quarto quesito: das causas de diminuição de pena alegadas pela defesa, quesito este que será apresentado de forma mais aprofundada a seguir.

As causas de diminuição de pena (minorantes), são encontradas no ordenamento jurídico brasileiro:

  1. na redação do artigo 14, inciso II, parágrafo único, do Código Penal, que versa sobre a diminuição de ⅓ (um terço) a ⅔ (dois terços) caso ocorra o reconhecimento do instituto relativo ao crime tentado, sendo este o crime que apenas não se consumou devido à circunstâncias alheias à vontade do agente;

  2. na redação do artigo 21, caput, parte final, do Código Penal, no qual o legislador reconhece que o erro evitável, ou seja, aquele erro que poderia ter sido contornado pelo agente durante a sua ação não o isenta de pena, mas apenas diminui esta em uma fração de ⅙ (um sexto) a ⅓ (um terço);

  3. na redação do artigo 24, §2º, do Còdigo Penal, que versa sobre a diminuição de pena cominada para o estado de necessidade, caso específico no qual este não seja capaz de excluir a antijuridicidade;

  4. na redação do artigo 26, parágrafo único, do Còdigo Penal, no caso da verificação concreta de uma das hipóteses de inimputabilidade, hipótese esta que ocorrerá em virtude de pertubação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado de um agente que, não era interiamente capaz de entender o caráter ilícito do fato ao tempo de seu cometimento;

  5. na redação do art. 28, §2º, do Código Penal, no caso específico de embriaguez proveniente de caso fortuito ou força maior que resulte, ao tempo do fato, uma redução da capacidade do agente em entender o caráter ilícito do fato;

  6. na redação do art. 29, §1º, do Código Penal, que versa sobre o instituto da participação de menor importância.

O legislador então trouxe, na redação do art. 483, inciso IV, o quarto quesito a ser formulado ao Conselho de Sentença caso a defesa utilize-se de uma ou mais causas de diminuição de pena, sendo imprescindível que o presidente do tribunal realize um quesito para cada uma das causas de diminuição. Logo, caso seja possível o reconhecimento da (a) materialização do instituto da tentativa cumulada com (b) o instituto da embriaguez por caso fortuito ou força maior que tornou o agente parcialmente capaz de entender a ilicitude do fato por ele praticado, entende-se ser necessário a formulação de um quesito para cada uma das situações alegadas anteriormente.

Neste momento, considera-se importante uma possível reflexão sobre o intervalo apresentado pelo legislador nas hipóteses de reconhecimento de uma causa de diminuição de pena. Note-se que o legislador previu um intervalo variável para o valor numérico da diminuição, ⅓ (um terço) a ⅔ (dois terços), portanto, caso ocorra o reconhecimento do instituto relativo ao crime tentado, cumpre ao juiz, na dosimetria da pena, considerar a proximidade da consumação do delito como um critério para se estabelecer a fração de diminuição mais adequada ao caso concreto, conforme entendimento consolidado pelos tribunais e orientação do STF, leia-se:

“[...] com efeito, a quantificação da causa de diminuição de pena relativa à tentativa (art. 14, II, CP) há de ser realizada conforme o iter criminis percorrido pelo agente: a redução será inversamente proporcional à maior proximidade do resultado almejado (nesse sentido: HC 95.960, Rel. Min. Ayres Britto, Primeira Turma, DJe-094 de 21-5-2009; HC 110.021, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, DJe-119 de 18-6-2012; HC 85.834, Rel. Min. Eros Grau, Primeira Turma, DJ de 12-8-2005; etc.) (Grifos dos Autores)

Neste sentido, a decisão do “quão próximo o autor chegou a concluir a sua ação” deveria ser, no caso específico do Tribunal do Júri, avaliada por seus julgadores, ou seja, pelo Conselho de Sentença, cabendo ao magistrado a tarefa exclusiva de realizar o cálculo relativo à diminuição, e não definir o seu valor, tese defendida pelos autores deste trabalho. A definição poderia ser feita por meio de um quesito específico para o caso da tentativa e o raciocínio ser expandido para as outras causas de diminuição de pena realizando as devidas compatibilização jurídicas.


2. O INSTITUTO DA TENTATIVA: Um Aprofundamento Sobre a Temática

Segundo Lenza et al (2022):

“[...] a tentativa (ou conatus) constitui a realização imperfeita do tipo penal. Dá-se quando o agente põe em prática o plano delitivo engendrado e, iniciando os atos executórios, vê frustrado seu objetivo de consumar o crime por motivos independentes de sua vontade”. (LENZA; GONÇALVES, 2022, p. 433).

