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A aplicabilidade da denunciação da lide nas ações de responsabilidade civil do Estado

A aplicabilidade da denunciação da lide nas ações de responsabilidade civil do Estado

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A denunciação da lide pode ser aplicada às ações de responsabilidade civil do Estado, quando um servidor causar um dano ao particular, e este ajuizar ação apenas contra o ente estatal?

Sumário: 01. Considerações iniciais. 02. A Responsabilidade objetiva do Estado pelos atos de seus agentes. 02.1. A Responsabilidade subjetiva do agente causador do dano. 02.2. A decisão administrativa como instrumento probatório. 03. A ação de regresso nos casos de responsabilidade estatal. 04. A aplicabilidade da denunciação da lide nas ações de Responsabilidade Civil do Estado. 04.1. Por atos cometidos no exercício da função jurisdicional. 04.2. Por atos cometidos no exercício da função administrativa. 04.3. Por atos cometidos por agentes vinculados a concessionárias e permissionárias. 04.4. Por atos cometidos por agentes políticos. 05. A denunciação da lide como método mais eficaz, célere e econômico de resolução do conflito. 06. Conclusão. 07. Referências.


1 Considerações iniciais.

Este trabalho tem como escopo analisar se a denunciação da lide pode ser aplicada às ações de responsabilidade civil do Estado, nos casos em que um servidor causar um dano ao particular, no exercício de função pública, e este último intentar ação indenizatória apenas contra o ente estatal.

Se é certo que se pode chegar a conclusões diametralmente opostas ao tratar de tal matéria, teremos sempre a convicção de que o presente artigo representa apenas uma modesta contribuição para um debate que, hodiernamente, está longe de ser encerrado.

De fato, após um breve estudo jurisprudencial, percebe-se que os Tribunais de Justiça brasileiros, bem como o próprio STJ, já têm deferido, em grande parte das ações de responsabilidade civil do Estado, a denunciação da lide requerida pela Administração Pública em face de seu agente, o que demonstra a desnecessidade de ajuizamento de ação de regresso autônoma.

Não fosse isso, vê-se que o art. 70, III, do CPC prevê como obrigatória a intervenção do terceiro que está obrigado, por lei ou por contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo daquele que perder o processo. E é justamente esse dispositivo que fundamenta este artigo, haja vista existir, de fato, uma vinculação de trabalho entre o agente público e o Estado.

Ademais, a denunciação da lide efetiva princípios processuais e constitucionais basilares, tais como a celeridade, a eficiência, a impessoalidade, a economicidade e a preservação do interesse público, já que, ao invés de se instaurarem duas demandas distintas (com a mesma finalidade), toda a discussão ocorrerá em apenas uma lide, produzindo uma única sentença. Desse modo, o responsável pelo prejuízo, adentrará, ab initio, no processo movido contra o Estado, efetivando o contraditório.

Percebe-se, assim, que há muito se discute acerca da possibilidade de aplicação da denunciação da lide nas ações de responsabilidade estatal, haja vista que a responsabilidade do Estado é objetiva, isto é, independe da averiguação da culpa ou do dolo (com exceção dos atos omissivos), enquanto que a responsabilidade do agente é subjetiva, sendo necessário, para que ele seja responsabilizado civilmente, a averiguação, in casu, dos referidos elementos.

Assim, diante do acirrado debate que circunda o tema, analisar-se-á se a aplicação da denunciação nas ações de responsabilidade estatal é a forma mais célere e econômica de resolução do conflito, vez que isenta o Estado do pagamento da indenização, tornando-o mero devedor subsidiário, para o caso do funcionário não possuir condições de indenizar o particular, além de tornar desnecessária a ação regressiva e fazer com que a vítima seja ressarcida diretamente, sem necessidade de precatório.

O que se busca com a denunciação da lide, pois, não é a declaração da irresponsabilidade estatal, até porque o Estado jamais poderá se escusar da obrigação de responder pelos danos causados por seus agentes, em atenção à culpa in eligendo (pela escolha dos funcionários), prevista no § 6º, do art. 37, da CF, mas sim garantir a efetividade do comando decisório, já que a sentença, por ser una, tornará desnecessária uma futura ação de regresso.

Pelo exposto, percebe-se que a morosidade e os altos gastos que permeiam os processos brasileiros em geral são desnecessários, já que o próprio ordenamento prevê institutos esclarecedores e de fácil aplicação, como a denunciação da lide, que foi criada com o escopo de acelerar e economizar as demandas, razão pela qual verifica-se que os agentes públicos faltosos podem (e devem) ser denunciados pelo Estado, o que resguardará o interesse coletivo e o patrimônio público.


2.A responsabilidade objetiva do Estado pelos atos de seus agentes.

A responsabilidade do Estado compreende três facetas distintas, porém interligadas, quais sejam: a responsabilidade administrativa, em que a culpa ou o dolo do agente público será averiguado via processo administrativo; a criminal, para os casos em que a falta tenha derivado de ato ilícito, típico, punível e culpável, gerando, por conseguinte, conseqüências no âmbito penal e a responsabilidade civil, que é objetiva e prescinde da averiguação do dolo ou da culpa.

No que pertine à responsabilidade administrativa, cumpre salientar que a decisão oriunda de processo disciplinar poderá ser utilizada como instrumento probatório na demanda indenizatória, corroborando o pedido de denunciação do agente à lide, já que tal título configura prova cabal da culpa do aludido funcionário, tornando desnecessária uma ampla instrução derredor da responsabilidade do mesmo, sob pena do processo se tornar repetitivo e, portanto, protelatório.

Com relação à responsabilidade penal, necessário ressaltar que a mesma é autônoma e independe de ação civil (art. 935 do Código Civil). Assim, caso seja verificado que o servidor cometeu um crime funcional, de responsabilidade, com abuso de poder ou, ainda, ato de improbidade administrativa, deverá responder a processo criminal, mesmo que não tenha sido ajuizada ação cível. Desse modo, se o agente for absolvido penalmente, entende-se que, por serem as instâncias autônomas, nada impedirá que o mesmo continue respondendo a processo administrativo, exceto se restar provada a inexistência do fato ou da autoria, nos termos do art. 126 da Lei nº 8.112/90.

Quanto à responsabilidade civil, vê-se que esta corresponde a uma obrigação de dar, fazer, não fazer ou, ainda, de reparar prejuízos causados, resumindo-se no dever contraído pelo agente faltoso de assumir publicamente o dano decorrente de seus atos diretos ou de atos cometidos por aqueles que lhe eram tutelados, a exemplo do Estado em relação aos seus agentes. Conceitualmente, tem-se que a responsabilidade civil do Estado é: "A obrigação que se lhe atribui, não decorrente de contrato nem de lei específica, para recompor os danos causados a terceiros em razão de comportamento comissivo ou omissivo, legítimo ou ilegítimo que lhe seja imputável." (GASPARINI, 2006, p.825).

Pois bem, nos primórdios do Direito das Obrigações, já se defendeu a irresponsabilidade absoluta do Estado, em razão da soberania, uma vez que o ente estatal representava uma autoridade incontestável perante seus súditos (The King can do no wrong), pelo que seus agentes respondiam, individualmente, pelos danos causados. Isto porque, imaginava-se que o Estado era a personificação do povo, não podendo ser demandado juridicamente, além do que, por não ser uma pessoa viva, o ente era incapaz de praticar atos ou condutas culposas. Pensava-se, também, que os danos causados pelo Estado não passariam de "um ônus de viver em coletividade". (BAHIA, 1995, p.15).

Por outro lado, vê-se que a responsabilidade civil se originou do latim respondere, cuja idéia central é a recomposição ou ressarcimento, enquanto que seus pilares jurídicos se sustentam nas teses Romanísticas, com base no princípio neminem laedere (não lesar a ninguém), cuja principal finalidade é fazer com que o agente faltoso repare o prejuízo pessoalmente, através da indenização por perdas e danos. Tal recomposição foi admitida pelas civilizações mais democráticas, entendendo-se que, caso a vítima não tivesse conhecimento da pessoa que lhe havia causado o dano, poderia demandar diretamente em desfavor da Administração Pública, não importando quem efetivamente havia sido o responsável. Com isto, iniciou-se a fase de verificação da culpa in eligendo do Estado, vez que o mesmo passou a responder pela "má escolha" dos seus funcionários. Para tanto, dividiu-se as atividades exercidas pelo Poder Público em atos de império, praticados em razão dos privilégios da Administração e impostos coercitivamente ao particular, sem a obrigação de indenizar, e atos de gestão, que se assemelham aos atos particulares e têm a finalidade de proteger o patrimônio público, gerando o dever de ressarcir, desde que provada a culpa do Estado.

Assim, observa-se que, anteriormente, a responsabilidade estatal era subjetiva, pois se baseava na culpa, o que, na prática, era muito difícil de ser provado pelo particular, pelo que, em regra, a Administração Pública escapava da obrigação de reparar. No entanto, o entendimento doutrinário evoluiu, alcançando a teoria da responsabilidade objetiva, em que basta a comprovação do dano e do nexo causal, sem necessidade de analisar se o Estado atuou culposamente. (BAHIA, 1995).

No Brasil, vê-se que, desde a primeira Constituição, em 1824, o tema vem, paulatinamente, sendo discutido, senão vejamos o art. 179, item 29, do citado regramento: "Os empregados públicos são estritamente responsáveis pelos abusos e omissões praticados no exercício de suas funções, e por não fazerem efetivamente responsáveis aos seus subalternos". Todas as outras Constituições previram entendimentos semelhantes, ora responsabilizando integralmente o funcionário (período da irresponsabilidade estatal – Cartas de 1824 e 1891), ora responsabilizando solidariamente o agente e o Estado (Constituições de 1934 e 1937), ora responsabilizando subsidiariamente a Administração Pública, cabendo ação de regresso contra o agente (a partir da Carta de 1946).

O tema foi evoluindo, até que, em 1988, a nossa Constituição Federal instituiu que:

Artigo 37.

[...]

§ 6º: As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que os seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de culpa ou dolo.

Nos casos, portanto, que o ente estatal figurar no pólo passivo da lide, a sua responsabilidade será objetiva, não sendo necessário analisar o dolo ou a culpa, bastando que a vítima quantifique o dano e demonstre o liame causal entre a falta e o prejuízo. Caso o agente público seja denunciado à lide, porém, deverá o Estado provar que foi ele quem cometeu a falta (o que, em regra, já foi averiguado no processo administrativo), eximindo-se, desde que quitada a dívida, do dever de indenizar.

Desse modo, verifica-se que a real finalidade da responsabilização estatal, além de permitir a igualdade entre as partes, é atingir o bem estar comum, devendo a Administração indenizar os prejuízos que ocasionar de forma célere, eficaz, econômica e eficiente (GIGENA, 1987).

Saliente-se, ainda, que a natureza da responsabilidade civil estatal é extracontratual, já que a vítima pode pautar suas alegações em vários fatos, desde que condizentes com uma violação às normas de Responsabilidade, tais como: imperícia, negligência, imprudência, abuso de direito ou de poder, falta de vigilância, eficiência, fiscalização ou segurança, morosidade na prestação dos serviços ou o simples dolus malus intencional. Assim, diante da responsabilidade objetiva do Estado, vê-se que a vítima precisa, apenas, demonstrar a culpa presumida, baseada no suposto risco causado pelo agente, constituindo-se em um dever-poder da Administração observar a extensão do dano e o liame causal entre o prejuízo e a falta, como explica Caio Mário Pereira (2005, v.I, p.295), senão vejamos:

O princípio da igualdade dos ônus e dos encargos exige a reparação. Não deve um cidadão sofrer as conseqüências do dano. Se o funcionamento de serviço público, independentemente da verificação de sua qualidade, teve como conseqüência causar dano ao indivíduo, a forma democrática de distribuir por todos a respectiva conseqüência conduz à imposição à pessoa jurídica do dever de reparar o prejuízo e, pois, em face de um dano, é necessário e suficiente que se demonstre o nexo de causalidade entre o ato administrativo e o prejuízo causado.

