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Considerações sobre o art. 236 do Código Eleitoral

Considerações sobre o art. 236 do Código Eleitoral

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O Código Eleitoral, ao proibir a prisão de eleitor nos dias próximos às eleições, salvo exceções, sempre causaram alguma perplexidade entre os juristas e o homem do povo.

Sumário: 1. Introdução. 2. Motivação histórica e evolução legislativa da vedação à prisão no período eleitoral. 3. Hipóteses de cabimento da prisão nos prazos do art. 236 do Código Eleitoral. 4. Releituras do art. 236 do Código Eleitoral. 4.1. Revogação e inconstitucionalidade. 4.2. Vedação à prisão somente para crimes eleitorais. 4.3. Cabimento de prisão provisória por ordem judicial. 4.4. O significado do verbo ‘prender’ do caput do art. 236 do Código Eleitoral. 5. Visão crítica dos posicionamentos externados nos itens 4.1, 4.2, 4.3 e 4.4. 6. Colisão de direitos fundamentais. 6.1. Do direito fundamental à segurança. 6.2. Crimes hediondos, roubo e crimes dolosos contra a vida. 7. As sentenças aditivas. 7.1. Rebatendo as críticas às decisões ou sentenças aditivas. 8. Conclusões articuladas. 09. Referências.


1. INTRODUÇÃO

As disposições do artigo 236 da Lei 4.767/65 (Código Eleitoral), ao proibirem a prisão de eleitor nos cinco dias que antecedem às eleições até 48 horas depois do seu encerramento (salvo em casos de flagrante delito, sentença condenatória por crime inafiançável e desrespeito a salvo-conduto), sempre causaram alguma perplexidade entre os juristas e o homem do povo.

Em tempo de eleições, sempre que um delito grave é cometido e o criminoso não pode ser preso por sua situação não se enquadrar nas exceções legais retro-referenciadas, ergue-se um clamor de protesto contra a injustiça do texto legal.

Em 2005, por exemplo, na época do referendo sobre o comércio das armas de fogo também foi vedada a prisão de eleitores nos mesmos moldes do artigo 236 do Código Eleitoral. Escudando-se na benesse legal, amparado por um salvo-conduto, o advogado Peter Amaro de Sousa, um dos acusados de matar o Major da Polícia Militar Pedro Plocharski em janeiro de 2005, apresentou-se na 1ª Vara Criminal de Curitiba. O advogado, que então estava com a prisão preventiva decretada desde cinco meses antes, prestou depoimento e depois foi tranqüilamente para casa.

Fatos como esse causam na população um sentimento de desalento com o sistema de justiça. Outros exemplos: se um acusado de homicídio está foragido - desde que não tenha contra si sentença condenatória – poderá placidamente aparecer para votar no dia da eleição. E a polícia, mesmo inteirada da presença do criminoso na cidade, não poderá prendê-lo face à vedação eleitoral de prisão no período. Claro, no entanto, que essa situação não impede que a polícia fique no encalço do acusado e faça sua prisão após as 48 horas subseqüentes ao encerramento da votação.

Os juízes em geral (incluindo-se aí especialmente os Ministros do Tribunal Superior Eleitoral) aplicam literalmente as disposições do artigo 236 do Código Eleitoral (CE), não vislumbrando qualquer inconstitucionalidade nessa norma, nem vendo qualquer necessidade de compatibilizá-la com outros direitos protegidos constitucionalmente.

No presente trabalho, ainda que de forma sucinta, mostram-se outras interpretações do artigo 236 do CE, que vão da afirmação de sua revogação, inconstitucionalidade, até à probição de prisões cautelares somente para os crimes previstos no Código Eleitoral.

Sem comungar com esses entendimentos, tem-se a pretensão de demonstrar que vedações à prisão de eleitores e candidatos nos prazos do artigo 236 do CE podem coexistir com o direito à segurança, desde que, por meio do uso da técnica de sentenças aditivas, possa ser feita uma releitura constitucional das hipóteses de prisão do eleitor, com sua ampliação para abranger os crimes hediondos, roubo e crimes dolosos contra a vida.

Neste texto, para fins exclusivamente didáticos, a época em que a prisão de eleitor é vedada pelo Código Eleitoral será designada como ‘período eleitoral’.


2. Motivação histórica e evolução legislativa da vedação à prisão no período eleitoral

A Justiça Eleitoral foi criada em 1932, no governo de Getúlio Vargas, quando foi editado um Código Eleitoral. Em 1934 a Justiça Eleitoral teve sua existência formalizada na Constituição.

A criação da Justiça Eleitoral fora reivindicada pelo Movimento Tenentista e outros segmentos da sociedade, especialmente a incipiente classe média urbana.

O Código Eleitoral de 1932, ao conceder o direito de voto às mulheres, reduzir para 18 anos a idade mínima para o indivíduo se alistar como eleitor e instituir o voto secreto, priorizou os ideais de representatividade e da busca da ‘verdade real’ nas eleições, até então marcadas pela prática constante de fraudes. Foi um autêntico rompimento com os desmandos do coronelismo e da prática do voto de cabresto.

Nesse quadro, ganhou muito o país com a instituição da Justiça Eleitoral, pois a um Poder independente caberia fazer o alistamento, a apuração de votos e o reconhecimento e diplomação dos eleitos.

Na República Velha (1889-1930), as fraudes nas eleições eram costumeiras, como pode-se aferir do seguinte texto:

"Embora a idéia de democracia e de repartição do poder já estivesse positivada, não tardou a ocorrência de eleições maculadas pelas fraudes. Para tanto, dois mecanismos eram constantemente utilizados, qual seja, o "bico de pena" e a "degola" ou depuração. A falsificação dos resultados pelo método "bico de pena" era praticada pelas mesas eleitorais, que prosseguiam com o ofício de junta apuradora, inscrevendo como eleitores pessoas fictícias, mortas e ausentes. Numa etapa posterior, realizada pela Comissão de Verificação de Poderes do Senado e da Câmara, "degolavam-se", ou seja, cassavam-se os diplomas de eleitos "que fossem considerados inelegíveis ou incompatíveis com o exercício do cargo". Desta forma, observando-se a freqüência destes dispositivos, ficaram convencionadas três ocasiões de fraudes: "na eleição, na apuração e no reconhecimento". Tais episódios não se restringiram somente à esfera do grupo situacionista, muito embora para ele estivessem disponíveis o aparato policial e o erário público. A oposição, também, se predominasse em algum reduto eleitoral, procuraria, por meio dos mesmos procedimentos levianos, influenciar a composição das mesas eleitorais e a apuração dos votos. Sobre esse caos político, adscreve Assis Brasil: "Ninguém tinha a certeza de se fazer qualificar, como a de votar.. .Votando, ninguém tinha a certeza de que lhe fosse contado o voto.. .Uma vez contado o voto, ninguém tinha a segurança de que seu eleito havia de ser reconhecido... [01]".

Por sua vez, os ‘coronéis’ exerciam a sua influência por intermédio do voto de cabresto, determinando aos eleitores do interior os candidatos em que deveriam votar. Para esse eleitorado, pobre e de poucas luzes, os votos valiam ‘recompensas’ do patrão, enquanto a desobediência poderia resultar em punições violentas. Não votando em quem o coronel mandasse, sujeitava-se o ‘eleitor’ a perder seu emprego e a não obter outro na região [02].

O ‘coronel’ também tinha a seu serviço a polícia (cujo chefe geralmente nomeava) e os ‘cabras’, que davam ‘proteção’ contra os adversários políticos e intimidavam eleitores.

Assim, como uma das formas de garantia da liberdade de voto do eleitor, além do voto secreto, o Código Eleitoral de 1932 (Decreto 21.076/32, de 24/02/1932) estabeleceu, como regra, a vedação da prisão em períodos imediatamente anteriores e posteriores ao dia de votação, nos seguintes termos:

Art. 98. Ficam assegurados aos eleitores os direitos e garantias ao exercício do voto, nos termos seguintes:

§ 1º Ninguém pode impedir ou embaraçar o exercício do sufrágio.

§ 2º Nenhuma autoridade pode, desde cinco dias antes e até 24 horas depois do encerramento da eleição, prender ou deter qualquer eleitor, salvo flagrante delito.

§ 3º Desde 24 horas antes até 24 horas depois da eleição, não se permitirão comícios, manifestações ou reuniões públicas, de caráter político.

§ 4º Nenhuma autoridade estranha à Mesa Receptora pode intervir, sob pretexto algum, em seu funcionamento.

§ 5º Os membros das Mesas Receptoras, os fiscais de candidatos e os delegados de partido são invioláveis durante o exercício de suas funções, não podendo ser presos, ou detidos, salvo flagrante delito em crime inafiançável.

§ 6º É proibida, durante o ato eleitoral, a presença de força pública dentro do edifício em que funcione a Mesa Receptora ou nas suas imediações.

§ 7º Será feriado nacional o dia da eleição.

§ 8º O Tribunal, Superior e os Tribunais Regionais darão hábeas-córpus para fazer cessar qualquer coação ou violência atual ou iminente.

§ 9º Nos casos urgentes, o hábeas-córpus poderá ser requerido ao juiz eleitoral, que o decidirá sem demora, com recurso necessário para o Tribunal Regional.

O Código Eleitoral de 1932 vedava a prisão de eleitor nos cinco dias antecedentes ao início da eleição até 24 horas após o seu encerramento, salvo na única hipótese de flagrante delito.

Os membros das mesas receptoras, fiscais de candidatos e os Delegados de partido só poderiam ser presos no ‘período eleitoral’ em flagrante delito por crime inafiançável.

Como a força pública, a mando dos coronéis, era freqüentemente utilizada para intimidar o eleitor, a lei proibiu sua presença dentro do edifício em que funcionava a mesa receptora ou nas suas proximidades.

No parágrafo 3º, havia a previsão de proibição de comícios e outras manifestações públicas desde 24 horas antes até 24 horas depois do encerramento da eleição, medida salutar para evitar confrontos de partidários de agremiações opostas, face ao natural acirramento dos ânimos nesse período.

Esse Código Eleitoral não previa para o candidato proibição de prisão diversa da do eleitor comum.

A Lei n.º 48, de 04/05/1935, que modificou o Código Eleitoral, assim dispunha sobre as garantias eleitorais (redação original):

Art. 165. Serão assegurados aos eleitores os direitos e garantias ao exercicio do voto, nos termos seguintes:

1) ninguem poderá impedir ou embaraçar a exercicio do suffragio;

2) nenhuma autoridade poderá, desde cinco dias antes e até vinte e quatro horas depois do encerramento da eleição, prender ou deter qualquer eleitor, salvo em flagrante delicto ou em virtude de sentença criminal condenatória por crime inafiançável ;

3) desde quarenta e oito horas antes, até vinte e quatro horas depois da eleição, não se permittirá propaganda politica, mediante radio-diffusão, ou em comicios, ou reuniões publicas ;

4) nenhuma autoridade estranha á, mesa receptora poderá intervir, sob pretexto algum, em seu funccionamento;

5) os membros das mesas receptoras, os candidatos, os fiscaes de candidatos e os delegados de partidos serão inviolaveis durante o exercicio de suas funcções, não podendo ser presos, ou detidos, salvo em flagrante delicto;

6) é prohibida, durante o acto eleitoral, a presença de força publica no edificio em que funccionar a mesa receptora, ou nas suas immediações, observado o disposto no art. 128, § 5º;

7) será feriado nacionaI, estadual ou municipal o dia de eleição;

8) o Tribunal Superior e os tribunaes regionaes darão Habeas-corpus e mandado de segurança para fazer cessar qualquer coacção ou violencia, actual ou imminente, ao exercicio do direito de voto de propaganda politica;

9) em casos urgentes o habeas-corpus e o mandado de segurança poderão ser requeridos ao juiz eleitoral, que o decidirá sem demora, com recurso necessario para o Tribunal Regional;

10) é vedade, aos jornaes officiaes da União, Estados, Districto Federal, Territorio e Municipios, a propaganda politica em favor de candidato ou partido contra outros.

Algumas alterações sensíveis foram introduzidas. Além da prisão em flagrante, tornou-se possível a prisão do eleitor no período eleitoral em razão de sentença criminal condenatória por crimes inafiançáveis. O legislador, sabiamente, já percebendo a insuficiência protetiva, viu-se na obrigação de incluir entre as exceções legais a possibilidade de prisão em razão de sentença condenatória por crime inafiançável.

