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Revisão conceitual dos títulos executivos trabalhistas à luz da EC nº 45/2004 e da Lei nº 11.232/2005

Revisão conceitual dos títulos executivos trabalhistas à luz da EC nº 45/2004 e da Lei nº 11.232/2005

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Com o crescimento gradativo da competência executiva da Justiça do Trabalho, não se pode mais relegar a segundo plano a análise da tessitura do título executivo e de suas diversas modalidades.

1. A formação da idéia do título executivo.

O tradicional processo executivo foi montado e estruturado levando em consideração a necessidade de certeza absoluta da existência da relação obrigacional. Somente diante da plena convicção quanto à existência do vínculo obrigacional, autorizava-se a atuação da tutela executiva. Permeada pela idéia de preservação do patrimônio e da liberdade dos indivíduos, a tutela estatal, visando ao adimplemento de obrigações, deveria ser precedida de título autorizador dessa ação.

Nesse sentido, o direito processual tradicional construiu ideologicamente a execução, partindo da premissa básica de que a atividade executiva pressupõe a existência de um título. A noção de título como viga mestra da tutela executiva é ilustrada pelo brocardo nulla executio sine titulo e revela-se como uma tentativa de conferir segurança no âmbito das relações jurídicas. Como bem assevera o mestre Cândido Rangel Dinamarco: "...a exigência de título executivo, sem o qual não se admite a execução, é conseqüência do reconhecimento de que a esfera jurídica do indivíduo não deve ser invadida, senão quando existir uma situação de tão elevado grau de probabilidade de existência de um preceito jurídico material descumprido, ou de tamanha preponderância de outro interesse sobre o seu, que o risco de um sacrifício injusto seja, para a sociedade, largamente compensado pelos benefícios trazidos na maioria dos casos." [01]

A existência do título é, portanto, a própria autorização para o desencadeamento da tutela executiva autônoma. Nesse caso, não há de se perquirir sobre a espécie da ação executiva a ser manejada, posto que todas as modalidades executórias pressupõem a existência do título. É o título que autoriza a intromissão na liberdade individual ou no patrimônio do devedor, tendo em vista o objetivo básico da satisfação da pretensão executiva. Daí a postura incisiva da doutrina em exigir a presença do título como elemento indispensável para a concretização da tutela executiva.

Muito discutiram os doutrinadores sobre a natureza jurídica do título. É fato que a questão não ocupa um espaço importante no âmbito do processo do trabalho [02], tendo em vista que as eventuais conclusões que se possam extrair do profícuo debate doutrinário, pouco repercutirão na condução do procedimento executivo [03]. No entanto, com o crescimento gradativo da competência executiva da Justiça do Trabalho por intermédio de alterações na legislação ordinária [04] e na Constituição Federal [05], não se pode mais relegar a segundo plano a análise da tessitura do título executivo e de suas diversas modalidades.


2. As modalidades de títulos executivos trabalhistas.

Tradicionalmente, o direito processual, na tentativa de uniformizar o procedimento executório, nos apresenta duas modalidades distintas de títulos executivos: os judiciais e os extrajudiciais. A distinção leva em consideração a origem os referidos documentos, tipificando como judiciais aqueles produzidos ou referendados pelo Poder Judiciário, e como extrajudiciais os elaborados pela atividade negocial do credor e do devedor.

Esse critério distintivo sempre teve como principal função delimitar o conteúdo dos meios de tutela do devedor [06]. Ora, tratando-se de título executivos judiciais, tendo em vista a existência de um controle prévio por parte do Poder Judiciário, o leque de matérias argüíveis em sede de meio de tutela do devedor, há de ser reduzido e limitado. A impugnação à execução fundada em título judicial é restrita às hipóteses expressamente reconhecidas pela legislação processual (CPC, art. 475-L e CLT, art. 884, §1º e 3º), exatamente levando-se em consideração o pretenso pronunciamento anterior quanto à existência do crédito.

Tratando-se de títulos extrajudiciais, a ausência de controle prévio do judiciário na sua formação afasta eventuais limitações quanto às matérias a serem incluídas na impugnação feita pelo devedor. Ora, se não há controle estatal prévio, não se poderia suprimir, mesmo diante de certas exigências, a possibilidade de o devedor discutir ampla e irrestritamente a formação do crédito [07].

A tradicional na tipificação dos títulos executivos, portanto, fundamenta suas bases na restrição ou não dos níveis de cognição próprios dos meios de impugnação do devedor. Essa dualidade simplificadora, no entanto, não é capaz de acompanhar a dinâmica das relações sócio-econômicas atuais, nem tampouco os novos institutos processuais que se apresentam.

A atipicidade da formação do título em questão nos remete à classificação trazida por Teori Zavascki, que realça a possibilidade de existência de uma terceira modalidade de título, resultado da formação mediante atuação jurisdicional e negocial das partes, verbis: "São também títulos que ensejam execução forçada as sentenças que têm como ‘efeito anexo’ o de tornar certa a obrigação de ressarcir danos. É o caso das sentenças que extinguem a execução provisória, das quais decorre , automaticamente, independentemente de condenação, a responsabilidade do exeqüente pelos prejuízos sofridos pelo executado, nos termos do art. 588, I do CPC. Da mesma forma nas situações previstas no art. 811 do CPC, nasce a executividade independentemente de condenação, de provimentos jurisdicionais que produzem a ineficácia das medidas cautelares e das quais decorre, como conseqüência natural da ordem jurídica, a responsabilidade objetiva do requerente pelos prejuízos causados ao requerido. Outro exemplo significativo de sentença que dispensa condenação para ter força executiva é a que julga procedente a ação de resilição de contrato de promessa de compra e venda. Segundo a jurisprudência do STF, reafirmada pelo STJ, em casos tais, a sentença é título para a ação de execução visando a entrega da coisa independentemente de ter havido pedido explícito ou condenação específica a respeito, pois a obrigação de restituir o bem é efeito necessário e natural da resolução do compromisso." [08]

Restou claro, portanto, da transcrição acima que o direito processual civil admite situações em que surgem da sentença efeitos obrigacionais diversos daqueles buscados na postulação inicial. Nesse caso, os efeitos obrigacionais vão se corporificar em um verdadeiro título executivo que, no entanto, será representado formalmente pela mesma sentença que resolveu a ação primitiva.

Vê-se, por conseguinte, que a classificação dual tradicional não é mais capaz de abranger todas as variáveis e particularidades do fenômeno jurídico na atualidade. Há diversas situações que são trazidas pela legislação que não permitem um enquadramento confortável na sistemática tradicional.

Vejamos como exemplo dessa assertiva a execução fundada em sentença arbitral. A modalidade é expressamente elencada como título judicial (Código de Processo Civil, art.475-N, V), no entanto, a sistemática preconizada para o procedimento arbitral (Lei Nº. 9.307, de 23 de setembro de 1996 ) estabelece a eficácia plena do título, independentemente de qualquer chancela do poder judiciário.

É óbvio que, nesta hipótese, a intenção do legislador foi diminuir o nível de cognição da impugnação manejada pelo devedor. No entanto, é fragrante que, pelo menos em relação a esse tipo específico de título executivo, os critérios tradicionais não são capazes de fornecer uma classificação segura das modalidades legais.

Quando transferimos o foco da discussão para o direito processual do trabalho, concluímos que a dualidade tradicional entre títulos executivos judiciais e extrajudiciais se apresenta ainda mais inócua. A ampliação do espectro da competência material da Justiça do Trabalho, impulsionada principalmente pelo advento da Emenda Constitucional Nº 45, de 08 de dezembro de 2004, criou um leque quase que infinito de títulos sujeitos à tutela executiva. Mesmo assim, a legislação processual trabalhista vigente limita-se a enumerar, de forma tímida e restritiva, alguns poucos títulos no âmbito da CLT, art. 876.

Diante desse laconismo do direito processual trabalhista, é óbvio que outras modalidades de títulos reconhecidos em nosso ordenamento jurídico podem ser assimiladas na sistemática laboral. Nessa assimilação, o procedimento da tutela executiva a ser adotado é aquele preconizado pela norma processual trabalhista, no entanto, fortemente influenciado pelas diretrizes procedimentais fixadas pelo direito processual civil. A classificação dos títulos executivos trabalhistas deve, por conseguinte, levar em consideração a origem dos títulos e suas características gerais. Levando em consideração esses fatores, propomos a seguinte classificação dos títulos executivos trabalhistas: a) títulos judiciais próprios; b) títulos judiciais subsidiários; c) títulos atípicos; d) títulos extrajudiciais próprios; e e) títulos extrajudiciais subsidiários.

Ao estruturar a tipificação dos títulos em cinco espécies diferentes, levamos em consideração em primeiro lugar o nível de cognição da impugnação a ser manejada e a origem da produção dos referidos títulos. Nesse sentido, acrescentamos às duas modalidades tradicionais de títulos uma terceira, que denominamos de atípicos. Atípicos porque não se amoldam perfeitamente em nenhuma das classificações tradicionais, tendo em vista o hibridismo da sua criação, apresentando características judiciais ou extrajudiciais, dependendo do ângulo de que se observa.

Desdobramos ainda as modalidades tradicionais em grupos diferentes, levando em consideração a previsão expressa na legislação processual trabalhista, ou ainda a aplicação subsidiária de normas pertencentes a outros ramos da processualística. Sendo assim, podemos classificar os títulos judiciais e extrajudiciais em originários, quando previstos de maneira expressa pela legislação laboral, e em subsidiários, quando provenientes da aplicação subsidiária de títulos previstos em outros ramos da processualística.

Analisaremos as modalidades de títulos executivos trabalhistas nos itens seguintes.


3. Títulos executivos trabalhistas judiciais originários.

Títulos executivos judiciais são aqueles produzidos ou referendados diretamente pelo próprio poder judiciário, onde "...a atividade de identificação da norma concreta já foi objeto de cognição" [09]. Na sua acepção tradicional os títulos judiciais apresentam como característica principal a limitação da cognição dos meios de tutela do devedor, ou seja, a defesa do devedor em face da tutela executiva acha-se circunscrita às hipóteses prevista em lei (CLT, art. 884, § 1º e 5º). Nessa modalidade, no entanto, só são relacionados os títulos expressamente preconizados pela legislação processual trabalhista e não provenientes da aplicação de qualquer dispositivo legal alienígena.