O instituto pode ser verificado de forma expressa por meio da leitura do artigo 14, II, do Código Penal, no qual o legislador considerou que ocorrerá a tentativa quando iniciada a execução do crime, este não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.

Comumente, a literatura jurídica apresenta os seguintes requisitos para a materialização da tentativa, são eles: a) início da execução, ou da denominada, fase executória; b) não consumação do delito propriamente dito; c) não consumação devido a circunstâncias alheias à vontade do agente, pois caso ocorra a não continuidade do delito por vontade do agente, verificar-se-a os possíveis institutos da desistência voluntária, arrependimento eficaz ou, a depender do delito, arrependimento posterior.

2.1 Da Punibilidade da Tentativa

Ainda segundo Lenza et al (2022), o direito penal pátrio acolheu a denominada teoria objetiva para o instituto da tentativa, a qual estabelece uma redução da pena para o delito imperfeito, uma vez que o bem jurídico protegido não foi sacrificado. Portanto, segundo a teoria objetiva, uma pessoa pode ser punida pelo crime de tentativa de homicídio, mesmo que o crime não tenha se consumado. Isso porque, a tentativa, em si, já é considerada um ato criminoso e merece punição.

Ao estudar o instituto da tentativa, é recorrente na literatura jurídica a sua classificação em espécies, são elas: a) tentativa perfeita ou crime falho; b) tentativa imperfeita; c) tentativa branca (ou incruenta); d) tentativa vermelha (ou cruenta); e) tentativa abandonada ou qualificada, nome dado por alguns doutrinadores à desistência voluntária e ao arrependimento eficaz; f) tentativa inadequada ou inidônea, que consiste no reconhecido instituto do crime impossível.

Com exceção das espécies de tentativa abandonada ou a tentativa inadequada, a consequência geral para o reconhecimento do instituto será a aplicação de uma causa de diminuição de pena prevista em um intervalo variável de ⅓ (um terço) a ⅔ (dois terços), a depender o quão próximo o agente esteve de percorrer todas as etapas do iter criminis.

Retomando as considerações anteriormente já realizadas, este trabalho tem como proposta desenvolver um método baseado na concepção de que a decisão do “quão próximo o autor chegou a concluir a sua ação”, entendimento invocado pelo Supremo Tribunal Federal em uma série de decisões que versam sobre o quantum de redução deveria ser aplicado ao caso concreto, deveria ser, no caso específico do Tribunal do Júri, avaliada por seus julgadores, ou seja, pelo Conselho de Sentença, cabendo ao magistrado apenas a tarefa exclusiva de realizar o cálculo relativo à diminuição, e não definir o seu valor. Entretanto, neste momento, nos deparamos com a seguinte problemática: “Como seria possível transferir para o Conselho de Sentença a tarefa de reconhecer o quantum de diminuição da pena deveria ser aplicado no caso de reconhecimento do instituto da tentativa?”.

Como resposta a pergunta realizada, entende-se que o reconhecimento do quantum de pena que deve ser aplicado no caso da verificação do instituto da tentativa pode ser feito por meio da confecção de um quesito específico direcionado ao Conselho de Sentença, cujo objetivo seria tornar possível a identificação do momento em que ocorreu a materialização do referido instituto.

Por fim, o produto principal deste trabalho consiste na apresentação e na discussão sobre uma proposta de elaboração de um quesito complementar para o caso do reconhecimento do instituto da tentativa baseado na escala Likert de discordância e concordância com a finalidade de transferir ao Conselho de Sentença a identificação do quão próximo o agente esteve no caso concreto de concluir todas as etapas do iter criminis e, consequentemente, o quantum relativo à fração de pena prevista pelo legislador deve ser aplicada pelo magistrado caso ocorra o reconhecimento do instituto da tentativa.


3. DO MÉTODO UTILIZADO

Com o objetivo de transferir para o Conselho de Sentença a atribuição de definir o quantum de pena que deve ser reduzido caso ocorra o reconhecimento do instituto da tentativa, foi proposto um método composto pelas seguintes etapas:

1ª - realização de um estudo sobre a escala Likert (1932), uma técnica amplamente utilizada para a elaboração de questionários valorativos que visam identificar graus de concordância e discordância acerca de uma proposição anteriormente formulada;

2ª - apresentação dos procedimentos utilizados para o cálculo das possibilidades fracionárias para o quantum de diminuição de pena deve ser aplicado para o crime tentado no âmbito dos crimes de competência do Tribunal do Júri.