Houve retração da garantia dos membros das mesas receptoras, fiscais de candidatos e Delegados de partido contra prisões no período eleitoral, passando-se a admitir prisão em flagrante até nos crimes afiançáveis.

A situação do candidato ficou inalterada em relação ao Código Eleitoral de 1932 no que tange à possibilidade de prisão no período eleitoral.

Também ampliou-se o prazo de proibição de comícios e reuniões políticas de caráter público (desde 48 horas até 24h depois do encerramento da votação).

No período do Estado Novo (1937-1945), foram nomeados interventores para o Poder Executivo Estadual e Municipal e as Casas Legislativas foram dissolvidas, não havendo eleições no país. Foi extinta a Justiça Eleitoral

Posteriormente, o Decreto-Lei n.º 7.586, de 28-05-1945 (que restabeleceu a Justiça Eleitoral), assim se referia às garantias eleitorais:

Art. 108. São assegurados aos eleitores os direitos e garantias ao exercício do voto, nos têrmos seguintes:

1) ninguém poderá impedir ou embaraçar o exercício do sufrágio;

2) nenhuma autoridade poderá, desde cinco dias antes e até quarenta e oito horas depois do encerramento da eleição, prender ou deter qualquer eleitor, salvo em flagrante delito ou em virtude de sentença criminal condenatória por crime inafiançável;

3) desde quarenta e oito horas antes, até vinte e quatro horas depois da eleição, não se permitirá propaganda política, mediante radiodifusão, em comícios, ou reuniões públicas;

4) nenhuma autoridade estranha à mesa receptora poderá intervir, sob pretexto algum, em seu funcionamento;

5) os membros das mesas receptoras, os fiscais de candidatos ou os delegados de partidos são invioláveis, durante o exercício de suas funções, não podendo ser presos, ou detidos, salvo em flagrante delito;

6) é proibida, durante o ato eleitoral, a presença de fôrça pública no edifício em que funcionar a mesa receptora, ou nas suas imediações, observado o disposto no art. 76, parágrafo único;

7) não se aplica a Lei Constitucional n.º 2, de 16 de maio de 1938, aos Juízes e funcionários a que incumbir o serviço eleitoral, em qualquer de suas modalidades.

A única alteração de relevo em relação à legislação anterior foi o aumento do prazo de vedação de prisão após o encerramento da eleição - de 24 horas para 48 horas.

Após, por meio da Lei n.º 1.164, de 24-07-1950 (Código Eleitoral), as garantias eleitorais foram assim vazadas:

Art. 129. São assegurados aos eleitores os direitos e garantias de exercício do voto, nos têrmos seguintes:

1) ninguém poderá impedir ou embaraçar o exercício de sufrágio;

2) nenhuma autoridade poderá, desde cinco dias antes e até quarenta e oito horas depois do encerramento da eleição, prender ou deter qualquer eleitor, salvo em flagrante delito ou em virtude de sentença criminal condenatória por crime inafiançável;

3) desde quarenta e oito horas antes, até vinte e quatro horas depois da eleição, não se permitirá propaganda política mediante radio-difusão, comícios ou reuniões públicas;

4) os membros das mesas receptoras e os fiscais de partido, durante o exercício das suas funções, não poderão ser detidos ou presos, salvo o caso de flagrante delito; da mesma garantia gozarão os candidatos desde quinze dias antes da eleição;

5) é proibida, durante o ato eleitoral, a presença de fôrça pública, no edifício em que funcionar a mesa receptora, ou nas mediações, observado o disposto no art. 83, parágrafo único;

6) a realização de qualquer ato de propaganda partidária ou eleitoral, que deva ter lugar em recinto aberto, fica apenas subordinada a comunicação por ofício ou telegrama à autoridade competente, que sómente poderá designar o local para a reunião, contanto que, assim procedendo, não a fruste ou impossibilite;

7) é vedado aos jornais oficiais, estações de rádio e tipografias de propriedade da União, dos Estados, Distrito e Territórios federais, municípios, autarquias e sociedades de economia mista, a propaganda política favorável ou contrária a qualquer cidadão ou partido;

8) as estações de rádio, mencionadas no inciso, precedente, nos quinze dias anteriores a uma eleição, proporcionarão meia hora diária de irradiação aos órgãos da Justiça Eleitoral, para a divulgação de esclarecimentos referentes ao processo eleitoral.

Art. 130. As estações de rádio, com exceção das referidas no artigo anterior e das de potência inferior a dez kilowatts, nos noventa dias anteriores às eleições gerais de todo o país ou de cada circunscrição eleitoral, reservarão diariamente duas horas à propaganda partidária, sendo uma delas pelo menos à noite, destinando-as, sob rigoroso critério de rotatividade, aos diferentes partidos, mediante tabela de preços iguais para todos.

Art. 131. A propaganda eleitoral, qualquer que seja a sua forma, só poderá ser feita em língua nacional.

§ 1º Os infratores dêste artigo ficam sujeitos à pena de três a seis meses de prisão, além da apreensão e perda do material de propaganda, qualquer que seja o meio de divulgação.

§ 2º O processo para apuração do fato a que se refere êste artigo é o das contravenções penais.

§ 3º Sem prejuízo do processo e da pena constante dêste artigo, o juiz eleitoral, o preparador e as autoridades policiais e municipais impossibilitarão imediatamente a propaganda.

A novidade introduzida foi em relação aos candidatos: a restrição à prisão foi ampliada para desde 15 dias antes do início da eleição, período em que ‘a eleição se decide’, ou seja, época em que as intenções de voto vão se firmando na mente do eleitor.

Posteriormente, sobreveio a edição da Lei n.º 4.767/65 (atual Código Eleitoral), que no tocante à possibilidade de prisão no período eleitoral acrescentou a hipótese de desrespeito à salvo-conduto:

"Art. 236. Nenhuma autoridade poderá, desde 5 (cinco) dias antes e até 48 (quarenta e oito) horas depois do encerramento da eleição, prender ou deter qualquer eleitor, salvo em flagrante delito ou em virtude de sentença criminal condenatória por crime inafiançável, ou, ainda, por desrespeito a salvo-conduto.

§ 1º. Os membros das Mesas Receptoras e os Fiscais de partido, durante o exercício de suas funções, não poderão ser detidos ou presos, salvo o caso de flagrante delito; da mesma garantia gozarão os candidatos desde 15 (quinze) dias antes da eleição.

§ 2º. Ocorrendo qualquer prisão o preso será imediatamente conduzido à presença do Juiz competente que, se verificar a ilegalidade da detenção, a relaxará e promoverá a responsabilidade do coator."

A proibição às prisões no período eleitoral – tirante as exceções legais – tem como uma de suas principais finalidades coibir abusos e evitar ‘armações’ que causem repercussões de tal monta que possam influenciar o eleitor ou colocar em dúvida, por interesse de partidos políticos, os resultados de uma eleição.

Ninguém duvida que uma segregação cautelar indevidamente decretada (seja de eleitor ou candidato a cargo eletivo) possa ser decisiva no resultado de uma eleição, independentemente dos cargos em disputa.


3. Hipóteses de cabimento da prisão nos prazos do artigo 236 do Código Eleitoral

Apresentar-se-á um pequeno apanhado de situações em que, na interpretação convencional do art. 236 do Código Eleitoral, é cabível a prisão provisória de eleitores no período eleitoral.

É preciso lembrar que o artigo 236 da Lei n.º 4.737/65 (Código Eleitoral) veda a prisão de eleitor, que é o brasileiro maior de 18 anos que se alistou na forma da lei – art. 4º do Código Eleitoral [03].

A observação é importante na medida em que, desavisadamente, alguns operadores do Direito pensam que os empecilhos à custódia cautelar se estendem a toda e qualquer pessoa, com exceção das hipóteses de flagrante delito, sentença condenatória por crime inafiançável e desrespeito a salvo-conduto.

Desta forma, desde que, é claro, presentes os requisitos autorizadores, pode ser feita nos prazos do artigo 236 do CE a prisão provisória de pessoa que não pode exprimir-se na língua nacional, já que nessa situação não pode se alistar como eleitor.

É possível no período eleitoral a prisão de indivíduo que não se alistou como eleitor, embora preenchendo os requisitos para tanto. É uma situação deveras corriqueira o fato de que muitas pessoas que atingiram os 18 anos de idade não tomaram as necessárias providências para efetuar seu alistamento eleitoral [04].

Já o inciso II do § 1º do artigo 14 da CF/88 prevê alistamento facultativo para o analfabeto. Assim, o analfabeto, embora maior de 18 anos, desde que não alistado eleitoralmente, não estará ao abrigo do disposto no artigo 236 do Código Eleitoral, podendo ter sua prisão provisória decretada.

Não podem alistar-se como eleitores os conscritos, durante o período do serviço militar obrigatório, nos termos do artigo 14, § 2º, da CF/88 [05].

Conscritos são aqueles que prestam o serviço militar obrigatório [06]. Os conscritos anteriormente alistados perante a Justiça Eleitoral estão impedidos de exercitar o direito de voto durante o período da conscrição (Resolução TSE 20.165, de 07.04.1998, Rel. Ministro Nílson Naves).

O conceito de conscrito também abrange o aluno de órgão de formação da reserva. Ele fica proibido de votar, ainda que anteriormente alistado [07].

Na lição de ALEXANDRE DE MORAES, "O conceito de conscrito estende-se aos médicos, dentistas, farmacêuticos e veterinários que prestam serviço militar obrigatório a teor da Lei 5.292. Também aos que prestam serviço militar na condição de prorrogação de engajamento incidem restrições da Constituição Federal, com base no art. 14, § 2º (Resolução TSE n.º 15.850, Rel. Min. Roberto Rosas).(2004, p. 541/542).

O artigo 236 do CE não agasalha a situação daqueles que estão com o seu alistamento eleitoral cancelado, o que ocorre, no que interessa ao presente estudo, nas hipóteses de o eleitor deixar de votar em três eleições consecutivas e nos casos de perda ou suspensão dos direitos políticos.

A perda dos direitos políticos dar-se-á em duas hipóteses: a) cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado; e, b) recusa de cumprir obrigação imposta ou prestação alternativa [08].

Já a suspensão dos direitos políticos (privação temporária de direitos políticos) pode acontecer em três hipóteses: a) incapacidade civil absoluta; b) condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos; e, c) improbidade administrativa (CF/88, art. 15, incisos II, III e V).

Em se tratando de condenação criminal transitada em julgado, a suspensão dos direitos políticos se dá nada importando se a infração penal é de natureza dolosa ou culposa, ou se é crime ou contravenção [09]. O fato de a pena carcerária ser substituída por restritiva de direitos também não modifica a situação de suspensão dos direitos políticos.

ALEXANDRE DE MORAES, ao tratar dos efeitos da condenação criminal, ensina que ‘a suspensão dos direitos políticos persistirá enquanto durarem as sanções impostas ao condenado, tendo total incidência durante o período de livramento condicional, e, ainda, nas hipóteses de prisão albergue ou domiciliar, pois somente a execução da pena afasta a suspensão dos direitos políticos com base no art. 15, inciso III, da Constituição Federal. Em relação ao período de prova do sursis, por tratar-se de forma de cumprimento da pena, o sentenciado igualmente ficará privado temporariamente de seus direitos políticos’ (2004, p. 587-588) [10].

Já decidiu o Tribunal Superior Eleitoral que o ajuizamento de revisão criminal não produz efeitos em relação à suspensão dos direitos políticos [11].

Prisão em flagrante

A palavra flagrante é de origem latina – flagrare, que significa queimar. No âmbito jurídico, diz respeito ao delito que está sendo cometido, que está acontecendo naquele exato momento, e que permite a prisão do seu autor sem a necessidade de mandado judicial.

As situações configuradoras de flagrante delito estão previstas no artigo 302, incisos I a IV, do CPP [12].

Breve observação se faz sobre a prisão em flagrante nos crimes permanentes, quando então a situação de flagrância se estende no tempo.

Segundo lição de FERNANDO CAPEZ (2004, p. 246) no crime permanente ‘o momento consumativo se protrai no tempo, e o bem jurídico é continuamente agredido. A sua característica reside em que a cessação da situação ilícita depende apenas da vontade do agente, por exemplo, o seqüestro (art. 148 do CP).