Quando houver, portanto, uma ligação direta e imediata entre o dano e a conduta do agente, deve o administrado ajuizar demanda em face do Estado ou diretamente contra o funcionário, salientando-se que, no primeiro caso, entende o STF, que a Administração deverá cobrar regressivamente do servidor, após indenizar a vítima, enquanto que o STJ admite que o agente seja denunciado à lide.

Desse modo, vê-se que a intenção do legislador, ao instituir a responsabilidade objetiva, foi potencializar a obrigação de indenizar e conferir à parte mais fraca da relação o direito à inversão do ônus da prova, não havendo necessidade que o particular prove a culpa do agente público/Estado, mas, tão somente, que quantifique o dano e demonstre o nexo de causalidade.

Conclui-se, assim, que a responsabilidade objetiva só será aplicada quando houver previsão legal e em caso de conduta comissiva, já que na omissão a responsabilidade permanecerá subjetiva, como é regra, em atenção à culpa in vigilando. Como há, de fato, norma específica tratando da responsabilização objetiva do Estado (art. 37, § 6º, da CF/88), em razão da culpa in eligendo da Administração, não há como ser aplicada a responsabilidade subjetiva ao Estado, já que esta é específica do servidor, devendo ser analisada via processo administrativo.

Pelo exposto, observa-se que o Estado possui a responsabilidade ética de reparar os danos porventura causados por seus agentes, como bem pontua o autor Egon Moreira (2003, p.135):

O respeito a um Estado Democrático de Direito impõe à Administração a adoção de comportamento ativo e respeitoso aos cidadãos. Reparar os males causados aos detentores do poder público (o povo) configura um mínimo de conduta ética e legal por parte de seus representantes, ou daqueles por si contratados.

Mas, como será analisada a culpabilidade do agente público?

2.1.A responsabilidade subjetiva do agente causador do dano.

Inicialmente, cumpre salientar que, para Hely Lopes Meirelles (2005, p.589), agentes públicos são "todas as pessoas físicas incumbidas da realização de algum serviço público, em caráter permanente ou transitório. [...] O essencial é que o agente da Administração haja praticado o ato ou a omissão administrativa no exercício de suas atribuições ou a pretexto de exercê-las."

Nesta mesma linha de intelecção se situa Celso Antônio Bandeira de Mello (2006, p.226), que esclarece que a expressão agente público "é a mais ampla que se pode conceber para designar genérica e indistintamente os sujeitos que servem ao Poder Público como instrumentos expressivos de sua vontade ou ação, ainda quando o façam apenas ocasional ou episodicamente".

Por fim, afirma Miriam Giusti (2004, p.41) que os agentes públicos são "Pessoas físicas ou jurídicas que prestam serviços à Administração Pública ou realizam atividades sob sua responsabilidade, exprimindo a vontade estatal em razão da autoridade que lhes foi conferida pelo próprio Estado".

Assim, observa-se que a qualidade de "agente" só gerará a responsabilidade estatal caso o mesmo, ainda que movido por sentimentos e emoções, pratique ato ligado ao exercício de suas funções públicas, já que, só assim, o Estado absorverá a falta, averiguando-a via processo administrativo, e se responsabilizará pelo ressarcimento da vítima, sem necessidade de comprovação da culpa.

Saliente-se, por outro lado, que só a responsabilidade do Estado é objetiva, devendo a conduta do funcionário ser averiguada para que o dano se torne indenizável. Ocorre que esta averiguação é, em regra, realizada internamente, antes mesmo do particular instaurar ação indenizatória, através de processo administrativo, sendo que a decisão que comprova a culpa ou o dolo do agente público, poderá ser apresentada como instrumento probatório na demanda cível, tão logo seja requerida a denunciação da lide, vez que a mesma reconhece a falta perpetrada pelo funcionário.

Pelo exposto, verifica-se, de logo, que a denunciação é o melhor remédio nas hipóteses de responsabilização estatal, em razão da celeridade e da economia processual, já que, ao invés de se instaurarem duas demandas distintas - a principal, movida pela vítima contra o Estado, e a ação de regresso, ajuizada pelo Poder Público contra o agente causador do dano -, tudo será resolvido simultaneamente, resguardando-se o direito do agente de perseguir e comprovar o grau de culpa com que concorreu para a prática do ato (ampla defesa e contraditório), salientando-se, mais uma vez, que tal conduta, em regra, é perquirida através de processo administrativo, restando ao Poder Judiciário o controle de legalidade do procedimento disciplinar que deu origem à decisão.

De mais a mais, todo agente público possui os deveres de lealdade, fidelidade, dedicação ao serviço, respeito às leis, obediência à fiel execução da atividade, moralidade, boa-fé e ética. Assim, caso sua falta derive do desrespeito a alguma dessas obrigações, o mesmo deverá ser punido administrativamente, por meio de advertência, suspensão ou exoneração, e civilmente, reparando o dano que causou a terceiro ou, ao menos, ressarcindo o Poder Público.

Cumpre salientar, também, que o ônus probatório, seja quando a denunciação for aplicada, seja na hipótese de ajuizamento de ação regressiva autônoma, pertence ao Estado, já que é este que terá que demonstrar qual de seus agentes causou o dano e, portanto, possui o dever de indenizar.

Observa-se, assim, que a denunciação da lide é a forma mais eficaz de isentar o ente estatal da demanda (ou, ao menos, de torná-lo devedor subsidiário) e, conseqüentemente, resguardar o patrimônio público, vez que tal intervenção traz ao processo principal o efetivo causador do dano, para que ele arque com os prejuízos que causou, de acordo com suas condições financeiras.

Desse modo, é irrelevante a argumentação do STF, que entende ser inaplicável a denunciação nas ações de responsabilidade do Estado, sob a alegação de que a culpa do agente não pode ser discutida na mesma demanda em que se analisa a responsabilidade objetiva da Administração, uma vez que tal discussão, de fato, já foi dirimida no processo administrativo, devendo a decisão daí oriunda ser apresentada como meio de prova, corroborando o pedido de intervenção na lide.

2.2 A decisão administrativa como instrumento probatório.

Pois bem, após breve explanação acerca da responsabilidade do agente público, há de se demonstrar como se desenrola o processo de apuração de falta perpetrada pelo mesmo e conseqüente punição.

Inicialmente, deve-se ressaltar que a sindicância é um procedimento mais célere e informal que o processo administrativo, podendo até anteceder esta demanda. Tal instituto visa "elucidar uma irregularidade no serviço público e, se for comprovado o ilícito e houver indícios convincentes de autoria, instrumento preparatório do processo administrativo disciplinar." (COSTA, 2003, p.217). Este procedimento prescinde de defesa formal, já que trabalha com o conceito da "probabilidade", além de ser preliminar, pois, em geral, antecede o processo disciplinar, prestando-se à averiguação do lastro probatório da infração. Ocorre que a sindicância tem sido realizada por pessoas que não guardam conhecimento da matéria apurada, o que acaba por atrasar e obscurecer a resolução da mesma, culminando na ineficácia e na nulidade do instituto (GONZALEZ; OCTAVIANO, 2002).

Assim, verifica-se que o processo disciplinar é o meio mais eficaz para se apurar a culpa do agente faltoso, sendo que a decisão oriunda desse procedimento, apesar de não guardar vinculação com a sentença que será proferida no processo indenizatório, vai, por certo, influenciar o convencimento do juiz, corroborando o pedido de denunciação da lide, haja vista já ter sido comprovada a culpa do servidor, tornando desnecessária, pois, uma longa instrução probatória e a própria ação de regresso.

O processo disciplinar é o procedimento que mais se assemelha ao processo judicial, seja pelo rito e pelas formalidades (audiência, defesa etc), seja porque dará brecha à intervenção do funcionário na ação de responsabilidade estatal. Tal processo está conceituado no art. 148 da Lei nº 8.112/90, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores federais, in verbis: "O processo disciplinar é o instrumento destinado a apurar responsabilidade do servidor por infração praticada no exercício de suas atribuições ou que tenha relação com as atribuições do cargo em que se encontre investido."

Verifica-se, portanto, que a finalidade do processo disciplinar é democrática, já que limita a conduta dos servidores, penalizando aqueles que causarem prejuízos para a própria Administração ou para os particulares, como explica Egon B. Moreira (2003, p.63):

A existência e a celebração do processo administrativo fazem parte da busca por um Estado Democrático de Direito. É atividade pela qual o particular contribui com a formação da "vontade" estatal, de forma direta e imediata. Como decidiu o Tribunal Regional Federal da 5ª Região: "A homenagem ao devido processo legal é um comportamento da Administração pública que se insere no cultivo à democracia e respeito ao direito do cidadão."

A sanção do funcionário deverá ser fixada de acordo com o grau, a qualidade e a intensidade da falta, sempre em respeito aos princípios previstos no art. 5º e incisos da CF e na Lei nº 9.784/99, que trata da procedimentalidade do processo administrativo, a exemplo do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório, da legalidade, da proporcionalidade e da moralidade.

Por fim, cumpre ressaltar que, caso a culpa do servidor seja reconhecida no processo disciplinar, o mesmo poderá ser demandado civilmente pelo particular ou denunciado à lide pelo Estado, uma vez que a decisão administrativa servirá como meio de prova na ação indenizatória. De fato, se já foi comprovada a participação do agente no ato danoso, poderá o mesmo integrar à ação de responsabilidade do Estado, não havendo necessidade deste último indenizar a vítima e só depois de longos anos receber o ressarcimento, via ação regressiva, até porque o funcionário pode não possuir mais condições de quitar a dívida, tendo, inclusive, fraudado a execução.

Para que se ratifiquem as razões supra demonstradas, há de se analisar a disposição do art. 37, § 6º, da CF, que prevê a possibilidade do Estado ser ressarcido pelo agente público via ação de regresso.


3.A ação de regresso nos casos de responsabilidade estatal.

De início, cumpre observar que a nossa Constituição inovou, já que a responsabilidade das Pessoas de Direito Público foi estendida às Pessoas de Direito Privado que prestam serviços públicos. Ademais, substituiu-se o conceito de funcionários por uma expressão mais abrangente: agentes.

Ressalte-se, ainda, que a responsabilidade objetiva tem como principal fundamento o ressarcimento dos danos causados por agentes do Estado sem perquirição da intenção do funcionário. Assim, o ilícito, o prejuízo ou o abuso no exercício das funções, por parte do servidor, não exclui a responsabilidade da Administração Pública, já que esta assume socialmente os riscos pela execução dos serviços, bem como pela escolha dos agentes que irão exercê-los (culpa in eligendo), respondendo civilmente pelos prejuízos causados aos particulares de boa-fé.

Desse modo, vê-se que, nos casos de responsabilidade civil do Estado pelos danos causados por seus agentes, aquele que paga a indenização (responsável indireto) possui um direito regressivo contra o efetivo causador do prejuízo. Tal direito se traduz pela expressão "ação in rem verso", isto é, ação de regresso, que deverá ser proposta logo após o trânsito em julgado da ação principal.

Cretella Júnior (1999, p.340) conceitua o direito de regresso como sendo "O poder-dever que tem o Estado de exigir do funcionário público, causador de dano ao particular, a repetição da quantia que a Fazenda Pública teve de adiantar à vítima de ação ou omissão, decorrente do mau funcionamento do serviço público, por dolo ou culpa do agente".

A ação regressiva é, pois, uma medida judicial ordinária, que deve ser ajuizada após o término da ação que condenar o Estado a indenizar o particular, como explica Rui Stoco (2003, p.554):

O direito de regresso é também admitido quando a pessoa jurídica de direito público é condenada a ressarcir o dano causado por seu preposto (Cf/88, art. 37, parágrafo 6º). Mas a norma constitucional não estabelece a solidariedade entre o Estado e o servidor, nem determina o litisconsórcio passivo deste último na ação intentada contra a pessoa jurídica de direito público pelo particular lesado por ato do funcionário.A ação deve ser proposta contra a União, os Estados e Municípios, ou contra as entidades da administração indireta. Finalmente cabe observar que a ação regressiva se exerce mediante a prova do pagamento da condenação passada em julgado.