Neste Capítulo, portanto, será apresentado a união entre a método Likert e a confecção dos denominados Coeficientes de Diminuição de Pena, coeficientes estes que devem ser associados a percepção do Conselho de Sentença quanto ao momento em que foi possível o reconhecimento da tentativa.

3.1 A Escala Likert

Em seu trabalho revisional, Bermudes (2016) afirma que a escala Likert foi elaborada pelo educador e psicólogo Rensis Likert em 1932, quando este recebeu seu Ph.D, em psicologia pela Universidade de Columbia. Likert realizou um levantamento usando uma escala de um a cinco pontos tendo como objetivo medir atitudes, e, por meio de sua tese, ficou demonstrado que podia captar, assim, mais informações do que se tivesse utilizado os métodos até então desenvolvidos.

Appolinário (2007, p.81), definiu a escala Likert como “um tipo de escala de atitude na qual o respondente indica seu grau de concordância ou discordância em relação a determinado objeto”. A definição trazida por Appolinário é feliz ao realizar uma síntese do que considera como sendo a definição da escala. Entretanto, considera-se o conceito proposto por, Aguiar; Correia e Campos (2011, p.2) um dos mais assertivos trazidos atualmente pela literatura, in verbis:

“[...] São uma das escalas de autorrelato mais difundidas (escala Likert), consistindo em uma série de perguntas formuladas sobre o pesquisado, onde os respondentes escolhem uma dentre várias opções, normalmente cinco, sendo elas nomeadas como: Concordo muito, Concordo, Neutro/indiferente, Discordo e Discordo muito. (Aguiar; Correia e Campos, 2011, p.2)

Conforme pode-se inferir do conceito proposto por Aguiar et al (2011), na sua forma originária, a escala foi constituída a partir de cinco pontos, entretanto, com o passar do tempo, vários pesquisadores foram alterando o número de pontos utilizados em seus questionários, denominando assim a escala como do tipo Likert (SILVA JUNIOR; COSTA, 2014).

O Quadro 01 a seguir apresenta um exemplo da utilização tradicional para a escala Likert, veja:

Quadro 01 - Escala Likert com 5 (cinco) pontos de Concordância/ Discordância

1 - A utilização do Julgamento Simulado (Júri Simulado) contribui para a construção das práticas argumentativas orais.

Discordo Totalmente

1

Discordo Parcialmente

2

Não Concordo nem Discordo (Indiferente)

3

Concordo Parcialmente

4

Concordo Totalmente

5

Fonte: Júri Simulado como Método ativo de ensino, aprendizagem e avaliação (2018). Adaptado pelos autores.

Tradicionalmente, a escala utiliza-se de uma sentença do tipo afirmativa seguida de 5 pontos relacionados à concordância ou discordância sobre o tema apresentado. Entretanto, conforme mencionado anteriormente, não é incomum que a escala Likert sofra pequenas modificações em seu número de pontos de concordância e discordância, apresentando-se como opções mais de cinco possibilidades, como, por exemplo, as opções:

Quadro 02 - Escala Likert com 7 (sete) pontos de Concordância/ Discordância

Discordo Totalmente

1

Discordo

2

Discordo Parcialmente

3

Não sei

4

Concordo Parcialmente

5

Concordo

6

Concordo Totalmente

7

Elaboração dos Autores

O modelo apresentado é conhecido comumente como escala Likert de 7 (sete) pontos simétricos, nos quais os valores tanto positivos quanto negativos são espelhados e possuem o mesmo peso na análise das respostas. Observe que o ponto central, identificado pela sentença “Não sei”, é um ponto neutro, com atribuição de pontuação 0 (zero), no caso de uma análise concreta.

Outra inovação, diferente da proposta original realizada por Rensis Likert (1932), é a utilização de perguntas diretas antes da marcação dos pontos de concordância ou discordância, ou seja, não é incomum que pesquisas sociais utilizam-se de sentenças interrogativas diretas em suas pesquisas.