Apenas dois títulos executivos trabalhista se enquadram nos requisitos acima expostos: as decisões passadas em julgado ou das quais não tenha havido recurso com efeito suspensivo e os acordos, quando não cumpridos (CLT, art. 876, primeira parte). Embora se apresentem numericamente reduzidos, esses títulos representam a maioria esmagadora do movimento processual destinado a impulsionar a tutela executiva no âmbito da Justiça do Trabalho.

A imprecisão técnica e metodológica própria da regulação processual feita pela Consolidação faz com que sejam necessários alguns ajustes, a fim de que sejam dimensionados corretamente os dois títulos judiciais trabalhistas. Inicialmente, não se pode dizer que as "decisões" sejam os títulos, tendo em vista que o termo é genérico e envolve todo e qualquer ato judicial que tenha conteúdo decisório. Nesse sentido, no âmbito do conceito de decisão, pelo menos na consagrada sistemática do direito processual brasileiro, vamos encontrar as sentenças e as decisões interlocutórias. É fato que essas últimas podem até assumir o papel de título judiciais, todavia não foi essa a intenção do marco normativo estabelecido pela CLT, art. 876. De fato, as "decisões" a que se reporta o referido dispositivo legal são as "sentenças" proferidas pelos órgãos jurisdicionais trabalhistas.

Da mesma forma, a incongruência terminológica do artigo em questão nos força a estabelecer o verdadeiro alcance do termo "acordo". Adotando uma visão sistêmica, podemos facilmente concluir que o acordo a que se reporta o legislador, nada mais é do que a sentença homologatória de conciliação entre as partes, denominada entre nós de Termo de Conciliação (CLT, arts. 831, parágrafo único e 846, § 1º). Além do mais, é totalmente dispensada a utilização do complemento "não cumprido", tendo em vista que não é a inadimplência que confere a condição de título, mas o simples reconhecimento legal de sua eficácia executiva. Nesse sentido, melhor será denominar este título de sentença homologatória de conciliação havida entre as partes.

Detalhemos a análise das duas espécies de títulos judiciais originários.

3.1 A sentença proferida pelos órgãos jurisdicionais trabalhistas.

Conforme explanado no item anterior, é indispensável que sejam apresentados os corretos limites do título judicial preconizado pela CLT, art. 876. O documento que é portador de eficácia executiva não é "decisão", mas sim a sentença proferida por órgão jurisdicional trabalhista. Mesmo estabelecida essa premissa é indispensável ressaltar que não são todas as sentenças trabalhistas que assumem o caráter de título executivo, mas tão-somente as sentenças que apresentam algum provimento de caráter sancionatório direto [10], ou seja, que impliquem na efetiva mudança de uma situação fática, por atuação direta do poder judiciário [11]. Não importa o rótulo que se busque dar ação que resultou na sentença, pois o que servirá como forma de mensuração são os limites e as características do próprio provimento jurisdicional.

Tomemos, como exemplo dessa questão, o caso do inquérito para apuração de falta grave (CLT, art. 853). Segundo posição francamente dominante na doutrina [12], trata-se de ação de característica predominantemente constitutiva, pois busca obter a resolução do contrato de trabalho de um empregado portador de estabilidade ou de garantia provisória no emprego (CLT, arts. 543, § 3º). O fato de essa ação ser classificada como constitutiva não lhe retira, a priori, a possibilidade de produzir um título executivo judicial. É certo que, em sendo acolhida a pretensão do autor, o provimento jurisdicional será preponderantemente constitutivo, correspondendo ao reconhecimento do término da relação laboral. No entanto, em não sendo acolhida a pretensão destinada ao rompimento do liame empregatício, a sentença passará a contemplar um comando de caráter condenatório, impondo ao autor obrigação de fazer [13] e de pagar [14]. Nesse sentido, a sentença que julga improcedente a postulação do inquérito para apuração de falta grave é titulo executivo judicial trabalhista originário, posto que contempla sanção direta a uma das partes, somente alcançável mediante atuação da tutela executiva. Não é relevante o rótulo que se procura dar à ação manejada, mas sim pesquisar as características do provimento jurisdicional.

Ressalte-se que, mesmo sentenças que contemplem a improcedência da postulação do autor, podem adquirir o caráter de título judicial, bastando que imponham obrigações acessórias, como o pagamento de custas processuais ou de honorários periciais (CLT, arts. 789, § 1º e 790-B).

Muito embora tenhamos citado expressamente a sentença como título executivo, não se pode deixar de mencionar que o acórdão dos tribunais também pode ser considerado como título executivo judicial originário. Isso poderá acontecer em duas situações distintas. A primeira delas, quando se tratar de processos de competência originária dos tribunais. Nesse caso, em havendo comando jurisdicional passível de tutela executiva é óbvio que o título não é a sentença, até porque inexistente em tais procedimentos. Entre as hipóteses em que o acórdão em processos de competência originária pode assumir o caráter de título executivo judicial podemos citar, entre outras: a) acolhimento de pretensões condenatórias havidas em sede de ação rescisória (CPC, art. 494; CLT, art. 836, parágrafo único); b) condenação em custas processuais decorrentes do trâmite de Mandado de Segurança de competência originária dos Tribunais; c) custas e despesas processuais decorrentes dos procedimentos de dissídios coletivos.

Mas não apenas nos processos de competência originária dos tribunais os acórdãos podem adquirir do caráter de título executivo. Nas hipóteses de recursos em face das decisões de primeiro grau, o acórdão substitui a sentença de primeiro grau, mesmo que não tenha havido reforma desta, conforme disposição do CPC, art. 512. Nessas situações, o título executivo não é a sentença, mas sim o próprio acórdão.

3.2 A sentença homologatória de conciliação entre as partes.

O processo do trabalho apresenta-se, em sua essência, conciliador. Muito embora a tentativa de conciliação entre os litigantes seja característica presente também do âmbito do direito processual civil [15], no processo do trabalho a fase conciliatória ocupa um papel de destaque. Dentro da própria estrutura procedimental do rito comum (tanto na sua vertente ordinária como sumaríssima) as tentativas de conciliação situam-se no início e no término da tramitação processual (CLT, arts. 846 e 850, in fine) e o Juiz do Trabalho tem a função conciliatória como dever a ser cumprido no curso processual.

O produto do êxito da conciliação havida entre as partes é o "termo de conciliação", conforme preceitua a CLT, art. 846. O termo a que se refere a legislação processual trabalhista nada mais é do que uma sentença homologatória exarada pelo magistrado condutor do feito. A utilização da expressão "termo de conciliação" apenas se justifica pela ausência de rigorismo científico da norma processual trabalhista vigente. De fato, o ato de o magistrado homologar a conciliação havida entre as partes é, induvidosamente, uma sentença, tendo em vista que o trâmite do processo de cognição se encerra definitivamente com o referido ato jurisdicional. Tanto é verdade que o próprio diploma legal trabalhista (de forma absolutamente desnecessária) equipara o termo de conciliação a uma sentença irrecorrível (CLT, art. 831, parágrafo único).

Essas considerações devem ser tecidas para que se fixe a característica jurisdicional da atividade jurisdicional de homologação dos acordos judiciais. O ato de homologação do acordo firmado no âmbito processual não é simples atividade formal de documentação de ato de conciliação entre as partes. A atuação do Juiz deverá ser fiscalizadora e inibidora de eventuais desvios, excessos ou prejuízos para pessoas estranhas à relação processual. É essa atitude dinâmica do magistrado que confere a característica de titulo judicial aos acordos firmados entre os litigantes no curso do processo e, conseqüentemente, inibe e delimita as formas de tutela do devedor em um eventual processo executivo. A própria legislação processual civil, ressaltando a postura mais dinâmica do magistrado como condutor do processo, autoriza a atuação jurisdicional direta contrária ao interesses dos litigantes, conforme se vê do CPC, art. 129. Ora, se pode o Juiz determinar a extinção do processo sem julgamento do mérito quando verificar a tentativa das partes de desvirtuar o processo, poderá muito bem criar óbices para a homologação de conciliações que impliquem em concessões desiguais ou venham a prejudicar o interesse de terceiro.

A utilização do termo acordo para designar o título executivo, portanto, afigura-se despropositada. Não é o simples ajuste de vontade entre os litigantes que vai conferir a autorização para o desencadeamento da atividade executiva, mas sim a atividade jurisdicional que referenda a confluência de vontade dos litigantes. A exeqüibilidade da obrigação pactuada nasce, por conseguinte, do comando jurisdicional homologatório e não apenas da vontade dos litigantes, sendo essa a característica primordial dessa modalidade de título executivo.


4. Títulos executivos judiciais subsidiários.

Afirmamos nos itens anteriores que a característica marcante dos títulos executivos judiciais é a sua produção no âmbito do poder judiciário e a limitação das formas de defesa do devedor no dentro do procedimento executivo correspondente. Vimos igualmente que há títulos judiciais tipicamente trabalhistas, tendo em vista que são preconizados de forma expressa pela legislação processualista laboral. Há, entretanto, alguns títulos que são judiciais na sua essência, todavia não são enumerados de forma expressa pela legislação trabalhista.

A falta da indicação normativa própria não afasta, no entanto, a competência da Justiça do Trabalho para processar as execuções respectivas. Muito embora os juslaboralistas não tenham cuidado de sistematizar essas modalidades de títulos executivos , podemos concluir que elas sempre estiveram presentes em nosso processo. O advento da Emenda Constitucional Nº 45, de 08 de dezembro de 2004, por outro lado, ampliou significativamente a possibilidade de aplicação de novos títulos judiciais ao processo do trabalho. Tentando sistematizar a temática é que propomos a criação de outra categoria de títulos, ou seja, os judiciais subsidiários. Esses títulos, conservando as características próprias dos títulos judiciais, são assimilados, de forma subsidiária, pelo processo do trabalho por conta da compatibilidade procedimental e de competência. Seguindo essa linha de raciocínio, seriam os seguintes os títulos executivos judiciais subsidiários: a) sentença penal condenatória transitada em julgado; b) decisão que antecipa os efeitos da tutela jurisdicional; c) decisão interlocutória que fixa penas pecuniárias concernentes às obrigações de fazer e de não fazer decisão que antecipa os efeitos da tutela jurisdicional; d) acordo extrajudicial homologado judicialmente.