Desse modo, inferi-se que a cobrança regressiva é lenta e custosa, já que há de se esperar o trânsito em julgado da ação principal para que o Estado cobre do agente faltoso o ressarcimento devido, instaurando uma nova ação, devendo, ainda, perquirir a responsabilidade deste último, o que, na prática, é desnecessário, haja vista que esta já foi averiguada em sede de processo administrativo.

Por outro lado, caso o funcionário seja denunciado à lide, percebe-se que todo o procedimento se tornará mais célere, uma vez que ele adentrará no processo principal e será abarcado pela sentença, não havendo mais necessidade de instauração de nova demanda.

Este último entendimento, entretanto, encontra como opositores os juristas mais conservadores, tal como Hely Lopes Meirelles (2005, p.444), que afirma que:

A ação de indenização da vítima deve ser ajuizada unicamente contra a entidade pública responsável, não sendo admissível a inclusão do servidor na demanda. O lesado por ato da Administração nada tem a ver com o funcionário causador do dano, visto que o seu direito, constitucionalmente reconhecido (art. 37), é o de ser reparado pela pessoa jurídica, e não pelo agente direto da lesão. Por outro lado, o servidor culpado não está na obrigação de reparar o dano à vítima, visto que só responde pelo seu ato ou por sua omissão perante a Administração a que serve, e só em ação regressiva poderá ser responsabilizado civilmente.

Existem, porém, alguns doutrinadores que entendem que a vítima pode optar entre mover a demanda contra o Estado (cabendo o regresso), diretamente contra o servidor ou, ainda, contra ambos conjuntamente, através da denunciação, senão observemos algumas opiniões a esse respeito:

A ação de indenização proposta pela vítima pode ter como sujeito passivo o próprio agente público ou mesmo o Estado. Por outro lado, isso pode fazer o particular, se fundada a ação em culpa ou dolo do agente público e Estado, propondo a ação contra ambos, agente público e Estado, como responsáveis solidários, ou mesmo só contra o agente público (MELO, 1979, p.221, v.II).

À vítima cabe optar entre propor a ação contra o agente ou contra o Estado, que, acionando o agente, deve provar a culpa e assumir o risco da insolvência deste, e que, agindo contra o Estado, não precisa provar a existência de culpa, tendo a solvência garantida (DALLARI, 1990, p.87).

Nessa mesma linha de intelecção, vêm se estabelecendo o entendimento do Colendo Supremo Tribunal Federal, consoante se infere dos arestos abaixo colacionados:

A responsabilidade objetiva do Estado pelos prejuízos causados por seus agentes não afasta o direito que tem o prejudicado ou o Estado de postular a necessária reparação diretamente do funcionário que causou o dano (STF – 1ª T. – RE – Rel. Antonio Neder – RT 538/275).

O fato de a Constituição Federal prever direito regressivo às pessoas jurídicas de Direito Público contra o funcionário responsável pelo dano não impede que este último seja acionado conjuntamente com aquelas, vez que a hipótese configura típico litisconsórcio facultativo. Precedente: RE 90071 (STF – 1ª T. AI – Rel. Rafael Mayer – j. 26/11/85, RT 604/253).

Observa-se, assim, que a maioria dos doutrinadores aduz para a possibilidade do Estado, em sendo demandado, mover, posteriormente, ação regressiva contra o agente faltoso, com o fito de ter ressarcida a indenização paga. Tal entendimento, porém, não nos parece o mais adequado, tendo em vista a possibilidade de aplicação da denunciação da lide, trazendo, de logo, à demanda, o real causador do prejuízo, para que este possa, desde o início, se defender, bem como, se possível, arcar com as despesas processuais e quitar o débito, tornando desnecessária a ação de regresso e fazendo com que a vítima receba seu crédito diretamente do servidor, sem precatório.

O Poder Público não pode, portanto, isentar seus agentes da responsabilidade civil, já que não possui disponibilidade sobre o patrimônio público, devendo, apenas, adotar as providências cabíveis para reparar os prejuízos por eles causados, averiguando as faltas cometidas pelos mesmos.

Do mesmo modo que a demanda indenizatória, a ação regressiva transmite-se aos sucessores e herdeiros do agente público, nos termos do art. 122, § 3º, da Lei nº 8.112/90, podendo, ser ajuizada mesmo após a exoneração, a aposentadoria ou a morte do servidor, o que ocorre usualmente, já que tal demanda só pode ser proposta após o trânsito em julgado da ação principal.

Observado que o Estado pode cobrar regressivamente o ressarcimento do agente público, passar-se-á a demonstrar, na prática, a desnecessidade da ação regressiva diante da possibilidade de aplicação da denunciação da lide, com fulcro na celeridade, na eficiência, na economicidade e na supremacia do interesse público, vez que o Estado deve priorizar os interesses da coletividade, não podendo dilapidar o patrimônio público pagando toda e qualquer indenização, por vezes decorrentes de atos ilícitos e dolosos causados por seus servidores.

Assim, caso o funcionário seja incorporado ao processo principal, não haverá necessidade de ajuizamento de nova ação, o que, certamente, ajudará a diminuir os gastos do Judiciário e o tempo de duração da lide, dando eficiência ao iter jurisdicional e à resolução do conflito, senão vejamos:


4.A aplicabilidade da denunciação da lide nas ações de responsabilidade civil do Estado.

A denunciação da lide é uma espécie de intervenção de terceiros forçada ou obrigatória, que imprescinde da existência de um direito regressivo, como já visto. No caso em foco, vê-se que o Estado possui, de fato, um direito de regresso em relação ao agente que causou o dano, uma vez que litiga em virtude de ato perpetrado por este último, com o qual mantém uma vinculação de trabalho.

Conceitualmente, costuma-se afirmar que: "Denunciação da lide é o ato pelo qual o autor ou o réu chamam a juízo terceira pessoa, que seja garante do seu direito, a fim de resguardá-lo no caso de ser vencido na demanda em que se encontram. (SANTOS, 2004, p.27)". E mais:

Denunciar a lide à alguém não é senão trazer esse alguém para a lide, por força de garantia prestada, ou em razão de direito regressivo existente em face desse terceiro; aproveita o denunciante do mesmo processo para exercer a ação de garantia ou a ação de regresso em face do denunciado; visa, pois, a dois objetivos: vincular o terceiro ao quanto decidido na causa e a condenação do denunciado à indenização. (DIDIER JÚNIOR, 2006, p.101).

O Processo Civil muito utiliza a denunciação da lide, já que tal figura presta-se a chamar alguém (estranho à relação) a responder aos termos do processo, do qual, originariamente, não fazia parte e cujos efeitos podem atingi-lo. O denunciado é convocado para defender os seus interesses contra uma futura ação regressiva ou direito de garantia que o denunciante pretende contra ele, uma vez que a sentença faz coisa julgada e tal não pode acontecer sem o contraditório e a ampla defesa.

Com a denunciação, portanto, o terceiro citado é obrigado a integrar o pólo passivo da demanda, desde que antes seja verificada a sua legitimidade. Tal convocação deve ocorrer até o saneamento, inexistindo chamamento em fase recursal. Com a intervenção, instauram-se duas relações no mesmo processo: a do autor (no caso, o particular) e do réu (Estado) da ação principal e a do denunciante (Estado) e do denunciado (agente público) da ação de denunciação da lide. Ressalte-se, que o resultado da ação principal prejudica a ação de denunciação, pois se o denunciante vencer a demanda, a ação regressiva restará improcedente, já que não existiu pagamento de indenização.

De mais a mais, o art. 70 do CPC prevê as hipóteses de cabimento do referido instituto. Os incisos I e II não geram maiores problemas, já que abrangem o alienante na evicção e o proprietário ou possuidor indireto por força de obrigação ou direito, não sendo, pois, aplicáveis ao caso em tela. O alvo de debates, entretanto, se situa no inciso III, que prevê que:

A denunciação da lide é obrigatória:

[...]

III – àquele que estiver obrigado, pela lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo do que perder a demanda.

Como se observa, a norma fala em "contrato", porém não exemplifica quais os contratos que são abrangidos pelo referido artigo. Desse modo, alguns juristas têm entendido que o inciso é genérico e, portanto, ineficaz. É o que explica Sidney Sanches (1984, p.120), quando diz que:

A hipótese prevista no inciso III do art. 70 não é senão uma norma de encerramento: nos incisos I e II o legislador prevê a denunciação da lide em situações de garantia específicas; no inciso III, generaliza, afirmando que cabe a denunciação em outras hipóteses em que houver garantia. Não cabe a denunciação, fundada neste inciso III, em qualquer, absolutamente qualquer situação, sob pena de inviabilizar-se o julgamento da demanda. A interpretação há de ser restrita.

Outros doutrinadores, tal como Cândido Rangel Dinamarco (2004, p.402), costumam afirmar que: "Daí a implantação da hipótese descrita no inc. III do art. 70, de redação intencionalmente ampla e destinada a ter vasta abrangência, para maior efetividade do instituto e da tutela jurisdicional que mediante ele se possa obter".

Ora, nos casos de responsabilidade do Estado, percebe-se que todos os requisitos inerentes à denunciação estão presentes, senão vejamos: a) verificação da culpa do agente público no processo administrativo, vez que a decisão daí oriunda será utilizada como instrumento de prova no processo judicial; b) existência de obrigação contratual, pois o servidor possui uma relação de "trabalho" com o Poder Público; c) direito de regresso do Estado, na proporção das condições financeiras do agente, permanecendo o primeiro como responsável subsidiário, diante da sua culpa in eligendo; d) possibilidade da sentença principal abarcar e condenar o agente litisdenunciado; e) controle de legalidade da decisão administrativa realizado pelo Juiz ao analisar o pedido de denunciação.

Desse modo, não há qualquer impedimento procedimental que torne inaplicável a denunciação da lide nos processos em debate, o que corrobora o entendimento de que é totalmente desnecessário o ajuizamento de ação regressiva autônoma, consoante já salientado.

Assim, o Estado, ao ser processado, deverá requerer a citação do real causador do dano, demonstrando, em Juízo, que a conduta deste último já foi averiguada via processo administrativo ou, ao menos, que possui provas da autoria do dano. Após o chamamento, o denunciado poderá: não comparecer e ser revel; comparecer, aceitar a denunciação e se defender, tornando-se litisconsorte do Estado; comparecer e concordar com as alegações da vítima; comparecer e negar a condição de denunciado, também efetivando o contraditório. De qualquer modo, após a citação, o agente passa a integrar a relação jurídico-processual, sendo abarcado pela sentença a quo (SANTOS, 2004).

A denunciação da lide, pois, encontra-se em total sintonia com as ações de responsabilidade estatal, quando existam indícios fortes acerca da autoria do prejuízo, efetivando a celeridade e a economia processuais, como afirma Cândido Rangel Dinamarco (2004, p.399), senão vejamos:

Essa configuração do instituto permite apontar como sua ratio não só a economia processual, pois propicia o julgamento de duas causas em um processo só e sentença única, preparada por uma só instrução; como ainda a harmonia de julgados, pois evita o duplo sucumbimento daquele que, vencido em uma causa, correria o risco de receber depois outra sentença desfavorável na ação de garantia, declarando o juiz a inexistência da obrigação que lhes foi imposta antes.

Como a demanda inicial prejudica a segunda ação, só haverá necessidade dessa última persistir caso haja a obrigatoriedade de recomposição patrimonial por parte do Estado. Assim, com a denunciação, a Administração não mais precisará pagar o débito, uma vez que o funcionário já terá adentrado no processo, sendo abarcado pela decisão e condenado, caso seja a hipótese, a ressarcir diretamente a vítima, permanecendo o Estado como devedor subsidiário, nos termos do art. 37, § 6º, da CF, já que o ente assume os riscos pelos serviços prestados e pela contratação dos servidores, sendo responsabilizado objetivamente em caso de incapacidade do verdadeiro causador do prejuízo.