Uma vez compreendida a grandeza da ferramenta de pesquisa apresentada, faz-se necessário um estudo sobre as possíveis fraquezas de sua utilização. Neste sentido, Matos (2010, p.68), afirma que:

“[...] uma das fraquezas deste formato está no fato de que, se os sujeitos que responderam o questionário possuírem uma tendência a avaliar positiva ou negativamente o objeto de pesquisa, a escala Likert3 tradicional irá restringir a variância das respostas”. (MATOS, 2010, p. 68)

Como proposta para solucionar este problema, faz-se necessária a utilização de uma metodologia que envolve os formatos de respostas assimétricos (Skewed responses formats), que são escalas que possuem mais alternativas de respostas positivas (positively-packed) do que respostas negativas (negative-packed). Como exemplo, um formato de resposta que se utiliza de tal técnica comumente apresenta as seguintes opções:

• discordo fortemente, que representa uma possibilidade de resposta negativa;

• discordo na maior parte, que representa uma possibilidade de resposta negativa;

• concordo ligeiramente, que representa uma possibilidade de resposta positiva;

• concordo moderadamente, que representa uma possibilidade de resposta positiva;

• concordo na maior parte, que representa uma possibilidade de resposta positiva;

• concordo fortemente, que representa uma possibilidade de resposta positiva.

Além de proporcionar um grau maior de variância nas respostas, ao utilizar-se do formato de respostas assimétricas positivas (positively-packed) ou respostas negativas (negative-packed), a identificação de aspectos positivos ou negativos relativos ao objeto de pesquisa ao qual se pretende analisar torna-se mais evidente. Por exemplo, um questionário assimétrico, do tipo (positively-packed), oferecerá, ao participante da pesquisa, maiores possibilidades de variâncias positivas em relação a aspectos positivos relativos ao objeto de pesquisa avaliado, oferecendo quatro possibilidades positivas de respostas.

No âmbito deste trabalho, o deslocamento no sentido positivo da escala refere-se ao reconhecimento dos maiores índices de redução para o crime de tentativa, ou seja, o Conselho de Sentença possuirá mais opção que tenham como resultado um maior benefício para o acusado do que a menor possibilidade de redução prevista no ordenamento jurídico. Este formato será utilizado exatamente por ter como proposta contornar a problemática trazida por Matos (2010, p.68) sobre a possível tendência que possa existir durante a avaliação do Conselho de Sentença em voltar-se para uma possível resposta tanto no sentido positivo como negativo, uma vez que a escala foi construída no sentido de fornecer ao réu uma maior possibilidade de ser aplicado o maior índice possível de redução de pena, mas não descartando a chance do reconhecimento do menor coeficiente de redução de pena.

Por fim, neste trabalho será confeccionada uma escala likert do tipo assimétrica (positively-packed) de 5 (cinco) pontos. Todos os procedimentos acerca da sua confecção serão apresentados nos tópicos que se seguem.

3.2 Cálculo das Possibilidades Fracionárias para o Quantum de Diminuição da Pena para a Tentativa

Conforme já mencionado, como proposta para elaboração de uma ferramenta para identificação do quantum de diminuição de pena que deve ser aplicado a um caso concreto em que ocorra o reconhecimento do instituto da tentativa, utilizaremos a escala Likert assimétrica positiva (positively-packed), ou seja, a formulação dos pontos de concordância e discordância da escala proposta estará direcionada no sentido de favorecer a aplicação da causa de diminuição de ⅔ (dois terços) da pena da tentativa para o réu.

Para o cálculo das diminuições propostas, foi realizada a transformação das frações originalmente previstas pelo legislador em números decimais, uma vez que, para o cálculo final, essa transformação resulta em uma facilitação para o cálculo da pena, levando em conta que existe um espectro de frações entre ⅓ (um terço) e ⅔ (dois terços).

Perceba que ⅔ (dois terços) equivale à 0,666…(dízima periódica simples), em sua forma decimal. Se trabalharmos com 2 (dois) algarismos significativos, método que será a partir de agora utilizado, ⅔ (dois terços) ≅ 0,67. As correções dos algarismos foram realizadas de modo que não se verificará a ocorrência, em nenhuma hipótese, de prejuízo para o réu com relação aos arredondamentos. Logo, utilizando-se do mesmo método, pode-se inferir que ⅓ (um terço) 0,33.

