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Atos jurídicos imperfeitos. Praticados por menores absolutamente incapazes. Validade

Atos jurídicos imperfeitos. Praticados por menores absolutamente incapazes. Validade

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A questão dos efeitos dos atos ou negócios jurídicos praticados por certos menores absolutamente incapazes ainda não conseguiu chamar a atenção de muitos daqueles que operam com o direito.

S U M Á R I O:. INTRODUÇÃO. Justificativa. Delimitação do problema. Material e método. CAPÍTULO I- PERSONALIDADE E CAPACIDADE. 1.1 Noções gerais. 1.2 Capacidade e direito comparado. 1.3 Limitações da capacidade. 1.4 Capacidade para a prática de ato jurídico. CAPÍTULO II- FATO JURÍDICO. 2.1 Noções gerais. 2.2 Fatos que independem da vontade. 2.3 Fatos que dependem da vontade. 2.4 Fatos jurídicos em sentido estrito. 2.5 Fatos voluntários lícitos. 2.6 Direito subjetivo. CAPÍTULO III- ATO JURÍDICO. 3.1 Noções gerais. 3.2 A vontade no ato jurídico. 3.4 A vontade no ato jurídico stricto sensu. 3.5 Ato jurídico e negócio jurídico. 3.6 Capacidade para a prática de negócio jurídico. 3.6 A autonomia da vontade. 3.7 Teorias da vontade e da declaração. 3.8 Incapazes de praticar ato jurídico válido. CAPÍTULO IV- ATO JURÍDICO ANULÁVEL, INEXISTENTE E NULO. 4.1 Noções gerais. 4.2 Ato jurídico anulável. 4.3 Vícios da vontade. 4.4 Erro. 4.5 Dolo. 4.6 Coação. 4.7 Simulação. 4.8 Fraude contra credores. 4.9 Lesão e estado de perigo. 4.10 Ato jurídico inexistente. 4.11 Ato jurídico nulo. 4.12 Atos de objeto ilícito ou impossível. 4.13 Atos jurídicos que não revestem forma legal. 4.14 Preterição de solenidade legal. 4.15 Ato que a lei declara nulo ou nega efeito. 4.16 Atos praticados pelos absolutamente incapazes. 4.17 Atos praticados pelo menor de dezesseis anos. CAPÍTULO V- ATOS PRATICADOS PELOS MENORES ABSOLUTAMENTE INCAPAZES E SEUS REFLEXOS. 5.1 Direito comparado. 5.2 A boa fé. 5.3 Incapacidade absoluta e atos jurídicos efetivos. 5.4 Menores absolutamente incapazes e autonomia privada. 5.5 Atos dos menores absolutamente incapazes e seus reflexos.. CONSIDERAÇÕES FINAIS. BIBLIOGRAFIA.


R E S U M O

A questão dos efeitos - e não são poucos - dos atos ou negócios jurídicos praticados por certos menores absolutamente incapazes, conquanto seja realmente de notável percepção pelo alto interesse e importância que representa no campo prático, em realidade ainda não conseguiu chamar a atenção de muitos daqueles que operam com o direito, seja porque em primeira e não cuidadosa análise a entendem por demais simples, seja porque não se propuseram a enfrentá-la aprofundadamente porquanto isto poderia levar à insólita conclusão pela ruptura de um segmento do sistema jurídico brasileiro, qual seja, o referente às nulidades definidas pelo Código Civil.

A Constituição Federal ao estabelecer no seu art.5º, inciso XXXVI que: a lei não prejudicará... o ato jurídico perfeito... fez anotar a vontade do legislador constituinte de que as relações jurídicas revestidas de normalidade e regularidade recebam proteção legal, da mesma forma que, em sentido negativo, aqueles atos jurídicos marcados por irregularidades que os comprometam, em regra, não terão apoio quer da legislação constitucional, quer da infra-constitucional.

O mandamento principal que contém o inciso - subjetivo em geral - é a segurança e enfoca a lei no tempo. Mas o verdadeiro escopo é conceder às pessoas a estabilidade nas relações jurídicas entre elas e o Estado, até porque, a propósito do tema, a própria Constituição Federal tutela a autonomia privada (artigo 1º, IV), e assegura aos menores, quaisquer que sejam, a convivência comunitária (artigo 227, CF), aí compreendida, evidentemente, a prática dos atos de sua vida civil.

Preciso é entretanto que o ato jurídico seja perfeito, o que, segundo o artigo 6º, § 1º, da LICC, significa o seguinte: reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou. E quanto aos seus requisitos também para a perfeição, os descreve o artigo 82 do Código Civil como sendo: agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei. O artigo 104 do Código Civil de 2002 pouco altera os aludidos requisitos, definindo-os como: agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei.

Por outro lado o presente escrito argumenta sobre a análise dos efeitos que o ordenamento jurídico como um todo concede àqueles atos - negócios - jurídicos que não são revestidos de total perfeição. Vale dizer: analisar-se-á, sob um aspecto, os reflexos ou efeitos do ato jurídico imperfeito, notadamente aquele praticado por agente incapaz, isto é, menores absolutamente incapazes, em determinadas circunstâncias.

Não se cuidou dos negócios jurídicos quanto aos menores relativamente incapazes porque a eles já se deu tratamento legal seja expresso, seja implícito ou tácito, conforme artigos 154, 155, 156 e 157 do Código Civil e artigos 180 e 181 do Novo Código, de 2002, bem assim pelo próprio instituto da ratificação (artigos 148, 149 e 150 do Código Civil e artigos 172 a 174, do Novo Estatuto).

Especificamente perquiriu-se sobre como solucionar o questão decorrente da existência da norma fulminante do artigo 145 do Código Civil (de 1916 e do artigo 104 do novo Código Civil de 2002) em cotejo com os negócios jurídicos envolvendo coisas móveis e de pequeno valor, praticados por pessoas com idade que as coloca em situação de absoluta incapacidade e que via de regra não recebem qualquer censura jurídica. Em outras palavras, aqui haverá tutela legal de um ato jurídico imperfeito, sem que isto implique em afronta à mencionada norma constitucional. Essa é a realidade fenomênica que o trabalho procurará analisar, compreender e explicar.

Portanto verifica-se que ao mesmo tempo em que a Constituição dá apoio legal aos atos jurídicos perfeitos, acaba ela indiretamente tutelando também alguns atos imperfeitos e que, por motivos de interesse público e de política de adoção dos bons costumes, do interesse social e do princípio da boa fé, vêm a receber validade, até porque a Carta não os proibe expressamente.

No primeiro capítulo foi abordada a noção de personalidade e capacidade.

No segundo abordou-se a idéia de fato jurídico, com a correspondente digressão sobre o que vêm a ser fatos voluntários e não voluntários e as diferenças entre fato e ato jurídico.

No terceiro estudou-se propriamente sobre o ato jurídico, o elemento vontade como requisito do ato, a diferença entre ato e negócio jurídico e a prática de ato jurídico pelos incapazes.

No quarto capítulo cuidou-se do ato anulável, inexistente e nulo, com noções gerais e específicas de cada um, especialmente os atos praticados pelos menores absolutamente incapazes.

No quinto capítulo cuidou-se da elaboração de noção sobre a boa fé, focalizando o ato jurídico em relação ao terceiro de boa fé e, por derradeiro, sobre o ponto principal do trabalho, ou seja, os efeitos e reflexos do ato jurídico praticado pelo menor absolutamente incapaz, notadamente ao terceiro de boa fé.

Por derradeiro pautamos sob a consideração de que o ato jurídico nulo, em situações tais (praticados por menores absolutamente incapazes), atualmente podem produzir efeitos válidos, principalmente aos terceiros de boa-fé, pois se revestem de praticamente todos os requisitos exigidos pela lei, doutrina e princípios gerais de direito e não atentam contra os bons costumes.

Por isso consideramos que a boa fé e os costumes, mais a autonomia privada, em casos tais, têm o condão de fazer a convalescença do negócio jurídico que aparentemente nasceu inválido, assim vigente a máxima de que na hipótese então inexistiria inconstitucionalidade (art. 5º, XXXVI, CF) na proteção de ato jurídico imperfeito.


I N T R O D U Ç Ã O

Em primeiro lugar mostra-se convinhável fazer anotado que a expressão negócio jurídico, adotada pelo novo Código Civil, de 2002, no Título I, do Livro III, aqui tomará lugar, em sentido genérico, à de ato jurídico, porém acentuando-se que para levar em conta o trabalho e tendo em vista que na Constituição Federal - artigo 5º, XXXVI - perdura a segunda expressão, bem como que a pesquisa envolve sucessivas remissões ao Código Civil de 1916, ambas serão usadas genericamente e terão o mesmo sentido, dada a concepção unitarista outrora adotada pelo direito civil brasileiro.

Pois bem. O estudo a respeito do negócio jurídico, sobre adquirir contornos da maior complexidade e encanto, revela-se também de suma importância, dada a sua onipresença em praticamente todas as fontes do direito material.

A pesquisa ora retratada se direciona, basicamente, à análise em torno de pontos ainda não claramente solucionados pelas literaturas nacional e estrangeira, pois não há uma firmeza de entendimento sobre os efeitos de alguns negócios jurídicos praticados pelos menores absolutamente incapazes.

Esse fenômeno, pouco debatido pelos juristas, nos fez proceder a dissertação colacionando dados e elementos de autores estrangeiros e da literatura jurídica brasileira, procurando compreender e explicar as respectivas noções dos atos dos menores, notadamente os direcionados aos terceiros de boa fé, considerando, os resultados daí advindos.

É certo que a doutrina destaca, com precisão, o conceito de negócio jurídico nulo, efetuado pelos menores absolutamente incapazes, em relação aos demais atos defeituosos, porém obviamente tal diferença deverá ser aferida e objetivada, também, quanto à vontade do incapaz, ao comportamento da sociedade e ao terceiro que participa desse negócio nulo, ou de seus efeitos. Essa é a principal argumentação do presente trabalho.

A exemplo do Direito de Família, em específico no que toca ao instituto do casamento, o Código Civil houve por bem informar as noções do ato nulo, ato inexistente e ato anulável, em variadas situações, cujos limites também procuraremos de certa forma demonstrar.

A boa fé, sabe-se, em determinados casos faz nascer direitos com extremo vigor, conforme as doutrinas mais modernas do mundo jurídico, inclusive sendo acolhida pelo próprio ordenamento brasileiro, especialmente no artigo 113 do novo Código Civil, de 2002, bem assim se acha inserta no artigo 4º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor, dentre outros.

E nem é por acaso que SILVIO DE SALVO VENOSA acentua que o novo diploma orienta o legislador para, ao procurar o sentido de uma manifestação de vontade, ter sempre em mira os princípios de boa fé, regra geral dos contratos bem como a orientação dos costumes que cercam a realização do negócio (Direito Civil, Parte Geral, ed. Atlas, S.Paulo, 2002, p.403).

Não obstante, parece correto que a regra deve ser levada em conta no campo da excepcionalidade, pois o direito somente existe e surge como instrumento regulador dos conflitos intersubjetivos sociais quando há campo válido para a semeadura, devendo essa sua fonte ser lícita, por isso que a se concluir somente nascer e se originar o direito quando para tanto há meio justo para um justo fim, em decorrência aqui excluído, por completo, o adágio segundo o qual os fins justificam os meios.

Nesse desiderato considera-se que em regra a nulidade letal e fulminante do negócio jurídico consiste num óbice para a proliferação de seus efeitos, até porque o que nasce morto desvanecido permanecerá. Porém como tudo que é próprio da dialética do direito, esse conceito merecerá a contrapartida da excepcionalidade, rubrica que o trabalho tende a trazer ao enfocar importante tema.

Reconhece-se que há imensa polêmica acerca da idéia do conceito de negócio jurídico, cuja pesquisa se mantém inesgotável aqui e no estrangeiro. Porém, com relação aos efeitos do negócio jurídico praticado diretamente pelos menores absolutamente incapazes, máxime, portanto, na ausência de representação legal, a questão não chega a ser de todo explicitada e pacificada. A doutrina, senão omissa - pois remete a outros princípios e institutos - é incompleta e a jurisprudência praticamente inexiste, havendo poucos julgados que consideram aqueles atos válidos ou apenas anuláveis.