Desse modo, caso o agente possua condições financeiras para pagar a indenização, o administrado receberá a quantia de forma direta, sem necessidade que o Estado lhe pague via precatório.

A maior polêmica acerca do art. 70, III, do CPC se refere à aceitação do instituto no caso em que a denunciação traz novas questões ao processo principal, ocasionando "demoras" na instrução (DINAMARCO, 2004). Ocorre que o ingresso do agente público na ação de responsabilidade estatal não ampliará os limites da demanda, uma vez que a culpa do mesmo já foi averiguada via processo administrativo, bastando que o magistrado controle a legalidade da referida decisão.

Pelo exposto, deve-se interpretar o dispositivo supracitado de maneira a atingir a finalidade instrumental da norma, que é a pacificação social, como explica Alexandre Câmara (2006, p.201), ao afirmar que a denunciação da lide "não é apenas uma comunicação (denúncia) acerca da existência de um processo, mas contém verdadeira demanda incidental de garantia, através da qual se formula pretensão em face do terceiro convocado a integrar o processo".

Observa-se, assim, que a denunciação da lide é uma garantia do Estado, já que este só terá que indenizar caso o servidor não possua condições financeiras para tanto. Assim, o direito de regresso será exercido na própria ação de responsabilidade estatal, tornando o feito mais célere.

De fato, o Estado não deve assumir todo e qualquer dano causado por agentes públicos, ainda mais quando o prejuízo derivou de um ilícito ou de um ato doloso, sob pena dos interesses particulares de determinados funcionários se sobreporem ao Estado Democrático de Direito, que preza pela supremacia do interesse público e pelo resguardo do patrimônio estatal.

Saliente-se, ainda, que a denunciação não procrastinará a ação de responsabilidade estatal, ao contrário, a agilizará, tendo em vista a existência de decisão administrativa reconhecendo a falta perpetrada pelo agente, não havendo necessidade de se rediscutir, no Judiciário, a conduta do mesmo. Da mesma forma, vê-se que o particular não será prejudicado, uma vez que receberá a indenização diretamente do funcionário, tornando despiciendo o lento pagamento via precatório.

Em desfavor da aplicabilidade da denunciação da lide se situa o entendimento jurisprudencial do STF, como bem pontua o jurista baiano Fredie Didier Júnior (2006, p.104), ao aduzir que:

As pessoas jurídicas de direito público e as prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurando o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. [...] O STF tem se inclinado em sentido da inadmissibilidade da denunciação em tais casos, sob o argumento de que diversos os fundamentos da responsabilidade, num caso, do Estado, em relação ao particular, a simples causação do dano; no outro, do funcionário em relação ao Estado, a culpa subjetiva.

Cumpre, então, colacionar o seguinte aresto originado do Supremo Tribunal Federal, qual seja:

Constitucional. Responsabilidade Civil do Estado. Seus pressupostos. Processual Civil. Ação de indenização, fundada em responsabilidade objetiva do Estado, por ato de funcionário, não comporta obrigatória denunciação a este, na forma do art. 70, III, do Cod. Proc. Civil, para apuração de culpa, desnecessária a satisfação do prejudicado (STF, RE 93880, Rio de Janeiro, DJ 05.02.82, 2ª T., Min. Décio Miranda).

Em sentido oposto, consolida-se a jurisprudência do STJ, como demonstram as seguintes ementas:

Processual Civil. Responsabilidade do Estado. Denunciação da lide. Obrigatoriedade (Art. 70, III, do Código de Processo Civil). Em face de preceito expresso de lei, a denunciação da lide é obrigatória a todo aquele que estiver forçado pela lei ou por cláusula contratual a indenizar, pela via do regresso, o prejuízo do que perder a demanda. Tornar facultativa a denunciação da lide importa no descumprimento explícito da lei (art. 70, III, do CPC) e na afronta ao princípio da economia processual (STJ, RESP 196321, Paraná, DJ 26.04.99, T1, Min. Demócrito Reinaldo).

Responsabilidade civil do Estado – Denunciação da lide – Servidor público – Possibilidade em nome da celeridade e da economia processual, admite-se e se recomenda que o servidor público, causador do acidente, integre, desde logo, a relação processual (STJ, RESP 165411, Espírito Santo, DJ 03.08.98, T1, Min. Garcia Vieira).

O Estado responde pelos danos que seus agentes causarem a terceiros. Sua responsabilidade é objetiva, independe de dolo ou culpa. O agente público causador do dano, por sua vez, indeniza regressivamente a Administração Pública. Em virtude do direito de regresso existente entre o Estado e o funcionário de seus quadros, é admissível a denunciação da lide, com arrimo no art. 70, III, do CPC, para que o servidor causador do dano integre a relação processual na condição de litisdenunciado (STJ, RESP 156.289, T1, DJ 02.08.99, Min. Demócrito Reinaldo).

O Estado – quando réu em processo de indenização por acidente de trânsito – tem direito de denunciar a lide ao motorista que conduzia o veículo oficial [...] (STJ, RESP 13.621, São Paulo, Min. Humberto de Barros).

Estas últimas razões parecem ser mais condizentes com a prática atual, em razão da necessidade de desabarrotamento do Poder Judiciário. Assim, vê-se que nada impede que o Estado denuncie o agente público responsável para que este integre a demanda principal, tornando desnecessária uma posterior ação de regresso e ensejando, de logo, o início da execução contra o referido funcionário.

Ressalte-se que, caso o agente não seja denunciado à lide, tendo que aguardar a ação de regresso para ressarcir o Estado, o mesmo poderá, visando eximir-se da dívida, transferir seus bens a terceiros, para que, no momento da demanda, não mais possuir condições de ressarcir o Estado, causando grave fraude executória e contra credores. Assim, a sentença pós-denunciação tornará o servidor devedor do ente estatal, eximindo-se de tal encargo caso pague a indenização à vítima.

Neste ponto, cumpre trazer à baila o pensamento inovador de Alexandre Câmara (2006, p.206):

A nosso juízo, e assumindo os riscos de uma posição isolada, o fato de o Estado, civilmente responsável, ter direito de regresso em face de seu agente que tenha causado o dano, não exclui a responsabilidade deste perante o lesado, a qual decorre do art. 927 co Código Civil de 2002. assim sendo, nada impediria que se formasse um litisconsórcio (facultativo, obviamente) entre a pessoa jurídica de direito público e seu servidor.

Efetivamente, a responsabilidade do Estado permanece em relação ao particular, até porque o ente público assumiu os riscos na contratação daquele agente, restando configurada a culpa in elegendo. Ocorre, entretanto, que o ente estatal só deverá ser obrigado a indenizar caso o servidor não possua condições para tanto. O que denota que a responsabilidade do Estado é meramente subsidiária.

Barbosa Moreira há muito defende a aplicabilidade da denunciação nas ações de responsabilidade estatal, como se percebe do seu relato na Ação Civil nº 8.995/1979:

Não colhe o argumento em contrário, às vezes suscitado, de que a denunciação da lide ao funcionário introduz no processo novo "thema decidendum", por depender da ocorrência de culpa ou dolo daquele o reconhecimento do direito regressivo da pessoa jurídica de direito público. Tal argumento prova demais, porque com a denunciação, em qualquer caso, se introduz novo "thema decidendum"; questioná-lo equivaleria a pensar que algum denunciado fique impedido de defender-se negando a obrigação de reembolsar o denunciante, isto é, contestando o direito regressivo deste. Na verdade, a nenhum denunciado se recusa a possibilidade de contestá-lo. Pouco importa que ela se relacione com a exigência de dolo ou culpa ou com qualquer outra circunstância: a situação é sempre, substancialmente, a mesma (TJ do Rio de Janeiro).

De fato, havendo o reconhecimento da culpa do agente em processo administrativo, não há argumento jurídico que impeça a aplicação da denunciação da lide, até porque o juiz deverá reapreciar a legitimidade do ato formador da decisão administrativa, cabendo a decretação da nulidade da mesma, caso haja vício ou ilegalidade. Desse modo, torna-se desnecessária a realização de nova instrução, bem como a ação de regresso, efetivando-se os princípios da celeridade, eficiência e economicidade, previstos no inc. LXXVIII, do art. 5º, da CF. A denunciação garante, pois, que o Estado não precise indenizar o particular para só depois cobrar o ressarcimento do servidor, já que todas as questões serão debatidas e resolvidas in simultaneus processus.

No caso de responsabilidade estatal, pois, estar-se-á diante de uma sub-rogação, já que o ente acionado, após indenizar, assume os direitos do credor, podendo cobrar o ressarcimento do agente causador do dano, não cabendo uma interpretação restritiva do art. 70, III, do CPC, vez que a norma quer "restringir a denunciação da lide às situações de garantia própria" (DIDIER JR., 2005, p.316).

Humberto Theodoro Júnior (2005, p.119) também admite amplamente a aplicação da denunciação da lide nos casos de responsabilidade civil do Estado, por entender que:

Existindo o direito regressivo a ser resguardado pelo réu, a instauração do procedimento incidental da denunciação em nada altera a posição do autor na ação principal. Se seu direito de indenização é objetivo, continua com esse caráter perante o Estado-réu. Se o direito regressivo contra o funcionário depende da culpa do servidor que praticou o ato lesivo, ao denunciante é que incumbirá o ônus da prova da culpa, durante a instrução normal do processo. O autor da ação principal não sofrerá agravo nenhum em seus ônus e deveres processuais. O direito regressivo do Estado é que restará condicionado ao fato da culpa do servidor e só será acolhido se tal restar evidenciado na instrução. [...] Se o art. 70, nº III, do CPC, prevê a denunciação da lide "àquele que estiver obrigado, pela lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo do que perder a demanda; e se o texto constitucional é claríssimo em afirmar que o Estado tem "ação regressiva contra o funcionário responsável", não há como vedar à Administração pública o recurso à litisdenunciação.

Ademais, a própria Constituição afirma que o Estado possui direito de regresso contra o agente faltoso, não havendo como lhe ser negado o instrumento da denunciação da lide, sendo este o entendimento do STJ, senão vejamos: "É de todo recomendável que o agente público, responsável pelos danos causados a terceiros, integre, desde logo, a lide, apresente sua resposta, produza prova e acompanhe a tramitação do processo." (STJ, 1ª T, RESP 594/RS, Min. Garcia Vieira, ac. 07.11.96).

Pelo exposto, vê-se que é decorrência lógica do Estado Democrático a adequação ao devido processo legal, além da otimização da duração da lide, bem como a proporcionalidade como corolário da relação necessidade-benefício social, prestando-se a denunciação da lide aos ditames do Estado de Direito, vez que visa ampliar o acesso à Justiça, atuar com menos onerosidade, com celeridade e eficiência e adequar o processo aos reais interesses coletivos.

Assim, não há qualquer empecilho à aplicação da denunciação nas ações de responsabilidade estatal, devendo-se demonstrar, na prática, exemplos que comportam a utilização do citado instituto.

4.1 Por atos cometidos no exercício da função jurisdicional.

A responsabilidade do Estado por atos jurisdicionais não é aceita pacificamente pela doutrina, sob o argumento de que o juiz precisa agir livremente, sem interferência dos outros dois Poderes. Não fosse isto, aduz Zanella Di Pietro (2006, p.533) que: "A indenização por dano decorrente de decisão judicial infringiria a regra da imutabilidade da coisa julgada, porque implicaria o reconhecimento de que a decisão foi proferida com violação da lei".

Este, entretanto, não parece ser o melhor entendimento, já que a própria Constituição, em nenhum momento, excetuou tal responsabilidade, além de que o Código Civil e o CPC taxam, expressamente, a responsabilidade pessoal dos magistrados, observando-se, na prática, inúmeros casos que comportam a responsabilização do Estado por atos jurisdicionais, os quais, em regra, permitem a aplicação da denunciação da lide.