A matemática aplicada para a construção do método proposto consistiu na aplicação do procedimento apresentado a seguir:

  1. Inicialmente, para calcular o valor de 5 pontos tendo como extremidades os valores 0,67 e 0,33, com intervalos iguais, devemos:

  1. Calcular o tamanho do intervalo

O tamanho de cada intervalo será igual à diferença entre os dois números dividido por 4, já que queremos 5 valores iguais entre eles. Tamanho do intervalo = (0,67 - 0,33) / 4 = 0,085

  1. Adicionar o tamanho do intervalo 0,33 para obter os valores intermediários:

  • Valor 1: 0.33

  • Valor 2: 0,33 + 0,085 = 0,415

  • Valor 3: 0,415 + 0,085 = 0,50

  • Valor 4: 0,50 + 0,085 = 0,585

  • Valor 5: 0,585 + 0,085 = 0,67

Assim, temos os cinco seguintes valores igualmente espaçados entre 0,33 e 0,67 como pontos extremos temos: 0,33 - 0,415 - 0,50 - 0,585 - 0,67.

A Tabela 01 apresenta a relação entre os coeficientes identificados a partir do cálculo realizado anteriormente para cada um dos 5 (cinco) momentos fracionados para a identificação da aplicação da diminuição de pena proposta.

Tabela 01 - Relação entre os Coeficientes de Diminuição e os Momentos da Materialização da Tentativa

Momento 01

Momento 02

Momento 03

Momento 04

Momento 05

Início dos Atos Executórios do Delito

Antes de Atingir a Metade dos Atos Executórios

Pouco Antes da Metade dos Atos Executórios

Pouco Depois de Finalizar a Metade Todos Atos Executórios

Finalização de Todos os Atos Executórios

0,67

( Coeficiente pré-definido)

0,585

0,50

0,415

0,33

(Coeficiente pré-definido)

De acordo com a Tabela 01, para cada momento relativo ao iter criminis com relação à fase de execução do delito, foi realizada sua divisão em 5 (cinco) momentos distintos, sendo estes numerados de 1 (um) a 5 (cinco), tendo como 1 (um), o momento no qual deve ser aplicado o máximo de diminuição de pena e 5 (cinco), o momento no qual deve ser aplicado o mínimo de diminuição de pena.

Ainda conforme a Tabela 01, para cada momento executório considerado, foi associado um coeficiente de multiplicação para cálculo da pena. O valor de cada coeficiente está devidamente associado a cada momento da execução proposto, sendo que:

  1. o Momento 01 está associado ao coeficiente 0,67 de diminuição;

  2. o Momento 02 está associado ao coeficiente 0,585 de diminuição

  3. o Momento 03 está associado ao coeficiente 0,50 de diminuição

  4. o Momento 04 está associado ao coeficiente 0,415 de diminuição

  5. o Momento 05 está associado ao coeficiente 0,33 de diminuição

A título de exemplo de aplicação da metodo proposto, ao considerarmos que um crime da competência do Tribunal do Júri, após ter sido reconhecido o instituto da tentativa, e o juiz, no procedimento relativo à dosimetria da pena ainda na terceira fase, tenha fixado a pena base no quantitativo de 18 anos de reclusão, com a premissa de que o agente tenha realizado atos executórios relativos ao Momento 2 proposto, ou seja, o agente tenha realizado atos cuja linha executória seja identificada como “Antes de Atingir a Metade dos Atos Executórios”, teremos uma redução de pena calculada da seguinte forma:

Tabela 02 - Cálculo da Redução de Pena para um Crime Tentado Hipotético relativo ao Momento 3

18x0,585 (Coeficiente de Diminuição para o Momento 2) = 10,53 anos (dois algarismos significativos),

ou seja,

10 anos, 6 meses e 10 dias, desprezando-se as frações de dias conforme artigo 11, do Código Penal

A Tabela 02 apresenta os cálculos realizados para um crime cuja pena foi arbitrada após a aplicação da minorante relativa à tentativa. Observe que, conforme anteriormente mencionado, os cálculos são sempre realizados considerando 2 (dois) algarismos significativos.


4. APLICAÇÃO CONCRETA E RESULTADOS

Neste Capítulo, pretende-se apresentar, por meio de exemplos fictícios, adaptados de casos reais, a aplicação concreta de todo o método proposto neste trabalho, ressaltando de forma expressa, os pormenores a serem considerados.