4.1 Sentença penal condenatória transitada em julgado

O Código de Processo Civil vigente, em seu art. 475-N, II, [16] traz a possibilidade de execução direta dos efeitos cíveis das condenações criminais. Ou seja, diante de um pronunciamento definitivo do poder judiciário acerca da ocorrência de um ilícito criminal, a autoria e a culpabilidade, restaria à vítima apenas provocar o poder judiciário para obter a reparação dos danos correspondentes na esfera cível. "A sentença penal condenatória é título executivo para que a vítima do dano causado pelo delito obtenha a correspondente indenização no juízo cível. Condenado o delinqüente, em processo penal, não haverá necessidade de a vítima promover, no cível, uma ação de indenização por perdas e danos, bastando-lhe ajuizar, desde logo, a prévia liquidação dos danos, em processo de liquidação de sentença, de modo que tornada líquida e certa a sentença de condenação penal, tenha início, com base nela, a execução." [17].

Afasta-se, por conseguinte, a necessidade de um processo cognitivo prévio a fim de apurar a responsabilidade pela indenização do dano, que se acha plenamente evidenciada no âmbito da ação penal. Observem que não existe dependência da reparação cível com a condenação criminal, no entanto é impossível se rediscutir no âmbito cível a materialidade e a autoria do delito, quando já estiverem determinados no procedimento criminal (CC, art. 935). O que se opera, de fato, é um sensível alargamento dos efeitos da sentença criminal na órbita civil, como bem observa Araken de Assis, verbis: "A regra inédita do art. 63 do CPP, agora secundado pelo art. 584, II, do CPC, outorgou à sentença penal condenatória o efeito anexo extra-penal." [18]

Não há qualquer dúvida quanto à aplicabilidade dessa modalidade de título executivo judicial ao processo do trabalho. O vigente inciso VI do art. 114 da Constituição Federal assegura a competência da Justiça do Trabalho para o julgamento das ações envolvendo indenização por danos materiais e morais decorrentes da relação de trabalho. Na hipótese, a pretensão própria da execução da sentença penal condenatória é a reparação ex delicto, ou seja, a recomposição dos danos decorrentes do ilícito penal. Caso o ilícito penal tenha sido praticado no âmbito da relação de trabalho, não se afigura qualquer impedimento para que haja o ajuizamento da respectiva ação executiva no âmbito da Justiça do Trabalho.

Imaginemos o seguinte exemplo. Determinado empregado veio a sofrer lesões corporais de natureza grave, tendo como agente o seu próprio empregador. Tramitando a respectiva ação penal e operando-se a condenação transitada em julgado impondo pena ao agente, abre-se a possibilidade de a vítima buscar a reparação respectiva, tanto de índole material, como também moral. Ora, se optasse o ex-empregado por um procedimento cognitivo prévio para as reparações, induvidosamente a competência seria da Justiça do Trabalho, por força do dispositivo constitucional retro mencionado. Como é possível manejar a ação indenizatória própria não haveria qualquer impedimento para fazê-lo por intermédio da tutela executiva autônoma, também no âmbito do judiciário obreiro.

O exemplo acima é apenas ilustrativo das infinitas possibilidades concretas de manejo do respectivo título judicial no âmbito do direito processual do trabalho. Nesse sentido, todas as infrações criminais praticadas no âmbito da relação de trabalho e que comportem a reparação cível correspondente podem ser objeto de execução perante a Justiça do Trabalho, seguindo toda a matriz procedimental desse ramo.

Alerte-se, no entanto, que a possibilidade de manejo da execução direta da ação penal condenatória, pressupõe que o responsável pela indenização seja o próprio autor do delito reconhecido e apenado pelo poder judiciário. Havendo dissociação entre o agente delituoso e o responsável pela reparação, como ocorre em relação à responsabilidade objetiva do empregador (CC, art.932, III), não existe a possibilidade de execução direta, sob pena de se comprometer o próprio devido processo legal. Como bem acentua Teori Albino Zavascki, "...a eficácia da sentença penal condenatória se dá em favor da vítima e de seus herdeiros (Código de Processo Penal, art. 63) e em face , apenas, do condenado e, se for o caso do seu espólio ou herdeiros, mas não alcança o terceiro que, embora possa ter responsabilidade civil pelos atos praticados pelo autor do delito, não tem responsabilidade penal, e por isso mesmo, não foi parte na respectiva ação." [19] .

Pensemos na seguinte hipótese. Um determinado empregado de uma empresa guiava uma empilhadeira embriagado e acaba atropelando e matando um colega de trabalho. Sendo o agente condenado pela prática de homicídio culposo, os herdeiros do empregado falecido poderão buscar a reparação dos danos materiais e morais diretamente do empregador, nos precisos termos do CC, art. 903, III. Nessa situação, no entanto, não é possível a execução direta da sentença penal condenatória, tendo em vista que o empregador não foi integrado na respectiva ação penal, até porque lhe falta a respectiva responsabilidade criminal. Aos sucessores do falecido que buscam a responsabilidade do empregador, só restará a interposição da respectiva ação indenizatória, também perante o judiciário obreiro.

As hipóteses de utilização dessa modalidade de título executivo judicial são praticamente infinitas no âmbito do direito processual do trabalho, tendo em vista que o elemento determinante para o manejo do título é o fato de o delito ter sido cometido no âmbito da própria relação de trabalho.

4.2 Decisão que antecipa os efeitos da tutela jurisdicional.

A legislação processual trabalhista é totalmente omissa em relação à possibilidade geral de antecipar os efeitos da tutela jurisdicional [20]. No entanto, não há mais qualquer dúvida quanto à aplicação ao direito processual do trabalho da normatização contida no Código de Processo Civil, art. 273, consistente na possibilidade de se anteciparem os efeitos da tutela jurisdicional pugnada.

Ao se aplicar à sistemática do direito processual do trabalho o instituto da antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, também se transfere a este ramo da processualística a possibilidade de se "efetivarem" as obrigações constantes das decisões antecipatórias, nos termos do CPC, art. 273, § 3º. Nesse sentido, contemplando a decisão obrigação de fazer ou de não fazer, deverá o Juiz lançar mão da tutela específica preconizada pelo CPC, art. 461, e induvidosamente aplicada subsidiariamente ao processo trabalhista.

Em relação às obrigações de pagar, eventualmente contempladas na decisão antecipatória, a concretização do comando jurisdicional dar-se-á pela aplicação, no que couber, do disposto no CPC, art. 588 [21]. Nesse caso, estaremos diante de uma tutela de cunho executivo, dotada dos meios necessários para concretizar a quitação da obrigação reconhecida na decisão interlocutória. Sabendo-se que a atividade executiva pressupõe a existência de título executivo, é óbvio que o título em questão é a própria decisão interlocutória.

Não é pacífica a posição no âmbito do direito processual civil quanto à caracterização da decisão antecipatória como título executivo. Sustentam a natureza de título executivo das decisões de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, entre outros, Teori Albino Zavascki [22] e Araken de Assis [23]. É certo que entre os processualistas não existe unanimidade em relação ao tema [24], no entanto o nosso direito processual fixou como paradigma para o desencadeamento da tutela executiva a existência de um título e dessa condição não se pode fugir. Mesmo que a tutela de execução se dê de forma incidental ou sincrética, conforme disposições previstas tanto na CLT, art. 878 e no CPC, art. 475-I, não se pode abolir a existência de um marco que autoriza a atividade executiva do poder jurisdicional. É certo que a noção tradicional de título executivo não autoriza reconhecer essa característica em decisões não definitivas, entretanto, conforme largamente expusemos neste trabalho, houve uma sensível ampliação do conceito de título. Não se pode, no entanto, afastar a obrigatoriedade de pronunciamento jurisdicional ou documento legalmente reconhecido que permita a atuação direta da tutela executiva.

Sendo assim, a decisão interlocutória que antecipa os efeitos da tutela jurisdicional vem a se constituir em título executivo judicial, todavia sem reconhecimento expresso na legislação processual trabalhista.

4.3 Decisão interlocutória que fixa penas pecuniárias concernentes às obrigações de fazer e de não fazer.

A tutela específica das obrigações de fazer pressupõe a existência de meios de pressão próprios para o atendimento da pretensão constante da decisão judicial ou do título executivo extrajudicial. Um dos meios de pressão mais largamente utilizados é a aplicação de multas ao devedor, conhecidas também como astreintes. Essas multas podem ser previamente cominadas nas decisões interlocutórias, sentenças ou mesmo nos documentos dotados de eficácia executiva, nos termos do CPC, art. 461, §§ 4º e 6º. Em tais situações, a imposição das mulas dar-se-á fora do âmbito de incidência da decisão judicial que tutela a relação jurídica ou documento contemplado pela eficácia executiva, mas sempre por intermédio de decisão interlocutória do Juiz.

Ao fixar a multa o Juiz apenas exerce poderes próprios da tutela específica da obrigação de fazer, no entanto, havendo necessidade de "cobrar" as multas aplicadas, a atividade jurisdicional é tipicamente executiva. Nesse sentido, a tutela executiva tem como base ou ponto de partida a decisão que fixou o montante e a periodicidade das multas. Observem que, nesse caso, o instrumento de pressão próprio do cumprimento das obrigações de fazer ou de não fazer não se insere no âmbito nuclear do provimento jurisdicional. Ou seja, a simples quitação das multas aplicadas não é capaz de liberar o devedor do cumprimento integral das obrigações de fazer ou não-fazer inseridas no título.

Não há, portanto, uma correlação entre as condutas impostas ao devedor. A primeira consiste em uma atitude omissiva ou comissiva e a última em uma obrigação de pagar, que tem como nascedouro a recalcitrância do devedor. Nesse caso a obrigação de pagar origina-se de uma decisão judicial, mesmo que interlocutória.

Imaginemos uma situação típica no âmbito do direito processual do trabalho. Ao julgar ação trabalhista, o Juiz do Trabalho condena o réu a anotar a Carteira de Trabalho e Previdência Social, sem especificar no comando jurisdicional qualquer cominação pelo descumprimento da obrigação de fazer. Constatado que o réu não cumpriu espontaneamente a obrigação constante originalmente da sentença, o Juiz impõe uma multa equivalente a R$ 10,00 (dez reais) por cada dia de descumprimento.