Dir-se-ia que o problema, no direito civil brasileiro, é de ser resolvido por regras de direito objetivo e por princípios gerais, na medida em que nos casos em que os menores absolutamente incapazes praticam negócios jurídicos, estariam eles representados (artigo 84, CC, artigo 116 do CC de 2002) ainda que indiretamente pelos pais ou responsáveis, assim sendo aqueles apenas longa manus destes em tais atos negociais. Entretanto a solução não parece adequada seja porque tal conduta se incompatibiliza por completo com o instituto da representação e também porque não haveria explicação para as hipóteses em que os incapazes estivessem, por qualquer motivo, sem representação legal.

Tal estado de coisas, contudo, é resolvido em outros países por intermédio de regras específicas do direito objetivo, de modo que, tanto na Alemanha, França, Itália, Portugal e Suíça, os negócios jurídicos cometidos pelos menores absolutamente incapazes são, às vezes, considerados tão somente anuláveis na medida em que praticados sem qualquer ofensa ao seu próprio interesse ou ao social.

No que pertine à distinção entre ato jurídico e negócio jurídico, a doutrina, na sua grande maioria, fecha questão pela acolhida do negócio jurídico, em cuja esteira acabou vindo o novo Código Civil de 2002, ao expressar este último - negócio jurídico - a partir do artigo 104, em frontal posicionamento com o Código de 1916, Livro III, Título I.

O Código Civil - no caso o de 1916 - em países como o Brasil, Itália e França, consagrou a teoria unitarista ao definir o ato jurídico, pois engloba neste o negócio jurídico, não fazendo qualquer distinção de conceitos, conquanto civilistas como Vicente Ráo e Caio Mario da Silva Pereira dentre outros, há tempos já ensinem que a separação, como dizem os autores alemães, atende melhor à técnica e aos fins práticos, chegando este último, aliás, a asseverar a existência de ato jurídico lato sensu e stricto sensu, sendo o primeiro uma manifestação de vontade tendente a gerar efeitos jurídicos e a segunda consistente numa manifestação volitiva do homem visando a obtenção de um resultado.

O novo Código Civil brasileiro acabou por fazer adoção da teoria dualista, ao mencionar tanto o negócio jurídico (artigo 104) como o ato jurídico (artigo 185), terminando por centrar explicitações no primeiro, de cuja essência são na maioria as relações jurídicas de direito material.

Embora no direito comparado, como se viu, adote-se a teoria unitarista, vários autores sustentam que melhor se apresenta a dualidade de conceitos, dada a sua melhor apuração técnica ajustável aos atos e negócios jurídicos, certo que aos autores alemães, que fazem a distinção entre o ato jurídico e o negócio jurídico, se deve a origem dessa dualidade, e a esse respeito Vicente Rao lembra Enneccerus, Kipp e Wolff.

Também pesquisamos informalmente a jurisprudência e verificamos divergências existentes.

A justificativa sobre o assunto se fixa nas contradições que existem entre a aceitação dos efeitos dos atos praticados, na chamada vida corrente, pelos menores absolutamente incapazes, quando ausente a representação legal, como válidos ou não e seus reflexos à sociedade como um todo e ao terceiro de boa fé.

Orientam-se vários julgados, na esteira do pertinente dispositivo legal (artigo 145, CC) e da própria doutrina, no sentido de que os atos levados a efeito pelos referidos menores são nulos. E se por outro lado estamos a sustentar que aqueles atos, desde que relativos à vida cotidiana ou corrente, envolvendo serviços ou coisas móveis de pequeno valor são válidos, deduz-se que essa orientação, na vida prática, dará a oportunidade de uma sustentação jurídica de situação de fato, real, sobre cuja validade pouco se discute, conquanto, repise-se, se revele de suma importância na vida em sociedade até pelo volume quantitativo com que se apresenta.

Os autores nacionais não abordam o problema de maneira conveniente e satisfatória e, por outro lado, o Código Civil não dá a solução devida, por norma específica, obrigando o jurista a buscar explicações e soluções na parte geral.

E como, repita-se, também não há jurisprudência definida, somos do pensar que este trabalho, sobre levar a uma necessária reflexão que o assunto exige, poderá abrir caminho para se discutir solução normativa, até porque insta anotar que, quando se dispõe a elaborar trabalho de cunho científico, lógico, não se procura solucionar a matéria simplesmente à vista dos efeitos que ela apresenta, mas sim buscar a causa e a própria essência em sua constituição.

Portanto, no estudo da questão acerca dos menores absolutamente incapazes enquanto sujeitos de relações jurídicas de direito material, procuramos demonstrar que o elemento volitivo efetivamente existe na ação daqueles e atua no rumo de elaborar um ato jurídico informado pela boa fé, pela normalidade dos costumes, pelo interesse social, pela não ofensa ao interesse público e, sobretudo, pela autonomia da vontade privada.

Seria mais lógico e fácil, como acontece na vida prática judicial e na jurisprudência de um modo geral, atestar que os atos jurídicos elaborados pelos menores absolutamente incapazes são nulos simplesmente porque quanto à mente destes não há que se cogitar de vícios do consentimento, assim somente se falando de vício na formação estrutural do negócio.

Entretanto o trabalho mostra que a vida prática, mais que isto, exige reflexão a respeito dado o volume das relações jurídicas em que aqueles atuam diariamente e com absoluta normalidade quer quanto à sua formação, quer quanto à execução ou efeitos, inclusive revelando-se - tais relações jurídicas - como verdadeiro fator de sustentação de determinados segmentos econômicos da sociedade, os quais se conduzem voltados para a correspondente faixa etária (envolvendo aqueles incapazes), oferecendo-lhe e colocando à disposição produtos e serviços. Praticam os tais menores, portanto, nesses casos, negócios jurídicos cuja formação estrutural não padece de qualquer eiva.

Convém anotar ainda que, quando estudamos os problemas relativos ao direito de Família notadamente no que respeita ao casamento, concluímos que em determinadas situações o ato nulo e até o inexistente produzem efeitos válidos em atendimento aos fins sociais, compreensão que, mutatis mutandis, não tem porque não ser estendida para a presente proposição.

Por derradeiro é certo que o trabalho compreendeu, para o seu desenvolvimento, colheita de pesquisas em trabalhos diversos, livros, revistas, nacionais e estrangeiros, internet e em jurisprudência, pelo que conclui-se que o material é eminentemente bibliográfico.

Deixa-se assentado que o método usado é o dialético, de modo que apresentaremos a tese, a antítese e, finalmente, a síntese, e ainda que, como a lei é algo que denota uma realidade histórica na progressão do tempo, não poderemos deixar de invocar, também, o denominado método Histórico - Evolutivo, por pensar que o Direito enquanto ciência deve ser adaptado às exigências sociais imprevistas, assim como às sucessivas variações do meio.


CAPÍTULO PRIMEIRO

Sumário. 1. Noções Gerais. 2. capacidade e direito comparado. 3. limitações da capacidade. 4. capacidade para a prática de ato jurídico.

1. Noções gerais.

A conceituação doutrinária sobre personalidade e capacidade é tema que não sugere grandes debates.

Personalidade é a aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações (Caio Mário, in Instituições, vol. I, p.153).

E dí-lo Pontes de Miranda: é a capacidade de ser titular de direitos, pretensões, ações e exceções e também de ser sujeito (passivo) de deveres, obrigações, ações e exceções. Capacidade de direito e personalidade são o mesmo. E acrescenta: Ninguém pode manifestar vontade, ou criar cláusulas interpretáveis a respeito de todas essas matérias (Tratado de Direito Privado, Tomo 1, p.209).

A definição é derivada do artigo 2º do Código Civil. O início da personalidade civil do homem é o seu nascimento com vida, de acordo com o artigo 4º do mesmo diploma legal.

Uma vez afirmado e definido que todo homem é titular de direitos e obrigações desde o seu nascimento com vida, a lei adotou critérios para estabelecer em que condições pode o homem exercer pessoalmente a titularidade de uma relação jurídica. Tem-se então a divisão dos homens em absolutamente incapazes, relativamente incapazes e capazes.

O Código Civil, em seu artigo 5º relaciona os absolutamente incapazes, quais sejam, menores de dezesseis anos, loucos de todo o gênero, surdos-mudos que não puderem exprimir sua vontade e os ausentes, declarados tais por ato do juiz.

Os relativamente incapazes, elencados no artigo 6º do Código Civil são: os maiores de dezesseis anos e menores de vinte e um anos, os pródigos e os silvícolas.

Agente capaz, em contrapartida, é aquele que não se encontra nas situações dos artigos 5º e 6º do Código Civil e artigos 3º e 4º do novo estatuto civilista a entrar em vigor, as quais definem a incapacidade relativa e a absoluta, daí inferir-se que menores absolutamente incapazes são as pessoas com idade abaixo de dezesseis anos.

2. Capacidade e direito comparado

Os Códigos Civis Português e Italiano, menos severos, declaram que a maioridade civil se inicia aos 18 anos.

Em arremate a essa maior liberalidade, e como se verá adiante, no capítulo V, que trata dos atos jurídicos praticados por menores absolutamente incapazes, tem-se que, a exemplo do Código Civil Português, o suíco e o alemão entendem que menores absolutamente incapazes são aqueles que ainda não completaram sete anos de idade e o italiano, por seu turno, não define a idade da incapacidade absoluta mas apenas declara que qualquer que seja o menor, os seus negócios jurídicos só serão anulados se lhe trouxerem prejuízo. Já nos Estados Unidos (Código Civil, artigo 301) e na Inglaterra, a incapacidade absoluta termina aos quatorze anos de idade.

Com a divisão - entre incapacidade absoluta, relativa e capaidade - teve o legislador a intenção de proteger os incapazes, sejam eles absolutos ou relativos, preservando os seus interesses, em virtude que lhes falta a completa maturidade para discernir e praticar os atos de sua melhor conveniência. Essa maturidade completa e capacidade integral para o exercício de atos jurídicos somente é adquirida aos vinte e um anos de idade, segundo o critério objetivo adotado pelo legislador - artigo 9º do Código Civil, afora os casos de emancipação ditados pelo mesmo artigo. O critério objetivo da idade para dividir as capacidades é conveniente já que seria extremamente desgastante e inviável a realização de exames médicos ou psicológicos em cada indivíduo para se determinar se este já atingiu o grau de discernimento compatível com a prática pessoal dos atos civis.

Fala-se então em capacidade de gozo e em capacidade de exercício, sendo esta a que habilita o indivíduo a exercer pessoalmente os atos da vida civil, e aquela a capacidade dos absolutamente ou relativamente incapazes que, embora titulares de direitos e obrigações, não podem exercê-los pessoalmente, necessitando de representação ou assistência.

3. Limitações da capacidade

Segundo Orlando Gomes, a capacidade de direito ou de gozo confunde-se, hoje, com a personalidade, porque toda pessoa é capaz de ter direitos. Ninguém pode ser totalmente privado dessa espécie de capacidade. Não obstante, admitem-se restrições de caráter especial. Há pessoas que são privadas do gozo de certos direitos.

E mais: as limitações da capacidade de fato prendem-se ao estado da pessoa. São de ordem física ou jurídica. Produzem incapacidade geral, ou incapacidade parcial, e incapacidade absoluta e relativa. Ora impedem totalmente o exercício dos direitos, ora inabilitam a pessoa à prática de um ou vários atos jurídicos. A natureza da causa impeditiva influi do modo de suprir a incapacidade.

Dessume, prossegue o autor, que a incapacidade para o exercício dos direitos consta de preceitos legais de ordem pública, que abrem exceções à regra geral da capacidade. A lei priva da capacidade as pessoas que presume não tenham discernimento necessário para a prática de alguns ou de todos os atos jurídicos. A incapacidade não tem, desse modo, a mesma extensão. Ora se impõe à pessoa em relação a todos os direitos civis, ora a alguns ou ao modo de exercê-los. Divide-se, conseqüentemente, em incapacidade absoluta e incapacidade relativa. Admite-se ainda a incapacidade natural que é a incapacidade de entender e de querer, que não está judicialmente declarada (o interdito ainda não declarado tal por ato do juiz). (Introdução ao Direito Civil, 9ª ed. Forense: Rio de Jneiro, 1987, p.140/150)

4. Capacidade para a prática de ato jurídico

A incapacidade absoluta consiste na impossibilidade do exercício dos atos da vida civil. Suas causas ligam-se ao estado individual da pessoa: a idade e a saúde.