Cenário Hipotético 01: J. está sendo acusado de cometer o crime de homicídio em sua modalidade tentada em face de P. Devido a natureza do crime, J. foi julgado pela Vara do Tribunal do Júri da Comarca da Cidade de Contagem - MG. Após todas as etapas de acusação e defesa, inclusive as alegações finais, o magistrado deverá, caso não haja dúvida a ser esclarecida, conforme previsão artigo 485, se dirigir à sala especial para dar início da votação acompanhado dos jurados, do Ministério Público, do assistente, do defensor do acusado, do escrivão e do oficial de justiça. Neste momento, serão lidos os quesitos, um por um, para que o Conselho de Sentença realize a sua votação por meio de cédulas contendo as expressões sim e não.

O modelo de quesitação e o caso anteriormente exposto de forma simplificada foi baseado em um evento ocorrido na Comarca de Contagem-MG e a quesitação formulada pelo magistrado competente foi confecionada da seguinte forma:

  1. Quesito 01: Da Materialidade

Na data XX de XXX de XXXX, por volta das XXX, próximo ao número XX do endereço XXXX, a vítima P. foi atingida por golpes de faca, sofrendo lesões corporais que a levaram à morte?

[ ] Sim [ ] Não

Após a apuração dos votos, verificou-se que o número de respostas “sim” para o reconhecimento da materialidade do fato foram suficientes para avançar para o próximo quesito.

  1. Quesito 02: Da Autoria

O acusado(a) J. foi quem realizou os golpes de faca contra a vítima XXXX?

[ ] Sim [ ] Não

Após a apuração dos votos, verificou-se que o número de respostas “sim” para o reconhecimento da autoria de J. com relação à prática do crime foram suficientes para avançar para o próximo quesito.

  1. Quesito 03: Do Quesito Genérico

O jurado, absolve o(a) acusado(a) J. em relação aos atos praticados contra a vítima P. ?

[ ] Sim [ ] Não

Para o caso concreto, não houve absolvição com base no quesito genérico de redação obrigatória conforme disposição expressa pelo artigo 483, §2º do Código de Processo Penal.

  1. Quesito 04: Da Desclassificação

O(A) acusado(a), da forma como agiu, deu início à execução de um crime de homicídio que somente não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade, sobretudo, devido à superficialidade dos cortes sofridos?

[ ] Sim [ ] Não

Neste momento, o Conselho de Sentença reconheceu por meio de votação a materialização do instituto da tentativa com relação ao crime de homicídio.

Conforme anteriormente mencionado, os quesitos transcritos foram utilizados pelo juízo da Vara do Tribunal do Júri da Comarca da Cidade de Contagem - MG. Algumas adaptações foram realizadas apenas para manter-se o sigilo do documento original , mas nada que prejudique a sua interpretação ou conteúdo central.

Observe que o quesito representado pela letra d) corresponde exatamente à possibilidade pelo Conselho de Sentença em reconhecer a materialização do instituto da tentativa previsto no art. 14, inciso II, do CP. Logo, em uma situação em que os jurados reconheçam a ocorrência do instituto da tentativa, o juiz togado deverá, conforme os ditames do parágrafo único do mesmo artigo, aplicar a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de ⅓ (um terço) a ⅔ (dois terços) na dosimetria tendo como norte de aplicação o entendimento do Superior Tribunal Federal quanto o valor fracionário a ser considerado.

Neste momento, os autores propõem a apresentação ao conselho de sentença de um quesito adicional para que o Conselho de Sentença apenas identifique o momento da materialização do instituto da tentativa na forma apresentada a seguir:

Quesito: Identificação do Momento em que Ocorreu a Materialização do Instituto da Tentativa

  1. Determinação do Quantum de Pena

Reconhecido o instituto da tentativa e tendo como base as informações alegadas neste tribunal acerca do caso concreto em discussão, você, jurado, acerca do quão próximo do resultado almejado o acusado chegou, considera que este:

  • Cessou todos os seus atos praticamente no início de sua conduta (0,67)

  • Cessou todos os seus atos antes de atingir a metade de sua conduta (0,585)

  • Cessou todos os seus atos pouco antes de atingir a metade de sua conduta (0,50)

  • Cessou todos os seus atos na pouco antes de finalizar a sua conduta (0,415)

  • Cessou todos os seus atos executórios de sua conduta (0,33)4

Como são 7 (sete) jurados que compõem o Conselho de Sentença, o voto de 4 (quatro) deles reconhecendo o mesmo momento dos atos executórios, implica no reconhecimento, inequívoco, de que aquele quantum de diminuição de pena deverá ser utilizado na dosimetria de pena.