Maria Emília M. Alcântara (1988, p.75) aponta os casos mais corriqueiros de responsabilidade civil do Estado em razão de atos perpetrados por juízes, quais sejam:

Prisão preventiva decretada contra quem não praticou o crime, causando danos morais; a não concessão de liminar nos casos em que seria cabível, em mandado de segurança, fazendo perecer o direito; retardamento injustificado de decisão ou de despacho interlocutório, causando prejuízo à parte. A própria concessão de liminar ou de medida cautelar em casos em que não seriam cabíveis pode causar danos indenizáveis pelo Estado. Apenas para o caso de dolo, fraude, recusa, omissão, retardamento injustificado de providências por parte do juiz, o artigo 133 do CPC prevê a sua responsabilidade pessoal por perdas e danos.

Não se pode, contudo, olvidar-se que os juízes, tais como os demais servidores, não são infalíveis e intangíveis, cabendo, portanto, a responsabilização pessoal destes pelas faltas cometidas, não procedendo o frágil argumento de que o Poder Judiciário é soberano e intocável (PIETRO, 2006).

Apenas para elucidar eventuais controvérsias acerca do tema, cumpre demonstrar algumas hipóteses exemplificativas que permitem a aplicação da denunciação da lide, senão vejamos:

1– Se restar comprovado que a sentença foi proferida com parcialidade ou sem obediência à proporcionalidade e à razoabilidade, poderá o juiz ser denunciado à lide, caso o lesado intente ação contra o Estado. Isto porque, não obstante a responsabilidade estatal ser objetiva, o referido ente não deverá arcar com um dano causado diretamente por seu funcionário, seja por dolo ou culpa, principalmente no caso do mesmo possuir condições de quitar o débito. Com a denunciação, pois, evitar-se-ão fraudes, já que o juiz adentrará, de logo, no processo, efetivando o contraditório e assumindo o prejuízo que causou, permanecendo o Estado como responsável subsidiário.

2– Também na hipótese de abuso da autoridade judiciária, poderá o juiz, em não sendo processado diretamente pelo particular, ser denunciado à lide pela Administração Pública, seguindo-se os ditames da Lei nº 4.898/65, que regula o Direito de Representação e o processo de Responsabilidade Administrativa Civil e Penal, nos casos de abuso de autoridade.

3– Um outro exemplo de responsabilidade do Juiz que pode ensejar o seu chamamento ao processo principal está previsto no artigo 1.744 do Código Civil, o qual prevê a responsabilização no caso do mesmo se omitir e não nomear tutor de forma oportuna ou não exigir garantia legal deste.

4- A responsabilidade estatal também deverá ser averiguada no caso de demora ou negativa de prestação jurisdicional, seja por dolo ou por culpa. De fato, se o Juiz efetivamente causar um dano, no exercício da função, deverá ter a sua responsabilidade apurada administrativa e judicialmente, podendo ser denunciado à lide pelo Estado, vez que possui plenas condições de quitar o débito. É o que ocorre, por exemplo, quando uma pessoa acometida por uma doença degenerativa ajuíza ação com pedido liminar que lhe permita realizar determinada cirurgia, que não está sendo liberada pelo plano de saúde, e o magistrado, mesmo ciente da gravidade da moléstia, acaba demorando, por desídia ou por inimizade, para proferir a decisão antecipada, ocasionando o falecimento do paciente.

Observe-se que, nesse caso, inexistiu uma omissão, mas sim uma expressa negativa de cumprimento da prestação jurisdicional, pelo que patente é a responsabilização do agente, o que não ocorreria se a demora decorresse de motivos fortuitos alheios a sua vontade ou por falta de aparelhagem.

Assim, desproporcional seria que o Estado esperasse longos anos o término da ação principal para só depois intentar ação regressiva contra o magistrado causador do dano, visando ser ressarcido.

Desse modo, em casos patentes de responsabilização pessoal do agente público, principalmente quando já houver decisão administrativa, não haverá necessidade de ajuizamento de ação de regresso, uma vez que a conduta faltosa do juiz já foi devidamente averiguada via processo administrativo, cabendo o chamamento deste, pois, ao processo indenizatório.

No que tange ao erro judiciário, cumpre salientar que esta situação exige a análise do caso concreto, tendo em vista ser casuística e variável, como explica Luiz Antônio S. Hentz (1995, p.31): "Opera com erro o juiz sempre que declara o direito a um caso concreto, sob falsa percepção dos fatos; a decisão ou sentença divergente da realidade conflita com os pressupostos da justiça, entre os quais se insere o conhecimento concreto dos fatos sobre os quais incidirá a norma jurídica".

O erro, pois, pode ser in judicando, o que expressa equívoco no julgamento, ou in procedendo, isto é, na condução do processo. O principal erro judiciário abrange o cumprimento de pena além do tempo fixado na sentença, nos termos do inc. LXXV do art. 5º, da CF, senão vejamos estes arestos:

Se uma pessoa foi encarcerada, injustamente, sem qualquer motivo, e, se, em tal situação, tinha o Poder Público a obrigação de manter e assegurar sua incolumidade física, por certo que deve responder pelas conseqüências dos danos que ele sofreu na prisão, pagando-lhe uma indenização que há de ser a mais completa possível (TJSP – 4ª C. Apelação, Rel. Henrique Machado – RT 511/88).

O Estado é responsável pela reparação do erro judiciário, devendo a indenização cobrir os danos morais e materiais decorrentes da execução condenatória, em detrimento do réu inocente. A indenização pode ser pleiteada em ação autônoma, perante o Juízo cível, chamando-se o responsável ao processo, ou na ação de revisão criminal (TJBA – 1ª C. Apelação – Rel. Paulo Furtado – RDA 157/258).

Pelo exposto, vê-se que, em não sendo aplicada a denunciação da lide, tanto a parte lesada, quanto o próprio ente estatal demandado, seriam prejudicados pela demora, tendo que arcar com gastos desnecessários na ação de regresso e esperar a execução de precatório.

Não procede, portanto, o argumento de que a soberania dos serviços judiciários excluiria tal Poder de sofrer reprimendas, sob pena do Judiciário se sobrepor aos outros dois Poderes, violando a isonomia aclamada na Carta Magna, como salienta Lafayette Pondé (1995, p.315), ao afirmar que:

O serviço judiciário é um setor de funcionamento do Estado, como o são todos os demais serviços públicos; distingue-se destes tão-só pela função jurisdicional, que preferentemente ele exerce. Isto, porém, não o eleva acima da ordem jurídica, a cuja fiel e exata aplicação ele se destina. E, até mesmo por sua destinação específica, os danos que ele cause ser o mais prontamente reparados, para que não permaneça sem remédio a violação sofrida pela vítima que o buscará sedenta de justiça.

Existem, também, inúmeros outros exemplos práticos que permitem a denunciação do juiz causador do dano à lide, quando, como acentua o professor Canotilho (2005, p.660):

(1) houver grave violação da lei resultante de "negligência grosseira"; (2) afirmação de factos cuja inexistência é manifestamente comprovada pelo processo; (3) negação de factos, cuja existência resulta indesmentivelmente dos actos do processo; (4) adopção de medidas privativas da liberdade fora dos casos previstos na lei; (5) denegação da justiça resultante da recusa, omissão ou atraso do magistrado no cumprimento dos seus deveres funcionais.

Não fosse isto, a própria Constituição trata do erro judiciário no art. 5º, inc. LXXV, aduzindo que: "O Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença". Este também é o entendimento do STJ, senão vejamos o seguinte aresto:

Administrativo. Responsabilidade Civil. Denunciação da lide. Cabimento. Art. 70, III, do CPC. 1- A Administração Pública tem direito subjetivo processual de denunciar a lide, na qualidade de terceiro, o seu funcionário, seja político, administrativo ou judicial, na forma do art. 70, III, do CPC, nas ações de Responsabilidade Civil contra si intentadas. 2- A referida denunciação, se requerida, não pode ser indeferida pelo Juiz. Precedente: RESP n. 95.368-18, Rel. Min. José Delgado, DJU de 08.11.96. (REsp 100158 / DF ; RESP 1996/0041948-5, Min. Milton Luiz Pereira), sem grifos no original.

Desse modo, caso o Juiz seja denunciado, o Estado permanecerá como responsável subsidiário, para o caso do agente não possuir condições de arcar com a indenização, nos termos do art. 37, § 6º, da CF e, ainda, em razão da culpa in eligendo, já que o dano foi causado por um servidor integrante do seu quadro funcional, assumindo o Estado os riscos de ter "contratado" aquele funcionário.

Diante das razões expendidas, vê-se que não há qualquer fundamento jurídico que impeça que o Estado chame o juiz faltoso para integrar o processo, visando acelerar o procedimento, diminuir os gastos e evitar a propositura de uma nova e desnecessária demanda.

4.2 Por atos cometidos no exercício da função administrativa.

Analisar-se-á, agora, a aplicação da denunciação àqueles que exercem a função administrativa.

De fato, quando um servidor prestar um serviço sem qualidade ou de modo ineficiente, o Estado poderá chamá-lo para integrar a ação de responsabilidade civil, após a averiguação de sua culpabilidade, evitando, assim, a propositura de uma ação regressiva e reduzindo o tempo da demanda e os gastos cartorários. Isto porque, o exercício de função pública, nas palavras de Hely Lopes Meirelles (2005, p.75), "exige perícia, técnica e perfeição de ofício". Assim, com a responsabilização do funcionário, estar-se-á exercendo um efeito preventivo de litígios, evitando atuações irresponsáveis e moralizando os agentes acerca de seus efetivos encargos públicos.

Muitos são os exemplos de aplicabilidade da denunciação da lide em ações movidas a título de responsabilidade civil do Estado por faltas perpetradas por agentes administrativos (professores, bombeiros, serventuários, policiais etc), sendo que os casos que mais ensejam o chamamento do funcionário são os de colisão de veículos oficiais, como explica Yussef Said Cahali (1995, p.142):

É certo que, por vezes, em caso de colisão de veículos, a análise da culpabilidade entrosa-se intimamente com a análise do nexo de causalidade material; de tal modo que, se entendida dispensável a prova de um mínimo de culpa do motorista do veículo oficial, resta o exame amplo da conduta do mesmo quando do acidente, para verificar até que ponto terá ela concorrido para a sua verificação de molde a determinar ou não a responsabilidade.

Ressalte-se, também, uma hipótese muito comum de responsabilização estatal por ato de agente na função administrativa que é a dos policiais, quando estes, por exemplo, prendem um suspeito erroneamente, apreendem um bem de forma abusiva e ilegal ou atiram num cidadão inocente. Isto porque, tais servidores vivem no liame entre o dever de agir, dando segurança aos cidadãos, e a possibilidade de atuar, levando-se em consideração a previsibilidade do dano (BAHIA, 1995).

Como não se pensar, ainda, na possibilidade de denunciação da lide no caso de erro médico cometido por um profissional concursado em um hospital público?

Pelos motivos expostos e levando-se em consideração os exemplos taxados, cumpre colacionar alguns arestos acerca da matéria em foco, senão vejamos:

Adotou o direito brasileiro, em sede de responsabilidade civil do Estado, a teoria do risco administrativo, com a possibilidade de o Estado, após indenizar os lesados, acionar regressivamente o agente causador do dano, em caso de dolo ou culpa deste. É com base no princípio da economia processual que se admite a denunciação à lide do servidor público culpado (Resp 236837/RS, Min. Garcia Vieira, T1, DJ 03/02/2000), grifos nossos.

Ação de Indenização contra o Estado – Responsabilidade objetiva – Presunção de culpa – Acidente de Trânsito – Denunciação da lide – Motorista Oficial (CPC art. 70).

[...]

II – O Estado – quando réu em processo de indenização por acidente de trânsito – tem direito de denunciar a lide ao motorista que conduzia o veículo oficial.