A capacidade legal, muitas vezes, é um fictio legis, pois, em casos tais, nem sempre o sujeito é desprovido do querer e do discernimento. É o que ocorre, por exemplo, no caso dos ausentes, no de certos menores, além de outras situações.

Portanto, quando a lei traça os limites de capacidade da pessoa, fácil se torna a aferição objetiva em cada caso concreto, e isso é evidente. No entanto, quando a pesquisa há de ser feita nas lindes da capacidade natural, o problema se torna bastante crucial em certos casos, mesmo porque, conforme sabemos, a mente humana é deveras complexa.

Tomando-se como base essa orientação concluímos que a vontade, nas declarações alusivas aos atos jurídicos, deverá se revestir das características da vontade válida, não podendo ter vícios que a maculem.


CAPÍTULO SEGUNDO

Sumário. 2.1. Noções gerais. 2.2. Fatos que independem da vontade. 2.3. Fatos que dependem da vontade. 2.4. Fatos jurídicos em sentido estrito. 2.5. Fatos voluntários ilícitos. 2.6. Direito subjetivo.

2.1. Noções gerais

Todo acontecimento que, dependente ou não da vontade humana, produz efeitos jurídicos, é denominado fato jurídico. Portanto, na ampla variedade de resultados, uns são juridicamente relevantes e outros não o são. Por isso, estes últimos são denominados, simplesmente, fatos ou fatos não jurídicos, pois não afetam o mundo do direito, enquanto outros despertam interesses jurídicos.

No entanto, determinados efeitos naturais, que não causam repercussão no campo do direito, poderão se transformar em fatos jurídicos. Assim, por exemplo, certos fenômenos da natureza, quando não interferem na esfera jurídica, são conhecidos, tão somente, como fatos naturais, ou atos não jurídicos. Mas, por outro lado, se esses mesmos fenômenos afetarem o mundo do direito, passarão a pertencer à categoria dos fatos jurídicos, pois deixaram os domínios dos naturais, ao atingirem objetos tutelados pela lei, e passaram à denominação de fatos jurídicos.

Por isso, definimos fato jurídico como todo acontecimento, natural ou emanado do homem, capaz de produzir resultados na órbita jurídica, isto é, determinados resultados que causem o nascimento, a modificação ou a extinção de um direito.

Na verdade, conforme expõe Washington de Barros Monteiro, todos os direitos procedem de algum fato, - ex facto ius oritur - positivo ou negativo, e se extinguem quando ocorre alguma circunstância prevista na lei acarretando-lhe o perecimento. A esses acontecimentos, diz ele, denominamos fatos jurídicos (lato sensu). Alguns desses fatos independem da vontade humana, ou a vontade a eles concorre de modo indireto, como ocorre com o nascimento, a morte e a maioridade, o decurso do tempo, o caso fortuito, a força maior, etc. Outros produzem efeitos de acordo com a vontade do homem e, assim, são denominados atos jurídicos e outros, ainda, produzem efeitos jurídicos, porém sem qualquer atenção ao elemento psíquico interno e, por isso, denominados são de atos ilícitos. (Monteiro, Washington de Barros, Curso de Direito Civil: Parte Geral, I. v., 18. ed. São Paulo, Saraiva, 1979, p.164).

Para Orlando Gomes, fato jurídico é todo acontecimento, dependente, ou não, da vontade humana, a que o Direito atribui eficácia. No sentido restrito, a manifestação de vontade que provoca efeitos jurídicos, denominando-se então ato jurídico. Na acepção lata, o fato jurídico engloba o ato jurídico; na estrita, a ele se opõe. (Gomes, Orlando, Introdução ao Direito Civil, v. I, ed. Rio de Janeiro, Forense, 1987, p.209).

Entretanto, no decorrer da exposição, demonstrar-se-á que o ato ilícito produz efeitos jurídicos e, evidentemente, em sua pesquisa não poderá ser abandonada a atenção ao elemento psíquico interno.

O fato de não pretender, o sujeito, a sanção imposta na lei não significa falta do requisito voluntário da formação do ato ilícito.

Diante do que foi exposto, conforme prepondera a melhor teoria, ato ilícito é ato jurídico e, portanto, mister se faz a admissão da inclusão do elemento voluntário em sua formação.

Dessa maneira, pelo que foi enfocado, não distingue o doutrinador os fatos jurídicos voluntários dos atos jurídicos, pois se limita a expor que os atos jurídicos são as ações humanas.

Deixa anotado também que outras ações produzem efeitos jurídicos, porém sem qualquer atenção à vontade: são os atos ilícitos.

Porém somos do entender que há certos acontecimentos que dependem da vontade humana mas que, entretanto, se classificam como fatos jurídicos. Em contrapartida há resultados emanados da vontade que constituem atos ilícitos e, na realidade, são atos jurídicos como oportunamente se analisará.

Parafraseando Teixeira de Freitas, o doutrinador Vicente Ráo ensina que os fatos jurídicos se dividem em fatos (voluntários e involuntários), sendo os voluntários classificados em lícitos e ilícitos e, quando os lícitos têm por finalidade a aquisição, a modificação, ou a extinção de direitos, são designados atos jurídicos.(Teixeira de Freitas, Augusto, Esboço, "In" Vicente Ráo, Ato Jurídico. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1979, p.12).

Poder-se-ia então questionar, aqui, a respeito dos atos praticados por aqueles que não desfrutam do querer e, portanto, não praticam ação, face à inexistência do elemento volitivo. São eles agentes de atos jurídicos, mesmo constatada a ausência dos requisitos formadores da vontade ? Essa questão, de certa complexidade, será analisada no capítulo referente à vontade na formação do ato jurídico.

Pela lição de Serpa Lopes afere-se que os fatos em geral têm sentido muito amplo, compreendendo todos os fatos da natureza ou os humanos relacionados com o homem na sociedade. Esses fatos poderão ser simples, como o nascimento, a morte, ou complexos, como ocorre com a posse ad usucapionem. Em seguida expõe que, no conceito de Savigny, reproduzido por Clóvis Bevilaqua, fatos jurídicos são determinados acontecimentos, em virtude dos quais as relações de direito nascem e se extinguem. Classifica-os, com H.Capitant, em: a) independentes da vontade; b) - voluntários. Explica que estes últimos se dirigem à aquisição ou à perda de um direito (relações contratuais) ou, embora tenha a vontade atuado, há impossibilidade de afirmação a respeito da intenção na reprodução de efeitos jurídicos, em relação aos atos ilícitos. (SERPA LOPES, José Maria de. Curso de Direito Civil. I. v., 3. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1960, p.385).

O magistério de Pontes de Miranda expõe que os fatos não jurídicos são os denominados materiais, ou energéticos, econômicos, políticos, de costumes, morais, artísticos, religiosos, científicos. Na medida em que entram no mundo jurídico passam a denominar-se de fato jurídico. Por assim ser, são jurídicos quaisquer fatos (suporte fáticos) que entrem no mundo jurídico, sem exclusão. (PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado: Parte Geral. Tomo II. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1983, p.183).

Realmente jurídico é qualquer fato que cause repercussão no mundo do direito. E ainda, depois de se encerrar a definição de fato jurídico, seguindo a lição de Savigny, Limongi França preleciona que esses fatos são de ordem natural, nos quais não há a intervenção da vontade humana, como acontece com o nascimento, a morte, o caso fortuito. Outros nascem por arbítrio do sujeito, como ocorre com os atos jurídicos, os quais denomina de atos jurídicos em sentido estrito, para diferenciá-los dos fatos jurídicos em geral e, por fim, trata dos fatos que independem da vontade do sujeito, e que se definem como atos ilícitos, cujos efeitos estão preordenados na lei, como pode ser verificado com a reparação prevista para o caso de dano. Por fim, menciona o autor uma terceira classe, onde se encontra um fato natural (residência), ligado a um fato de vontade (ânimo definitivo), como se infere com aquisição de domicílio (artigo 31 do Código Civil e artigo 70 do Novo Estatuto). (França, Rubens Limongi. Manual de Direito Civil, 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980, p.252).

O doutrinador Cunha Conçalves define que há fatos jurídicos de efeitos indiretos, ficando o autor sujeito a obrigações não queridas, como os verificados nos delitos, nos quase-delitos e até nos quase-contratos. Nos primeiros não há manifestação da vontade, mas sim um desfalecimento dela, como os oriundos da negligência, da imprudência e da imperícia (CUNHA CONÇALVES, Luiz da. Princípios de Direito Civil Luso-Brasileiro. v. I. São Paulo: Max Limonad, 1931, p.190).

Obviamente que seria desvirtuar a culpabilidade subjetiva afirmar que não há manifestação de vontade nos casos de negligência, imprudência ou imperícia, pois sabe-se que em tais procedimentos, embora a vontade não vise diretamente o resultado, ela existe, pois está voltada à conduta perigosa causadora do dano.

2.2 Fatos que independem da vontade

Segundo Carvalho Santos, em análise ampla, fato é todo acontecimento que independe da vontade humana e se opõe a ato, que gera resultado voluntário. (CARVALHO SANTOS, J.M. Código Civil Brasileiro Interpretado. 7. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, v. II, 1958, p.213).

Dessa forma, os fenômenos naturais poderão ser chamados de fatos, pois, para sua produção, não há envolvimento da vontade humana.

Para Vicente Rao, o conceito de fato jurídico compreende três categorias: a) fatos exteriores que independem da vontade; b) fatos voluntários cuja disciplina e cujos efeitos são determinados exclusivamente por lei; c) fatos voluntários (declarações de vontade) dirigidas à consecução dos efeitos práticos que, de conformidade com a lei, deles decorrem. Os fatos voluntários são, também, denominados fatos jurídicos em sentido estrito. (RAO, Vicente. Ato Jurídico. 2. ed. São Paulo: Saraiva, p.20).

2.3 Fatos que dependem da vontade

Tais fatos, também chamados de fatos conforme a vontade humana, ou voluntários, se subdividem, segundo Santoro Passarelli, em fatos jurídicos em sentido estrito e nos denominados atos jurídicos.

Para o jurista italiano, esses fatos, classificados como de sentido estrito, ou fatos jurídicos stricto sensu, seriam os acontecimentos resultantes de fenômenos naturais, ou aqueles que, embora dependentes da participação do homem, são obras do acaso, como ocorre com a descoberta de tesouro.(PASSARELLI, Francesco Santoro. Teoria Geral do Direito Civil. Tradução de Manuel de Alarcão. Coimbra: Atlântica, 1967, p.12).

Aduz ainda que os atos jurídicos são aqueles dependentes da vontade humana, voltados para os resultados pretendidos, pois, embora declarem a vontade, essa é tutelada pelos ordenamentos legais, por cujas conseqüências o usuário eventualmente arcará.

Porém quanto aos atos negociais a vontade é dirigida aos efeitos práticos pretendidos pelo homem, porquanto essa vontade delimita o conteúdo da relação jurídica em face da autonomia privada.

2.4 Fatos jurídicos em sentido estrito.

Ainda Passarelli justifica a inclusão que faz nos fatos jurídicos em sentido estrito, ou simplesmente nos fatos jurídicos, de certos acontecimentos por atos do homem, tais como: edificação, plantação, descoberta de tesouro etc., acrescentando que o fato humano, em casos tais, não tem indagação a respeito da capacidade de agir do sujeito, ou seja, do elemento psíquico: consciência da ação.

Na opinião de alguns autores, todavia, os fatos voluntários podem se caracterizar como fatos jurídicos stricto sensu quando os efeitos a serem atingidos já estão preordenados na lei, motivo pelo qual se denominam fatos voluntários lícitos. Por isso que, na opinião deles, os fatos voluntários seriam, então, aqueles para os quais a vontade do agente não se dirige aos fins queridos, mas tão somente ao comando regulado pelo ordenamento legal.