O réu, entretanto, só veio a cumprir a obrigação imposta trinta dias após a intimação do respectivo despacho. Nesse caso, a obrigação de fazer restou plenamente adimplida, no entanto permanece o devedor inadimplente quanto à multa. O cumprimento tardio da obrigação de fazer também não é capaz de quitar as astreintes devidas anteriormente, que deverão ser cobradas por intermédio da atividade executiva. Identifica-se, na hipótese, um título executivo autônomo e como tal desvinculado daquele gerador da obrigação principal.

4.4 Acordo extrajudicial homologado judicialmente.

A alteração do Código de Processo Civil, conduzida pela Lei Nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005, criou um tipo novo de título judicial: a sentença homologatória de acordo extrajudicial (art. 475-N, inc. V). Abre-se, portanto, a possibilidade de que qualquer tipo de transação judicial possa ser objeto de referendo do Poder Judiciário, mesmo que não exista um procedimento jurisdicional previamente constituído. Nesse caso, a atividade jurisdicional consiste em assegurar a lisura do ajuste e permitir que se dê mais segurança no cumprimento das obrigações ajustadas pelos transatores. A sentença homologatória da transação entre os litigantes, portanto, é alçada ao nível de título judicial típico, tendo em vista que a atividade jurisdicional prévia garantirá a liberdade da manifestação volitiva e a legalidade do ajuste. Há, portanto, uma nítida tendência para se privilegiar a atividade autocompositiva dos litigantes, aliás caminho inexorável da processualística moderna.

Não se deve, no entanto, tipificar a atuação do magistrado homologador da transação extrajudicial como simples exercício da jurisdição voluntária, na qual se opera, tão-somente, a administração dos interesses privados. Ao ser chamado a referendar ajuste entre as partes, o Juiz atua no exercício do seu poder jurisdicional pleno, buscando apresentar de forma concreta e efetiva a composição daquele conflito de interesses apresentado. Nesse sentido, a homologação poderá ser rejeitada pelo órgão jurisdicional, ao ser identificado prejuízo de terceiro ou mesmo um ajuste manifestamente prejudicial a um dos litigantes.

A aplicação dessa modalidade de título executivo ao direito processual do trabalho, portanto, não apresenta nenhum tipo de empecilho. O Juiz do Trabalho poderá ser chamado a homologar uma transação extrajudicial de litígio inserido no âmbito de sua competência, sendo que essa decisão homologatória disporá de eficácia executiva plena.


5. Títulos executivos atípicos.

Conforme já expusemos anteriormente, a dualidade ortodoxa entre títulos executivos judiciais e extrajudiciais não se presta para tipificar algumas modalidades de pronunciamentos jurisdicionais dotados de eficácia executiva. Como a doutrina estabelece como elemento diferenciador básico a amplitude do nível de cognição dos respectivos meios de tutela do devedor, há determinadas situações em que esse critério não é suficiente para estabelecer essa distinção. Há casos em que o título é produzido por intermédio do Poder Judiciário e que a matéria a ser discutida em sede de meios de tutela do devedor não se encontra limitada. Em outras hipóteses poderíamos nos deparar com títulos tipificados como extrajudiciais, mas que, tendo em vista sua própria essência, não podem ter questões relativas à sua formação discutidas no âmbito do próprio processo executivo.

É fato que o direito processual contemporâneo, abandonando os rigores liberais do processo tradicional, adota uma postura de verdadeira relativização do princípio do título. Essa salutar tendência da processualística, no entanto, não afasta a premissa básica, construída no sentido de que a atividade executiva autônoma, em regra, pressupõe a existência de um título.

O direito processual brasileiro, utilizando a imprescindibilidade do título para a construção da tutela executiva autônoma, levou em consideração uma classificação básica dos títulos em judiciais e extrajudiciais. Essa classificação nunca teve por objetivo seccionar os procedimentos executórios, mas apenas delimitar o teor e a amplitude dos meios de tutela do devedor em face da execução. Partiu-se da premissa de que os títulos executivos extrajudiciais, como produzidos pela atividade negocial das partes, poderiam ser dotados de uma maior amplitude dos meios de tutela do devedor, admitindo-se um elastecimento da atividade cognitiva exercida pelo Juiz. Nesse sentido, os títulos executivos judiciais, já que produzidos pelo próprio judiciário, através de procedimento cognitivo autônomo, devem ter sensivelmente limitado o acesso aos meios de tutela, em favor da própria segurança e perpetuidade das decisões judiciais.

Foi nesse contexto de aparente objetividade que o direito processual civil delimitou, de forma sistêmica, o conteúdo dos meios de tutela do devedor nas duas hipóteses de execução, conforme se vê do CPC, arts. 475-L, 741 [25], 744 e 745. A sistematização da matéria partiu da premissa de que a dualidade dos títulos executivos, construída sob o fundamento da forma de produção dos referidos documentos, fosse suficiente para determinar a amplitude dos meios de tutela do devedor.

A promulgação da Lei Nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005, não alterou os efeitos da dualidade dos títulos executivos em face dos meios de tutela do devedor e ainda tornou mais clara a referida separação. Ora, em se tratando de execução de títulos judiciais, a defesa do devedor se procede no âmbito da própria relação processual cognitiva, por intermédio da impugnação ao cumprimento da sentença, nos precisos termos do vigente at. 475-L do Código de Processo Civil. Esse meio de defesa direto do devedor encontra-se, portanto, limitado às hipóteses expressamente relacionados nos incisos I a VI do referido dispositivo legal.

A complexidade das relações jurídicas atuais, aliada à própria ampliação dos títulos executivos previstos em nossa legislação, torna necessária a reavaliação dessa dualidade de classificação, principalmente como elemento delimitador da amplitude dos meios de tutela do devedor. De fato, há diversas situações previstas em que, muito embora o título não tenha sido submetido ao crivo do poder judiciário, por sua própria natureza, ou mesmo por determinação legal, há um enquadramento compulsório na categoria dos títulos executivos judiciais e, conseqüentemente, uma limitação dos meios de tutela do devedor.

Um exemplo dessa situação são as chamadas sentenças arbitrais. Com efeito, as sentenças arbitrais são relacionadas como títulos executivos judiciais (Código de Processo Civil, art. 475-N, IV), muito embora não dependam de qualquer tipo de homologação judicial [26]. Nesse sentido, a dualidade preconizada tradicionalmente é descaracterizada, posto que se confere status de título judicial a um negócio jurídico entabulado exclusivamente no âmbito da órbita privada dos litigantes.

Outra situação de ruptura do sistema dual de classificação dos títulos executivo está presente no Código de Processo Civil, art. 475-N, III, quando o legislador classifica como título executivo judicial a sentença homologatória de transação ou de acordo, "...ainda que inclua matéria não posta em juízo.". Ora, nessa situação o objeto da transação judicial que não consta da postulação inicial do autor sequer se tornou litigioso, tendo em vista que não integrou a res in iudicium deducta. Mesmo assim, essa matéria integrará o título judicial e sofrerá as mesmas limitações cognitivas atribuídas ao exercício dos meios de tutela do devedor, muito embora, nesse particular, a atividade jurisdicional tenha se limitado a certificar a manifestação volitiva dos litigantes.

Restou claro, por conseguinte, que a dualidade tradicional entre títulos executivos judiciais e extrajudiciais, embora possa satisfazer a maior parte das situações preconizadas na processualística, não é absoluta e comporta uma série de rupturas. Essa desagregação do sistema dual permite, como vimos anteriormente, o surgimento de uma categoria híbrida de títulos, capaz de agregar as características e os limites típicos de cada uma das formas tradicionais de títulos executivos.

Em verdade, a atipicidade dessas execuções tem uma influência direta na implementação das tutelas de que se pode valer o devedor. O interprete, portanto, deverá observar as variações conceituais e adequá-las em relação aos limites de defesa de que poderá dispor o devedor, evitando assim, o prejuízo ao devido processo legal, ou, em outro extremo, a própria efetividade do processo executivo.

O direito processual do trabalho é terreno extremamente fértil para a identificação desses títulos denominados de atípicos. De fato, é possível enumerar dois tipos de títulos executivos que não se adaptam aos padrões tradicionais de classificação dos títulos executivos: créditos previdenciários decorrentes das decisões trabalhistas e os termos de ajuste de conduta firmados perante o Ministério Público do Trabalho.

Passemos à análise dessas modalidades.

5.1 Créditos previdenciários decorrentes das decisões trabalhistas.

Não é tarefa fácil estabelecer as diretrizes conceituais da execução previdenciária [27]. A doutrina não encontrou uma diretriz majoritária que pudesse explicar a autonomia de um procedimento de execução fiscal, impulsionado de ofício e originado de uma sentença trabalhista. Na verdade trata-se de instituto sem precedentes dentro de nossa processualística, principalmente quando enfrentamos o problema do título executivo.

Para alguns doutrinadores, a atipicidade da execução previdenciária na Justiça do Trabalho faz com que seja relegada a um plano secundário a discussão acerca da existência de título executivo, tendo em vista o caráter nitidamente acessório dessa execução [28]. Não vejo, no entanto, como desprezar essa discussão em sede de direito processual do trabalho. Os problemas cruciais da execução previdenciária não podem ser resolvidos apenas pela concepção de que essa modalidade executória tem uma "geração espontânea", sem qualquer vínculo formal com a sentença de cognição originária, mas apenas marcada pela acessoriedade.

De fato os efeitos processuais da execução previdenciária no patrimônio do devedor devem ter origem de um título executivo, mesmo que fora dos padrões ortodoxos de classificação.

Por tal razão, outra parcela considerável da doutrina, embora identificando o título executivo gerador dos efeitos da tutela executiva previdenciária, incorpora-o no âmbito do próprio título judicial geral, como um verdadeiro efeito anexo ou secundário da sentença. Concebe-se, portanto, a execução previdenciária como apenas uma simples decorrência da sentença trabalhista, inexistindo qualquer tipo de autonomia do evento desencadeador dessa modalidade executória.

Não há dúvidas de que se trata de uma construção engenhosa destinada a explicar um instituto sem precedentes no âmbito do direito processual. Acredito, no entanto, que essa concepção não é suficiente para delimitar a natureza jurídica da execução previdenciária, nem tampouco para oferecer elementos concretos para caracterizar os meios de tutela do devedor.