III – Requerida a denunciação, em tal processo, defeso ao Juiz condicioná-la à confissão de culpa, pelo Estado (Resp 163097, Humberto G. de Barros, DJ 28/09/98), sem grifos no original.

Ato ilícito praticado por preposto – Dano causado por disparo de arma de fogo de policial em tumulto público – Ação de Indenização – Denunciação da lide na espécie – Suficiência da certeza de ser a bala proveniente de arma utilizada pela Polícia Militar (RT, 641:139).

Como visto, já está se tornando pacífica a possibilidade de denunciar o agente público causador do dano à lide nas ações de responsabilidade civil do Estado, desde que haja indícios fortes acerca da culpa do mesmo, senão vejamos alguns arestos exemplificativos:

Ao funcionário interessa intervir na ação, não só para assegurar o justo valor da indenização como, também, para evitar as despesas de dois processos: o movido contra a Administração e o desta contra ele. A letra e o espírito da Constituição permitem a participação, no processo, do funcionário, já que o Poder Público, executado por ato de seu representante, lesivo a terceiro, tem direito de exigir, diante do princípio da regressividade, do autor do dano, aquilo que pagou ao prejudicado (RT 544/260, 18.06.80).

Admite-se a denunciação da lide nos casos de responsabilidade civil do Estado quando a reparação de danos funda-se na culpa do preposto, porque, uma vez reconhecida esta, o direito de regresso da pessoa jurídica de direito público será simples corolário da aplicação da norma constitucional (TACSP – 5ª C., AI, Rel. Laerte Nordi, DJ 11/6/86).

Subsidiária, como visto, será a responsabilidade do Estado nos casos em que o agente público não possua condições de indenizar, seja porque o ente assume os riscos de ter contratado aquele funcionário, seja, em razão da culpa in eligendo, nos termos supletivos do art. 932, III, do Código Civil ("Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: [...] III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele.") e da Súmula 341 do STF ("É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto."), haja vista que o Estado é o "empregador" do agente público.

Cumpre salientar, ainda, diante da vastíssima gama de hipóteses de danos causados por agentes no exercício da função administrativa, outros casos que permitem a denunciação da lide:

1– Os leiloeiros, peritos, tabeliãs e tradutores poderão ser denunciados caso tenham causado dano ao particular, desde que haja nexo de causalidade entre suas condutas e os prejuízos sofridos.

2– Se um serventuário da Fazenda Pública expedir um título de posse, conferindo certo pedaço de terra a alguém que não tem direito ou, ainda, antes do prazo da usucapião, da mesma forma, em sendo comprovada que a sua conduta derivou de dolo (inimizade, por exemplo) ou culpa, poderá o mesmo ser chamado para integrar o processo, como bem pontuou o STJ: "O Estado responde pela culpa de seus agentes, expedindo títulos de domínio pleno de terras que não lhe pertenciam e que, por isso, foram restituídas aos legítimos donos em prejuízo dos sucessores daqueles títulos. Cabível a denunciação do agente pelo art. 70, III, do CPC. (STJ – 1 T. J. 315.74 – RTJ 72/145)".

3– Outro caso que permite a denunciação da lide é o erro cometido pelos subordinados de certo serventuário, senão vejamos: "É o serventuário responsável civilmente pelo que se passa em seu cartório. Cabe-lhe culpa in vigilando, ou in eligendo, sobre os erros de ofício de seus subordinados. (TJSP, Apelação – Rel. Henrique Machado – 63/155)".

4– Responde, ainda, cabendo a denunciação da lide, o titular do cartório por ato de escrevente que subtrai dinheiro entregue pela parte, para pagamento de dívida cobrada pelo Juízo, senão vejamos:

Administrativo e Processual Civil – Responsabilidade do Estado – Evento danoso causado por ato de tabelionato não oficializado – Legitimidade Passiva – Denunciação da lide – Ação de regresso – Nexo de causalidade.

1. Provado nos autos que a fraudulenta alienação imobiliária só se realizou em face de apresentação de falsa procuração pública, cabe ao Estado responder pela indenização por ato ilícito do seu preposto. 2. Os tabelionatos são serventias judiciais e estão imbricadas na máquina estatal, mesmo quando os servidores têm remuneração pelos rendimentos do próprio cartório e não dos cofres públicos. 3. Embora seja o preposto estatal também legitimado para responder pelo dano, sendo diferentes as suas responsabilidades, a do Estado objetiva e a do preposto subjetiva, caminhou a jurisprudência por resolver em primeiro lugar a relação jurídica mais facilmente comprovável, cabendo, entretanto, a denunciação à lide do agente (REsp 489511 / SP, Ministra Eliana Calmon – T. 2 - 22/06/2004, DJ 04.10.2004 p. 235), grifos nossos.

5- Um outro exemplo bastante comum ocorre quando um escrivão levanta uma quantia e se apropria indevidamente desse valor. Nessa hipótese, do mesmo modo, possível é a aplicação da denunciação da lide, como bem reconheceu o TJ de São Paulo na seguinte ementa: "Deve ser citado para integrar a lide contra a Fazenda do Estado, o escrivão que levantou quantia pertencente a terceiro e dela se apropriou" (4ª Câmara Cível do TJSP, 17.04.80, RT 540/103).

Pelo exposto, vê-se que é plenamente aplicável, às ações de responsabilidade estatal, a denunciação do agente público à lide, desde que reste demonstrada a efetiva culpa (em regra, há decisão administrativa prévia), bem como o nexo causal entre a conduta do funcionário e o prejuízo.

4.3 Por atos cometidos por agentes vinculados a concessionárias e permissionárias.

Passemos, agora, à análise acerca da responsabilidade do Estado em razão de ato cometido por agentes vinculados às Pessoas Jurídicas de Direito Privado prestadoras de serviços públicos, mediante delegação estatal, ou seja, às concessionárias e permissionárias, vislumbrando-se a efetiva possibilidade de tais entidades serem denunciadas à lide pelo ente estatal demandado.

Inicialmente, entendia-se que as concessionárias e permissionárias não possuíam desejo e, portanto, não podiam causar ilícito ou agir com dolo ou culpa. Com a evolução do Direito Administrativo, entretanto, passou-se a se responsabilizar tais pessoas pelos atos perpetrados por seus agentes, mantendo-se, porém, a responsabilidade do ente que delegou o serviço, até porque este possui o dever de fiscalizar se as atividades estão sendo bem prestadas.

Não fosse isto, a própria Constituição prevê, em seu art. 175, a hipótese de delegação da prestação do serviço público, salientando que, se a atividade estiver sendo prestada de modo ineficaz, ilegal ou ineficiente, o ente delegante deve encampar o serviço e voltar a prestá-lo de maneira adequada, consoante interpretação extraída dos arts. 175, IV, da CF, 22 da Lei nº 8.078/90 (CDC) e 6º da Lei nº 8.987/95, sob pena de responder objetivamente pelos danos causados aos particulares.

Caso o usuário processe o Estado, este poderá denunciar a concessionária e tal empresa também poderá chamar seu funcionário para integrar a lide, tendo em vista a existência de um direito regressivo do Estado em face da prestadora de serviço e desta última em face do trabalhador faltoso.

Assim, diante da celeridade, da eficiência e da economia processual, previstas no art. 5º, LXXVIII, da Carta Magna, há de ser aplicada a denunciação da lide nas ações de responsabilidade estatal, permanecendo o Estado como devedor subsidiário, para o caso da concessionária falir ou não ter condições de pagar o débito. De qualquer modo, vê-se que não haverá necessidade de propositura de ação regressiva, já que o "ressarcimento" será realizado na própria ação principal.

A denunciação da lide é, pois, um instrumento que garante a razoável duração do processo, não havendo qualquer fundamento que a torne inaplicável às ações de responsabilidade do Estado. De fato, o argumento de que a responsabilidade do agente não pode ser discutida no processo movido contra o Estado não procede, já que, em regra, o funcionário já foi processado administrativamente, restando comprovada a sua conduta faltosa, bem como o nexo de causalidade entre esta e o dano.

Por outro lado, respondendo a concessionária objetivamente perante o usuário do serviço, resta pacífica a possibilidade da mesma ser denunciada à lide caso o ente delegante tenha sido demandado diretamente pelo particular, assumindo todos os ônus processuais. Caso, porém, a empresa delegada não possua condições de indenizar, deverá o Estado quitar o débito, tendo em vista a Teoria do Risco, vez que a Administração Pública "assumiu o risco" de delegar a prestação de determinado serviço público, como bem pontuam os seguintes doutrinadores:

Pode dar-se o fato de o concessionário responsável por comportamento danoso vir a encontrar-se em situação de insolvência. Uma vez que exercia atividade estatal, conquanto por sua conta e risco, poderá ter lesado terceiros por força do próprio exercício da atividade que o Estado lhe pôs em mãos. Isto é, os prejuízos que causar poderão ter derivado diretamente do exercício de um poder cuja utilização só lhe foi possível por investidura estatal. Neste caso, parece indubitável que o Estado terá que arcar com os ônus daí provenientes. Pode-se, então, falar em responsabilidade subsidiária (não solidária) existente em certos casos, isto é, naqueles – como se expôs – em que os gravames suportados por terceiros hajam procedido do exercício, pelo concessionário, de uma atividade que envolveu poderes especificamente do Estado. [...] Exauridas as forças do concessionário, desaparece o intermediário que, por ato do concedente, se interponha entre o terceiro prejudicado e o próprio concedente. Este, por conseguinte, emerge espontaneamente na arena jurídica, defrontando-se diretamente com o lesado, para saldar compromissos derivados do exercício de atuação que lhe competiria (MELLO, 2006, p.647).

A Administração não pode deixar de ser o "garante final da indenização patrimonial do lesado" pela actuação do concessionário (GONÇALVES, 1999, p.374).

De mais a mais, o art. 25 da Lei nº 8.987/95 ("Incumbe à concessionária a execução do serviço concedido, cabendo-lhe responder por todos os prejuízos causados ao poder concedente, aos usuários ou a terceiros, sem que a fiscalização exercida pelo órgão competente exclua ou atenue essa responsabilidade".) prevê a responsabilidade objetiva de tais pessoas, não sendo coerente que o Estado responda pelos danos causados pelas mesmas, cabendo, pois, a denunciação da lide.

Tal previsão deriva, também, da atividade lucrativa prestada por tais Pessoas, já que as mesmas são remuneradas através das tarifas pagas pelos usuários, as quais representam elemento essencial ao equilíbrio contratual, não fundamentando um risco-proveito do Estado. (FERREIRA, 1999, p.780).

Por todo o exposto, observa-se ser plausível a aplicação da denunciação da lide tanto no caso da concessionária em face de seu agente (verdadeiro causador do dano), quanto no caso do ente delegante em face da prestadora de serviço público, senão vejamos o seguinte aresto:

Processo Civil. RESP. Prequestionamento. Ausência. Enunciado n. 282, Súmula/STF. Esferas Civil e Criminal. Independência. Art. 1.525, Código Civil. Interpretação. Denunciação da lide. Art. 70, III, CPC. Indeferimento. Ausência de cerceamento de defesa. Princípio da economia e presteza. Doutrina. Precedentes. Recurso desacolhido.

[...]       

III - Embora, em princípio, admissível, nos termos do art. 70-III, CPC, o cabimento da denunciação da lide ao causador direto do dano, como no caso de preposto de empresa concessionária pública, por ser decorrente de lei a responsabilidade da empresa (arts. 37, § 6º da Constituição e 1.521-III, CC), não se mostra recomendável anular o feito, nesta Corte, a partir do inacolhimento da denunciação e ensejar a remessa dos autos à origem para que, uma vez admitida a intervenção, sejam ali apreciados os argumentos da denunciante, proferindo-se decisão a respeito. Tal procedimento redundaria em delonga, a que não se justifica submeter os autores, sem interesse algum na relação paralela.

IV - A denunciação da lide, como modalidade de intervenção de terceiros, busca atender aos princípios da economia e da presteza na entrega da prestação jurisdicional, devendo ser prestigiada quando não pôr em risco tais princípios, como era o caso. (216657 /SP; RESP 1999/0046404-4, Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, T4, DJ 16/11/1999), grifos nossos.