Conclui-se então que nesses casos o sujeito não endereça sua vontade aos fins colimados por seu interesse e sim à finalidade prescrita na lei. Nesses fatos não se pesquisa a capacidade de agir do sujeito, mas tão somente a sua capacidade de querer. O agente quer praticar a ação, mas não pretende a imposição do princípio sancionador regulado pela norma, porém, é óbvio, a ele se sujeita, pois a vontade da lei é que impera. Por imperar essa vontade legal e não a vontade do agente é que se está diante de um acontecimento denominado de fato jurídico em sentido estrito.

No que se refere aos fatos jurídicos em sentido estrito, ou de efeitos indiretos, aparece a gestão de negócios, vista, obviamente, pelo lado do gestor e, com relação aos fatos jurídicos voluntários ilícitos, surgem os delitos e os quase-delitos. Essa denominação de fato jurídico stricto sensu é adotada por aqueles que propugnam pela teoria unitária.

Em contrapartida os adeptos da teoria dualista preferem a designação de ato jurídico stricto sensu e a de negócio jurídico.

Não obstante, em sentido amplo, fato jurídico é qualquer acontecimento, ao qual a lei reconhece certa repercussão no mundo jurídico, ao contrário de fato simples, que não atinge o campo do direito. Estes não produzem qualquer fenômeno no direito, pois as normas que os regulam são simplesmente morais; mas, conforme já colacionado, se algum desses fatos normais produzir resultado a demandar análise no mundo do direito, ele se definirá como jurídico.

Sob esse prisma Barassi ensina a diferença entre fato e ato jurídico, digredindo que, em sentido amplo, fato jurídico é qualquer acontecimento, ao qual a norma prevê uma modificação no mundo jurídico.

No sentido menos genérico e mais próprio, fato jurídico é todo acontecimento que não seja ato jurídico ou negócio jurídico. Este é uma declaração apta a produzir efeitos jurídicos. São fatos jurídicos em sentido estrito uma notificação, ou declaração de ciência, o nascimento, a morte, o decurso do tempo, o perecimento de frutos. (BARASSI, Lodovico. Instituzioni di Diritto Civile. 4. ed., Milano: Dott, A. Giuffré Editore, 1948, p.113: "In sensu ampio, fatto giuridico é quelqunque evento a cui la norma ricollega la formazione o la modificazione, oppure lëscuzione della formazione cc. Di un rapporto giuridico. In senso meno generale e pi proprio "fatto giuridico"o "negozio giuridico". Questultimo é una dichirazione intesa a produrre effetto giuridico. Sono dunque fatti giuridici in senso stretto una notificazione o una dichirazione di scienza (n.51 in fine); oppure la náscita, la morte, il decorso del tempo, la perezione dei frutti".

2.5 Fatos voluntários lícitos

De absoluta normalidade assinalar que fatos jurídicos voluntários há que se definem como lícitos e outros, entretanto, como ilícitos. Essa classificação é aceita por aqueles que entendem estar o ilícito integrado como fato jurídico e não como ato jurídico.

Vários doutrinadores prelecionam que o ato ilícito não é ato jurídico, pois o próprio termo "ilícito" já está a demonstrar que não o é, porque ilícito é o antijurídico e, portanto, deixa de ser jurídico.

Tais pensadores, como se sabe, enfrentam a questão pelo lado do direcionamento da vontade, sob a argumentação de que a voluntariedade, no ato ilícito, não se objetiva aos interesses do autor, pois ele nem mesmo aceita os efeitos previamente determinados pelo ordenamento jurídico, por não pretender a respectiva penalidade. Por isso é a conclusão: não se classificando como ato jurídico, o ilícito integra, simplesmente, a categoria dos fatos jurídicos, por não serem os seus efeitos buscados pela vontade do agente.

Evidentemente, pela posição exposta, tais resultados seriam definidos como fatos jurídicos em sentido estrito, porque a vontade estaria preordenada na lei e, dessa forma, o autor seria obrigado a pautar sua vontade àquela tutelada pela norma.

Entretanto o entendimento que aqui se adota é o de que, se o ilícito provém da vontade humana, causando determinados efeitos no mundo jurídico, é normal e lógico que não deixa de ser um ato jurídico. Negar ao ilícito a qualidade de ato jurídico, sob alegação de que o sujeito não pretende a sanção imposta pela lei, seria desvirtuar o conceito de ato jurídico, que nada mais é do que a dinamização da vontade no mundo exterior, produzindo efeitos jurídicos. O ilícito é, também, manifestação voluntária e produz modificação no mundo do direito, motivo por que não deixa de ser um ato jurídico.

O professor Francisco Ovidio, ao enfocar o assunto, o fez com o título: Os atos ilícitos são atos jurídicos ? no qual ele esclarece com precisão que as posições doutrinárias favoráveis à inclusão dos atos ilícitos na categoria dos atos jurídicos são abundantes. Afirma haver Hans Kelsen mostrado que a tendência de excluir do campo do direito o ilícito (não direito) representa pensamento ingênuo e pré-científico e, por isso, arremata que o Projeto de Lei nº 634-B, de 1975, referente ao Novo Código Civil Brasileiro, então já aprovado pela Câmara dos Deputados, colocara a questão enfocada de maneira coerente com a melhor doutrina. (OVÍDIO, Francisco. Os atos ilícitos são atos jurídicos ? O Estado de S.Paulo, São Paulo: Tribunais, 21/2/1985. p.28).

Finalmente deve-se deixar claro que o Projeto do Código Civil dispunha - e acabou sendo integralmente acolhido - no Livro III, títulos I, II e III sobre os fatos jurídicos, distingüindo três espécies: os negócios jurídicos (art. 104 e seguintes), os atos jurídicos lícitos (art.185) e os atos ilícitos (art.186 e seguintes), superando-se aquilo que Miguel Reale considera uma sinonímia rigorosa e cabível entre ato ilícito e ato jurídico. (REALE, Miguel, Lições Preliminares de Direito, São Paulo: Saraiva, 1995, p.202).

Na visão de Pontes de Miranda, com a precisão de sempre, este pondera com grande propriedade que, o ato ilícito entra no mundo jurídico como situação que a regra jurídica previu, como se verifica com os fatos lícitos, pois o direito tanto se preocupa com os atos lícitos, que acolhe e regula, quanto com os atos contrários a ele, que ele tem de colocar no seu mundo (que é o mundo jurídico), em vez de previamente o repelir e os deixar fora do mundo (PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti, op.cit., p.202).

Eduardo Espínola, abordando a teoria da vontade, deixa entender que sendo ela a fonte geradora dos direitos e das obrigações, orienta a ação humana, seja ao objetivo do ato lícito, seja em relação ao ilícito, porquanto a vontade é o escopo final de todo direito, pois o direito é substância dessa vontade, já que a integram as capacidades de querer e de discernir, porque é através delas que os atos se concretizam e se tornam atos jurídicos (ESPÍNOLA, Eduardo, Tratado de Direito Civil Brasileiro, São Paulo; Freitas Bastos, 1941, p.203).

Logicamente ao se acolher a expressão negócio jurídico, estar-se-á admitindo que o ilícito é ato jurídico porque, embora a vontade do agente esteja preordenada na lei, no momento da ação, é certo que ele a endereçou ao objetivo visado, ou seja, à prática do ilícito.

Deixar de conceituar o ato ilícito como ato jurídico seria desvirtuar o papel da vontade na formação do ato, sob a fundamentação de que o autor não pretendia a sanção imposta na regra.

A circunstância de o agente não pretender arcar com os gravames derivados de seu procedimento não significa ausência de vontade à prática desse mesmo procedimento.

Bem de ver que, todo indivíduo com capacidade, medida esta pela média dos homens, homo medius, poderá praticar ato jurídico, seja lícito ou ilícito. Tanto que, conforme é sabido, não dispõe dessa faculdade aquele, ao qual falta, justamente, o elemento volitivo.

Ao se afirmar que o sujeito praticou um ilícito, o que se quer é passar a idéia de que ele produziu um fenômeno no mundo jurídico e esse procedimento, por estar assim conceituado, não poderá deixar de ser denominado de ato jurídico.

Seja o direito o princípio de inspiração divina, ou a adequação do homem à vida social, o certo é que sem ele não poderia o homem viver em sociedade.

De outro lado, analisando o direito sob a ótica objetiva, ou sob a forma de direito natural, a lógica leva a admitir que, sendo o direito natural fonte de onde emana a norma positiva, todo homem poderá agir para defender um direito seu e, também, poderá provocar um ataque a direito alheio, produzindo o que denominamos de ilícito. Em qualquer das hipóteses, todavia, ele criou um resultado, integrante do universo jurídico, e esse evento não poderá ser retirado de seu verdadeiro habitat.

2.6 Direito subjetivo.

A facultas agendi já não mais satisfaz à definição do chamado direito subjetivo, pois, consoante poderá ser aferido, há exemplos de titulares de direito subjetivo que, entretanto, não têm a faculdade para agir. É o caso, por exemplo, do feto, do louco, aos quais falta o discernimento ou a própria vontade, ou ambos. Tais sujeitos, por óbvio, embora titulares de direitos, não apresentam condições para defendê-los.

O artigo 4º do Código Civil (artigo 2º do Novo Código) é taxativo no sentido de que a lei põe a salvo os direitos do nascituro, demonstrando, dessarte que, embora inexistente da faculdade para a prática da ação garantidora, tem o nascituro o direito subjetivo, traduzido, é evidente, na norma positiva.

Não compreendemos que o direito se confunde com o Estado, isto é, com o sistema de normas ditadas pelo poder público, pois se assim fosse, teríamos que admitir a inexistência de prerrogativas individuais em relação a esse Estado. Sabemos que assim não é. Tanto é certa a negativa, que a própria Constituição Federal dita normas alusivas aos direitos fundamentais, bem como às garantias individuais, até mesmo contra o próprio poder estatal.

Não obstante o direito receba batismo da própria norma, é certo que ele nasce com o homem, no momento em que este se houve em relacionamento com outro indivíduo da mesma espécie.

Enquanto Duguit e Kelsen negam o direito subjetivo, a própria vida do direito mostra que é impossível a separação entre a lei e a individualidade, pois aquela nasce em decorrência dos direitos inerentes a esta. Não poderia ser formulada uma regra, caso não existissem, antes, os direitos subjetivos, a fim de serem por ela amparados. Kelsen vê no direito uma ordem de coação, motivo pelo qual enxerga a força estatal como garantidora do cumprimento da norma (KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução de João Batista Machado. 2ª ed.Coimbra; Aménio-Amado, 1962, p.86: "É de rejeitar-se uma definição de direito que o não determine como ordem de coação).

Daí concluir-se, portanto que, o Estado, antes de tudo, é substituto da vontade das partes, na garantia da tutela jurídica.

Para que possamos amparar nossos direitos subjetivos, evidentemente, necessitamos de segurança, não como o fim em si mesma, mas como meio à consecução de uma determinada finalidade. Ela é a trilha que nos conduz ao resultado certo; o foco luminoso que nos leva a palmilhar a vereda até o início do túnel. Sem a segurança não poderíamos caminhar com firmeza sobre o desconhecido e, no mundo jurídico, da mesma forma a segurança determina a rota de nossas metas. No âmbito objetivo é ela o caminho firme para a busca da finalidade. É a bússola de orientação ao navegante; é a estrela que dirige a marcha dos Reis Magos à casa do Nazareno; é o Cruzeiro do Sul que orienta, à noite, o canoeiro, perdido nas grandes águas, ao encontro do rumo para o acampamento.

Porém, nos domínios do subjetivo, ela se entrelaça com a certeza e, portanto, quando sentimos segurança, em nosso mundo interior, passamos a ter certeza de que estamos aptos a conseguir o resultado almejado.