O enquadramento da cobrança do crédito previdenciário decorrente da sentença trabalhista não pode ser resumido a um simples efeito anexo ou secundário do decisum, tal como ocorre com a chamada hipoteca judiciária, preconizada pelo CPC, art. 466. Nessas situações, os efeitos estão ligados diretamente ao teor do provimento jurisdicional e, embora autônomos, apresentam caráter nitidamente acessório, não dispondo de existência própria. Há, por conseguinte, um verdadeiro nascimento espontâneo da obrigação, sem que exista a necessidade de pronunciamento jurisdicional expresso, ou mesmo de provocação das partes [29].

Observe-se que, nesse caso, a obrigação acessória que nasce da sentença é de caráter nitidamente constitutivo, não gerando qualquer obrigação de fazer, não fazer, dar ou pagar para o réu. Como se trata de efeito imediato e automático, suas conseqüências independem da concordância, ou mesmo ciência da parte adversa. Vejamos o caso da hipoteca judiciária. Como efeito acessório da sentença, sua concretização dependerá, exclusivamente, de iniciativa do autor da ação, nos termos do CPC, art. 466 e Lei Nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, art. 167, I-2 e seu efeito será de assegurar o direito de seqüela em relação ao patrimônio do devedor e prevenir eventual fraude à execução.

O efeito secundário não integra o núcleo da sentença, mas apenas estabelece condições externas para que o comando sentencial possa atingir o seu objetivo [30]. O caráter acessório dos efeitos anexos, portanto, faz com que sua existência dependa da validade e continuidade da própria sentença, sendo que a eventual reforma do julgado ou mesmo a transação realizada pelos litigantes faz com que os efeitos anexos desapareçam, independentemente de qualquer pronunciamento jurisdicional prévio [31].

Esse caráter de acessório não é suficiente para explicar o nascimento da obrigação previdenciária emanada de decisão trabalhista, sem que venha a lhe atribuir um caráter amplamente autônomo. O nascedouro da execução trabalhista é, sem qualquer dúvida, a sentença trabalhista. No entanto, o seu efeito executório não nasce do título executivo judicial típico, mas é produto de outra manifestação estatal que atribui força executória ao pronunciamento jurisdicional.

Ora, a força executiva do título não nasce de seu caráter estritamente formal. Logo, a sentença trabalhista ao condenar o empregador no crédito trabalhista ou ao declarar a existência do contrato de trabalho [32], faz nascer um crédito previdenciário autônomo em relação à obrigação da ação geradora da sentença. O único vínculo entre a decisão trabalhista e a formação do crédito previdenciário decorre dos limites fáticos e temporais trazidos pelo pronunciamento jurisdicional laboral. Toda a construção do crédito previdenciário é conduzida de maneira autônoma, não se concebendo qualquer resquício de acessoriedade nessa construção.

O caráter autônomo do crédito trabalhista, portanto, pode ser demonstrado com o fato de que a eventual conciliação havida entre o credor e o devedor trabalhista não tem o condão de afetar o crédito previdenciário. Caso o crédito previdenciário fosse apenas um efeito anexo da sentença trabalhista, certamente a conciliação havida entre os litigantes teria o condão de alterar a natureza do crédito de natureza previdenciária. Não é isso que acontece. A conciliação havida entre os litigantes da ação trabalhista não atinge o crédito previdenciário já constituído, até porque temos a caracterização de obrigação nitidamente autônoma.

Nesse sentido, a sentença trabalhista gera dois títulos executivos distintos. O primeiro, representando os créditos de natureza estritamente trabalhista, enquadra-se com perfeição no conceito tradicional de título judicial, posto que nasceu da atividade do poder judiciário, tendo os integrantes da relação executiva participado diretamente da relação jurídica originária. O problema maior reside em tipificar o segundo título executivo, já que representa uma relação executiva que não se confunde com a relação processual que resultou na sentença trabalhista.

Não tenho dúvida de que a execução previdenciária é lastreada por um título executivo e que esse título é materialmente representado pela sentença trabalhista. No entanto, o grande desafio é proceder à classificação desse título executivo dentro da insípida categorização dual trazida por nosso direito processual, conforme já dissemos anteriormente.

Acrescente-se que a relação executiva engendrada apresenta uma parte totalmente estranha à relação processual primitiva, no caso, a União Federal, representada pela Previdência Social. Sendo assim, não vemos como afastar a identificação de um título executivo autônomo representativo do crédito previdenciário e portador também de força executiva autônoma e independente.

Esse título, muito embora seja representado materialmente pela sentença trabalhista, não pode ser classificado na categoria de títulos judiciais. Essa inserção pura e simples poderia causar a limitação da defesa do devedor no âmbito do processo executório, tendo em vista que essa é a finalidade da dualidade entre títulos judiciais e extrajudiciais. O título executivo representativo da execução previdenciária não se encaixa com naturalidade em nenhuma das espécies. Nem pode ser concebido como título extrajudicial, tendo em vista que decorreu de uma decisão jurisdicional, nem tampouco pode ser enquadrado como título judicial, posto que enfeixa uma obrigação inteiramente estranha daquela discutida na ação principal.

Podemos concluir, portanto, que a execução previdenciária é lastreada por um título executivo, representado formal e materialmente pela sentença trabalhista. Esse título executivo, tendo em vista a hibridez da sua formação, não se enquadra nem na categoria de título judicial, nem tampouco de extrajudiciais, demandando a formulação de um terceiro gênero de títulos mistos.

5.2 Dos termos de ajuste de conduta firmados perante o Ministério Público do Trabalho.

Embora o Termo de Ajuste de Conduta perante o Ministério Público do Trabalho seja considerado como um título executivo extrajudicial trabalhista (CLT, art. 876), não se pode olvidar o fato de que esse instrumento não é exclusivo do direito processual do trabalho. Trata-se, na verdade, de matéria prevista originalmente pela Lei Nº 7.347, de 24 de julho de 1985, art. 5º, § 6º que regula o instituto da ação civil pública no direito brasileiro.

A idéia básica do Termo de Ajuste de Conduta é obter do eventual réu da ação civil pública o reconhecimento da prática de ato ensejador da reparação através da jurisdição coletiva e possibilitar a reparação das pretensas lesões decorrentes. Não se trata de uma transação ou mesmo de uma conciliação, mas sim uma verdadeira confissão por parte do acusado, devidamente respaldada pelos membros do Ministério Público. Conforme já nos pronunciamos anteriormente: "...não há, portanto, espaço para renúncias ou transações no âmbito do procedimento investigatório, até porque o Ministério Público não é o titular da relação jurídica que está sendo protegida. Não seria admissível, pois, que o representante do parquet pudesse transacionar em direitos que, mesmo de cunho patrimonial, são considerados irrenunciáveis por nossa legislação." [33]

O legislador, ao alçar o termo de ajuste de conduta ao nível de título extrajudicial, objetivou eliminar a fase de cognição, possibilitando o recurso direito ao poder judiciário, com o fito de possibilitar a imediata correção das irregularidades apontadas. Como a formação do termo de ajuste de conduta depende da manifestação volitiva do acusado, haverá a completa eliminação da atividade cognitiva que tenha por finalidade aferir e delimitar a conduta imputada e sancionada. Trata-se, portanto, de uma concretização dos comandos normativos protetivos dos direitos metaindividuais. "Em regra, portanto, o compromisso de ajustamento de conduta visa a alcançar aquilo que seria pretendido com o ajuizamento da ação civil pública, ou seja, aquilo que a ordem jurídica prescreve como comportamento devido..." [34].

Vê-se, por conseguinte, que o objetivo primordial do termo de ajuste de conduta é evitar a discussão fática e jurídica quanto à materialidade da conduta afrontosa aos interesses metaindividuais. Trata-se, portanto, de uma alternativa posta à disposição do acusado que poderá aceitá-la ou não, posto que, apenas através do provimento jurisdicional concreto, é que poderá impor compulsoriamente determinada conduta.

O realce dessas características é de extrema relevância para que se possa aquilatar o verdadeiro alcance dessa modalidade de título executivo extrajudicial. Ao contrário da maioria dos títulos extrajudiciais, o termo de ajuste de conduta, normalmente, contempla obrigações de fazer e de não fazer, firmadas juntamente com obrigações de pagar, quase sempre de natureza de cláusula penal. Nesse contexto, a obrigação implementada no respectivo documento apresenta-se relevante do ponto de vista social, tendo em vista a tutela de um interesse de cunho metaindividual. De fato, como já afirmamos anteriormente, a atividade do Ministério Público na efetivação do termo não é de mediador ou de conciliador.

É fato que o representante do Ministério Público pode ser chamado a mediar conflitos individuais e o exercício dessas atribuições pode gerar um título executivo extrajudicial, na forma do Código de Processo Civil, art. 585, II [35]. Nessa situação, no entanto, a atividade do Ministério Público relaciona-se, tão-somente, à certificação da validade da manifestação volitiva dos transatores, mesmo assim em sede de direito de caráter individual. Não se vislumbra a ocorrência de qualquer interesse público na formação do referido título, mas, tão-somente, a necessidade de assegurar a lisura na estruturação do negócio jurídico.

Quando nos deparamos com a formação do termo de ajuste de conduta, concluímos que a finalidade da atuação do Ministério Público é a tutela de direitos metaindividuais, e não a garantia de relações jurídicas individualizadas. Nessa situação, o agir do representante do Ministério Público não enfeixa uma relação de cunho transacional, mas sim um mero registro da conformação do acusado em sanar as lesões indicadas. Nessa linha de raciocínio, expõe, com brilhantismo, o eminente Hugo Nigro Mazzilli: "...o compromisso de ajustamento de conduta não é um contrato; nele o órgão público legitimado não é o titular do direito transindividual, e, como não pode dispor do direito material, não pode fazer concessões quanto ao conteúdo material da lide. É, pois, o compromisso de ajustamento de conduta um ato administrativo negocial por meio do qual só o causador do dano se compromete, exceto implicitamente, a não propor ação de conhecimento para pedir aquilo que já está reconhecido no título." [36]

Ao obter a concordância do acusado em admitir a responsabilidade pelas lesões apontadas, o representante do parquet atua no exercício pleno de suas atribuições de defensor da sociedade, não se identificando qualquer resquício de composição privada de conflitos. Sendo assim, embora enquadrado legalmente como título extrajudicial, não se pode negar que o Termo de Ajuste de Conduta é um instrumento da realização de direitos não-patrimoniais e, portanto, impregnados pelo interesse público. Nessa situação, a concordância e o reconhecimento do acusado perante o órgão ministerial conferem ao termo de ajuste uma nível bem mais denso de certeza ao documento, equivalente a próprio pronunciamento jurisdicional.