Diante das considerações tecidas, vê-se que, em sendo admitida a denunciação, desnecessária será a propositura de ação regressiva, haja vista que o agente público indenizará diretamente o particular lesado, sem necessidade de precatório ou, ao menos, ressarcirá o Estado imediatamente.

4.4 Por atos cometidos por agentes políticos.

Enfim, analisar-se-á a aplicabilidade da denunciação nas ações de responsabilidade estatal em razão de danos causados por agentes políticos, mais especificamente pelos parlamentares que atuam em nome do Estado, sem subordinação hierárquica e com garantias de prerrogativas e imunidades.

Inicialmente, cumpre salientar que os agentes políticos "são os titulares dos cargos estruturais à organização política do País, isto é, são os ocupantes dos cargos que compõem o arcabouço constitucional do Estado e, portanto, o esquema fundamental do poder. Sua função é de formadores da vontade superior do Estado". (MELLO, 2006, p.135)

Já Hely Lopes Meirelles (2005, p.72) diz que tais agentes "são os componentes do Governo nos seus primeiros escalões, investidos em cargos, funções, mandatos ou comissões, por nomeação, eleição, designação ou delegação para o exercício de atribuições constitucionais".

Ocorre que há muito se afirmava que os agentes políticos não poderiam ser responsabilizados por eventuais erros de atuação, sob o argumento de que os próprios cidadãos haviam escolhido tais pessoas para assumir o poder. Não obstante, passou-se a se vislumbrar que os parlamentares são servidores públicos, pelo que, tal como os demais funcionários, poderiam ser responsabilizados pelos prejuízos que causassem, o que tem sido muito comum nos dias atuais, já que é cada vez mais corriqueiro o desvio de verbas, a corrupção, a lavagem de dinheiro, entre outros ilícitos funcionais perpetrados pelas autoridades políticas brasileiras. Tais fatos, inclusive, têm majorado o número de processos administrativos disciplinares movidos contra membros do Senado e da Câmara.

Ressalte-se, de logo, que os parlamentares respondem pessoalmente por crimes de responsabilidade e por improbidade administrativa, o que não se confunde com as ações de responsabilidade civil movidas contra o Poder Público, em razão de danos causados diretamente pelos mesmos.

Havendo decisão administrativa, inclusive, reconhecendo a falta do parlamentar (principalmente as oriundas das CPI´s), verifica-se que a mesma deverá ser apresentada pelo Estado na ação de responsabilidade civil, servindo como instrumento probatório e demonstrando que não haverá necessidade de nova instrução para se discutir a responsabilidade do agente, desde que resguardado o exercício do contraditório e da ampla defesa, nem da propositura de ação de regresso autônoma.

Assim, tem-se entendido que o agente político pode OU ser demandado diretamente pelo particular OU ser denunciado à lide pelo ente estatal nos casos em que o prejudicado mova a demanda apenas contra o Estado, cabendo trazer à baila o seguinte aresto exemplificativo: "A Municipalidade responde pelos prejuízos causados a dono de estabelecimento comercial fechado ilegalmente por determinação do prefeito, cabendo a responsabilização direta do agente político. (TJSP – 5 Câmara – Apelação – Rel. Roberto Rodrigues, J. 26.4.79 – RT 541/131)".

Outro exemplo muito corriqueiro que permite a denunciação da lide ocorre quando determinado agente político concede entrevista a um programa de rádio ou televisão e injuria, difama ou calunia alguém. Assim, supondo-se que o prejudicado optasse por litigar contra o ente público do qual faz parte o parlamentar, este último poderia ser denunciado para integrar o processo, respondendo pelos prejuízos morais que causou, permanecendo o Estado como responsável subsidiário.

Ressalte-se, ainda, que, nos dias atuais, com o crescimento desenfreado da corrupção parlamentar, o número de processos administrativos movidos contra os agentes políticos tem aumentado diariamente, o que, mais uma vez, nos traz a idéia de que, em já existindo decisão administrativa condenatória, a mesma deverá ser apresentada como título probatório na demanda movida pelo particular contra o Estado, haja vista ser prova cabal da culpa do parlamentar.

Desse modo, caso o agente ingresse na demanda principal, estar-se-á obedecendo aos ditames da celeridade, da eficiência e da economicidade, uma vez que o Estado não precisará ajuizar nova ação para ser ressarcido, além do que a vítima receberá diretamente, sem necessidade de precatório.

Pelas razões expendidas, cumpre demonstrar quais os efeitos práticos decorrentes da denunciação da lide, principalmente o fato de tornar prescindível a ação de regresso, já que o direito regressivo será exercido na própria ação de responsabilidade civil do Estado.


5 A denunciação da lide como método mais eficaz, célere e econômico de resolução do conflito.

Como visto, inúmeras são as hipóteses que admitem a denunciação do agente público à lide, para que este assuma os prejuízos que causou de forma célere, sendo desnecessária uma futura ação de regresso, evitando gastos e desabarrotando o Poder Judiciário.

De fato, a ação de regresso é cabível quando, aquele que teve que indenizar um terceiro pelos danos causados por outrem, resolva cobrar o ressarcimento da pessoa que efetivamente causou o prejuízo, como no caso do Estado que, após indenizar o particular, cobra a dívida do agente responsável.

Cumpre, neste ponto, reiterar a previsão dos seguintes artigos insertos na Lei nº 8.112/90:

Art. 122. A responsabilidade civil decorre de ato omissivo ou comissivo, doloso ou culposo, que resulte em prejuízo ao erário ou a terceiros.

[...]

§ 2º Tratando-se de dano causado a terceiros, responderá o servidor perante a Fazenda Pública, em ação regressiva.

§ 3º A obrigação de reparar o dano estende-se aos sucessores e contra eles será executada, até o limite do valor da herança recebida...

Art. 124. A responsabilidade civil-administrativa resulta de ato omissivo ou comissivo praticado no desempenho do cargo ou função.

Observa-se que os dispositivos supracitados, extraídos da Lei que trata do regime jurídico dos servidores públicos da União, das autarquias e das fundações públicas federais, prevêem o direito de regresso, não vedando, por outro lado, a denunciação da lide.

Saliente-se, ainda, que, apesar da previsão do art. 37, § 6º, da CF, vê-se ser mais eficaz a aplicação da denunciação nos casos de responsabilidade estatal, ao invés da cobrança via ação regressiva, com a finalidade de diminuir os gastos processuais e agilizar a resolução do feito. Entretanto, tal cobrança impende que seja verificada a culpa ou o dolo do funcionário, já que sua responsabilidade é subjetiva, e o elo de ligação entre a pessoa que está movendo a ação de regresso e aquele que está sendo demandado, justamente para que fique claro que o autor (o Estado) merece ser ressarcido.

Neste sentido, são as palavras de Zanella Di Pietro (2006, p.536):

Quando se trata de ação fundada na responsabilidade objetiva do Estado, mas com argüição de culpa do agente público, a denunciação da lide é cabível como também é possível o litisconsórcio facultativo (com a citação da pessoa jurídica e de seu agente) ou a propositura de ação diretamente contra o agente público.

Ademais, não há qualquer argumento jurídico que impeça que a decisão administrativa que reconhece a culpa do agente seja utilizada como meio de prova para o chamamento do mesmo à demanda, até porque tal sentença se fundamentou na instrução realizada no processo disciplinar.

Por outro lado, depreende-se que a decisão da ação de responsabilidade civil do Estado abarcará tanto o denunciante, quanto o denunciado, como salientam os seguintes autores:

O juiz ao decidir a lide originária, como ainda, a lide oriunda da denunciação, terá de apreciar os pressupostos de uma e outra. Assim, se dá pela procedência da ação contra o Estado, tendo em vista a culpa do funcionário, ipso facto, deverá dar pela procedência da denunciação da lide, estabelecendo, na sentença o ressarcimento devido: os fundamentos da ação contra o Estado e o da denunciação da lide identificam-se (ALVIM NETTO, 1980, p.264-265).

Finalmente, uma vez admitida a denunciação da lide àquele que estiver obrigado a indenizar em ação regressiva o prejuízo do que perder a demanda (art. 70, III, do CPC), a sentença, sob pena de nulidade, deve decidir não só a responsabilidade da ré em relação à vítima, mas também a do funcionário denunciado perante a Administração Pública (6.ª Câm. Cív. do TJRJ, 6.12.77, RT 519/235); pois, sentença que não julga o mérito da denunciação da lide, ou da ação de garantia, é inoperante (6.ª Câm. do 2º TACivSP, 14.2.79, RT 525/164) (CAHALI, 1995, p.106).

Desse modo, observa-se que, com a denunciação da lide, tanto o particular, quanto o Estado sairão beneficiados do processo, tendo em vista que o primeiro receberá a indenização diretamente do agente público, não precisando aguardar o pagamento via precatório, e o segundo restará apenas como devedor subsidiário no caso de ausência de capacidade financeira por parte do denunciado.

Vê-se, pois, que a aplicação de tal espécie de intervenção de terceiros nas ações de responsabilidade estatal corrobora os princípios da celeridade, da eficiência e da economicidade, elencados no art. 5º, LXXVIII, da Carta Magna, seja na resolução do conflito, seja no que tange ao ressarcimento estatal.

O Poder Judiciário, por seu lado, ao analisar a decisão administrativa que reconheceu a culpa do agente, haverá de realizar o controle de legalidade, observando se o procedimento transcorreu corretamente (GIUSTI, 2004, p.137). O que não será necessário, por certo, é uma ampla e demorada instrução visando averiguar a responsabilidade do funcionário, uma vez que a mesma já foi analisada no procedimento interno. As decisões administrativas, portanto, não são definitivas, mas se revestem de moralidade, fundamentando, por conseguinte, o pleito de denunciação da lide.

Assim, como a denunciação torna despicienda a ação regressiva, diminui-se a possibilidade do agente fraudar a execução, já que o mesmo deverá indenizar diretamente o cidadão, sem necessidade de ressarcir o Estado, posteriormente, como ressalta Cahali (1995, p.138):

A sentença, que julga procedente a ação indenizatória ajuizada contra a Fazenda Pública, e declara a responsabilidade do denunciado pelas perdas e danos da condenação, vale como título executivo contra o próprio funcionário faltoso, exercendo-se assim o direito de regresso nos próprios autos do processo original. [...] Um ponto, porém, deve ser reafirmado: o direito de regresso do permissivo constitucional somente pode ser exercido por via da denunciação da lide em que a sentença declara secundariamente a responsabilidade do funcionário; ou por via da ação regressiva de direito comum contra o funcionário.

Pelos motivos esposados, vê-se que os argumentos em desfavor da aplicabilidade da denunciação da lide nos casos de responsabilidade do Estado são completamente desfundamentados e ultrapassados.

De fato, a própria Controladoria Geral da União já proferiu parecer positivo em relação à aplicabilidade da denunciação nas referidas ações, reconhecendo, inclusive, que a responsabilidade subjetiva do agente público deve ser averiguada previamente, através de processo administrativo, senão vejamos os trechos pertinentes extraídos da apostila eletrônica do referido órgão, publicada no site http://www.cgu.gov.br/cgu/guia_PAD_novo/Apostila%20de%20Texto%20CGU.pdf, p. 269:

Para o foco pessoal do agente público, de imediato, antecipe-se que, no atual ordenamento jurídico, a responsabilidade civil de servidor tem natureza subjetiva. Em outras palavras, a obrigação pessoal do agente público em reparar dano em decorrência do exercício do seu cargo requer a comprovação de que a sua conduta causadora do prejuízo foi dolosa ou culposa. Sem esse pré-requisito essencial, ainda que a atuação pública do servidor tenha acarretado dano, não se cogita de responsabilizá-lo civilmente a reparar. A prévia comprovação da chamada culpa subjetiva do agente pode ter sido obtida em processo administrativo disciplinar (em que a comissão, após ter apurado ou ao menos indicado o prejuízo, ao final, procede à comunicação descrita em 4.10.7.2) ou em ação de reparação de danos. [...]