Por isso que, a norma nos dá a segurança e a certeza para garantia de nossos direitos subjetivos. A segurança legal, dentro da segurança jurídica, nos leva à certeza, a qual, também, sofre variações, dentre os povos, por apresentar-se quanto à classificação, entre certeza no sentido objetivo e no subjetivo. Algumas línguas a conceituam por uma só forma. No latim sua definição é certitudo; no italiano certezza; no alemão gewissheit. Outras línguas a definem sob dois prismas, subjetivo e objetivo. Assim, a espanhola a conceitua subjetivamente como certitumbre e certeza no mundo objetivo; a inglesa dispõe do termo certitude para a definição subjetiva e certainity para a objetiva.

No Brasil, a certeza tem conteúdo do subjetivo porque a sentimos em nossa convicção íntima.

Santo Tomás de Aquino dá algumas definições de certeza: a) baseada na causa (a fé é mais certa que o saber); b) certeza baseada no objeto (o que melhor se adere ao conhecimento). Para ele a certeza é virtude do conhecimento. Mas, afirma referido sábio que, para a prática do exercício do conhecimento devem as coisas conhecidas se encontrar no interior de quem realmente as possa conhecer. (MACEDO, Sílvio de. Enciclopédia Saraiva: Direito e certeza. São Paulo; Saraiva, v.5 p.149).

É certo que a justiça, na relação valorativa, se sobrepõe à segurança, mesmo porque o fim último do homem é a busca da verdade. A justiça é verdade e está acima do direito material. O direito nem sempre é o justo, podendo este ser buscado no direito natural, e nem sempre no objetivo. Por esse lado, reconhecemos com Graf Zu Dohna, na teoria do meio justo para um justo fim (princípio de justiça), inspirada na teoria do direito justo de Staimmler, ou das normas de cultura de Mayer, que a certeza, como meio justo, para obtenção do justo fim (a justiça), é o fundamento desta. (HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal, v. I, 3ª ed. Rio de Janeiro, Forense, 1955, p.20).

Para tanto, às vezes o julgador tem de deixar as incertezas da regra e decidir de acordo com a razoabilidade, ou seja, no campo da lógica do razonabe, pois, segundo Siches, a interpretação da norma requer alusões a princípios axiológicos e critérios valorativos que, muitas vezes, não estão inseridos na lei, motivo pelo qual deverá o julgador buscar elementos nas altas dimensões informadoras do razoável. (SICHES, Luis Recaséns, Experiência jurídica. Naturaleza de la cosa y lógica razonable. México; Fondo de Cultura Econômica, 1971, p. 536).

O direito subjetivo é, pois, tão visível que, se atentarmos para os direitos fundamentais, notaremos que, antes mesmo da norma positiva, ele já se estampa aos olhos como amparo à resistência e à opressão. É ele o verdadeiro princípio de justiça, ligado à liberdade e à igualdade. Por isso preleciona Jorge Miranda que ele apresenta a postura abstrata, um indivíduo sem individualidade.(MIRANDA, Jorge, Os direitos fundamentais. Sua dimensão individual e social na Constituição portuguesa. Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política. São Paulo; Revista dos Tribunais, v. I, n. 1, p.198, out/dez.1992).

Dessa forma, o direito subjetivo é a representação natural de justiça e, portanto, da verdade, lastreado no direito natural que é o conjunto de princípios supremos e necessários, inspiradores do direito positivo, no dizer de Vicente Ráo. (RAO, Vicente. O direito e a vida dos direitos. v. I. tomo I. 2ª ed. São Paulo; Resenha Tributária, 1976, p.140).

Sintetizando: o direito subjetivo é anterior ao direito objetivo. Não poderia este existir sem aquele. O subjetivo, fruto do Direito Natural, do princípio de justiça, é o ser do qual o objetivo é retrato.


CAPÍTULO TERCEIRO

SUMÁRIO. 3.1. Noções Gerais. 3.2. A vontade no ato jurídico. 3.3. A vontade no ato jurídico stricto sensu. 3.4. Ato jurídico e negócio jurídico. 3.5. A autonomia da vontade. 3.6. Teorias da vontade e da declaração. 3.7. Incapazes de praticar ato jurídico válido.

3.1 Noções gerais

Nosso Código Civil define ato jurídico como todo ato lícito que tem por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos. É um ato emanado da vontade do homem e, por isso, ao produzir efeitos queridos pelo agente, se denomina ato jurídico. O novo Código a entrar em vigor não definiu expressamente o ato jurídico preferindo incluí-lo na estrutura do negócio jurídico ao qual o equipara, desde que lícito, e cujos elementos constitutivos são os mesmos definidos no estatuto ainda em vigor.

Clóvis Bevilaqua, remontando ensinamentos de Savigny, assevera que a idéia de conservar direitos foi substituída pela de resguardar, a qual, no entanto, não tem a mesma extensão. Segundo ele, tal supressão justifica-se, segundo a autoridade de Savigny (n.104, nota, letra b); porém é bem de ver que, entre o nascimento e a extinção e direito, está, forçosamente, a sua existência, e esta vivência do direito exige, em certas situações, para o fim de ser mantida, atos que a visem conservar, como sói acontecer, com o protesto, a ressalva, a retenção, o seqüestro e a interrupção da prescrição (BEVILAQUA, Clóvis, Código Civil dos Estados Unidos do Brasil, 4ª ed. Rio de Janeiro; Paulo de Azevedo Ltda., 1931, p.328).

O ato jurídico deriva, necessariamente, da ação do homem, ou seja, da declaração de vontade, e produz resultados reconhecidos pelo direito. O mesmo ocorre, também, com o ato ilícito, que se origina da ação humana, causando danos a outrem, produzindo, entretanto, efeitos desejados pelo autor, embora não querida a sanção legal.

Dessa forma, o ato jurídico poderá ser ou não conforme o direito positivo. Se se apresenta em conformidade com a lei é um ato lícito, pois o ordenamento permite a atuação do agente para a efetivação da conduta. Se é contrário ao direito posto, isto é, se o autor não pauta sua conduta de acordo com a norma, nasce um ato ilícito, reprovado pela estrutura legal.

Os atos jurídicos, consoante classificação feita pela doutrina, se subdividem em: a) atos materiais; b) participações.

Exigem os primeiros, para a perfectibilização, além da emanação da vontade, uma atuação material. Dois portanto, são seus elementos: um de ordem interna, representado pela vontade e o outro consubstanciado por um ato material. Indispensáveis são, portanto, à constituição desses atos, os dois requisitos, um de natureza subjetiva e outro de constituição objetiva.

As participações se originam pela declaração e, segundo Orlando Gomes, para a ciência de intenção ou de fatos. Nessa classificação, entretanto, que poderíamos apontá-la como pertencente aos atos jurídicos em sentido estrito, o referido doutrinador menciona a "destinação", sob a lição de que o autor do ato, em casos tais, dá conhecimento a outrem - o destinatário - de que tem certo propósito ou ocorreu determinado fato. O objetivo é, pois, dar ciência a alguém a respeito de certo acontecimento ou de um desejo. (GOMES, Orlando, Introdução ao Direito Civil, 6ª ed. Rio de Janeiro; Forense, 1979, p.287).

Todavia, ao se assinalar ato jurídico em sentido estrito, demonstra-se que se adentra à teoria dualista e, assim sendo, deixaremos essa análise para ser feita no momento em que for tratado da vontade no ato jurídico, bem como da diferenciação entre ato jurídico e negócio jurídico.

3.2 A vontade no ato jurídico

Integrante do ato jurídico, denominado vontade, o elemento volitivo se caracteriza pelos requisitos: a) vontade propriamente dita (elemento interno); b) declaração da vontade (elemento externo).

Assim, essa vontade negocial se dirige aos efeitos práticos, tutelados pelo ordenamento jurídico, tendo o sujeito a intenção de que referidos efeitos se concretizem.

A escolha, portanto, dos resultados pretendidos é da própria vontade do agente e não da vontade implícita da lei.

Em contrapartida, quando o querer do agente não pode fazer a escolha, isto é, quando ela fica adstrita ao ordenamento jurídico, dizemos que o sujeito não pratica um ato jurídico, mas tão somente um fato jurídico em sentido estrito, ou um ato jurídico stricto sensu, caso estejamos, neste último caso, filiados à corrente dualista.

De maneira que, na formação do ato jurídico, a vontade prepondera. Por isso, então, afirmamos que, no ato jurídico o sujeito, através de sua vontade, faz a escolha dos efeitos pretendidos, enquanto que, nos fatos jurídicos em sentido estrito predomina a vontade da norma, sem direito ao agente dessa escolha.

Por tudo isso podemos asseverar que a vontade desempenha o papel mais relevante no estudo dos atos jurídicos, quer se trate dos atos lícitos, que dos ilícitos.

A vontade, além de constituir um elemento estrutural do ato, dando-lhe vida, concretiza seus efeitos, motivo pelo qual se destaca, nitidamente, da vontade formadora do fato jurídico em sentido estrito, onde ela não tem força preponderante para que o sujeito possa alcançar os resultados queridos, porque a ele não é permitida a escolha desse querer, por sujeitar-se à vontade da norma.

Dessa forma pode-se afirmar que a estrutura do ato jurídico se perfaz em três vértices, em um verdadeiro actum trium, consubstanciados pelo ato de vontade, para os efeitos queridos e, finalmente, pela aprovação da lei.

Faltando um desses três requisitos, não mais poderemos apontar a existência do ato, ou do negócio jurídico. Aqui, a posição do analista é mais filosófica e matemática do que, propriamente, jurídica e isto porque dos enunciados decorrem os resultados matematicamente na medida daqueles.

Portanto, com relação ao elemento volitivo, conclui-se que, no ato jurídico, ou no negócio jurídico, a vontade ditada pelo sujeito escolhe os efeitos queridos, enquanto que nos fatos jurídicos, ou nos atos jurídicos stricto sensu ela adere à vontade consubstanciada na norma.

Daí decorrer que a vontade é, pois, a alavanca que sustenta a formação dos atos jurídicos. Por isso, razão assistia aos juristas que afirmavam que a vontade é a raiz metafísica do mundo e da conduta humana; porém, ao mesmo tempo, é a fonte de todos os sofrimentos.

Diante disso, quando se refere à vontade, pretende-se aduzir que, além do querer - elemento volitivo - necessário é convir que imprescindível se faz a presença, também, do requisito discernimento, marcado pelo entendimento ou elemento inteligente. Sem essa formação não nos é possível conceber a idéia do princípio volitivo. Poderemos, até mesmo, conciliar ao lado do entendimento o mecanismo da intuição, os quais caminham lado a lado, cuja simbiose desencadeia o aperfeiçoamento intelectivo.

De fato pode-se afirmar que a vontade que integra os atos jurídicos deverá ser originária, em regra, de pessoa dotada de capacidade, a fim de que possa comandar e dar validade às pretensões do agente.

Diante disso preleciona Ramón Domingues Aguia que a vontade, quando objetivada a um efeito jurídico, não pode ser manifestada por alguém que não esteja em perfeito juízo, como ocorre com o alienado, ou com a criança de pouca idade. Dessarte, caso isso ocorra, o ato jurídico carecerá de vontade negocial.(AGUILA, Ramón Domingues. Teoria General del Negócio Jurídico. Chile, Editora Jurídica de Chile, 1977, p.12)

A conduta humana pode se comportar ou não com o direito e, em qualquer dessas situações, ela é a força criadora do ato jurídico, quer seja ele lícito ou ilícito. Quando afirmamos que o ato é voluntário, evidentemente estamos a nos expressar no sentido de que a vontade deu propulsão ao ato, fazendo-o nascer. Se a vontade é dirigida aos efeitos queridos pelo autor, ou, por outro lado, se ela está afeta aos resultados preordenados na norma, ou ainda se ela não aceita a sanção imposta na lei, tudo isso são conclusões que mais levam a admitir a integração da vontade em todos os atos jurídicos.

Assim, todas as vezes que temos em mente um ato jurídico, a primeira pesquisa que fazemos é no sentido de sabermos se o agente obrou com vontade ou não. Em caso positivo, concluímos que o ato foi voluntário e, em caso contrário, se inexistente a voluntariedade, asseveramos tratar-se de um fato natural ou jurídico e não de um ato jurídico.