Sentença condenatória por crime inafiançável

No prazo do art. 236 do CE é possível a prisão de eleitor que tenha contra si uma sentença condenatória por crime inafiançável. Não é exigido que a sentença tenha transitado em julgado, bastando que na sentença não tenha sido reconhecido o direito de o acusado aguardar em liberdade o julgamento do apelo.

Crimes inafiançáveis são: a) os que têm pena mínima superior a dois anos de reclusão (art. 323, inciso I, do CPP), como, por exemplo, o homicídio doloso, estupro, atentado violento ao pudor, roubo, etc; b) os de racismo, crimes hediondos, tortura, tráfico de entorpecentes, terrorismo e a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (art. 5º, inc. XLII, XLIII e XLIV, da CF/88); c) os crimes punidos com reclusão que provoquem clamor público ou que tenham sido cometidos com violência contra a pessoa ou grave ameaça.

Se a prisão do eleitor é cabível na hipótese em que a sentença condenatória por crime inafiançável não transitou em julgado, a fortiori será possível quando o trânsito em julgado já haver ocorrido.

No que pertine aos membros da mesa receptora de votos, fiscais de partidos ou coligações e candidatos, a restrição à prisão no período eleitoral fica ampliada – art. 236, § 1º, do CE.

Os membros das mesas receptoras, fiscais e Delegados de partido [13] não podem ser presos salvo em caso de flagrante delito, enquanto estiverem no efetivo exercício de suas funções. Fora delas, a situação equipara-se a de um eleitor comum, aplicando-se a regra contida no caput do art. 236 do CE.

Os candidatos a cargos eletivos não podem ser presos desde 15 dias antes da data prevista para as eleições, à exceção da hipótese de flagrante delito.

Cumpre fazer referência que tramita atualmente no Congresso Nacional projeto de lei de autoria do Senador Francisco Pereira (PL-ES), que visa a acrescentar duas novas exceções à proibição de prisão de candidatos nos prazos do artigo 236 do CE, quais sejam: a) sentença condenatória transitada em julgado, e, b) prisão preventiva decretada antes do início do período de 15 dias que o dispositivo determina.

Desrespeito a salvo-conduto

No seu artigo 235, o Código Eleitoral autoriza ao Juiz Eleitoral ou ao Presidente da mesa receptora de votos expedir salvo-conduto - com cominação de prisão de até 05 dias em caso de desobediência – em favor de eleitor que sofrer violência, moral ou física, na liberdade de votar, ou pelo fato de ter votado.

A finalidade do salvo-conduto é garantir que o eleitor não sofra qualquer espécie de coação ou constrangimento quando está se dirigindo a sua seção de votação, enquanto vota e após ter votado.

Como já visto, em muitos rincões do Brasil, onde ainda imperam o ‘coronelismo’ ou o trabalho ‘semi-escravo’, é muito comum haver facilidades para coagir eleitores.

A medida pode ser ordenada, como explica FÁVILA RIBEIRO, ‘não apenas contra autoridade policial ou autoridade pública em geral, dispondo de maior elastério, recaindo contra qualquer pessoa que esteja a ocasionar gravame, físico ou moral, à liberdade de voto. Nessas condições, o salvo-conduto poderá ser emitido em favor do eleitor em virtude de coação emanada de patrão contra o seu empregado, do proprietário contra os seus colonos ou rendeiros, do dirigente sindical contra associados, do diretor de estabelecimento de ensino contra os seus discípulos, do chefe de família contra o outro cônjuge, seus filhos e dependentes, enfim, genericamente, contra quem quer que esteja a cometer violência moral ou física sobre o desempenho do eleitor no ato de votação’ (2000, p. 415).

O salvo-conduto é válido das 72h anteriores ao início da votação até 48h depois do seu encerramento.

Em conseqüência do que foi exposto, estão vedadas, na interpretação ‘tradicional’ do artigo 236 do Código Eleitoral, as prisões temporárias; prisões preventivas; as decorrentes de sentença de pronúncia e de sentenças condenatórias por crimes afiançáveis; a prisão do depositário infiel.

Esclareça-se, por oportuno, que no período previsto no artigo 236 do CE não pode ser feita a prisão do eleitor devedor de alimentos por não estar albergada pelas exceções do citado dispositivo legal, conforme ensinam PEDRO ROBERTO DECOMAIN e PÉRICLES PRADE (2004, p. 300).


4. Releituras do art. 236 do Código Eleitoral

Estudou-se retro os casos em que, na interpretação tradicional (literal) do artigo 236 do Código Eleitoral as prisões de eleitor podem (ou não) ser efetuadas.

No entanto, a insatisfação dos juristas em geral com a rigidez do texto legal, inadequado para fazer frente às candentes necessidades de, em alguns casos durante o período eleitoral, decretarem-se prisões provisórias, vem paulatinamente obrigando os operadores do Direito a fazer novas leituras sobre o artigo 236 do Código Eleitoral, flexibilizando-o em atendimento ao direito constitucional à segurança e ao princípio da efetividade do processo.

Com efeito, parece ser quase um consenso entre os doutrinadores que a interpretação tradicional conferida ao art. 236 do Código Eleitoral não vem ao encontro dos ditames da justiça social e do direito à segurança.

No tópico seguinte, serão vistos alguns posicionamentos que vão desde a afirmação de inconstitucionalidade do artigo 236 do CE, sua revogação, até sua aplicabilidade restrita aos crimes eleitorais, passando pelos ensinos de que a prisão por determinação de autoridade judicial no período eleitoral não é vedada pela norma em comento e de que é possível o cumprimento da ordem de prisão no período eleitoral, desde que decretada anteriormente a esse período.

4.1 Revogação e inconstitucionalidade

JOEL J. CÂNDIDO, eminente especialista em Direito Eleitoral, no plano doutrinário é uma das vozes que se levanta para afirmar a revogação do artigo 236 do Código Eleitoral. E o faz nos seguintes termos:

"Hoje, com a vigência do art. 5º, LXI [14], da Constituição Federal, o art. 236 e § 1º, do Código Eleitoral, está revogado. Mesmo fora daqueles períodos, ninguém pode ser preso, a não ser nas exceções mencionadas na lei. E pelas exceções constitucionais a prisão será legal, podendo ser efetuada mesmo dentro dos períodos aludidos no Código Eleitoral. Em resumo: se a prisão não for nos moldes da Constituição Federal, nunca poderá ser efetuada; dentro dos limites da Constituição Federal pode sempre ser executada, mesmo em época de eleição." (2003, p. 303).

A Constituição brasileira, tão pródiga na concessão de direitos, não oporia qualquer óbice para que a prisão de eleitores se fizesse dentro do período citado no artigo 236 do CE.

Acatando-se in totum tal ordem de idéias, forçoso seria também concluir que o artigo 298 do Código Eleitoral estaria revogado [15].

Já na senda na inconstitucionalidade, argumenta-se que a vedação posta no artigo 236 do CE consagra verdadeira afronta ao princípio da isonomia, criando duas classes de cidadãos, uma sujeita às prisões cautelares no período do artigo 236 do CE e outra imune pela simples condição de ser eleitora.

Na visão dos críticos, o art. 236 da Lei n.º 4.737/65 estaria criando um supercidadão, que no período especificado não poderia ser preso. O alistamento eleitoral e o direito de votar seriam os diferenciais. A discriminação não se justificaria, até mesmo porque o não-alistado eleitor também tem participação política, influenciando outros com sua opinião, trabalhando para candidatos, cobrando realizações da classe política, etc.

Cite-se outra possível situação que violaria o princípio da isonomia: dois indivíduos que praticaram o mesmo delito censurável, ostentando um a condição de eleitor e o outro não. O último poderá ser preso preventivamente no período do artigo 236 do CE enquanto o primeiro não, dada a sua condição de eleitor.

De outro lado, poderíamos ter situações teratológicas com a aplicação irrestrita do art. 236 do CE. Por exemplo: um indivíduo eleitor que cometesse um delito de furto no período eleitoral poderia ter sua liberdade restringida pela prisão em flagrante (prisão provisória). Já um narcotraficante, um estuprador ou um latrocida, indivíduos socialmente muito mais perigosos e que cometeram delitos que causam grande clamor social, não poderiam ter a prisão preventiva ou a prisão temporária decretadas.

Isso não se poderia admitir, pois, como lembra CARLOS MAXIMILIANO, "Deve o Direito ser interpretado inteligentemente: não de modo que a ordem legal envolva um absurdo, prescreva inconveniências, vá ter a conclusões inconsistentes ou impossíveis" (p. 136).

Em comentário ao artigo 236 do CE, MARCOS RAMAYANA tece as seguintes e judiciosas considerações: "Consagra o artigo legal evidente exagero, que não mais merece permanecer na ordem jurídica, pois os motivos que embasaram o legislador para a adoção da regra não prevalecem nos tempos atuais (2004, p. 353). No entanto, do texto acima não fica claro se RAMAYANA considera o artigo 236 da Lei n.º 4.737/65 inconstitucional ou, simplesmente, desnecessário.

Importante referir que no Congresso Nacional tramita o Projeto de Lei n.º 7.573/2006 [16], de autoria do Deputado Fernando de Fabinho (PFL-BA), que propõe a revogação pura e simples do artigo 236 do Código Eleitoral. A redação do projeto é a seguinte:

"PROJETO DE LEI N.º 7.573/2006

"Revoga o art. 236 do Código Eleitoral.

"O Congresso Nacional decreta:

"Art. 1º. Esta lei revoga o art. 236 da Lei n.º 4.737, de 15 de julho de 1965, que institui o Código Eleitoral, de maneira a relativizar o princípio do direito de voto diante do princípio da segurança da sociedade, permitindo em todo o território nacional a prisão dos cidadãos, mesmo no período compreendido entre os cinco dias que antecedem e as quarenta e oito horas que se sucedem à eleição.

"Art. 2º. Revogue-se o art. 236 da Lei n.º 4.737, de 15 de julho de 1965.

"Art. 3º. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Na justificativa do projeto de lei, Sua Excelência faz as seguintes e judiciosas considerações, que certamente externam o pensamento de respeitável parcela da comunidade jurídica e do povo em geral: "...sopesando o direito de voto e o direito de segurança da sociedade contra os indivíduos que atentam contra os valores que lhe são caros, o legislador preferiu o primeiro, estabelecendo algumas exceções. No entanto, passadas mais de quatro décadas da entrada em vigor da norma e vivendo nós hoje em um mundo muito mais violento, penso que não mais se justifica tal garantia eleitoral. O livre exercício do sufrágio há de ser garantido de outra forma, mas não mais dando um salvo-conduto de uma semana a inúmeros criminosos, para que circulem tranqüilamente no período das eleições".

4.2 Vedação à prisão somente para crimes eleitorais

Em interessante e instrutivo artigo publicado no Jornal Correio Braziliense de 30.09.2002 (Caderno Direito & Justiça), FRANCISCO RODRIGUES DA SILVA, membro do Poder Judiciário de Pernambuco, defende que a vedação à prisão de eleitor nos prazos do art. 236 da Lei n.º 4.737/65 diz respeito exclusivamente aos processos por prática de crimes eleitorais propriamente ditos, excluindo-se as demais espécies de delitos.

Textualmente, é referido:

"Os crimes eleitorais foram criados e instituídos pelo Legislativo federal, como fundamento e reflexo maior da República Federativa do Brasil, levando em meta a cidadania e o pluralismo político, para garantir e assegurar a soberania popular mediante plebiscito e referendo exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, obrigatório e facultativo.

Essas infrações penal-eleitorais são conceituadas e definidas no Código Eleitoral (artigos 289 a 354, da Lei nº 4.737, de 15-7-1965)..."

"(...)

"Com efeito, para os crimes propriamente eleitorais, e somente para eles, não cabendo para os demais crimes, o Código Eleitoral pátrio, no intuito manifesto de assegurar e garantir o sufrágio universal, em prol da cidadania, que se reflete no direito de votar e ser votado e até mesmo para evitar as conhecidas ‘‘denúncias pré-fabricadas’’, inclusive à instauração de ‘‘processos-eleitoreiros’’ contra adversários políticos nos períodos eleitorais, se antecipou, dizendo o seguinte:

Art. 236, 1º. (...)

"Não nos esqueçamos, sob outro enfoque, que o Código Eleitoral adotou providências iminente (rápida, à época de sua edição) e eminente (de qualidade) com o objetivo de evitar prisões advindas de ‘‘queixas eleitorais temerárias’’ e instauração de ‘‘processos forjados’’ contra desafetos e adversários políticos no período considerado, por lei, como do pleito ou em razão dele.