Na hipótese que aqui mais interessa, em que a prévia apuração da culpa subjetiva deu-se no escopo do processo administrativo disciplinar, após a comunicação do fato à Consultoria Jurídica do órgão e à Controladoria-Geral da União, conforme exposto em 4.10.7.2, como conseqüência do julgamento, instaura-se o rito sintetizado a seguir.

Por outro lado, se a ação do servidor acarreta dano a particular, em decorrência do art. 37, § 6º da CF, a análise requer uma separação de efeitos. Primeiramente, a responsabilização civil de ressarcir a vítima recai sobre o Estado, abrangendo o quantum o particular perdeu, despendeu e deixou de ganhar em decorrência do sinistro (ou seja, abrange desde o dano emergente até o lucro cessante). Aqui, diferentemente da necessidade de se comprovar culpa subjetiva do agente, de acordo com o que a doutrina chama de "teoria do risco administrativo" (que assume a existência de um risco inerente da atividade pública sobre o particular), basta à vítima comprovar a ocorrência do dano e o nexo de causalidade entre este dano e a ação ou omissão da administração para que já se justifique o dever estatal de indenizar, não lhe sendo necessário comprovar a culpa da administração ou de seu agente. É como se aqui se operasse uma inversão do ônus da prova, incumbindo à administração comprovar a culpa de terceiro, ou a culpa concorrente ou exclusiva da vítima, ou força maior e caso fortuito, para excluir ou atenuar sua responsabilidade civil de reparar. [...]

Complementando a análise, retornando o foco para a repercussão sobre o servidor, relembre-se que, conceitualmente, a responsabilização civil de reparar o dano causado no exercício do seu cargo requer a prévia comprovação de que a conduta eivou-se de dolo ou culpa. Não havendo esses elementos da conduta, resta apenas a responsabilização objetiva do Estado em indenizar o particular.

Ou seja, para o caso em que a atitude dolosa ou culposa do servidor, no exercício do seu cargo, causa dano a terceiro, têm-se duas relações jurídicas de naturezas totalmente distintas: além da já mencionada responsabilidade civil objetiva, na modalidade risco administrativo (que liga o particular à administração, para a qual basta a comprovação do dano e da relação causal entre a atividade pública e o prejuízo), surge ainda, entre a administração e o seu servidor, a responsabilidade subjetiva contra este último, que requer a prévia comprovação da sua atitude culposa ou dolosa. [...]

O art. 37, § 6º da CF assegura à administração, uma vez indenizada a vítima, o direito de propor ação regressiva contra seu servidor cuja culpa subjetiva já foi previamente comprovada. Assim, não há ação regressiva contra o servidor sem as anteriores condenação definitiva da administração e comprovação da culpa subjetiva do agente. [...]

A jurisprudência tem aceitado a denunciação à lide, instituto previsto no art. 70, III do CPC, com o qual o autor ou o réu do processo judicial chama a juízo terceira pessoa tida como garantia do seu direito, a fim de vê-lo desde já resguardado, caso venha a ser vencido na lide. Tendo a vítima argüido na inicial da ação indenizatória não só a responsabilidade objetiva do Estado, mas também a culpa subjetiva do agente, é cabível o emprego daquele instituto jurídico. Assim, a União contesta a ação indenizatória movida pelo particular e denuncia, como litisconsórcio, o servidor já previamente responsabilizado. (sem grifos no original).

Vê-se, assim, que a União já tem se valido deste instrumento de celeridade, visando resguardar os interesses da coletividade, tendo em vista a indisponibilidade do patrimônio público, bem como para punir o agente faltoso, após o contraditório, resguardado o princípio da proporcionalidade, já que o mesmo só arcará com os prejuízos que causou na exata medida de suas condições financeiras.

Assim, a responsabilidade objetiva estatal, além de proteger o particular, resguarda o patrimônio público, uma vez que a finalidade precípua do Estado é efetivar os direitos básicos dos cidadãos, tais como: educação, saúde etc, pelo que o mesmo não pode continuar ressarcindo todos os danos causados por servidores, muitos dos quais oriundos de atos ilícitos ou dolosos, sob pena de desvirtuamento da sua função. Desse modo, não há qualquer óbice à aplicabilidade da denunciação nos casos em comento, como explicam Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Arenhart (2006, p. 128):

Há quem sustente que não é possível a denunciação por conta da intromissão, no processo, de argumento novo, não presente na demanda original – afinal, a responsabilidade do estado é objetiva (independe de dolo ou culpa), enquanto a do servidor é subjetiva, dependendo da avaliação de culpa deste -, o que viria a prejudicar a aceleração processual, decorrente da exclusão da matéria "culpa" desse processo. Hoje, porém, prepondera a orientação no sentido do cabimento da denunciação, mormente considerando que está em jogo o patrimônio público, que, como elemento indisponível pertencente a toda coletividade, depende da mais pronta reintegração.

Diante dos fortes e convincentes argumentos apresentados acerca da aplicabilidade da denunciação da lide, observa-se "a deficiência do fundamento principal dos juristas e tribunais que defendem a tese restritiva, ora destroçado, que se ampara na ampliação do objeto de conhecimento do Juízo, prejudicial ao autor da ação principal." (sic) (GOMES, 2003, p.1).

Verificado, portanto, que a denunciação da lide, nestes termos, não ampliará a matéria processual em debate, vê-se ser totalmente desfundamentada a tese negatória de aplicação, consoante reconhecido pelo aresto ora transcrito, senão vejamos:

Servidor – denunciação à lide – Impossibilidade de Indeferimento. Processual Civil. Ação de Responsabilidade Civil contra o Poder Público. Ato ilícito praticado por agente público. Denunciação da lide. Impossibilidade de ser indeferida.

1 – A denunciação da lide contra servidor público autor do ato ilícito discutido em ação de responsabilidade civil proposta contra o Poder Público, se por este requerida, não pode ser indeferida pelo juízo. 2 – A adoção desse sistema de fixação de tal relacionamento processual visa se homenagear o princípio da economia processual, evitando-se uma nova demanda. Efeitos da ação regressiva. 3 – Recurso provido. (RESP n. 95368/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon).

Assim, em nome da celeridade, da economicidade e à luz da prevalência do interesse público sobre o particular e da preservação do patrimônio estatal, comprova-se a desnecessidade de ajuizamento de ação de regresso nas ações de responsabilidade do Estado, haja vista que, nesses casos, o juiz deverá acatar o pedido de denunciação e proferir sentença ampla, envolvendo ambos os litígios e abrangendo a matéria referente ao ressarcimento estatal, desde que observada a proporcionalidade entre a falta e o dano causado, além da condição econômico-financeira do citado funcionário.

Desse modo, estar-se-á resguardando os interesses do Estado, bem como os do particular, uma vez que este último receberá a indenização diretamente do agente, sem necessidade de esperar longos anos o pagamento via precatório, salientando-se que o ente estatal continuará sendo o garantidor subsidiário, já que detém a culpa in eligendo, por ter "escolhido mal" os seus funcionários.


6.Conclusão.

Diante dos argumentos jurídicos demonstrados ao longo das presentes razões, pode-se concluir que:

1- A Responsabilidade Civil do Estado e a denunciação da lide são temas muito debatidos pela doutrina e jurisprudência atuais, vez que o primeiro diz respeito ao próprio Estado Democrático de Direito, enquanto que o segundo é instrumento de celeridade processual.

2- O Estado responde objetivamente pelos danos causados por seus agentes, nos termos do art. 37, § 6º, da CF, tendo em vista a culpa in eligendo. Assim, o particular, ao pleitear uma indenização, não precisa demonstrar vestígio de dolo ou culpa, bastando que comprove o nexo de causalidade entre o dano e a conduta do agente. Desse modo, o ônus da prova se inverterá, passando o Estado a ter que provar que o servidor não causou o prejuízo ou que existe uma excludente de culpabilidade.

3- A responsabilidade deriva do risco social e é instrumento da Democracia, já que se subsume na idéia de que o Estado deve proporcionar o bem estar a todos e indenizar o particular por qualquer dano sofrido, de forma célere, eficaz e econômica, nos termos do art. 5º, LXXVIII, da CF.

4- A responsabilidade objetiva só será aplicada quando houver previsão legal e em caso de conduta comissiva, como ocorre no caso da responsabilização do Estado, com fulcro no art. 37, § 6º, da CF.

5- O Estado pode cobrar regressivamente do funcionário a indenização paga ao particular, já que há uma relação contratual (de trabalho) entre ambos, pelo que o primeiro se sub-roga nos direitos do credor, devendo propor a ação após o trânsito em julgado da demanda principal.

6- Caso o Estado queira denunciar o agente público à lide, poderá utilizar a decisão administrativa que comprovou a culpa ou o dolo do mesmo como instrumento probatório, vez que, assim, desde que assegurado o contraditório, não haverá necessidade de se realizar uma nova e ampla instrução.

7- A denunciação da lide é o melhor remédio nas hipóteses de responsabilização do Estado, em razão da celeridade, da economia processual e da efetividade, já que, ao invés de se instaurarem duas demandas distintas (com a mesma finalidade), tudo será resolvido simultaneamente.

8- É irrelevante a teoria do STF de que a denunciação é inaplicável às ações de responsabilidade estatal, porque a culpa do agente não pode ser perquirida na demanda que analisa a responsabilidade da Administração, uma vez que a primeira, em regra, já foi averiguada via processo administrativo.

9- Com a denunciação, será minimizada a possibilidade do funcionário fraudar a execução, já que o mesmo será executado diretamente pela vítima, não havendo necessidade de um novo processo.

10- O art. 70, III, do CPC prevê a denunciação àqueles que possuem direito regressivo em face de outrem, derivado de lei ou contrato, e alcança todos os casos que admitem ação regressiva, inclusive os oriundos da responsabilidade estatal, como já admitem o STJ e a Corregedoria Geral da União.

11- Por economia processual, celeridade, harmonia dos julgados e eficiência, bem como para evitar decisões conflitantes, a responsabilidade do agente poderá ser apurada nos autos da ação reparatória movida pelo particular, via denunciação da lide, já que a sentença abarcará tanto o conflito existente entre o Estado e a vítima, assim como aquele instaurado pelo primeiro em face do funcionário.

12- O Estado responde pelos danos causados por agentes no exercício das funções legislativa, jurisdicional, administrativa e política, cabendo a denunciação dos referidos servidores às demandas movidas pelos particulares lesados, ainda mais quando já existir prova documental comprovando o a culpa dos mesmos. Desse modo, não haverá ampliação do tema em debate, uma vez que a responsabilidade do funcionário já foi reconhecida em sede de processo administrativo.

13- É decorrência do Estado Democrático a adequação da demanda ao devido processo legal, a otimização da duração da lide e a observância da proporcionalidade. A denunciação, portanto, se presta aos ditames do Estado de Direito, já que visa ampliar o acesso à Justiça, atuar com menos onerosidade, com celeridade e eficiência e adequar o processo às necessidades da coletividade, não havendo qualquer empecilho à utilização de tal instrumento nas ações de responsabilidade estatal.

14- Caso o servidor torne-se parte, o particular receberá a indenização diretamente, sem precatório ou ação de regresso, o que agilizará o feito. Tal intervenção também beneficiará o Estado, que terá o seu patrimônio resguardado, podendo distribuir melhor os recursos públicos.

15- Como a denunciação não amplia a matéria processual, totalmente desfundamentada é a tese de inaplicabilidade do referido chamamento às ações de responsabilidade estatal, principalmente em face da celeridade e da economicidade, à luz da prevalência do interesse público sobre o particular.


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GIACOMO, Fernanda Salinas di. A aplicabilidade da denunciação da lide nas ações de responsabilidade civil do Estado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1911, 24 set. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11766. Acesso em: 26 abr. 2024.