Porém, ao deparar frente a um ilícito, nota-se que a vontade foi a sua fonte de origem e, conseqüentemente, a viga mestra da causa do resultado. Não importa se o sujeito desejava ou não a pena cominada na lei, pois o certo é que a vontade deu nascedouro ao ato, o qual causou reflexos no mundo do direito, motivo pelo qual passou a ser ato voluntário, ou ato jurídico.

Disso conclui-se que o conteúdo da vontade é o marco discriminante para aferição entre o fato e o fato jurídico, bem como entre este e o ato jurídico, ou entre os atos negociais e os não negociais.

Na mesma ordem de idéias acena Vicente Ráo, que as distinções entre atos negociais e atos não negociais, segundo a doutrina germânica, são: " a) as declarações de vontade que constituem negócio jurídico (willenserklaerrung), mediante as quais o agente quer e visa a determinação do resultado, ordenando a lei que esses resultados se produzam exatamente por serem queridos pelo agente; b) as exteriorizações de vontade que não constituem negócio jurídico, mas também produzem efeitos ou resultados jurídicos, não por força da vontade do agente (que os pode ou não querer), mas por força da lei; c) a exteriorizações de idéias ou representações, cuja vontade, de que resultam, não se dirige à consecução de um resultado jurídico, mas se destina a exteriorizar uma idéia, a representação mental do agente sobre determinado fato (in Buergerliches Recht). (RÁO, Vicente, Ato jurídico, op. cit. p.38).

Diante dessa colocação quer-se afirmar que os atos jurídicos se aperfeiçoam, portanto, pela dinamização da vontade no mundo exterior e essa manifestação voluntária se concretiza através da ação, a qual, entretanto, poderá se compor de um ou de vários atos. De modo que, mais correto seria o emprego da expressão - ação - e não ato, porque esse é elemento daquela, sendo certo que o requisito "vontade" constitui o elemento essencial da ação, da qual o ato é a concretização.

Os atos jurídicos poderão ser positivos sou negativos. Os primeiros se formam pela dinâmica voluntária, enquanto que os segundos pela omissão (o fazer e o deixar de fazer). Portanto, mesmo nos casos omissos existe a vontade de não fazer e, presente o requisito voluntário, não deixa a omissão de ser uma ação, porém negativa.

A vontade revela-se como o ponto marcante e de sustentação do ato jurídico. Tanto é verdade que, quando ocorre a coação física, ou seja, a vis absoluta, denominada, também, por coação material, inexistente é a ação, por falta do elemento volitivo do sujeito. O coagido, em casos assim apresentados, se torna um autômato nas mãos do coator e, por isso, não pratica ação, pois é apenas o instrumento pelo qual este, por intermédio do princípio da teoria mediata, se torna o verdadeiro agente.

Por outra parte, não constituem ato de vontade, de acordo com lições de José Frederico Marques, os pensamentos da vida espiritual interna, porque não exteriorizados no mundo; nem a situação inconsciente, nem a conduta forçada por coação irresistível, consubstanciada pela vis corporalis. Citando Haus, termina o autor afirmando que somente a Deus cabe auscultar os pensamentos e, por outro ângulo, lastreando-se na doutrina italiana, acrescenta: pensiero non paga gabella. (MARQUES, José Frederico. Tratado de Direito Penal. 2ª ed. São Paulo; Saraiva, v.II, 1961, p.158).

Os fatos, portanto, conforme já tivemos oportunidade de relatar, ou carecem de importância jurídica, como por exemplo, um passeio, um convite, um cumprimento, ou produzem determinados efeitos que causam repercussão no mundo do direito. Estes, ou são produzidos pelo sujeito para satisfação de sua vontade, buscando os efeitos práticos, tutelados pela norma, ou o agente aceita aqueles preordenados na lei e, ainda há aqueles, denominados ilícitos, quando, então, a vontade do sujeito produz resultados contrários à norma.

Em verdade estes últimos, conforme já alertamos no presente trabalho, são atos jurídicos também porque, na realidade, o ato antijurídico é jurídico por pertencer ao mundo do direito. Tais atos não estão fora do campo jurídico, pois, admitindo o contrário, chegaríamos à conclusão no sentido de que seriam fatos naturais ou sociais e não jurídicos. Se são contrários ao direito é porque se encontram dentro desse campo e se submetem à comparação: o antijurídico e o jurídico.

3.3 A vontade no ato jurídico stricto sensu

Conforme já tivemos a oportunidade de afirmar, de um lado estão as declarações de vontade que buscam os efeitos queridos, tutelados pela lei, e de outro estão as declarações voluntárias que somente atuam de acordo com a vontade da norma, isto é, aceitam os resultados impostos pela lei. A essas declarações que determinam conseqüências jurídicas ex lege, independentemente de escolha, damos o nome de fatos jurídicos em sentido estrito. Essa última concepção, entretanto, tem por seguidores aqueles que cursam as linhas da doutrina unitarista da ação, enquanto os que fazem opção pela doutrina dualista preferem a classificação da seguinte forma: fato jurídico, ato jurídico em sentido estrito e negócio jurídico.

Tais atos jurídicos stricto sensu ou também denominados no direito alemão como atos de direito, são atos lícitos, cujos efeitos queridos não são determinados pelo conteúdo da vontade do agente, mas sim diretamente pelo comando da norma. A vontade humana, nesses casos, não te mo condão de dar direcionamento ao ato para a busca de efeitos pretendidos ou queridos, mas simplesmente adere aos resultados emanados da lei.

Obviamente não se quer afirmar que o sujeito, nesses casos, está destituído de vontade de praticar o ato, mas, o que ocorre é que essa vontade é direcionada aos resultados impostos pela norma.

Os atos jurídicos em sentido estrito, se dividem em atos semelhantes aos atos jurídicos e em atos reais. São semelhantes aos atos jurídicos os que contêm exteriorizações de um acontecimento subjetivo ou do pensamento, ou seja, uma vontade e uma representação. Assim, o efeito se produz ex lege e não em face da vontade propriamente dita. É o que acontece, por exemplo, na constituição de domicílio e na gestão de negócios sem mandato.

Tais exteriorizações da vontade são diversas, como ocorre com as reclamações, a fixação de prazo a fim de que haja pronunciamento; a reclamação para retificação a fim de que seja realizada eleição; as comunicações etc.

Referidos atos, chamados reais, se qualificam como de resultados técnicos, mas produzem, segundo imposições legais, um efeito jurídico. Assim, a especificação, que requer unicamente a constituição de fato de nova coisa, mas dela deriva o ordenamento jurídico; a aquisição da posse; o descobrimento de tesouro; a composição científica ou artística, originando direito do autor.

3.4 Ato jurídico e negócio jurídico

De acordo com o que já foi exposto, os fatos podem se apresentar como materiais, não causando qualquer efeito no mundo do direito, ou como jurídicos, isto é, quando produzem resultados que afetam o campo jurídico. Interessa-nos, evidentemente, o estudo destes últimos, máxime daqueles decorrentes da vontade humana.

Mercê disso trazemos à discussão ensinamentos de Santoro Passarelli, o qual informa que os fatos voluntários se subdividem em fatos stricto sensu e em atos jurídicos, pois são os primeiros todo acontecimento da natureza, com repercussão na lei, como a morte, o nascimento, as inundações ou anda aqueles para cujo nascimento há a participação do homem, embora a causa seja originária do fortuito, como ocorre com a descoberta de tesouro.

Os atos jurídicos, por outro lado, afirma o mesmo autor, são ações resultantes da vontade do homem, dirigidas aos resultados pretendidos, embora tais resultados possam ser ou não preordenados na lei. Por isso os atos jurídicos se subdividem em atos jurídicos stricto sensu e em negócios jurídicos. (PASSARELLI, Santoro. Op. cit. p.30)

Não obstante o Código Italiano seja adepto da teoria unitarista, Passarelli faz a distinção de conceitos para colocar, de um lado, o ato jurídico e, de outro, o negócio jurídico.

No direito alemão é clara a distinção entre ato jurídico e negócio jurídico. Os autores alemães se preocupam com a classificação esses atos, diferenciando os negociais dos não negociais.

Nas declarações de vontade, portanto, ou atos de efeitos queridos, o agente dirige sua vontade aos resultados pretendidos. Já nos atos semelhantes aos negócios, ou atos de direito, a exteriorização da vontade produz efeitos ex lege e não ex voluntate.

Há ainda os atos reais, que nos levam unicamente a um resultado de fato, porém produzem um efeito jurídico, como ocorre com a especificação, a aquisição de uma obra científica, da qual deriva o direito do autor.

Finalmente, os atos poderão ser classificados como contrários ao direito, dos quais deriva, ex lege, uma conseqüência desvantajosa para o autor.

Entretanto, conforme prepondera Orlando Gomes, a doutrina e a jurisprudência brasileiras não distinguem ato jurídico do negócio jurídico e nem mesmo, às vezes, dão a diferença entre ato jurídico e ato jurídico stricto sensu, e afirma ser difícil estabelecer uma separação entre eles. (GOMES, Orlando, Introdução ao Direito Civil, 8ª ed. Rio de Janeiro; Forense; 1986, p.337. Expõe o autor as principais espécies de atos jurídicos em sentido estrito: "A ocupação, a derelição, a gestão de negócios, o pagamento em débito, a fixação de transferência de domicílio, o reconhecimento de filho ilegítimo, os esponsais, a descoberta de tesouro, a comissão, a confusão... as manifestações de sentimentos, as denúncias, os atos devidos").

Há autores que classificam a especificação, a comissão, a confusão como atos jurídicos em sentido estrito, sob a afirmação de que a vontade é irrelevante. Outros já se orientam no sentido de que tais institutos são atos jurídicos e outros há, ainda, que admitem como atos jurídicos as notificações, as oposições, as quais são declarações de vontade e, portanto, nada mais são do que um ato jurídico, ou um negócio jurídico. (GOMES, op. cit. p.229).

O Código Civil em vigor não faz distinção entre ato jurídico e negócio jurídico, pois a este último não se refere. Por outro lado, como tivemos oportunidade de analisar com Orlando Gomes, na doutrina e na jurisprudência há divergências sérias a respeito da colocação do problema no campo diferencial.

Na Itália, igualmente, o Código Civil não contempla o negócio jurídico, motivo pelo qual várias críticas foram feitas àquela legislação por Stolfi, afirmando ele que o negócio jurídico é estranho à lei italiana, a qual emprega a expressão atos jurídicos, ao invés de adotar o vocábulo mais adequado, o negócio jurídico (STOLFI, Giuseppe, Teoria del Negozio Giuridico. Padova; Cedam, 1947, p.13).

Na mesma trilha discorre Santoro Passarelli a respeito da impropriedade do Código Italiano, asseverando que o termo negócio jurídico é mais apropriado do que ato jurídico (PASSARELI, Santoro, op.cit.p.101).

A lição de Vicente Ráo, com pertinência, expõe que a escola alemã e outros que a seguiram nos deram poderosa contribuição a respeito da diferenciação do conceitos, assinalando, com muita propriedade, que os pandectistas germânicos denominam de negócio jurídico o que chamamos de ato jurídico (RÁO, Vicente. Ato Jurídico. Op. cit. p.34. Explica o autor que "devemos aos pandectistas germânicos e aos autores que se seguiram uma poderosa contribuição à doutrina do que nós chamamos de ato jurídico e negócio jurídico que eles dominam").

Como outros códigos, o direito objetivo francês não distingue entre ato jurídico e negócio jurídico, situando-os dentro da mesma definição, conforme ensinam Planiol et Ripert, sob a orientação de que o ato jurídico unilateral é a manifestação da vontade de um só pessoa, que produz efeito jurídico, como o testamento. O ato bilateral ou plurilateral tem, por exemplo, a convenção. Por isso anotamos que os referidos juristas limitam o negócio e o ato jurídicos dentro de um só conceito (PLANIOL, Marcel et RIPERT, Georges Traité Pratique de Droit Civil Français. Paris; Librairie Générale de Droit et Jurisprudence. v. I. 1952, p.358: "L''acte juridique unilateral est la manifestation de volonté d''une seule persone qui produit un effet juridique; par exemple, un testament. L''acte bilateral ou plurilateral - la convention".