Outra possibilidade seria a verificação de um empate com relação ao reconhecimento de momentos executivos diferentes. Neste caso, como solução, os autores propõem a utilização daquele mais favorável ao réu, tendo como fundamento básico a obediência de um dos maiores vetores axiológicos que perpassam todo o sistema jurídico penal, o princípio do in dubio pro reo, amplamente estudado no âmbito do Direito Penal.

4.2 Exemplos de Cálculos a Partir dos Coeficientes Propostos

A partir dos coeficientes apresentados, serão apresentados exemplos concretos com relação à aplicação do método proposto. Para tanto, serão apresentados tópicos com diversas situações hipotéticas.

  1. Homicídio Simples Tentado

Considere que na primeira fase da dosimetria, circunstância judiciais, a culpabilidade; os antecedentes; a conduta social; à personalidade; os motivos; às circunstâncias; às consequências; o comportamento da vítima, sejam todas favoráveis ao acusado.Na segunda fase, atenuantes e agravantes, tenha mantido a pena do acusado no mínimo legal, não podendo ser reduzida conforme enunciado da Súmula 231 do STJ. Na terceira fase, causas de diminuição e aumento de pena, tenha-se reconhecido a tentativa como uma causa de diminuição de pena.

Para o crime de homicídio, a pena mínima base é de 6 (seis) anos, portanto temos as seguintes possibilidades com relação aos cálculos propostos:

Tabela 03 - Cálculo do Quantum de Diminuição de Pena Deve ser Aplicado para Reconhecimento da Tentativa para o Crime de Homicídio Tentado pelo Método Proposto

Momento 1

Momento 2

Momento 3

Momento 4

Momento 5

6 anos

Homicídio Simples Tentado

6x0,67=4,0

ou seja

4,0 anos (redução)

6*0,585=3,51

ou seja

3,0 anos, 6 meses e 3 dias (redução)

6*0,50=3,0

ou seja

3,0 anos (redução)

6*0,415=2,49

ou seja

2 anos, 5 meses e 26 dias (redução)

6*0,33=1,98

ou seja

1 ano, 11 meses e 22 dias (redução)

Importante mencionar que os resultados apresentados pela multiplicação para cada momento possuem dois algarismos significativos, sendo, portanto, aplicada as regras de arredondamento matemático para resultados com 3 (três) ou mais.

Para o cálculo da redução da pena pela tentativa para o crime de homicídio simples tendo como referência a pena base, não houveram como resultado frações de dias, mas se isto tivesse ocorrido, deve-se seguir a máxima prevista pela art. 11, do CP, que alude sobre a obrigatoriedade do desprezo em relação às frações de dias.

  1. Infanticídio

Para o crime de infanticídiotentado fixado em sua pena base, verifica-se os seguintes cálculos e reduções:

Tabela 04 - Cálculo do Quantum de Diminuição de Pena Deve ser Aplicado para Reconhecimento da Tentativa para o Crime de Infanticídio Tentado pelo Método Proposto

Momento 1

Momento 2

Momento 3

Momento 4

Momento 5

Detenção de 2 a 6 anos

Infanticídio Tentado

2x0,67=1,34

ou seja

1 ano, 4 meses e 12 dias (redução)

2*0,585=1,17

ou seja

1 ano, 2 meses e 6 dias (redução)

2*0,50=1,0

ou seja

1 ano (redução)

2*0,415=0,83

ou seja

9 meses e 25 dias (redução)

2*0,33=0,66

ou seja

7 meses e 20 dias (redução)

Para os demais crimes, o método de aplicação será sempre o mesmo, sendo necessário:

  1. o reconhecimento da tentativa para crime em análise;

  2. a identificação do momento em que de fato foi possível reconhecer a tentativa;

  3. a aplicação do respectivo Coeficiente de Diminuição de pena calculado para o momento identificado;

  4. cálculo matemático para a identificação da diminuição da pena no caso concreto.


5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tendo como base a premissa de que o julgamento dos crimes de competência do Tribunal do Júri devem ser realizados por meio do Conselho de Sentença, incluindo a este também a atribuição relacionada à decisão do quantum de pena que deve ser aplicada no caso de reconhecimento da causa de diminuição de pena relativa à tentativa, mas sem deixar de reconhecer as limitações técnicas que este conselho possui em relação a aplicação da dosimetria, atribuição esta privativa do magistrado, este trabalho propõe a utilização de um método para que o próprio Conselho possa decidir sobre essa questão.