6. Títulos executivos extrajudiciais próprios.

Nunca houve tradição no âmbito do direito processual do trabalho quanto à previsão de títulos executivos extrajudiciais. Sempre se discutiu quanto à possibilidade de processamento de títulos executivos extrajudiciais não-trabalhistas, mas por muitos anos inexistiu previsão legal específica para essa modalidade executória no âmbito do direito processual do trabalho. Foi apenas com o advento da Lei Nº 9.958, de 12 de janeiro de 2000, que, alterando a redação primitiva do art. 876 da CLT, reconheceu expressamente dois títulos extrajudiciais: os termos de ajuste de conduta perante o Ministério Público do Trabalho e os termos de conciliação perante das Comissões de Conciliação Prévia.

Quantos aos primeiros já discorremos no item anterior, vindicando a impossibilidade de serem tipificados no âmbito da classificação tradicional. Restaríamos a análise dos termos de conciliação perante as comissões de conciliação prévia.

A única convergência conceitual entre o Termo de Ajuste de Conduta e os Termos de Conciliação perante as Comissões de Conciliação Prévia reside no fato de que ambos são tipificados pela legislação processual trabalhista como títulos extrajudiciais. A partir desse ponto, desaparece qualquer outra coincidência na aferição da natureza jurídica dos dois institutos. O Termo de Conciliação, ao contrário do termo de ajuste, documenta uma transação judicial havida entre empregado e empregador acerca de conflitos individuais de trabalho (CLT, art. 625-E).

Essa transação realizada entre o empregado e a empresa apresenta duas finalidades: liberar a empresa quanto ao adimplemento de verbas decorrentes do contrato de trabalho (CLT, art. 625-E, parágrafo único) e garantir o acesso direito do trabalhador mediante a provocação imediata da tutela executiva (CLT, art. 625-E, caput). Muito embora não tenha sido esse o motivo determinante da instituição das Comissões de Conciliação Prévia, não se pode deixar de identificar, além do interesse direto do empregador em obter a "quitação" do contrato de trabalho, a finalidade protetiva do empregado, na medida em que se garante a impossibilidade de rediscussão da matéria transacionada. Nesse sentido, preconiza Estêvão Mallet, verbis: "Vale o termo de conciliação como título executivo, de caráter extrajudicial, porém. Permite, pois, imediato ajuizamento de ação de execução, com citação da parte inadimplente para o pagamento do valor devido, sob pena de penhora. Não está afastado o cabimento de embargos à execução. Mas em tais embargos não se poderá questionar a exigibilidade da obrigação decorrente da conciliação, salvo nos restritos antes indicados, não se concebendo, por exemplo, seja argüida prescrição verificada antes da conciliação e não invocada oportunamente. A celebração da conciliação, a despeito da prescrição consumada, implica renúncia do benefício, conforme art. 161, do Código Civil." [37].

Dentro desta linha de raciocínio, o Termo de Conciliação, formado segundo os parâmetros da CLT, art. 625-E, enquadra-se no âmbito da noção tradicional de título executivo extrajudicial. No entanto, esse título é dotado de uma teleologia diversa daquela que lastreia o título extrajudicial preconizado pelo Código de Processo Civil, art. 585, II, posto que não se quer apenas garantir o registro de uma transação extrajudicial, mas sim permitir uma pretensa "segurança" para a relação de emprego. O artificial caráter dual desse termo de conciliação demonstra que uma das finalidades da formação do termo de conciliação é garantir o acesso do empregado ao poder judiciário, exigindo o integral cumprimento das obrigações ajustadas. Evita-se, por conseguinte, a rediscussão do pretenso crédito trabalhista por intermédio de ação de conhecimento.


7. Títulos executivos extrajudiciais subsidiários.

Há uma discussão tradicional no âmbito do direito processual do trabalho acerca da possibilidade de serem executados títulos extrajudiciais produzidos no âmbito de relações jurídicas submetidas à competência da Justiça do Trabalho. De fato nunca houve uma convergência de opiniões acerca da admissibilidade de tais títulos na sistemática laboral [38], nem pronunciamento jurisdicional que identificasse a convergência das opiniões sobre o tema.

O advento da Emenda Constitucional Nº 45, de 08 de dezembro de 2004, no entanto, pôs fim a toda controvérsia. Ao estabelecer o constituinte derivado a competência da Justiça do Trabalho para julgar os conflitos decorrentes da "relação de trabalho" (Constituição Federal, art. 114, I), abandonou-se a limitação contida na antiga redação do art. 114 da Carta Política. Ou seja, os litígios não se circunscrevem aos limites internos da relação de emprego, envolvendo questões geradas, mesmo que de forma indireta, por aquela relação. Nesse sentido, é admissível que as relações de crédito decorrentes dos liames jurídicos submetidos à competência da Justiça do Trabalho, desde que representados por documentos dotados de eficácia executiva, sejam cobradas neste órgão do poder judiciário.

Conforme já expusemos anteriormente, a legislação trabalhista só se reportou de forma explícita a dois tipos de títulos extrajudiciais. No entanto, é possível identificar no âmbito da legislação processual civil, bem como na legislação esparsa, uma série de documentos que, eventualmente, podem ter origem de uma relação jurídica inserida na competência material da Justiça do Trabalho. Não se pode, por essa razão, vindicar uma enumeração taxativa de todos os títulos extrajudiciais que possam ser demandados perante a Justiça do Trabalho, mas sim estabelecer um parâmetro para a inserção desses títulos. Nesse sentido, o critério básico para a integração dos títulos extrajudiciais subsidiários é o fato de serem originados de uma relação jurídica base integrante da competência da Justiça do Trabalho.

A enumeração que será feita a seguir, portanto, não pretende ser taxativa. Visa apenas a estabelecer diretrizes lógicas para o manejo de títulos extrajudiciais, agora tipificados de subsidiários, no processo do trabalho. É óbvio que a realidade é bem mais rica que a imaginação do doutrinador, sendo possível que surjam hipóteses mais amplas de execução de títulos extrajudiciais perante a Justiça do Trabalho.

De toda forma, passemos a analisar algumas hipóteses de títulos extrajudiciais subsidiários.

7.1 Títulos de crédito dotados de eficácia executiva.

Os títulos de crédito devem ser dotados naturalmente da eficácia executiva, tendo em vista que se trata de uma dos atributos básicos desse instituto jurídico. No nosso sistema, no entanto, a eficácia executiva do título depende de previsão legal específica. Essa previsão é feita tanto pelo CPC, art. 585, I, como também por intermédio da legislação extravagante.

É possível que esses títulos de crédito decorram de uma relação jurídica submetida à competência da Justiça do Trabalho e, nesse caso, a competência para o julgamento da respectiva ação executiva também será desse ramo do poder judiciário. Dever-se-á pesquisar, portanto, se o crédito representado no documento de crédito poderia ser exigido por processo de cognição ajuizado em ação submetida à Justiça Laboral. Em caso afirmativo, não há dúvidas quanto à competência para o processamento da respectiva execução fundada em título extrajudicial.

Tomemos como exemplo hipótese clássica do direito processual do trabalho. Determinado empregado, ao ser demitido, recebe seus haveres rescisórios por intermédio de cheques sem a devida provisão de fundos. Diante da inadimplência patronal, restaria ao empregado ajuizar a respectiva ação executiva cobrando os valores descritos no documento de crédito. A competência firmar-se-ia em favor da Justiça do Trabalho, tendo em vista a possibilidade de o empregador ajuizar demanda cognitiva buscando os mesmo créditos naquele órgão jurisdicional.

Assim, a aferição da possibilidade de manejo da execução dos títulos de créditos parte da análise da relação jurídica geradora do crédito. Pouco irá importar a natureza, tipo ou característica dos títulos de crédito. Caso ele derive de uma relação jurídica cujas lesões se submetem à Justiça do Trabalho, é inegável a possibilidade do processamento.

7.2 Documentos públicos e particulares (Código de Processo Civil, art. 585, II).

O direito processual civil segue uma nítida tendência de ampliar o leque de títulos executivos extrajudiciais, buscando afastar a necessidade de ser promovido procedimento de cognição autônoma e, conseqüentemente, agilizar a prestação jurisdicional. Nesse sentido, o inciso II do art. 585 do Código de Processo Civil enumera uma série de documentos produzidos por atividade negocial das partes.

Os documentos públicos que estabeleçam obrigações de caráter trabalhista, portanto, são portadores de força executiva, sendo, portanto, exeqüíveis perante a Justiça do Trabalho. Da mesma forma, os documentos particulares subscritos pelo devedor, acompanhados de duas testemunhas e os instrumentos particulares de transação, desde que referendados pelo Ministério Público, Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores são portadores de eficácia executiva.

O único requisito que vislumbramos aplicável aos títulos enumerados envolve a ligação da obrigação ajustada no documento com alguma relação jurídica submetida à competência da Justiça do Trabalho. Não se deve confundir, entretanto, a eficácia executiva desses instrumentos, com uma eventual eficácia liberatória em relação ao contrato de trabalho. Essa última não é atributo dos títulos elencados, mas apenas do termo de conciliação perante as comissões de conciliação prévia (CLT, art. 625-E, parágrafo único) [39].

7.3 Certidão da dívida ativa da União (Código de Processo Civil, art. 585, VI).

O Código de Processo Civil estabelece de maneira genérica a certidão da dívida ativa como título executivo extrajudicial. Nesse sentido, as obrigações de que a Fazenda Pública seja titular devem ser expressas por intermédio da inscrição na respectiva dívida ativa. Tradicionalmente não havia como vindicar a aplicação subsidiária dessa modalidade de títulos extrajudiciais ao direito processual do trabalho.

O advento da Emenda Constitucional Nº 45, de 08 de dezembro de 2004, delegou à Justiça do Trabalho a competência para o processamento e julgamento das "... ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho". Enquadram-se nesse inciso todas as ações utilizadas pelos empregadores buscando discutir judicialmente as penalidades aplicadas, tais como, ações anulatórias, medidas cautelares, mandados de segurança, entre outras. Além desses procedimentos jurisdicionais visando à impugnação da ação dos órgãos fiscalizadores, também deverá ser processada perante a Justiça do Trabalho a ação buscando a cobrança das penas pecuniárias aplicadas aos empregadores.