Como se pode concluir, mesmo nos países onde a norma jurídica objetiva não se presta à distinção mencionada, a doutrina e a jurisprudência não deixam de se ajustar aos dois conceitos, reconhecendo, a cada qual, sua independência no mundo do direito. Aliás, como já tivemos oportunidade de esclarecer, o novo Código Civil de 2002 contempla o negócio jurídico nos artigos 104 e seguintes, distinguindo-os dos atos jurídicos.

De outra parte pretendemos afirmar que mais adequada à literatura jurídica é a dualidade de conceitos, ato jurídico em sentido estrito e negócio jurídico, e tanto isso é real que juristas estrangeiros ensinam que o negócio jurídico é uma situação de fato que contém uma ou várias declarações de vontade e que a lei reconhece como base para produzir o efeito jurídico qualificado de efeito querido. A vontade negocial é dirigida à obtenção de determinado resultado juridicamente protegido.

3.5 A autonomia da vontade

O Código Civil, ao definir ato jurídico se expressa no sentido de que o agente deve ser capaz. Assim, para a formação dos atos negociais é fundamental a demonstração da validade da vontade, isto porque, sendo o negócio produto da liberdade humana, deve brotar da vontade perfeita.

Nessa ordem de idéias não bate somente o direito brasileiro, porque conforme podemos conferir, no Direito Italiano, ensina Emilio Betti que a vontade é fonte geradora dos negócios jurídicos, pois essa dita fonte nada mais é do que aquilo que denominamos de autonomia da vontade privada. Assim, concluímos com Betti que o negócio jurídico está subordinado a um preceito obrigatório, dentro do plano social, antes do jurídico, delimitado pela vontade válida. Essa autonomia privada, por outro lado, é fonte reveladora de que a capacidade é o alicerce do ato válido. (BETTI, Emilio, Teoria Geral do Negócio Jurídico. Tradução de Fernando de Miranda. Coimbra: Revista de Direito e Estudos Sociais, 1969, t. 1, p.80).

Luigi Ferri, contrariando a doutrina de Betti, acrescenta que a autonomia se delimita dentro de determinados pontos, isto porque as normas jurídicas marcam as linhas de vida e a movimentação da vontade. Segundo ele, antes mesmo da análise dessa vontade, no plano social, ela passaria por aferição nos limites normativos, motivo pelo qual a autonomia da vontade fica adstrita à análise prévia da lei.

Além disso, anota, haverá de ser estudada essa autonomia de vontade em relação às incapacidades natural e legal. É por isso que, quando a lei delimita a capacidade do sujeito, de acordo com as imposições legais, não há pesquisa a respeito dos elementos componentes da vontade: querer e conhecer. (FERRI, Luigi. La Autonomia Privada. Tradução de Luis Sanches, Madrid; Revista de Derecho Privado, 1969, p.5).

A autonomia privada da vontade, a princípio, não chega a ser uma autonomia propriamente dita, isto porque ela perde parte de seu comando para o direito. Conforme é sabido, o livre arbítrio está delimitado pelo determinismo social.

Se assim, observa Orlando Gomes, seguindo ensinamento de Windscheid, a pessoa comanda e o direito se vale de parte desse comando, reservando para si a causa cognitio (GOMES, Orlando, Transformações Gerais do Direito das Obrigações. São Paulo; Revista dos Tribunais, 1967. p.65).

Por isso é óbvio, o negócio jurídico visado pelo prisma da autonomia privada se mescla com a vontade social, consubstanciada no direito público. Então essa autonomia abandona a vontade privada para dar passagem à vontade estatal no interesse da coletividade.

O conceito de negócio jurídico é a emanação da vontade destinada a produzir efeitos jurídicos correspondentes ao querer do agente, que age com discernimento, desde que previstos em lei. Para tanto, ensina Benedito Motta que o ser é social porque o fato jurídico é fato social, embora a recíproca não seja verdadeira. Dessarte, o ser jurídico como espelho da sociedade, em sua grandeza global e em suas partículas constitutivas da seiva humana, revela vontades que se entrelaçam por vínculos de direito e obrigações, entre homens e homens, homens e grupos, grupos e grupos e, por isso, por ser social, o ser jurídico é humanístico (MOTTA, Benedicto. O homem, a sociedade, o direito, em Marx. São Paulo; Revista dos Tribunais, 1978, p.109-110).

A autonomia privada é o poder de autodeterminação para a realização daquilo que o sujeito tem em mente e, por outro lado, o negócio jurídico é o instrumento ou a parte material, pela qual essa autonomia da vontade possa se concretizar. No entanto, ela sofre restrições, transformando o livre arbítrio em determinismo imposto pela norma social.

Assim sendo, analisado sob esse aspecto, é de se concluir que, na realidade, não existe vontade autônoma porque, no entrelaçamento do homem em sociedade, sua vontade está sempre a sofrer delimitações pelas imposições, tanto estatais quanto particulares, pois o homem que vive em sociedade terá constantemente que se ater às regras do direito, a fim de que não cometa abusos e não ultrapasse a linha de espaço de juridicidade, dentro de cujos limites pode se manter e não prejudicar direitos de terceiros.

3.6 Teorias da vontade e da declaração

São duas as teorias que disputam o conceito de vontade na formação do ato jurídico: a) teoria da vontade; b) teoria da declaração. Para os voluntaristas o que importa é a intenção dirigida às conseqüências jurídicas, isto é, a intenção do resultado. Se essa vontade não é objetivada ao resultado, não cria obrigação alguma ao agente.

De acordo com a teoria da declaração, entretanto, o que tem valor é o que está declarado, isto é, o que está contido na exposição, não importando o que o sujeito tem em mente. Assim, de acordo com essa teoria, há divergência de tratamento a respeito dos vícios de consentimento na interpretação do negócio jurídico, isto porque, antes de ser analisada a vontade interna do agente, far-se-á a pesquisa em torno dos termos declarados.

A teoria da vontade foi esboçada pelo nosso direito a exemplo da escola alemã, onde, dentre outros autores Savigny, Windscheid, Mommsen, Unger, Enneccerus e Oertmann foram seguidores.

No Brasil essa teoria se enraizou na literatura jurídica com a ressalva, evidentemente, de que a vontade necessita de um sinal para se definir. É que, uma não pode ter vida própria sem o auxílio da outra, isto é, a vontade não poderá ser interpretada se não for declarada e esta não terá acolhida se não foi alicerçada pela pesquisa interna do agente.

Bem de ver que a vontade se exterioriza por intermédio da declaração e esta tem vida porque, implícita em sua roupagem habita a vontade a lhe dar valor. Por tal motivo que se diz que a vontade se faz refletir por meio da declaração, que deve se manifestar de forma induvidosa, a respeito da pretensão do sujeito.

Portanto a declaração deve ser clara e precisa, porém, interiormente, necessita ela de vir acompanhada de vontade válida, porque, caso falhe o seu requisito essencial interno, aí então estará destituida de valor.

Tal elemento volitivo, válido, será preceito obrigatório do negócio jurídico, porquanto, antes mesmo de se refletir no mundo do direito, deve ele servir de molde legítimo dentro do plano social.

3.7 Incapazes de praticar ato jurídico válido

O artigo 82 do Código Civil (artigo 104 do Novo Código) dispõe que o ato jurídico será válido se o agente for capaz; se o objeto for lícito e se a forma for prescrita ou não defesa em lei. O artigo 5º do mesmo Estatuto (artigo 3º do Novo Código Civil) aponta os absolutamente incapazes para os atos da vida civil, sendo certo que seus interesses são cuidados por seus representantes legais.

Os relativamente incapazes somente podem praticar atos da vida civil quando assistidos por seus respectivos representantes.

Dessa forma, os menores de dezesseis anos, os loucos de todo o gênero, os surdos-mudos que não puderem exprimir a sua vontade e os ausentes não dispõem de vontade negocial, sendo nulos os negócios por eles praticados. Da mesma forma, não podem praticar ato jurídico em sentido estrito, cujos efeitos estão preordenados na lei, com as exceções referentes àqueles, evidentemente, que não lhes causem prejuízos como acontece em relação aos atos em geral.

As legislações brasileira, italiana, francesa, suiça, espanhola e portuguesa impõem a nulidade do ato jurídico produzido por um interdito, isto porque sua vontade está desprovida de capacidade para o querer ou para o discernimento.

O Código Civil alemão é taxativo em seu parágrafo 104 (CODE Civil Allemand. 18.10.1896. Executoire à partir de 1º janvier 1900. 3. ed. Paris; A.Pedone Editeur. Tradução de Raone de La Grasserie. "L''acte juridique qui viole uns proibition légale est nul, à moine de disposition contraire de la loi"), dispondo ser incapaz de negócio aquele que não completou sete anos de idade e, também, aquele que se encontra em estado de perturbação mental, com exclusão da determinação da vontade e, ainda, aquele que foi interditado.

A capacidade, portanto, é pressuposto dos atos jurídicos válidos. Se o ato foi praticado por pessoa capaz, ele não se invalida, mesmo se, posteriormente, esse sujeito se torne incapaz devido a uma perturbação mental qualquer. Ponto importante, todavia, se faz sentir a respeito do ato perpetrado pelo incapaz, quando não lhe cause prejuízo. Em casos tais, a nulidade não será declarada, em face da inexistência de gravames ao agente. Porém, como se verá mais à frente, esses atos são nulos, mas, por medida de política jurídica, permanecerão válidos.

Em tais hipóteses, então, os negócios jurídicos do doente mental, embora desprovido este de alicerce do discernimento, são considerados válidos em atendimento aos fins sociais da lei.

De outra parte, válidos são os negócios efetivados pelo ausente, declarado tal pelo juiz, porquanto, se ele pratica qualquer ato, durante o período dito de ausência, deixa de ser ausente, por estar presente àquele ato.

Portanto, a capacidade para a prática de negócio jurídico válido requer a presença da vontade provida de seus elementos - o querer e a consciência da ação: Inexistindo o primeiro não há ação; do juízo de valor sobre o segundo depende a formação da vontade negocial.

Na realidade, o sujeito que não age com discernimento ao praticar a ação material, não colima os fins visados pela vontade, por lhe faltar raciocínio para tanto. Pode ocorrer, entretanto, de estar presente a vontade do louco integrada por seu elemento querer, mas, por outro lado, lhe faltar o conhecimento - elemento intelectivo da vontade - ficando esta desestruturada, da mesma forma e, portanto, tornando nulo o ato.

Embora limitada a ação do incapaz, face à debilidade de sua vontade, o certo é que ele, também, é detentor de direito natural e, como tal, deve receber proteção da lei, quando ferido em seus direitos. Assim, em determinados casos, o ato do considerado anormal é válido em face dos princípios do direito natural, que lhe é inerente.

De sorte que, ensina Dourado de Gusmão que, enquanto o direito natural independe da vontade, por refletir exigências sociais da natureza humana em relação a todos os homens da sociedade, o direito positivo seria histórico e válido em espaços geográficos determinados, ou determináveis, de acordo com o espaço e o tempo. (GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao Estudo do Direito. 12. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1986, p.81).

Por ser detentor de direito natural é que, em certos casos, o ato nulo praticado pelo agente produz efeitos, por falar mais alto esse seu direito. Dessarte, não lhe advindo prejuízos, a responsabilidade do negócio fica adstrita à pessoa que com ele contrata.

Cunha Gonçalves, com precisão, ensina que o direito objetivo tem por origem o direito natural, do qual é manancial e, para alicerce, menciona o artigo 16 do Código Civil português, que a esse direito se refere.

Alerta o mestre português que os princípios do direito natural são as máximas clássicas do direito romano: honestae vivere, neminem laedere, suun cuique tribuere, especialmente esta última, pois dar a cada um o que é seu é a súmula de toda a teoria dos direitos subjetivos, ou seja, de quase todo o direito civil. Esse direito natural, nas palavras do professor, é afirmado por notáveis filósofos do direito, como Cathrein e Gény, pois ele resume os princípios de justiça e eqüidade, que devem orientar toda a atividade judicial e administrativa do Estado. (CUNHA GONÇALVES, Luiz da. Op. cit. 1951, p.13).