Essa causa inteligente e legal, e nesse aspecto aplaudimos de público, de suspensão temporária da eficácia de mandado de prisão, prevista somente no Código de Ritualidade Eleitoral, nas hipóteses que não haja incompatibilidade com a Constituição Federal, se dirige à ordem de segregação processual a bem do rito eleitoral — não confundir com processo criminal eleitoral — por crime exclusivamente previsto nos artigos do Diploma Punitivo Eleitoral, jamais por crime de outra natureza (crime comum, federal, militar, tributário, econômico, de responsabilidade etc.), previstos no Código Penal e leis especiais.

Nesse viés, se ninguém deve ser segregado ou levado à prisão por fato alheio, estranho, sem conexão ou continência com o fato-crime objeto de prisão previamente definido em lei como crime, é intuitivo também que ninguém mereça ser beneficiado por um privilégio dado a certa modalidade de crime. Trocando em miúdos, ninguém tem o direito de que seja suspensa ou sobrestada ordem de prisão por um crime comum, quando referido privilégio foi concedido tão-somente aos crimes eleitorais em benefício de procedimento eleitoral.

Daí admitirmos, entretanto, que ordem judicial de prisão daquele período, de fato e de direito, deve ser sobrestada, porém unicamente por fato indigitado criminoso na órbita eleitoral, a bem dos objetivos da República Federativa do Brasil, quais sejam, a soberania popular e a cidadania, não se cogitando em crimes de outras naturezas e diverso do pleito.

As assertivas do culto magistrado apontam, portanto, para a necessidade de utilizar-se da técnica de ‘interpretação conforme a Constituição’ para compatibilizar o art. 236 da Lei n.º 4.737/65 com a Carta Magna.

Na técnica de interpretação conforme a Constituição, obter-se-ia uma única interpretação do art. 236 do Código Eleitoral, afastando-se as demais interpretações possíveis.

Segundo o magistério de GILMAR MENDES, na interpretação conforme a Constituição o Tribunal declara qual das possíveis interpretações se revela compatível com a Lei Fundamental. Essa forma de decisão possui flexibilidade, que permite renúncia ao formalismo jurídico em nome da idéia de justiça material e da segurança jurídica (2005, p. 287).

Não há se confundir essa técnica com a declaração de nulidade sem redução de texto, na qual os órgãos da Administração Pública e do Poder Judiciário ficam impedidos de adotar determinadas interpretações, mas sem prejuízo das demais existentes.

Na interpretação conforme a Constituição, esclareça-se, o Poder Judiciário e a Administração Pública ficam proibidos de patrocinar toda e qualquer interpretação diversa daquela encampada pela Corte Constitucional.

4.3. Cabimento de prisão provisória por ordem judicial

Em outro importante trabalho doutrinário [17], no qual também é feita uma interpretação conforme a Constituição, GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO sustenta que o preceito do artigo 236 da Lei n.º 4.737/65 visa, em razão da importância de um pleito eleitoral para a Nação, evitar embaraços ilícitos ao exercício de voto. No entanto, fundado o impedimento em ordem judicial ou inquérito policial, em sede de segregação cautelar, não há como considerar tal circunstância um óbice ilícito ao exercício do sufrágio.

Prossegue o autor dizendo que "...não haverá, no ato de custódia, qualquer desvio ou abuso de poder de autoridade contrário a liberdade de voto (artigo 237 do C.E.). Haverá, sim, a ação da autoridade em prol da sociedade visando a responsabilização eficaz do cidadão pela prática de delito, com sua segregação por força de permissivo judicial evidenciando não estar ele apto a permanecer livre".

Concluindo, afirma que seu posicionamento é no sentido de ‘que a ordem de prisão passada por autoridade judiciária competente, seja de cunho definitivo, seja de cunho cautelar, não pode ser entendida como óbice a legítimo exercício de sufrágio, nem abuso de poder em desfavor da liberdade do voto, podendo ser cumprida mesmo no lapso estipulado no artigo 236 da Lei Eleitoral’.

Essa linha de idéias desafia novamente a aplicação da técnica de interpretação conforme a Constituição. O enfoque dado pelo autor sugere que a vedação à prisão nos prazos do art. 236 do CE diz respeito, tão-somente, aos embaraços ilícitos para o exercício do sufrágio, e não à normal atividade jurisdicional de decretação de prisões, sejam elas cautelares ou definitivas.

4.4. O significado do verbo ‘prender’ no caput do art. 236 do Código Eleitoral

Finalmente, é de serem feitas algumas considerações sobre o significado do verbo ‘prender’, contido no caput do artigo 236 do CE.

Autores há que sustentam que a prisão de um acusado possui dois momentos distintos: a decretação e a execução do comando judicial.

Segundo PAULO GUIMARÃES, especialista em Direito Eleitoral, ‘Quando o Código Eleitoral afirma que nenhuma autoridade pode ‘prender’ candidatos em um determinado período, ele se refere à decretação, e não ao ato físico de prender’. Assim, se a prisão foi decretada antes do período previsto no artigo 236 do CE, é válida e pode ser executada a qualquer momento, até que sobrevenha ordem judicial em sentido contrário’.

Comentando sobre a possibilidade de prisão de candidato a cargo eletivo do Distrito Federal no prazo previsto no artigo 236 do CE, LEOVEGILDO MORAIS, criminalista e ex-Procurador da República, assevera: "O que o Código Eleitoral visa proteger, em seu artigo 236, é o abuso de poder, a perseguição política contra um candidato. A intenção é impedir que, por força de algum motivo político, o candidato venha a ser preso no período de 15 dias antes e 48 horas depois da votação. Obviamente, isso não se aplica a quem teve a prisão decretada antes do período em questão. Nesse caso, trata-se apenas da execução de uma ordem judicial".

O raciocínio de que no período eleitoral possa ser executada a ordem de prisão decretada antes do seu início seria totalmente aplicável à situação do eleitor e das pessoas referidas na primeira parte do § 1º do art. 236 do Código Eleitoral.

Relembre-se que tramita no Congresso Nacional projeto de lei [18]de autoria do Senador Francisco Pereira (PL-ES), que autoriza a prisão preventiva de candidato nos casos de ter sido decretada antes do início do período de 15 dias que o artigo 236, § 1º, do CE, determina.


5. Visão crítica dos posicionamentos externados nos itens 4.1, 4.2, 4.3 e 4.4.

Em que pese respeitáveis os quatro posicionamentos acima mencionados, crê-se não ser possível fazer interpretações tão restritivas do artigo 236 do CE, ou, ainda, considerá-lo revogado ou simplesmente inconstitucional. Salvo melhor juízo, a garantia do direito ao voto e o direito à segurança não só podem como devem coexistir no nosso ordenamento jurídico. As propostas hermenêuticas vistas nos itens 4.1, 4.2, 4.3 e 4.4 esvaziam de maneira muito significativa a garantia do direito ao voto editada pelo legislador positivo.

RUI STOCCO e LEANDRO DE OLIVEIRA STOCCO não compartilham do entendimento que o art. 236 do CE estaria revogado. Sustentam esses autores que: "...o só fato do advento da Constituição Federal e do disposto no seu art. 5º, inciso LXI não tem o condão de impedir que a lei específica (Cód. Eleitoral) estabeleça regras de exceção e de validade temporária para o período eleitoral, voltadas à proteção e regularidade do pleito e para assegurar o direito constitucional do exercício da cidadania através da manifestação da vontade, expressada através do voto. Aliás, este Código Eleitoral foi posto a lume quando vigorava uma outra Constituição, que já previa a possibilidade de prisão com as garantias que especificava e nas hipóteses previstas em lei infraconstitucional, cuja sede principal é o Código de Processo Penal" (p. 751).

A época de eleições (independentemente dos cargos em disputa), pelas suas características específicas e grandes transformações, que dizem respeito à própria organização do Estado, é um período de exceção. E nesse período de exceção deve ter primazia a legislação eleitoral.

São vários os motivos que ainda justificam, embora com alguns temperamentos, a garantia prevista no artigo 236 do Código Eleitoral. Mencionar-se-á alguns.

1) especialmente nas eleições municipais, é assaz comum os candidatos aos cargos eletivos majoritários ou proporcionais se elegerem por escassa margem de votos, que algumas vezes não chega a uma dezena. Candidatos nas eleições proporcionais perdem eleições ou tornam-se suplentes por um ou dois votos. Nas últimas eleições municipais (2004), candidatos foram eleitos com apenas dois ou três votos de vantagem sobre seus adversários [19]. Em outros casos, candidatos à vereança obtiveram o mesmo número de votos, tendo a ocupação do cargo eletivo de ser decidida por critérios de desempate [20]. Nessas situações, vê-se bem que a prisão de um ou dois eleitores do candidato que se sagrou vencedor, feita no período do art. 236 do CE, poderia inverter completamente o resultado das eleições, fraudando-se, assim, a vontade popular.

2) A prisão de candidatos e fiscais e Delegados de partidos ou coligações, especialmente após o término da votação, poderia ensejar fraudes nas eleições por falta de fiscalização na apuração de votos.

Antes do advento das urnas eletrônicas, a apuração dos votos era feita manualmente, com anotações em planilhas, e sujeita a vários erros, de forma que uma fiscalização intensa dos partidos era primordial para que não houvesse distorção da vontade popular externada nas urnas.

Claro que hoje, em razão da utilização das urnas eletrônicas, as apurações dos votos não se estendem por vários dias, como antigamente, e as chances de fraudes e erros diminuíram bastante, mas nem por isso a fiscalização deve ser negligenciada, pois é fator de legitimação do pleito.

FÁVILA RIBEIRO faz as seguintes observações ao comentar o § 1º do art. 236 do Código Eleitoral (os grifos não constam do original):

"Enquanto para os mesários e fiscais de partidos não houve cronometração de tempo, em relação aos candidatos recua essa garantia aos 15 dias que precedem as eleições. Para os mesários, o lapso de tempo pode ser mais dilatado se for cometido à própria mesa receptora o encargo de proceder também à contagem de votos, nos termos dos arts. 188-189 do Código Eleitoral. Se houver essa distensão funcional, persistirão em atividade os mesários, ficando ainda amparados pela garantia até o completo encerramento dos trabalhos.

"No tocante aos fiscais, para os que devam atuar exclusivamente nas atividades pertinentes à votação, logo após a sua realização ficam desprovidos da garantia eleitoral. Para os que estejam no desempenho de atividade de fiscalização na fase de apuração é compreensível que se dilate a garantia até que se concluam os trabalhos de apuração da circunscrição em que estejam participando. Quanto aos candidatos retrocede a proteção legal a 15 dias antecedentes ao pleito, e deve manter-se eficaz enquanto estiver pendente a apuração para que tenham ensejo de assistir e participar de todos os trabalhos em resguardo de seus interesses e da própria mecânica representativa. (2000, pp. 417-418).

3) A prisão do eleitor é vedada desde cinco dias antes do pleito para que ele não possa ser preso enquanto se desloca para a sua seção de votação. Em 1932, quanto a garantia da vedação à prisão no período eleitoral foi criada, o Brasil era um país em que a maioria da população vivia em zonas rurais, distante, portanto, dos locais de votação. Não raro, o deslocamente até uma sessão eleitoral poderia levar alguns dias. Os meios de transporte também eram precários, de forma que o eleitor se deslocava com carroças ou até mesmo a pé, fazendo dois ou três dias de caminhada.

Mesmo nos dias atuais, o eleitor pode levar dias para deslocar-se até sua seção eleitoral. Isso ocorre especialmente quando o eleitor mora em um Estado da Federação e vota em outro. É comum eleitores sequer transferirem seu título para a cidade em que moram, justamente para no dia da eleição poderem visitar familiares e parentes na cidade a qual seu título eleitoral ficou vinculado.

4) Outro motivo para vedar a prisão no período eleitoral foi evitar o abuso da força policial para intimidar o eleitor. Era comum, especialmente nas pequenas comunas, uma espécie de subordinação da polícia aos poderosos locais. Policiais eram facilmente cooptados pelos ‘coronéis’ locais e atuavam a seu serviço, intimando eleitores com ameaças de prisão para que votassem ou deixassem de votar em determinados candidatos. Muitas vezes a prisão era feita em caráter de represália, imediatamente após a eleição, motivo também para que a garantia eleitoral fosse estendida para até 48 horas após o encerramento da votação.