Nesse sentido, considerando-se que as penas pecuniárias aplicadas pelos órgãos federais incumbidos da fiscalização das normas trabalhistas devem ser inscritas na dívida ativa da União (CLT, art. 642 e Lei Nº 8.036, de 11 de maio de 1990, art. 23, § 4º), o caminho judicial para a cobrança será a ação executiva, que ostentará como título respectivo a certidão da dívida ativa da União.


8. Dos títulos executivos produzidos no estrangeiro.

O direito processual civil elenca duas hipóteses distintas de títulos executivos produzidos no estrangeiro: as sentenças proferidas por Estado estrangeiro e submetidas ao exequatur do Superior Tribunal de Justiça (CPC, art. 475-N, VI) e os títulos extrajudiciais produzidos em outros países.

Em relação à primeira hipótese, a matéria não pertence à competência da Justiça do Trabalho, mesmo que a sentença submetida ao exequatur verse sobre questão trabalhista. Com efeito, a questão é tratada expressamente pelo texto constitucional que confere aos juízes federais de primeiro grau a competência para o processamento das execuções de sentenças estrangeiras homologadas pelo Superior Tribunal de Justiça (CF, art. 109, X).

Resta a possibilidade de execução de títulos de crédito produzidos no estrangeiro. O Código de Processo Civil admite a execução de títulos extrajudiciais produzidos no estrangeiro, independentemente de qualquer homologação das autoridades judiciárias brasileiras (art. 585, § 2º). Para que seja admitida a execução de tais títulos extrajudiciais é indispensável a observância dos seguintes requisitos: a) o título produzido no estrangeiro deve satisfazer os requisitos de formação exigidos pela lei processual brasileira; b) deverá o título prever o Brasil como local do cumprimento da obrigação; c) deve corresponder a uma das hipóteses expressamente preconizadas pela legislação brasileira.

Nesse sentido, sendo o título extrajudicial produzido no estrangeiro, mas sendo derivado de relação jurídica submetida à competência da Justiça do Trabalho, não vislumbramos qualquer obstáculo para o processamento da execução perante o órgão jurisdicional trabalhista brasileiro.

Não se diga que a hipótese é de difícil ocorrência, não apresentando qualquer relevância prática para o nosso estudo. Com efeito, a profunda modernização por que passaram os meios de comunicação nas últimas décadas, aliada ao barateamento dos meios de transporte, fez com que as relações de trabalho se tornem "globalizadas". Não é incomum que empregados brasileiros prestem serviços a empresas de outros países, mesmo permanecendo instalados aqui no Brasil. Também são costumeiros os programas de recrutamento de jovens brasileiros para a prestação de serviços temporários no estrangeiro. Nessas situações é provável que possa ser expedido algum documento que demonstre a existência de crédito trabalhista (título de crédito, contrato escrito de trabalho, entre outros) que se enquadre na sistemática de títulos extrajudiciais trabalhistas. Tais documentos, portanto, podem ser executados perante a Justiça do Trabalho brasileira.

Devemos observar que a hipótese não é desconhecida do direito processual do trabalho. A CLT, em seu art. 651, § 2º admite a atuação da jurisdição brasileira para os "...dissídios ocorridos em agência ou filial no estrangeiro, desde que o empregado seja brasileiro e não haja convenção internacional dispondo em contrário." Assim, se é admissível a ação cognitiva em face do empregador estrangeiro manejada em território nacional, indiscutível é a possibilidade de ajuizamento da ação executiva fundada em título extrajudicial produzido por esse mesmo empregador. É dispensável, inclusive, a exigência quanto à obrigação ser cumprida em território nacional, bastando que o empregador tenha estabelecimento aqui no Brasil.