O método foi proposto tendo como referência o entendimento do Superior Tribunal Federal, no qual a causa de diminuição de pena relativa à tentativa deve ser realizada conforme o iter criminis percorrido pelo agente, sendo que a redução a ser aplicada será inversamente proporcional à maior proximidade do resultado almejado (HC 95.960, Rel. Min. Ayres Britto, Primeira Turma, DJe-094 de 21-5-2009; HC 110.021, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, DJe-119 de 18-6-2012; HC 85.834, Rel. Min. Eros Grau, Primeira Turma, DJ de 12-8-2005; etc.)

Portanto, tendo como base o posicionamento consolidado do Superior Tribunal Federal, somado a utilização de uma ferramenta de fácil aplicação, além de reconhecida e solidificada academicamente, a escala Likert (LIKERT, 1932), foi confeccionado uma proposta de quesitação para que seja possível o reconhecimento de 5 (cinco) momentos que contemplam a fase de execução inserida no iter criminis .

Os 5 (cinco) momentos referidos anteriormente utilizaram-se do formato Likert de respostas assimétricas positivas (positively-packed), uma vez que, desta forma, estaríamos privilegiando o acusado no sentido de que 3 (três) momentos estão deslocados no sentido do reconhecimento de um maior quantum de diminuição de pena e 2 (dois) momentos relacionados ao menor quantum de diminuição de pena.

Como resultado deste trabalho, tem-se como proposta final a inserção do seguinte quesito que deve ser apresentado ao Conselho de Sentença após o reconhecimento do instituto da tentativa:

Quadro 03: Proposta do Quesito a Ser Apresentado ao Conselho de Sentença para Avaliar o Momento em que se Materializou o Instituto da Tentativa

Quesito Proposto - Reconhecido o instituto da tentativa e tendo como base as informações alegadas neste tribunal acerca do caso concreto em discussão, você, jurado, acerca do quão próximo do resultado almejado o acusado chegou, considera que este:

  • Cessou todos os seus atos praticamente no início de sua conduta

  • Cessou todos os seus atos antes de atingir a metade de sua conduta

  • Cessou todos os seus atos pouco antes de atingir a metade de sua conduta

  • Cessou todos os seus atos na pouco antes de finalizar a sua conduta

  • Cessou todos os seus atos executórios de sua conduta

Para cada uma das possíveis alternativas de marcação, ou seja, para cada um dos momentos propostos para o(s) ato(s) de execução, está associado a este um coeficiente multiplicador utilizado para o cálculo final da pena. Estes coeficientes são: 0,67; 0,585; 0,50; 0,415; 0,33, calculados a partir da utilização de preceitos matemáticos simples, com arredondamentos realizados sempre considerando 2 (dois) algarismos significativos, cujo multiplicador 0,67, representa a maior diminuição de pena possível e o número 0,33 a menor diminuição de pena possível.

Como perspectivas de trabalho futuro, têm-se:

  1. a revisão e aperfeiçoamento do método proposto por meio de um aprofundamento ainda maior sobre a temática e utilização da escala Likert assimétrica;

  2. expandir a utilização do método para a aplicação além do instituto do Tribunal do Júri, fornecendo assim ao juiz togado uma ferramenta para análise do quantum de pena que poderia ser aplicada no caso concreto para institutos relativos à majorantes ou minorantes de pena, uma vez que em todos eles é possível verificar um intervalo cuja aplicação é, a princípio, abstrata e de competência do magistrado;

  3. a validação e consequente melhoria, por meio de estudos de casos concretos, dos coeficientes apresentados neste trabalho; e

  4. a confecção de uma ferramenta automática para o cálculo da dosimetria da pena para o seu cálculo final.


6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Notas

  1. ...

  2. ....

  3. Metodologia desenvolvida por Rensis Likert, denominada escala Likert. Consiste em um formato de resposta utilizado em questionários. O valor singular desse formato é a ordinalidade não ambígua, ou seja, as respostas são previamente determinadas evitando assim que os respondentes criem suas próprias respostas. (BABBIE, 1999).

  4. Os coeficientes foram apresentados apenas com fins didáticos para reconhecimento da opção Likert e sua relação com a diminuição da pena proposta neste trabalho. Logo, os coeficientes não devem e não serão apresentados aos jurados.



Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANDRADE, Douglas; RABELO, Galvão. A utilização da escala Likert na formulação dos quesitos do tribunal do júri.. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7593, 15 abr. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/103782. Acesso em: 14 maio 2024.