Não é incomum membros das corporações policiais, especialmente nas pequenas cidades, terem afinidades com políticos locais, fato que às vezes enseja intimidação do eleitor identificado com as cores partidárias opostas, por medo de alguma ‘armação’ ou vindita.

Oportuno lembrar que até o advento do Código Eleitoral de 1932 não havia, na prática, o voto secreto, de forma que era fácil os chefes locais saberem em quem determinados eleitores votaram. [21]

É de bom alvitre ressaltar que os membros do Poder Judiciário também eram muito sujeitos às influências dos chefes políticos locais, nem sempre exercendo os juízes suas funções com a isenção necessária.

Não caia no olvido, por exemplo, que mais recentemente na nossa história o Ato Institucional n.º 5, de 1968, conferiu ao Chefe do Poder Executivo Federal poderes para demitir, remover, aposentar ou colocar em disponibilidade os magistrados, sendo suspensas as garantias constitucionais da vitaliciedade e inamovibilidade. Sem a garantia da inamovibilidade, se um magistrado proferir uma decisão que vá contra os interesses de um Chefe do Executivo, por manobras políticas poderia ser transferido para uma Comarca distante.

5) A vedação à prisão antes e depois da eleição também foi positivada para evitar acirramento de ânimos, especialmente nas pequenas comunas. Sabe-se que eleição é paixão, e as pessoas muitas vezes perdem o senso de medida em época eleitoral. Por exemplo, é comum membros de uma mesma família se agredirem – após discussões inflamadas -, motivados por divergências políticas. A prisão de eleitor no período eleitoral pode dar ensejo a vinganças contra partidários de agremiação oposta, principalmente quando se acredita que eles de alguma forma contribuíram para a prisão. Conturba-se, assim, o ambiente eleitoral, o que faz com que muitos eleitores sequer compareçam às urnas, tudo para preservar a integridade física e, às vezes, a própria vida....

Em todas as eleições, o TSE tem de autorizar o envio de tropas do Exército para garantir a tranqüilidade do pleito em alguns lugares do país.

O envio de tropas é comum nas eleições. Em 1994, 12 estados receberam as forças armadas. Em 1996, o exército esteve presente em 10 unidades da Federação. Em 1998, 09 estados pediram e foram atendidos pelo Tribunal Superior Eleitoral, que determinou o envio das forças federais.

Em 2002, justificando o envio de tropas federais para as eleições do Distrito Federal, o então Vice-Presidente do TSE, Sepúlveda Pertence afirmou: ‘‘A possível briga entre as duas torcidas, a situação delicada, as notícias e os boatos recentes foram importantes na hora de decidir [22].’’

Ainda, forças policiais são reforçadas em muitas cidades face ao periclitar da segurança pública por razões de disputas eleitorais.

Por parte de muitos candidatos denúncias inverídicas, visando proveito eleitoral, são feitas, tentando gerar uma situação que, manipulando o sistema de justiça, possa ensejar a prisão de candidatos da facção adversária.

6) prisões provisórias indevidamente decretadas no período eleitoral poderiam influenciar o resultado das eleições. Pense-se no impacto que poderia ter perante o eleitorado a prisão de um candidato a cargo eletivo às vésperas da eleição. Poderia significar uma derrota certa e redução significativa de votos para os demais candidatos de seu partido ou coligação, mediante maliciosa e demagógica exploração do fato pelo partido adversário. O mesmo se diga de prisão de influente cabo eleitoral.

7) a vedação à prisão no período eleitoral também contribuiu para que o resultado das eleições não seja posto em dúvida. É importante fator de legitimação do pleito. Uma eleição tumultuada, com um grande número de prisões no período, algumas de impacto devido à notoriedade do preso, podem fazer a população acreditar em manipulação e resultados viciados.

Em outras palavras, de nada adiantaria termos um processo eleitoral com lisura se a população não acreditasse que foi assim de fato.

Considerando tais motivos, o entendimento dos doutrinadores referidos nos itens 4.1, 4.2, 4.3 e 4.4 reduz de forma drástica a garantia eleitoral da vedação à prisão, tão necessária ao efetivo exercício da cidadania.

Como ensina GILMAR MENDES, ‘as decisões fundamentais do legislador, as suas valorações e os objetivos por ele almejados estabelecem também um limite para a interpretação conforme a Constituição. Não se deve conferir a uma lei com sentido inequívoco significação contrária, assim como não se devem falsear os objetivos pretendidos pelo legislador" (2005, p. 290).

Cabe, então, uma indagação. Haverá situações em que a prisões preventivas e temporárias poderão ser decretadas no prazo do artigo 236 do Código Eleitoral? As garantias eleitorais do direito ao voto prevalecerão sempre quando em confronto com outros direitos fundamentais? Haverá forma de compatibilizá-los?


6. Colisão de direitos fundamentais

É pacífico na doutrina e na jurisprudência que os direitos fundamentais não são intocáveis e absolutos. Como o homem vive em sociedade, estando em contato permanente com seu semelhante - que também goza de direitos e garantias -, natural que surjam situações de conflitos e choques entre esses direitos.

Tem-se colisão ou conflito de direitos sempre que a Constituição proteja, ao mesmo tempo, dois valores ou bens que estejam em contradição em um caso concreto.

Conforme CANOTILHO, uma colisão autêntica de direito fundamentais ocorre quando o exercício de um direito fundamental por parte do seu titular colide com o exercício do direito fundamental por parte de outro titular.

No tema que se trata, evidencia-se uma colisão entre direitos da coletividade (segurança pública, manutenção da ordem pública, efetividade do processo penal) e o direito do particular ao voto.

Em situações como essas, sempre é importante relembrar a seguinte lição do Supremo Tribunal Federal: "A lei deve ser interpretada não somente à vista dos legítimos interesses do réu, mas dos altos interesses da sociedade, baseados na tranqüilidade e segurança social [23]".

Respeitados os entendimentos em sentido contrário, em determinadas situações é de se permitir a decretação de prisões cautelares (temporárias e provisórias) nos prazos do art. 236 do Código Eleitoral, sacrificando-se parcialmente o direito individual.

Um exemplo: a prisão temporária pode ser decretada quando imprescindível para as investigações policiais e quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade. NUCCI refere: "esses dois elementos permitem a correta qualificação do suspeito, impedindo que outra pessoa seja processada ou investigada em seu lugar, evitando-se, por isso, o indesejado erro judiciário. Aquele que não tem residência (morada habitual) em lugar determinado ou não consegue fornecer dados suficientes para o esclarecimento da sua identidade (individualização como pessoa) proporciona insegurança na investigação policial" (p. 659-660).

Um outro caso em que a segregação cautelar se faz necessária, em detrimento do direito de voto, é quando o acusado está ameaçando ou aliciando as testemunhas de um processo criminal. Se atingir o seu intento, a persecução penal (de interesse de toda a sociedade) restará prejudicada e a impunidade será alcançada.

A possibilidade iminente de fuga de um acusado de crime também é motivo suficiente para que, em certos casos, se possa relativizar a regra de proibição à prisão no prazo do art. 236 do CE. O mesmo se diga de crimes que abalam a ordem pública, seja pela grande repercussão do fato ou pela extrema periculosidade do agente.

Veja-se a lição de MIRABETE: "Fundamenta em primeiro lugar a decretação da prisão preventiva a garantia da ordem pública, evitando-se com a medida que o delinqüente pratique novos crimes contra a vítima ou qualquer outra pessoa, quer porque seja acentuadamente propenso à prática delituosa, quer porque, em liberdade, encontrará os mesmos estímulos relacionados com a infração cometida. Mas o conceito de ordem pública não se limita a prevenir a reprodução de fatos criminosos, mas também a acautelar o meio social e a própria credibilidade da justiça em face da gravidade do crime e de sua repercussão" (fl. 690).

Indaga-se: um atentado contra vida de policial civil ou militar em serviço não causa abalo à ordem pública? Os vários atentados cometidos por membros do PCC (organização criminosa Primeiro Comando da Capital) contra as forças policiais, em sendo realizados dentro do período eleitoral, não justificariam uma prisão cautelar, presentes os pressupostos para sua decretação? Um maníaco sexual que violentasse e matasse indefesas crianças dentro do período eleitoral, mesmo sendo confesso, não poderia ser preso provisoriamente durante esse período em razão de não ter havido a situação de flagrância?

Por evidente, os fatos acima narrados ensejariam o sacrifício do direito individual, até mesmo porque é preciso preservar a credibilidade da justiça perante os jurisdicionados. A população – com inteira razão – não entende que em casos como esses a prisão não possa ser decretada. A aceitação acrítica do dispositivo legal permitiria, por exemplo, que acusado não sentenciado, mas foragido, pudesse aparecer livremente na cidade, em franco escárnio ao sistema de justiça, minando sua credibilidade e corroendo a confiança do povo nas instituições.

Em uma sociedade complexa como a nossa, é cada vez maior a tensão entre os direitos fundamentais do indivíduo e os de interesse da sociedade como um todo: direito à segurança, efetividade do processo judicial, etc. Nestes casos, a Constituição implicitamente autoriza que o legislador e o Poder Judiciário façam restrições aos direitos fundamentais, utilizando-se do princípio da proporcionalidade.

Pelo referido princípio, quando dois princípios entram em rota de colisão porque a aplicação de um provoca redução da esfera de aplicação de outro, cabe-se determinar se essa redução é proporcional, à vista da importância do princípio atingido. Em certos casos, induvidosamente, sobrelevar-se-á o direito fundamental à segurança.

6.1. Do direito fundamental à segurança

Toda pessoa que se encontre no território do país tem direito à segurança, cabendo ao poder público promover este direito, garantindo à população o direito de ir e vir, de se estabelecer com tranqüilidade, de ter sua intimidade preservada, sem que sua integridade física, moral ou psicológica seja colocada em risco.

A Declaração Universal dos Direitos do Homem, datada de 1948, no seu artigo III, prescreve que "todo homem tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal"

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (o famoso ‘Pacto de São José da Costa Rica’), no seu artigo 7º assegura que ‘toda pessoa tem direito à liberdade e à segurança pessoais’.

A Constituição Brasileira garante aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade – art. 5º, ‘caput’.

É absolutamente necessário que os operadores do Direito passem a enxergar que não somente o indivíduo tem direitos, mas que a coletividade pacata e ordeira precisa de ordem e segurança para levar em paz sua vida. O contrato social precisa ser protegido. O Estado tem sua razão maior de ser na proteção do todo, e não somente da da parte. Invoca-se ensinamento de SAMPAIO DÓRIA (grifos não constantes do original):

"Em verdade, o Estado, que o homem organiza, se destina ao bem do homem, e não à sua desgraça. Ninguém constrói, por exemplo, uma estrada de ferro para ser esmagado por um desastre. Nem mesmo para servi-la. Mas para se servir dela. Da mesma forma, não é para ser anulado que o homem organiza o Estado. As sociedades se formam em função dos indivíduos, e para eles. E, nas sociedades, a organização política, ou Estado, surge, mas é para garantir, igualmente, a cada um a liberdade, isto é, fazer, ou deixar de fazer, o que generalizado, não destrua, nem prejudique a vida social. Nunca para suprimir aos homens a dignidade da existência" (1962, p. 244).

Nas condições históricas em que vivemos, a garantia do direito ao voto deve ser relativizada em prol do direito à segurança, de que é titular a coletividade inteira e não somente alguns indivíduos. O direito ao voto pode ser compatibilizado com o direito à segurança, bastando que o Estado crie meios para que o preso provisório possa ser conduzido a local de votação no dia do pleito eleitoral.

Não podemos olvidar que o Brasil tem hoje um Poder Judiciário independente, qualificado e responsável, que não decretará prisões provisórias de forma leviana ou arbitrária. E se isso acontecer, sempre haverá outras instâncias judiciais para reparar o erro.

O que não pode acontecer é ingenuamente fechar-se os olhos para a onda de violência que assola o país (fomentada pela frouxidão das leis penais) e endeusar-se os que cometem delitos graves, a ponto de lhes blindar contra prisões preventivas e temporárias nos prazos do artigo 236 do Código Eleitoral. É preciosa a lição de SCALQUETTE:

"É incontestável que a proteção dos direitos fundamentais é meio para assegurar a liberdade e dignidades humanas, mas, como vimos, por vezes, esses direitos têm que ser limitados face as situações em que o bem comum exige sacrifícios individuais para garantia da ordem pública, pois acima dos interesses individuais está o interesse da coletividade e garantir o respeito aos direitos e liberdades não pode ser entendido como pretexto para que a desordem e a instabilidade pública se instaurem (2004, p. 173) (grifo não constante do original).