Notas

  1. In: Execução civil, 7ª ed. São Paulo, Malheiros, 2000, p. 457-458.
  2. Não é demais destacar que, mesmo no âmbito do direito processual civil, vislumbra-se um interesse mitigado para o estudo da natureza do título. Como bem assevera Marcelo Lima Guerra: "É importante observar, desde logo, que, ao contrário da doutrina italiana, onde floresceram interessantes teorias a respeito da natureza jurídica do título executivo, os autores nacionais, quase à unanimidade, pouco se detiveram em investigações acerca desse importante tema. De fato, como se vai mais adiante procurar demonstrar, os processualistas nacionais, até mesmo os que se ocuparam de uma forma mais aprofundada no processo de execução, em regra, limitam-se a tomar partido por uma das teorias que ainda formam a essência do fecundo debate doutrinário sobre o assunto de que se trata." (In: Execução forçada – controle de admissibilidade, 2ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1998, p. 86).
  3. A discussão acerca da origem da força executiva dos títulos é ilustrada pela célebre polêmica entre Carnelutti e Liebman, tão bem descrita pela maioria dos processualistas que se debruçam sobre o tema execução. O embate entre os dois processualistas italianos repousou na idéia da existência do caráter documental ou não dos títulos executivos. Segundo Carnelutti, a importância do título executivo reside no seu caráter documental, ou seja, a relevância do título como elemento impulsionador da tutela executiva autônoma está no aspecto probatório do título e não em seus elementos substanciais. Na visão de Liebman, o título executivo identifica-se na vontade estatal de conferir proteção àquela obrigação constante do título, sendo o caráter documental ou probatório do título irrelevante na concretização da tutela (cf. ZAVASCKI, Teori Albino. Título executivo e liquidação. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, p. 55-59;. ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução, 5ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1998, p.117-120; SILVA, Ovídio A. Baptista. Curso de processo civil,v. 02 4ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000, p. 31-36). Mas não foram apenas os célebres juristas italianos, tão festejados na doutrina brasileira, que delimitaram o debate sobre a natureza jurídica dos títulos executivos. Devemos citar as formulações de Italo Andolina que, de certa forma desprezando a dualidade entre os aspectos documental e probatório, centraliza a natureza jurídica do título em função do poder ou qualidade do órgão jurisdicional encarregado da tutela executiva (In: "Cognizione" ed "esecuzione forzata " nel sistema della tuttela giurisdizionale. Milano: Giuffrè, 1983, p. 58 apud MEDINA, José Miguel Garcia. Execução civil – teoria geral e princípios fundamentais, 2ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2004, p. 160-161; também Contributo alla dottrina del titolo esecutivo. Milano: Guiffrè, 1982, p. 80 apud GUERRA, Marcelo Lima. Op. cit. p. 98-99).
  4. Especialmente a Lei Nº 9.958, de 12 de janeiro de 2000, que alterou a redação do art. 876 da Consolidação das Leis do Trabalho e criou dois títulos executivos trabalhistas: termo de ajustamento de conduta perante o Ministério Público do Trabalho e o termo de conciliação perante os órgãos de conciliação prévia.
  5. Destaca-se a Emenda Constitucional Nº 20, de 15 de dezembro de 1998, que delegou a competência para a cobrança de contribuições previdenciárias decorrentes dos julgados trabalhistas .
  6. A vetusta lição de Leibman nesse aspecto ainda permanece atual e relevante, verbis: "A noção unitária do título executório permite abranger ainda a figura da oposição de mérito. No sistema e no objetivo com que se ordena, nosso direito, esta matéria contradiz-se a asserção de Mortara de que, na hipótese de um título contratual, "a ação de execução inclui a ação declaratória e a traz consigo no caminho que percorre". A eficácia de título de título executório atribuída a um ato contratual tem propriamente a função e o resultado de permitir ao credor que evite (e não que suspenda) o processo de cognição para alcançar diretamente a execução. Mesmo nesse caso, como sempre, poderá o devedor formular oposição, e até os motivos que poderá alegar são mais numerosos do que em face da coisa julgada; é ainda verdade que as questões a discutir poderão ser as mesmas que teriam constituído objeto do processo de cognição facultado ao credor, em vez de valer-se da qualidade de título executório inerente ao ato contratual. Nada disso, entretanto, é razão para confundir duas coisas tão diversas. Em fase estritamente executória terá o título a costumada eficácia, e ao devedor, que a quiser contestar, tocará agir com a oposição de mérito; dentro, somente, do processo de oposição (se o devedor quiser propô-lo) é que terá importância a natureza diferente do ato em questão." (In: Embargos do executado – oposição de mérito no processo de execução. Campinas, Bookseller, 2003, p. 219).
  7. Essa regra, no entanto, não é absoluta, posto que, como veremos mais adiante, há títulos judiciais que não recebem um pronunciamento jurisdicional prévio.
  8. In: Sentenças declaratórias, sentenças condenatórias e eficácia executiva dos julgados. In: Revista de processo, nº 28, p. 46/56. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2004, p. 55-56.
  9. ZAVASCKI, Teori Albino. Processo de execução – parte geral, 3ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2004, p. 272.
  10. Deve ser ressaltado que a moderna processualística abandonou a tradicional divisão ou segmentação da sentença em função de seus efeitos em condenatórias, constitutivas e meramente declaratórias. Todos os provimentos jurisdicionais, em menor ou em maior grau, apresentam uma carga condenatória, constitutiva ou declaratória. Essa tipificação, portanto, não é suficiente para determinar a incidência da tutela executiva sobre determinada sentença.
  11. Nesse sentido, merece o registro do escólio do Teori Albino Zavascki, verbis: "São títulos executivos, portanto, as sentenças proferidas no processo civil que definam, de modo completo, uma norma jurídica individualizada que contenha prestação exigível de entregar coisa, de fazer ou de não fazer, ou de pagar quantia, cuja execução forçada deva se dar em ação autônoma. Provimento judicial com essas características pode decorrer do julgamento de qualquer espécie de ação, e não apenas no de procedência de ação condenatória. É o que ocorre com a norma concreta contendo prestação de pagar quantia certa relativa a ônus sucumbenciais, cuja identificação, como se sabe, é praticamente universal nas sentenças civis, mesmo nas que não apreciam o mérito,(sentenças terminativas), ou que julgam o pedido improcedente." (In: Título executivo e liquidação. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, p. 86). Embora a abordagem seja específica para o direito processual civil, a discussão é de extrema revelância para o direito processual do trabalho, especialmente, quando vamos delimitar quais sentenças se enquadram no conceito de título executivo judicial.
  12. Vide LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito processual do trabalho, 3ª ed. São Paulo, LTr, 2005, p. 795; ALMEIDA, Isis de. Manual de direito processual do trabalho, 9ª ed. São Paulo, LTr, 1998, p. 295.
  13. Consistente em reintegrar o empregado no cargo anteriormente ocupado.
  14. Relativa aos salário vencidos, correspondentes ao período em que o empregado permaneceu afastado de suas funções.
  15. Não é demais mencionar o estabelecimento de uma fase conciliatória obrigatória no âmbito do rito ordinário cível, conforme CPC, arts. 447 e 448.
  16. A previsão da sentença penal condenatória como título executivo judicial já estava contida na redação originária do Código de Processo Civil, no antigo art. 584, II. Por intermédio da Lei Nº. 11.232, de 23 de dezembro de 2005, o referido título foi deslocado e inserido no âmbito do capítulo relativo ao "cumprimento das sentenças". A referida alteração, no entanto, foi tópica, permanecendo a mesma natureza para o título em questão.
  17. SILVA, Ovídio Batista da . Curso de processo civil, 4ª ed. v. 02 São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000, p. 39.
  18. In: Manual do processo de execução, 5ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1998, p. 131.
  19. In: Título executivo e liquidação. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, p. 88.
  20. Devemos destacar, no entanto, que a Consolidação das Leis do Trabalho estabelece duas modalidades de decisões de caráter satisfativo, conforme se observa dos incisos IX e X do art. 659. É fato que boa parte da doutrina, talvez impressionada pela utilização do termo liminar, tipifica os referidos provimentos como de natureza cautelar (vide GIGLIO, Wagner. Direito processual do trabalho, 13ª ed. São Paulo, Saraiva, 2003, p. 357; MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho, 25ª ed. São Paulo, Atlas, 2006. p. 568-569. Em sentido contrário, LEITE, Carlos Henrique. Curso de direito processual do trabalho, 3ª ed. São Paulo, LTr, 2003, p. 914).
  21. Observe-se que a Lei Nº. 11.232, de 22 de dezembro de 2005, revogou o citado artigo 588 do Código de Processo Civil, deslocando a regulação da chamada execução provisória para o art. 475-O.
  22. "Caso típico é o de medida antecipatória determinando o pagamento de quantia em dinheiro. Se não houver atendimento espontâneo de imposição, outro meio não terá o autor senão o de promover a ação de execução por quantia certa, hipótese em que o título executivo será a decisão deferitória da antecipação. O caráter provisório da execução decorre da natureza precária da decisão, que define e impõe ao demandado o atendimento da prestação objeto do pedido, mas o faz a base de juízo de verossimilhança , sujeito à confirmação ou revogação pela sentença. (In: Processo de execução – parte geral, 3ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2004, p. 318).
  23. "Assim, o gênero ‘decisão’ abrangerá dois tipos de atos decisórios, proferidos pelo juiz singular de primeiro grau: a sentença (art. 162, § 1º) e a interlocutória (art. 162, § 2º). Ao contrário do que usualmente se sustenta conforme a força da ação, a decisão constitui título executivo e autoriza execução (art. 475-J) ou cumprimento (artigo 475-I, caput, c/c arts. 461 e 461-A). É mais uma razão para interpretar extensivamente o art. 475-N, I)." (In:Cumprimento da sentença. Rio de Janeiro, Forense, p. 23).
  24. Interessante é o ponto de vista exarado por José Miguel Garcia Medina:"Conclui-se que a decisão que antecipa efeitos da tutela, embora autorize a execução imediata, não é título. Não se aplica à execução baseada em tal pronunciamento judicial o princípio nulla executio sine titulo , mas o princípio da execução sem título permitida. Infere-se, daí, a falsidade da máxima ubi executio, ibi titulo, já que nem toda a execução tem por base um título executivo."(Op. cit. p. 133).
  25. O referido artigo foi reformado pela Lei Nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005, tendo em vista que os embargos do devedor em execução de título judicial, no âmbito do direito processual do trabalho, só se aplicam à execução em face da fazenda pública.
  26. Antes da edição da Lei Nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, o procedimento arbitral dependia da homologação judicial dos chamados laudos arbitrais, através de procedimento preconizado pelos revogados artigos 1098-1102 do Código de Processo Civil. Sendo assim, o chamado laudo arbitral, tendo sido submetido à apreciação do poder judiciário, enquadrava-se, sem qualquer dificuldade, no âmbito do conceito tradicional de título executivo judicial.
  27. Adotaremos a terminologia execução previdenciária para designar o exercício da competência preconizada pela Constituição Federal, art. 114, VIII. Muito embora o texto constitucional reporte-se ao termo contribuições sociais, não reputo prudente sua utilização, tendo em vista que a competência da Justiça do Trabalho restringe-se à cobrança das contribuições sociais incidentes sobre a contraprestação remuneratória, na forma da Constituição Federal, art. 195, I, a e II. Nesse sentido, a utilização do termo execução previdenciária demonstra ser mais adequada à análise do problema.
  28. Nessa linha de raciocínio, é relevante a citação do eminente magistrado e juslaboralista Francisco Antônio de Oliveira que afirma (antes da vigência da Emenda Constitucional Nº 45, de 08 de dezembro de 2004): "...que a execução determinada pelo § 3º do art. 114 da CF, não teria base em título executivo, pois não fora objeto do pedido, de defesa, de sentença e muito menos do trânsito em julgado...Tem-se, pois, que tanto a cobrança da contribuição para a previdência tem conotação de acessoriedade com a causa principal no que pertine com o crédito trabalhista do trabalhador." In: A execução das contribuições sociais – enfoques processuais. Revista LTr, v. 67, p. 815-818. São Paulo, LTr, 2004, p. 817.
  29. Essa característica de há muito foi identificada pela doutrina. Nesse sentido, preconizava Moacyr Amaral Santos: "Enquanto os efeitos principais se manifestam em razão do pedido e por meio de pronunciamento explícito do juiz, ou seja, exprimem de modo expresso o conteúdo da sentença, os secundário independem de pedido especial da parte ou de pronunciamento do juiz, mas resultam do fato da sentença. Do fato da sentença – sentença como fato jurídico – surgem tais efeitos, automaticamente por força de lei, como decorrência do efeito principal, dispensando qualquer pedido da parte ou pronunciamento do juiz."(In: Primeiras linhas de direito processual civil, 12ª ed. São Paulo, Saraiva, 1992, p. 34.
  30. É lição de Ovídio Batista, quando afirma que: "A característica dos chamados efeitos anexos da sentença é serem eles externos, não tendo a menor correspondência com o seu respectivo conteúdo...Não fazendo parte da demanda nem da sentença, o efeito anexo não será objeto do pedido do autor nem de decisão por parte do juiz. Ele decorre da sentença, mas não é tratado por ela como matéria que lhe seja pertinente."(In: Curso de Processo Civil, v. 01. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000, p. 507.
  31. Como bem pontifica o processualista Cândido Rangel Dinamarco, verbis: " Precisamente porque nenhum desses efeitos secundários depende de decisão do juiz (de nenhum juiz), não se admitem recursos destinados a excluí-los sem também se peça a remoção da decisão que os produziu. (In: Instituições de direito processual civil, v. 03, 2ª ed. São Paulo, Malheiros, 2002, p. 209.
  32. Em sentido contrário, a Súmula Nº. 368 do Tribunal Superior do Trabalho que não admite a possibilidade de execução de contribuições previdenciárias decorrentes de provimentos meramente declaratórios, verbis:

    "DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS E FISCAIS. COMPETÊNCIA. RESPONSABILIDADE PELO

    PAGAMENTO. FORMA DE CÁLCULO.

    A Justiça do Trabalho é competente para determinar o recolhimento das contribuições fiscais. A competência da Justiça do Trabalho, quanto à execução das contribuições previdenciárias, limita-se às sentenças condenatórias em pecúnia que proferir e aos valores, objeto de acordo homologado, que integrem o salário-de-contribuição.

    É do empregador a responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias e fiscais, resultante de crédito do empregado oriundo de condenação judicial, devendo incidir, em relação aos descontos fiscais, sobre o valor total da condenação, referente às parcelas tributáveis, calculado ao final, nos termos da Lei nº 8.541/1992, art. 46, e Provimento da CGJT nº 03/2005.

    Em se tratando de descontos previdenciários, o critério de apuração encontra-se disciplinado no art. 276, § 4º, do Decreto nº 3.048/99, que regulamenta a Lei nº 8.212/91 e determina que a contribuição do empregado, no caso de ações trabalhistas, seja calculada mês a mês, aplicando-se as alíquotas previstas no art. 198, observado o limite máximo do salário de contribuição. " (negrito nosso)

  33. CORDEIRO, Wolney de Macedo. Fundamentos do direito processual do trabalho brasileiro. São Paulo: LTr, 2005, p. 86.
  34. LEAL, João Cláudio Gonçalves. Notas sobre o inquérito civil e o compromisso de ajustamento de conduta às exigências legais. In: Carlos Henrique Bezerra Leite (Org.) Direitos metaindividuais. São Paulo: LTr, 2005, p. 206/225 (221).
  35. Art. 585. São títulos executivos extrajudiciais:

    ..............................................................................

    II – a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; o documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas; o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Público ou pelos advogados dos transatores; (negrito nosso)

  36. In: A defesa dos interesses difusos em juízo – meio ambiente, consumidor, patrimônio cultural e outros interesses, 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 359.
  37. Primeiras linhas sobre as comissões de conciliação. In: Revista LTr, V. 64, p. 439/445, São Paulo: Ltr, abril de 2000, p. 444.
  38. Admitem a execução de títulos de crédito perante a Justiça do Trabalho: Isis de Almeida (Manual de direito processual do trabalho,2º v. 9ª ed. São Paulo, LTr, 1998, p. 435), Wagner D. Gilgio (Direito processual do trabalho, 13ª ed. São Paulo, Saraiva, 2003, p.491). Posicionam-se contrário à tese: José Augusto Rodrigues Pinto (Execução trabalhista. São Paulo, LTr, 2006, p. 27), Manoel Antônio Teixeira Filho (Execução no processo do trabalho, 7ª ed. São Paulo, LTr, 2001, p. 196-197).
  39. Mesmo assim em limites bem mais tímidos do que a literalidade do referido dispositivo legal expressa.

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CORDEIRO, Wolney de Macedo. Revisão conceitual dos títulos executivos trabalhistas à luz da EC nº 45/2004 e da Lei nº 11.232/2005. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1916, 29 set. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11781. Acesso em: 28 mar. 2024.