Assim, é de se advogar a possibilidade de prisão provisória em situações-limite, tais como nos casos de roubo, crimes hediondos e crimes dolosos contra a vida, como se passará a ver.

6.2 Crimes hediondos, roubo e crimes dolosos contra a vida

Em linhas gerais, pode-se dizer que crimes hediondos são aqueles que se mostram repugnantes, sórdidos, asquerosos, horrendos, seja pela sua gravidade objetiva ou por seus meios de execução.

Em razão disso, a própria Constituição Federal estabeleceu regime mais rigoroso no trato com esses crimes, considerando-os inafiançáveis e vedando a graça e a anistia.

O legislador infraconstitucional não formulou um conceito de crime hediondo, preferindo aplicar o ‘rótulo’ hediondo a alguns delitos descritos no Código Penal e em leis especiais. Por expressa disposição constitucional (art. 5º, LXIII), equiparou-se a hediondos os crimes de tortura, terrorismo e o tráfico ilícito de entorpecentes e de drogas afins.

A teor do art. 1º da Lei n.º 8.072/90, são considerados hediondos os seguintes crimes capitulados no Código Penal:

I – homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2º, I, II, III, IV e V); II – latrocínio (art. 157, § 3º, in fine); III – extorsão qualificada pela morte (art. 158, § 2º); IV – extorsão mediante seqüestro e na forma qualificada (art. 159, caput e §§ 1º, 2º e 3º); V – estupro (art. 213 e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único); VI – atentado violento ao pudor (art. 214 e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único); VII – epidemia com resultado morte (art. 267, § 1º); VII-A (Vetado); VII-B – falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 273, caput e § 1º, 1º-A e § 1º-B, com a redação dada pela Lei 9.677 de 2 de julho de 1998).

No parágrafo único do art. 1º da Lei 8.072/90 é prescrito que também se considera hediondo o crime de genocídio, consumado ou tentado.

A Lei n.º 8.072/90, afinada com o rigorismo exigido pela Constituição, estabeleceu outras restrições, tais como a proibição de concessão de indulto e liberdade provisória; maior tempo de cumprimento de pena (2/3) para concessão de livramento condicional; aumento dos prazos de prisão temporária para os crimes hediondos, etc.

Como magistralmente exposto por VOLNEI CORRÊA LEITE DE MORAES JÚNIOR:

‘...a instituição da categoria dos crimes hediondos, claramente não traduzindo um direito, certamente é uma garantia dos direitos fundamentais – à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade’ (art. 5º, caput).

"Conseqüentemente, os inimigos da Lei dos Crimes Hediondos são inimigos dos direitos fundamentais, que aquela garantia resguarda, são inimigos do garantismo constitucional, são inimigos da Constituição-Cidadã. Significa dizer: são hipócritas, porque vivem a proclamar juras de amor ao garantismo, quando na verdade desejam ver abolida uma das mais eficazes garantias dos Direitos Humanos" (2003, p. VIII).

Já o delito de roubo, seja na forma simples ou qualificada, é um dos mais levam pânico à população. O cidadão de bem é ‘atormentado’ pelos assaltantes no recesso de seu lar, nos seus locais de trabalho, lazer e estudo. Em conseqüência, o cidadão restringe ao máximo as suas atividades sociais, deixando de freqüentar determinados lugares ou só os freqüentado em horários que considera menos arriscados.

A lição ainda é de VOLNEY CORRÊA JÚNIOR: " não há nada mais dramaticamente objetivo, mais pungentemente concreto, mais tragicamente real que a teia de pavor no qual os cidadãos pacatos se vêem envolvidos pelos ladrões violentos’ (p. 24).

Já os crimes dolosos contra a vida representam as interdições máximas da convivência em sociedade, pois lesam o mais importante dos direitos fundamentais; com efeito, estar vivo é a condição para o exercício de qualquer direito.

Propugna-se aqui, então, que além das exceções previstas no artigo 236 do CE, possa haver a prisão cautelar de eleitor nos casos de cometimento de crimes hediondos, crimes dolosos contra a vida e roubo.

Esses delitos, como já referido acima, agridem a sociedade de uma forma muito peculiar e profunda. Com efeito, para os crimes hediondos, previstos em lei específica, a própria Constituição exige tratamento mais rigoroso; nos crimes dolosos contra a vida é atingido o bem maior do ser humano; e nos casos de roubo, porque representa um grande ataque à integridade psíquica da vítima, além da ausência de resposta pronta do poder público causar um sentimento de descrença do povo nas suas instituições do sistema de justiça.

Resta evidente que pela sua distinta natureza, os crimes hediondos, dolosos contra a vida e o roubo merecem tratamento diferenciado do dos demais crimes. E tanto é assim que esses delitos normalmente têm penas elevadas.

A prisão provisória por esses delitos impedirá que seus autores fiquem livres durante o prazo do art. 236 do CE, evitando-se a evasão dos criminosos, a intimidação de testemunhas e a prática de novos crimes, protegendo-se, assim, a sociedade.

Não se pode ter uma visão unilateral do direito processual, acreditando que essa província do direito é apenas um conjunto de normas para tutelar o acusado diante do poder do Estado, esquecendo-se que ele também deve tutelar a segurança dos cidadãos de bem.

Nesse ponto, cabe a indagação: por que meios, no prazo previsto no artigo 236 do CE, se estenderá a prisão provisória aos eleitores que cometeram crimes hediondos, crimes dolosos contra a vida e roubo? A resposta pode estar na utilização das chamadas sentenças ou decisões aditivas.


7. As sentenças aditivas

Em profícuo artigo, CELSO RIBEIRO BASTOS [24] teceu as seguintes considerações sobre as mais recentes técnicas de interpretação constitucional (grifos não constantes do original):

"As interpretações constitucionais tradicionais, cumpre dizer, limitam-se a levantar todas as possíveis interpretações que a norma sub examine comporta e a confrontá-las com a Constituição, através da utilização dos métodos histórico, científico, literal, sistemático e teleológico. Na interpretação constitucional tradicional não é permitido ao intérprete fazer qualquer alargamento ou restrição no sentido da norma de modo a deixá-la compatível com a Carta Maior. No segundo pós-guerra o que se assiste é uma inclinação da jurisprudência no sentido de maximizar as formas de interpretação que permitam um alargamento ou restrição do sentido da norma de modo a torná-la constitucional. Procura-se buscar até mesmo naquelas normas que à primeira vista só parecem comportar interpretações inconstitucionais - através da ingerência da Corte Suprema alargando ou restringido o seu sentido - uma interpretação que a coadune com a Carta Magna. Vale dizer que nas tradicionais formas de interpretação constitucional apenas se levantavam todas as possíveis interpretações e confrontavam-se com a Constituição. O intuito das modernas formas de interpretação constitucional é o de buscar no limiar da constitucionalidade da norma algumas interpretações que possam ser aproveitadas desde que fixadas algumas condições.

E é nesse quadro que se inserem as sentenças ou decisões aditivas.

Sentenças ou decisões aditivas são decisões judiciais que, em questionamento sobre a constitucionalidade de ato normativo, acolhem a impugnação, sem invalidá-lo. Em vez de operar-se a expulsão da norma do ordenamento jurídico, ela fica mantida com o acréscimo ao seu conteúdo de uma regulação que faltava para efetivar sua concordância com a Constituição.

Conforme a lição de EDÍLSON PEREIRA NOBRE JÚNIOR (p. 121): ‘Nessas decisões, a estrutura literal da norma combatida se mantém inalterada, mas o órgão de jurisdição constitucional, criativamente, acrescenta àquela componente normativo, vital para que seja preservada sua conciliação com a Lei Fundamental. A sua ocorrência coincide com as hipóteses em que o tribunal reconhece a existência de omissão parcial, justamente porque permitem o acréscimo do necessário para tornar a norma impugnada concordante com os mandamentos constitucionais"(grifo não constante do original).

Assim, a inconstitucionalidade não estaria no conteúdo do que a regra jurídica prescreve, mas, ao contrário, no fato de a norma não prescrever aquilo que a Constituição exige.

Segundo JORGE MIRANDA, ‘Nas decisões aditivas (também ditas modificativas ou manipulativas) a inconstitucionalidade detectada não reside tanto naquilo que ela não preceitua; ou, em outras palavras, a inconstitucionalidade acha-se na norma na medida em que não contém tudo aquilo que deveria conter para responder aos imperativos da Constituição. E, então, o órgão de fiscalização acrescenta (e, acrescentando modifica) esse elemento que falta’ (2002, p. 514).

Dito em outras palavras: há possibilidade de sentenças aditivas quando uma norma apresenta carga normativa inferior à que constitucionalmente deveria possuir. Há uma autêntica inconstitucionalidade por insuficiência protetiva. Os órgãos jurisdicionais, nesse caso, reputam inconstitucional a norma na parte em que não prevê determinada regulamentação. A sentença aditiva introduz no ordenamento o conteúdo normativo faltante.

No caso do art. 236 do CE, a ele deveriam ser ‘adicionadas’ as hipóteses de prisões preventivas por roubos, crimes hediondos e crimes dolosos contra a vida, de forma a fazer sua concordância com o mandamento constitucional do direito à segurança.

No âmbito penal, tivemos um exemplo de sentença aditiva por parte do Superior Tribunal de Justiça quando da interpretação do artigo 2º da Lei n.º 10.259/01, que criou os Juizados Especiais Cíveis e Criminais na esfera da justiça federal.

O artigo 2º da Lei n.º 10.259/01 estabelecia a competência da justiça federal para processar e julgar os feitos relativos às infrações de menor potencial ofensivo. Essas infrações assim restaram definidas no parágrafo único desse artigo: "Consideram-se infrações de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a dois anos, ou multa."

No entanto, na época o artigo 61 da Lei n.º 9.099/95 circunscreveu o conceito de infrações de menor potencial ofensivo àqueles delitos cuja pena máxima não fosse superior a um ano.

Essa incongruência resultou em tratamento discriminatório, pois, por exemplo, um desacato [25] cometido contra policial federal seria passível de oferta de transação penal ao seu autor, o mesmo não ocorrendo quando praticado contra policial civil ou militar dos Estados federados.

Para corrigir a disparidade, o Superior Tribunal de Justiça, fincado no princípio da isonomia, externou o entendimento de que a novel definição de infrações de menor potencial ofensivo, prevista na Lei n.º 10.259/01, derrogou aquela contida no parágrafo único do artigo 61 da Lei n.º 9.099/95. E note-se, por extremamente relevante, que o parágrafo único do art. 2º da Lei n.º 10.259/01, prescrevia que a nova definição de crimes de menor potencial ofensivo só era aplicável para os efeitos da própria Lei n.º 10.259/2001.

Concluindo: o STJ, por aplicação do princípio da isonomia, estendeu o conceito de menor potencial ofensivo da Lei 10.259/01 à Lei 9.099/95, desconsiderando a regra explícita de exclusão existente no parágrafo único do art. 2º do primeiro Diploma Legal citado. Em outras palavras, usou da técnica de sentença aditiva.

O legislador ordinário não tem liberdade absoluta, não podendo violar preceitos constitucionais e a principiologia do Estado Democrático de Direito.

Em síntese: o artigo 236 do Código Eleitoral somente pode ser ‘salvo’ de uma declaração de inconstitucionalidade com o uso da técnica de sentença aditiva. Para tanto, deve-se: a) agregar-se às exceções à prisão referidas no citado artigo as hipóteses de prisão cautelar por cometimento de crimes contra a vida, roubo e crimes hediondos; b) estender-se aos candidatos a possibilidade de prisão em virtude de sentença condenatória transitada em julgado.

Quanto ao segundo ponto, evidentemente, não há qualquer motivo para deixar de efetuar-se a prisão de candidatos em caso de a sentença condenatória ter transitado em julgado. A esse respeito, colha-se a abalizada lição de ÉDSON DE REZENDE CASTRO, que se vale de argumentos irrespondíveis: "...na literalidade da lei, o candidato não poderá ser preso em razão de decreto de prisão preventiva, ou temporária, ou mesmo por força de sentença condenatória criminal transitada em julgado, pois que a regra é o impedimento à prisão e a exceção é o estado de flagrância tão-somente. Não é possível levar o dispositivo a tal conseqüência. É evidente que aquele que tem contra si sentença penal condenatória transitada em julgado não só poderá como deverá ser preso, inclusive naqueles 15 dias que antecedem a eleição. Argumenta-se que a prisão do candidato, com toda a repercussão negativa que a medida alcança, prejudica seu desempenho nas urnas, podendo levá-lo a perder a disputa. E é verdade. Entretanto, tratando-se de prisão por sentença condenatória transitada em julgado, não há argumento que possa superar a necessidade de executar-se imediatamente o julgado criminal, até porque acima dos interesses do candidato está a pretensão executória estatal. Ademais, com a prisão do candidato, os eleitores recebem em relação a ele mais uma informação importante, qual seja, a existência de condenação criminal definitiva, que deve ser levada em consideração no momento da escolha. De resto, é bom lembrar que a providência (prisão) não trará qualquer prejuízo concreto para a candidatura, porque o candidato estará inelegível no dia das eleições, pois suspensos os seus direitos políticos (art. 15, III, da CF). De qualquer forma, então, ainda que fosse eleito, teria o seu diploma cassado, em sede de recurso contra a expedição de diploma, exatamente em razão da inelegibilidade superveniente ao registro" (p. 311-312).

Não são apenas os tribunais que podem se valer da técnica de sentenças aditivas, podendo fazê-lo qualquer Órgão do Poder Judiciário, pois exercem jurisdição constitucional.

A prisão provisória no período eleitoral para os que cometem crimes dolosos contra a vida, crimes hediondos e roubos também prestaria homenagem ao princípio da isonomia. Com efeito, se cabível prisão em casos de flagrante e sentença condenatória sem trânsito em julgado para indivíduos que praticaram crimes de menor gravidade, com mais razão ainda deverá se dar a segregação provisória nos crimes de maior gravidade, só que na forma de prisões temporárias ou preventivas.

Qualquer valor constitucional pode ser priorizado em uma sentença aditiva, inclusive – e especialmente - o direito à segurança.

7.1 Rebatendo as críticas às decisões ou sentenças aditivas

De plano já se nota que a principal crítica que os doutrinadores fazem à utilização das decisões ou sentenças aditivas é que estas se constituiriam em uma inadmissível usurpação da função legislativa por parte dos Órgãos do Poder Judiciário.

Entretanto, é de se ressalvar que nas sentenças aditivas os órgãos judicantes não criam livremente a norma jurídica, à semelhança do que faz o legislador, mas apenas ‘descobrem’, especificam, aquela já existente implicitamente no ordenamento jurídico ou passível de extração dos comandos constitucionais, a fim de preencher um ‘vazio’ constitucional.

Apropriado, nesse passo, menção às lições de EDÍLSON PEREIRA NOBRE JÚNIOR quando trata do tema (grifos não constantes do original):

"...não há que se equiparar tal atividade à legislação. O complemento introduzido pelas lições em exame, além de efeito indireto de declaração de inconstitucionalidade, não deriva de pura imaginação da Corte Constitucional, mas de integração analógica resultante de outras normas ou princípios constitucionais, cuja descoberta advém do engenho daquela.

"Perfilha o juiz constitucional, apenas e tão-só, solução constitucionalmente obrigatória..."

"Noutro passo, viceja raciocínio, com prestígio doutrinário (cf. PUGIOTTO, 1992, p. 3674-3679), segundo o qual o objeto principal da sentença aditiva apenas ilusoriamente seria uma omissão legislativa parcial. Diversamente, constitui uma norma vivente a patrocinar a exclusão não consentida constitucionalmente.

(...)

"Cappeletti (1984, p. 622-633), com base em cinco sólidas razões, demonstra a necessária legitimidade que usufrui, na atualidade, a jurisdição constitucional, acompanhada da capacidade criadora de seus integrantes. Isso porque: a) se acha dissipada a ilusão ocidental relativa à capacidade dos ramos políticos (Executivo e Legislativo) em materializar o consentimento dos governados; b) não se pode negar o esforço dos tribunais em modelar suas decisões, não com arrimo nas idiossincrasias e predileções subjetivas de seus membros, mas com o escopo de permanecerem fiéis ao sentido de justiça e de eqüidade da comunidade; (...) e) considerando-se que uma democracia não poderá subsistir numa conjuntura em que os direitos e liberdades dos cidadãos careçam de proteção eficaz, apresenta-se como essencial daquela que o controle judicial dos ramos políticos, porquanto a idéia democrática não se resume a simples maiorias, significando, também, participação, liberdade e tolerância.

"Esses argumentos, cuja dissecação se dispensa, por não se comportar nos lindes deste trabalho, espancam qualquer dúvida quanto a ser legítimo ao juiz constitucional, tanto no sistema difuso quanto no concentrado, assumir, no exame de eventuais contrastes entre a Constituição e os atos estatais, uma postura ativa, dinâmica e criadora, objetivando, assim, garantir um adequado controle do poder diante do arbítrio" (op. cit., p. 125).

Retomando o ponto: nas sentenças aditivas, não se tem a elaboração de uma norma jurídica, mas somente o complemento da norma existente, a partir de solução já constante no ordenamento jurídico, cuja descoberta se deu pelo trabalho do hermeneuta. Aqui, não há confundir atividade de criação jurídica com atividade legislativa.

Destaca RUI MEDEIROS [26] que:

"Efectivamente, embora parte da doutrina admita que as decisões modificativas são proferidas no exercício de um poder discricionário do Tribunal Constitucional e se contente em pedir aos juízes constitucionais que usem a sua liberdade de escolha com parcimônia, numerosos autores esforçam-se por sublinhar que não está em causa o exercício de uma função substancialmente criativa ex nihil, verificando-se tão-somente a extração de um quid iuris já presente — de modo cogente e vinculativo para o próprio legislador — no ordenamento. Nesta perspectiva, o órgão de controlo, ao modificar a lei, não actua como se fosse legislador, já que << não possui aquele grau de liberdade de opção para definir o escopo legal que é atributo do legislador>>. <<O quid iuris adiectum, ainda que não explicitado formalmente na disposição ou no texto (verba legis), está já presente, e in modo obbligante, no próprio sistema>>.

O jurista FRANCISCO CAMPOS já há muito assinalara:

"O poder de interpretar a Constituição envolve, em muitos casos, o poder de formulá-la. A Constituição está em elaboração permanente nos tribunais incumbidos de aplicá-la; é o que demonstra a jurisprudência do nosso Supremo Tribunal Federal, e particularmente, a da Suprema Corte Americana. Nos Tribunais incumbidos da guarda da Constituição, funciona, igualmente, o poder constituinte. [27]"

Enfocando o assunto sob um outro ângulo, não se pode deixar de perceber que o Poder Judiciário atua como uma espécie de ‘Delegado’ do Poder Constituinte originário para fazer a defesa da Constituição.

O Constituinte de 1988 depositou muita confiança no Poder Judiciário, fortalecido na nova ordem constitucional. Assim, um certo ativismo judicial, mais do que desejável, é indispensável para a efetivação dos direitos, postergada pela inércia legislativa.

É dever do magistrado, ante a omissão legislativa, valer-se da Constituição para dar efetividade ao direito em risco de perecimento ou de drástica redução de efetividade.

Oportuna menção à lição de SÉRGIO ALVES GOMES (2004, p. 59-60) (grifos não constantes do original): "...aplicar o Direito, em um Estado de Direito Democrático, significa aplicar antes de tudo a Constituição. Diante desta, todos os poderes constituídos e demais leis devem se curvar. E para aplicá-la deverá o juiz interpretá-la, segundo os ensinamentos, princípios, da hermenêutica constitucional, entendida como especialidade da hermenêutica jurídica. Ao adotar como meta a aplicação dos princípios e regras constitucionais e dos princípios da hermenêutica jurídica constitucional, o magistrado muito se distancia daquela postura de falsa "neutralidade" tão ao gosto da escola de exegese, para se tornar um autêntico concretizador dos valores que são, ao mesmo tempo, os fundamentos e objetivos do Estado de Direito Democrático. Sob a égide dos princípios que orientam este, o Juiz torna-se um importante sujeito ativo na aplicação e elaboração do Direito, ou seja, um efetivo participante da construção de uma sociedade autenticamente democrática. É óbvio que tal atitude não é simpática aos inimigos da democracia. A estes, nada melhor que juízes autômatos, dóceis ou indiferentes aos caprichos e desmandos deles. Felizmente, a consciência democrática vem produzindo cada vez mais, dentro e fora da magistratura, uma mentalidade renovadora do papel do juiz na sociedade e dos relevantes escopos desempenhados no correto exercício do poder que este exerce".

Em resumo: o juiz, ao ‘criar’ (rectius: descobrir) uma lei com base na Constituição para suprir uma lacuna deixada pelo legislador, não interfere na independência do Poder Legislativo.

Uma Constituição possui cláusulas gerais, abertas, e conceitos de valores tais como igualdade, dignidade, segurança, etc., o que inevitavelmente deixa ao intérprete uma vasta gama de deliberações possíveis.

Como se pode razoavelmente concluir, um dos objetivos buscados pela norma veiculada no artigo 236 do Código Eleitoral foi evitar que os órgãos judiciais decretassem prisões cautelares resultantes de elementos precários ou infundados, motivadas por perseguição política, e que pudessem resultar em sério gravame eleitoral.

Nos dias atuais, o Poder Judiciário exerce suas funções dentro um quadro de absoluta normalidade constitucional, ao contrário de décadas atrás, quando sofria considerável influência daqueles que exerciam o poder econômico e político.

Em um determinado momento histórico, preferiu o legislador, no conflito entre o direito à segurança pública e o direito ao voto, privilegiar o último.

No entanto, houve sensível modificação das condições históricas, o que não pode deixar de influir na interpretação dos textos legais.

O Brasil de hoje não é mais aquela sociedade agrária e atrasada socialmente da década de 30, momento em que surgiu pela prisão vez no ordenamento jurídico a proibição de prisão de eleitores durante o período eleitoral.

De outro vértice, o quadro da violência é absolutamente diferente daquele em que a proibição das prisões cautelares no período eleitoral foi gestado. A violência explode no país. Todo dia os brasileiros são ‘bombardeados’ pelos meios de comunicação social com notícias de crimes contra a vida cometidos de forma bárbara, estupros, roubos praticados por quadrilhas, tráfico de drogas, latrocínios, etc. Assim, a interpretação tradicional do art. 236 do CE, além de beneficiar os autores dos delitos mencionados, mina de forma irremediável a credibilidade do sistema de justiça, que fica impotente para dar uma resposta à sociedade no período eleitoral.

A jurisprudência tem como uma de suas missões ‘atualizar’ o texto legal defasado pelo tempo, garantindo-lhe ‘sobrevida’ e aplicação até que alterações legislativas se processem.

E combata-se, desde logo, a afirmação de que ao estender-se as hipóteses permissivas de prisão durante o prazo do art. 236 do CE estar-se-ia violando o princípio da legalidade ou fazendo-se analogia in malam partem. Inexiste analogia in malam partem contra ou em relação à Constituição.

Uma constatação óbvia: o Direito não pode ser isolado do ambiente em que vigora. E não se pode olvidar, também, que o artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil dá o sentido pelo qual a lei deve ser interpretada: de acordo com os fins sociais a que ela se dirige e com as exigências do bem comum.

Como ensina de forma lapidar MARIA HELENA DINIZ (1997, pp. 163-4), "Na falta de definição legal do termo ‘fim social’ o intérprete aplicador em cada caso sub judice deverá averiguar se a norma a aplicar atende à finalidade social, que é variável no tempo e no espaço, aplicando o critério teleológico na interpretação da lei, sem desprezar os demais processos interpretativos...O fim social é o objetivo de uma sociedade, encerrado na somatória de atos que constituirão a razão de sua composição; é, portanto, o bem social, que pode abranger o útil, a necessidade social e o equilíbrio de interesses etc...Conseqüentemente, fácil será perceber que comando legal não deverá ser interpretado fora do meio social presente; imprescindível será adaptá-lo às necessidades sociais existentes no momento de sua aplicação. Essa diversa apreciação e projeção no meio social, em razão da ação do tempo, não está a adulterar a lei, que continua a mesma" (grifos não constantes do original).

Não se perca de vista também que, se de um lado o Estado deve proteger o cidadão contra os excessos/arbítrios do direito penal e do processo penal (garantismo no sentido negativo, que pode ser representado pela aplicação do princípio da proporcionalidade enquanto proibição de excesso - Übermassverbot), esse mesmo Estado não deve pecar por eventual proteção deficiente (garantismo no sentido positivo, representado pelo princípio da proporcionalidade como proibição de proteção deficiente – Untermassverbot).

Situação deveras perigosa ao interesse social é a aceitação literal e acrítica do comando normativo albergado pelo artigo 236 do CE por parte da comunidade jurídica. Repete-se à exaustão a proibição de prisão do eleitor sem se pensar criticamente sobre a irrazoabilidade e a inconstitucionalidade por omissão da norma.

É trágico ver-se operadores do direito defendendo a proibição da prisão provisória de eleitor para todo e qualquer crime sem saber exatamente o porquê e mencionando jurisprudência para abonar a tese, sem fazerem qualquer reflexão crítica. Lembre-se aqui a lição do Ministro Humberto Gomes de Barros, que no REsp. 23.498/SP, julgado em 25/11/1992, observou: "A jurisprudência não é uma rocha cristalizada, imóvel e alheia aos acontecimentos. Ela é filha da vida, sua função é manter o ordenamento jurídico vivo e sintonizado com a realidade".

Nesse quadro, alvissareira é a tramitação no Congresso Nacional do Projeto de Lei do Senado 290/2006, de autoria da Senadora Serys Slhessarenko (PT-SC), que visa a alteração do art. 236 do CE para permitir no período a prisão provisória de autores de crimes hediondos e de crimes dolosos contra a vida. Como bem referiu a Senadora na exposição de motivos do referido projeto de lei, ‘a violência tem aumentado consideravelmente, de maneira que a manutenção do dispositivo, na forma em que vigente, beneficiará autores de crimes brutais, como assassinos e estupradores, como freqüentemente têm noticiado os meios de comunicação".

Concluindo: se os operadores do Direito quiserem ver um avanço de sua jurisdição constitucional para a proteção dos direitos fundamentais da coletividade, não devem olhar a utilização de sentenças aditivas com a velha mentalidade de que o Poder Judiciário só pode atuar como o legislador negativo.


8. Conclusões articuladas

1. A vedação à prisão de eleitores durante os períodos imediatamente antecedentes e posteriores à realização do pleito (salvo exceções legais) existe no Brasil desde a edição do Código Eleitoral de 1932;

2. Essa vedação tinha como objetivos, basicamente: a) garantir o comparecimento máximo às urnas, já que em muitas eleições há vitórias de candidatos por escassa margem de votos ou até por critérios de desempate; b) evitar que a prisão de candidatos, eleitores, Delegados de partidos e fiscais de partidos e coligações pudesse concorrer para a ocorrência de fraudes na apuração pela falta ou deficiência de fiscalização; c) impedir que prisões imotivadas ou arbitrárias pudessem influenciar de forma indevida o eleitorado, modificando o que seria o resultado normal da eleição caso a prisão indevida não ocorresse; d) evitar o uso de força policial para intimidar o eleitor; e) evitar o acirramento de ânimos entre partidários de agremiação políticas concorrentes.

3. Na leitura tradicional que se faz do artigo 236 do Código Eleitoral, tem cabimento, nos cinco dias que antecedem às eleições até 48 horas do encerramento da votação, além das exceções previstas expressamente nesse artigo, a prisão provisória de analfabetos não alistados; de pessoas não alistadas eleitoralmente, embora maiores de 18 anos; conscritos durante o período de conscrição; de pessoas que perderam ou tiveram suspensos os seus direitos políticos.

4. Ainda na leitura tradicional que se faz do art. 236 do CE, incabível a prisão provisória de eleitores (prisão preventiva, temporária, sentença de pronúncia) no período eleitoral. Nesse período, também não é possível a prisão de depositário infiel ou do devedor de alimentos.

5. A patente insuficiência protetiva do artigo 236 do Código Eleitoral tem levado os doutrinadores a considerá-lo revogado ou ou então a flexibilizar sua aplicação, com afirmações de que a vedação à prisão referida é inconstitucional; que só diz respeito aos crimes eleitorais propriamente ditos ou que a prisão por ordem judicial não é vedada pelo artigo em comento.

6. Há, ainda, interpretação no sentido de que a prisão provisória do eleitor pode ser feita dentro do período do art. 236 do CE, desde que decretada anteriormente a esse período.

7. A garantia posta no art. 236 do CE não é inconstitucional se flexibilizada para permitir-se a prisão provisória de autores de crimes dolosos contra a vida, crimes hediondos e roubo, bem como autorizar a prisão de candidatos que tiverem contra si sentença condenatória transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos.

8. Não há qualquer razão lógica ou jurídica para vedar-se a prisão de candidato no prazo do art. 236, § 1º, do Código Eleitoral em razão de sentença condenatória com trânsito em julgado, pois nesse caso o candidato estará com seus direitos políticos cassados (CF/88, art. 15, inciso III), portanto inelegível.

9. A maneira de estender-se a possibilidade de prisão provisória aos autores dos crimes dolosos contra a vida, crimes hediondos e roubo é com a utilização das denominadas decisões ou sentenças aditivas.

10. As sentenças ou decisões aditivas são decisões judiciais que, em questionamento sobre a constitucionalidade de ato normativo, acolhem a impugnação, sem invalidá-lo. Em vez de operar-se a expulsão da norma do ordenamento jurídico, ela fica mantida com o acréscimo ao seu conteúdo de uma regulação que faltava para efetivar sua concordância com a Constituição.

10. As sentenças aditivas não representam uma invasão do juiz no campo de atuação do legislador. O juiz apenas ‘revela’ uma norma que já existia no sistema.


09. Referências

BASTOS, Celso Ribeiro. As modernas formas de interpretação constitucional. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 27, dez. 1998. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/89>. Acesso em: 05 jan. 2007.

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Notas

01 O PAPEL DA JUSTIÇA ELEITORAL NA CONSOLIDAÇÃO DA DEMOCRACIA: ELEIÇÕES DE 1994-96, autores JÂNIO PEREIRA DA CUNHA E JOSÉ VALENTE NETO Disponível em http://72.14.209.104/search?q=cache:vtbhfHjAaXIJ:www.pgm.fortaleza.ce.gov.br/revistaPGM/vol09/11PapelJusticaEleitoral.htm+justi%C3%A7a+eleitoral+32+degola&hl=pt-BR&gl=br&ct=clnk&cd=24&lr=lang_pt, acesso em 05.01.2007.

02 Até a Revolução de 30, o eleitor recebia o envelope lacrado e com a cédula já previamente marcada. Só ele não sabia em quem havia "votado".

03 O alistamento eleitoral e o voto são facultativos para os maiores de 16 e menores de 18 anos, nos termos do art. 14, I, ‘c’, da CF/88. No entanto, eles não estão sujeitos à prisão por serem inimputáveis; sua situação é regrada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.

04 O artigo 14, § 1º, inciso I, da CF/88 prevê o alistamento obrigatório para os maiores de 18 anos.

05 Os policiais militares, em qualquer nível de carreira são alistáveis, tendo em vista a inexistência de vedação legal. (Res. nº 15.099, de 09.03.89, rel. Min. Villas Boas).

06 Na verdade, segundo o Regulamento da Lei do Serviço Militar (Artigo 3º, 5º, Decreto n.º 57.654, de 20 de janeiro de 1966), conscritos são definidos como os brasileiros que compõem a classe chamada para a seleção, tendo em vista a prestação do Serviço Militar inicial.

07 Res. nº 15.850, de 3.11.89, rel. Min. Roberto Rosas.

08 Ensina José Afonso da Silva que ‘...pela simples escusa de consciência não se perdem os direitos políticos, mas apenas se o escusante também recusar a cumprir a prestação alternativa (1993, p. 336).

09 Registre-se aqui, no entanto, entendimento minoritário no sentido de que não há suspensão dos direitos políticos nas sentenças condenatórias transitadas em julgado pela prática de contravenções penais: " (...) condenação criminal não tem o mesmo significado que ‘condenação penal’. (...) Crime é uma infração penal e contravenção penal é uma infração penal. A condenação penal abrange a ambos. A condenação criminal, todavia, só se refere ao primeiro. Destarte, o condenado por contravenção penal não está sujeito à suspensão dos direitos políticos’ (TRESP – Representação, Processo 10.028, Classe 7ª, Acórdão n.º 126.963, Relator Juiz Souza José, j. 10.10.1996).

10 "Em face do disposto no artigo 15, III, da Constituição Federal, a suspensão dos direitos políticos se dá ainda quando, com referência ao condenado com sentença criminal transitada em julgado, esteja em curso o período da suspensão condicional da pena" (STF – Pleno – Rextr 179/502-SP).

11 Recurso n.º 9.760/PI – Acórdão 12.877 – Relator Ministro Eduardo Alckmin, j. 29-09-1992.

12 "Art. 302 – Considera-se em flagrante delito quem:

I – está cometendo a infração penal;

II – acaba de cometê-la;

III – é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido, ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração;

IV – é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele o autor da infração;

13 Os Delegados de partidos devem ser equiparados aos membros da mesa receptora e fiscais de partidos e coligações no que pertine às restrições à prisão no período eleitoral, por analogia in bonam partem, conforme ensinam Pedro Roberto Decomain e Péricles Prade (2004, p. 300).

14 O inciso LXI do artigo 5º da CF/88 possui a seguinte redação: ‘ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei’.

15 Art. 298. Prender ou deter eleitor, membro de Mesa Receptora, Fiscal, Delegado de partido ou candidato, com violação ao disposto no art. 236: Pena – reclusão até quatro anos.

16 Projeto de lei apensado ao projeto de lei 3.735/200, de autoria do Deputado Dr. Hélio (PDT-SP), que visa acrescer, às ressalvas contra a prisão ou detenção de qualquer eleitor, no período compreendido entre os cinco dias anteriores e as quarenta e oito horas após o encerramento do pleito eleitoral, a hipótese de cumprimento de mandado de prisão expedido por autoridade judiciária competente, nos casos tipificados como crimes hediondos, assim definidos pela Lei n.º 8.072, de 25 de julho de 1990.

17 ‘A prisão de eleitores nas vésperas da eleição’, publicado no Boletim IBCCRIM n.º 20 – setembro de 1994.

18 Art. 1º O § 1º do art. 236 da Lei n.º 4.737, de 15 de julho de 1965 – Código Eleitoral, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 236....................................

§ 1º Os membros das Mesas Receptoras e os Fiscais de Partido, durante o exercício de suas funções, não poderão ser detidos ou presos, salvo o caso de flagrante delito; da mesma garantia gozarão os candidatos, desde quinze dias antes das eleições, salvo o caso de flagrante delito, sentença transitada em julgado e prisão preventiva decretada antes do início do período estipulado neste artigo (NR)"

Art. 2º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

19 Nas eleições municipais de 2004, por exemplo, Darci Savegnago (PT) elegeu-se Prefeito de Taquarucu do Sul/RS, com 999 votos, enquanto seu concorrente, Vanderlei Zanatta (PMDB), fez 996 votos.

20 Por exemplo, em Sarzedo (MG), Expedito João Bernardo (Pastor Expedito) e Marlene Ribeiro (Marlene do Sítio), ambos candidatos a Vereador pelo PDT, fizeram 151 votos, elegendo-se o primeiro por ser o mais idoso.

21 Para se ter uma boa visão do poder dos chefes locais em determinar o voto dos eleitores de alguma forma subordinados à sua ‘autoridade’, imperdível a leitura da obra ‘Coronelismo, enxada e voto’, de Victor Nunes Leal.

22 Correio Braziliense, 27 de outubro de 2002.

23 RHC 63.673-0-SP, DJU 20.06.1986, p. 10.929.

24 As modernas formas de interpretação constitucional. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 27, dez. 1998. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/89>. Acesso em: 05 jan. 2007.

25 Delito previsto no art. 331 do CP, cuja pena de detenção é de seis meses a um ano.

26 Citado em trecho do voto do Ministro do STF, Gilmar Mendes, no julgamento do MI 670-9/ES.

27 Direito Constitucional. Rio de Janeiro. Editora Freitas Bastos, 1956, p. 403, apud Edílson Pereira Nobre Júnior, op. cit., p. 117.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LEIRIA, Cláudio da Silva. Considerações sobre o art. 236 do Código Eleitoral. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1558, 7 out. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10498. Acesso em: 28 mar. 2024.