CAPITULO IV

SUMÁRIO. 4.1. Noções gerais. 4.2. Ato jurídico anulável. 4.3. Vício da vontade. 4.4. Erro. 4.5. Dolo. 4.6. Coação. 4.7. Simulação. 4.8. Fraude contra credores. 4.9. Lesão e estado de perigo. 4.10. Ato jurídico inexistente. 4.11. Ato jurídico nulo. 4.12. Ato de objeto ilícito ou impossível. 4.13. Ato jurídico que não reveste a forma legal. 4.14. Preterição de formalidade legal. 4.15. Ato que a lei declara nulo ou nega efeito. 4.16. Atos praticados pelos absolutamente incapazes. 4.17. Atos praticados pelo menor de dezesseis anos.

4.1 Noções gerais

O artigo 145 do Código Civil (artigo 166 do Novo Estatuto) é taxativo no sentido de que é nulo o ato jurídico: "I) quando praticado por pessoa incapaz. II) quando for ilícito ou impossível o seu objeto; III) quando não revestir a forma prescrita em lei; IV) quando for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; V) quando a lei taxativamente o declarar nulo ou lhe negar efeito".

O artigo 147 (171 do Código Civil a entrar em vigor) do Código expressa que é anulável o ato: "I) por incapacidade relativa do agente; II) por vício resultante de erro, dolo, coação, simulação ou fraude".

Far-se-ão alguns comentários quanto ao ato anulável e ao inexistente, superficiais, até porque o trabalho se refere ao ato nulo, especificamente aquele praticado pelo menor absolutamente incapaz, pois o objetivo é demonstrar que a ação emanada por determinados menores absolutamente incapazes é revestida do elemento vontade pela presença do querer e do discernimento.

4.2 Ato jurídico anulável

Segundo Carvalho Santos, ato anulável é aquele que apresenta os elementos essenciais à sua constituição, mas na realidade vem contaminado de vícios que afetam a proteção dos interesses individuais, distingüindo-se, nesse ponto, do ato nulo, porquanto neste há, em regra, ofensa aos princípios básicos da ordem pública, enquanto naquele existe, somente, um vício de vontade do sujeito. (CARVALHO SANTOS, J.M. Op. cit.p.258)

Anote-se que os negócios jurídicos anuláveis produzem efeitos até o momento do decreto da nulidade. Todavia, se a parte prejudicada não solicitar a declaração dessa invalidade, obviamente, efeitos se produzirão como se válido fosse. Por isso, no dizer de Washington de Barros Monteiro, a nulidade relativa é decretada no interesse privado da pessoa prejudicada, ou de grupo de pessoas, podendo essa nulidade ser suprida judicialmente, a pedido das partes interessadas, ou de seus representantes legais, ou ex officio. Serão, sempre conhecidas por intermédio de ação judicial e são prescritíveis. (MONTEIRO, Washington de Barros, Op. cit. p.265)

Por outro lado, se o negócio é anulado ele se equipara a um negócio nulo, advindo, então, a lição de Albaladejo, segundo o qual, desfeito judicialmente o negócio anulável, a equivalência é a de um negócio nulo. (ALBALADEJO, Manuel. El Negócio Jurídico. Barcelona; Libreria Bosch, 1958. p.415. "En conclusión, el negócio anulable, mientras no se impugna és un negócio valido, una vez impugnado eficazmente, equivale al negócio nulo".

4.3 Vícios da vontade

A vontade, sabe-se, é elemento essencial na formação do negócio jurídico. Porém, algumas vezes ela não se manifesta plenamente, acarretando, por isso, vícios que afetarão os resultados.

Assim, poderá a declaração apresentar-se viciada porque intencionalmente diversa da vontade verdadeira, como ocorre na reserva mental e na anulação. Poderá ocorrer, ainda, uma declaração eivada de vícios não queridos, como sói acontecer na ocorrência do erro, ou de dolo ou má fé de outrem. Na coação as falhas são denominadas de vícios do consentimento, porque o agir da pessoa está em descordo com o seu conhecimento.

Quando ocorre desacordo entre a vontade interna e a vontade objetivada, necessária se faz a interpretação teleológica, para ficar esclarecido qual das duas deverá prevalecer. Cada uma tem o seu valor, mas deve-se convir que em cada caso terão de ser pesquisadas as duas faces: a vontade íntima do sujeito e a objetivada.

Como já se acentuou, o artigo 85 do Código Civil (artigo 112 do novo Código) é expresso no sentido de que prevalecerá a intenção sobre a vontade dinamizada. Embora a lei objetiva ordene a busca da intenção do declarante, é certo que se atenda também, embora menos, às palavras com que foi ela elaborada. Por isso o Código ficou nomeio-termo entre as duas situações, sendo certo que ambas merecem análise. (CARVALHO SANTOS, J.M. Op. cit. p.285)

Advertem os cultores da declaração que os homens não dispõem de meios e nem disputam do poder de investigar o que se passa no íntimo de cada um e, se assim não fosse, propiciaria pretexto à parte contrária para apontar a inexecução de suas obrigações, sob fundamento de que a declaração não corresponde à verdadeira vontade.

4.4 Erro

Como um dos vícios do consentimento, apto a levar à anulabilidade do ato jurídico, o erro se caracteriza pelo estado psíquico decorrente da falsa percepção dos fatos e, por isso, o agente declara sua vontade em desacordo com a realidade. Essa declaração é produzida com defeito, devido à percepção falsa do declarante. O autor do negócio desconhece a realidade e expõe sua vontade apoiada em vícios, acreditando estar agindo corretamente. Difere esta situação daquela que ocorre na coação, pois nesta temo autor pleno conhecimento de que está agindo em desacordo com sua vontade, e obedecendo a imposição do coator.

O erro que anula o negócio jurídico é aquele que alcança a substância do ato e não pontos acidentais, como está determinado pelo artigo 86 do Código Civil (artigo 138 do Novo Estatuto); é chamado de erro substancial ou essencial. Está refletido na natureza do ato, ao seu objeto principal. É escusável ou inevitável, pois não poderia ser captado pelo homo medius, e, por isso, atingindo a essência do negócio e não se tornando perceptível pela média dos homens, é causa de anulabilidade.

Erro e ignorância não se confundem pois enquanto o primeiro é o falso conhecimento a respeito de determinada situação, a segunda importa no seu desconhecimento, pelo que, pode-se afirmar que o erro poderá ser invocado em relação à lei, mas a ignorância não: ignorantia legem nemo scusat.

4.5 Dolo

Dolo é a forma comum e mais grave do elemento subjetivo da culpabilidade e, por isso, se compõe de dois requisitos: um cognitivo, ou seja, o conhecimento do fato e outro volitivo, que é a vontade de realizar a conduta. Portanto, é a intenção de praticar a ação, sabendo que está agindo contra a lei, ou, a vontade consciente dirigida à execução de um resultado que a lei considera ilícito.

Desse modo, como vontade e representação, o dolo é, resumidamente, a representação e vontade de produzir o resultado ilegal, conhecendo o autor sua ilicitude ou, embora não querendo diretamente o evento, assume o risco de produzí-lo. Daí a afirmação de que ele não se limita somente no querer o resultado danoso, mas também na anuência da vontade ao resultado, assumindo o risco. É o dolo eventual, como subdivisão do indireto. O agente não quer diretamente o resultado, mas a ele anui com sua vontade.

A conduta dolosa poderá ocorrer por ação ou por omissão. Tanto procederá com dolo aquele que dirige uma mentira em relação a determinado negócio, para locupletar-se indevidamente, como aquele que se cala, omitindo-se à verdade do fato, no afã de levar outrem a erro.

Importa saber, porém, se o dolo é causa determinante do ato, porque, como ensina Clóvis Bevilaqua, somente o dolo principal, o que for causa do ato, denominado pelos romanos de dolus causam dans é que tem o condão de tornar o ato anulável, pois a característica do dolo é a intenção de prejudicar. (BEVILAQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro; Editora Rio, 1975, p.341).

Convinhável fazer anotado que, se ambas as partes no negócio, entretanto, agirem com dolo, não desfrutarão do amparo legal para a anulação do ato, porque a lei procura alicerçar a boa fé e, nesse caso, não haverá boa fé a ser defendida. Ademais, ninguém pode tirar vantagem através do próprio dolo, pelo que, nesse caso, o dolo não é causa de anulação do negócio jurídico.

4.6 Coação

O sujeito que pratica um negócio jurídico poderá ser forçado à efetivação de determinado resultado por duas maneiras: a vis absoluta, ou pela vis compulsiva. A primeira diz respeito à força física, a qual é causa de exclusão da vontade do pseudo-agente. A segunda, também denominada de força moral, ou violência moral, atua sobre a parte psíquica do coato, forçando-o a uma declaração viciada da vontade.

Quando o sujeito é forçado a praticar um evento mediante força física, inexistente é a ação porque o coato se transforma em simples autômato nas mãos do coator. Dessa maneira, qualquer ação por ele perpetrada não produzirá efeito algum, face à inexistência do mínimo de vontade à formação do ato negocial.

Porém, se o sujeito age sob força moral, ou vis compulsiva, emite ele uma declaração de vontade, embora viciada, a qual não lhe tira o consentimento, posto que imperfeito pelo vício que o inquina. Essa ação, entretanto, produz efeitos até o decreto que reconhece o vício do procedimento, por tratar-se de causa de anulabilidade.

Assim considerado, a violência física produz ato nulo ou inexistente, ao passo que a coação moral faz originar ato anulável. Diante dessa vis compulsiva, notamos que o sujeito declara uma vontade que, na realidade, não é aquela que habita o seu íntimo. Po isso que a declaração deverá ser analisada, pesquisando-se a vontade do declarante. O artigo 85 do Código Civil (artigo 112 do Novo Diploma) prescreve, assim que, nas declarações de vontade, o intérprete terá de analisar mais a intenção do sujeito do que, propriamente, o sentido literal da linguagem.

Para levar à anulabilidade do ato, a ameaça deverá ser séria e injusta, a respeito de um mal atual ou futuro, a ponto de impor na pessoa ameaçada um temor. Daí inferir-se que o ponto de partida para a pesquisa da ameaça é o metus sofrido ela vítima. Se esta, por acaso, não sentir medo da imposição feita pelo adversário, é certo que não ocorreu a ameaça, devido à falta de resultado para sua consumação.

Na apreciação da existência da coação leva-se em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento, da pessoa ofendida, bem como outras circunstâncias idôneas à pesquisa sobre a gravidade ou não do procedimento do autor. Na realidade, evidentemente, o temor da vítima mais se agravará diante de certas anormalidades, sejam físicas ou mentais do paciente.

Sabe-se também que não se considera como coação a ameaça de exercício de um direito e nem o temor reverencial, definindo-se este como receio de desgostar o pai, a mãe, ou a outras pessoas a quem se deve obediência.

Por fim, é necessário consignar que, mesmo exercida por terceiro, a coação vicia o ato. Se conhecida da parte, responderá esta solidariamente, mas, se não chegar o seu conhecimento, somente o coator responderá pelo dano.

4.7 Simulação

Primeiro dos vícios chamados sociais pela doutrina, a simulação não traduz um vício do consentimento mas produz um defeito no negócio. O negócio realizado sob simulação tem aparência normal, mas não se objetiva ao efeito que deveria produzir. Ela difere do dolo porque na simulação não são usados ardis ou artifícios maliciosos para enganar a parte contrária, porque a ofensa é dirigida a terceiros. É declaração enganosa, com objetivo de produzir efeito diverso do indicado, ou seja, do ordenado pela lei.

A simulação é absoluta quando a declaração de vontade visa a não produção do resultado. O agente demonstra um querer, quando, na realidade, ele não quer. É relativa, também denominada por dissimulação, quando o procedimento tem por finalidade aparentar outro de natureza diferente, como acontece com a compra e venda dissimulando uma doação, ou quando a venda é feita a um terceiro, a fim de que este transmita o bem a descendente do alienante.

A simulação pode ser maliciosa ou inocente. A primeira tem por regra a violação da lei ou a conduta enganosa a terceiros, ao passo que na inocente a declaração não causa prejuízos a ninguém e, por isso, não causa a anulabilidade do ato, por não produzir dano.

A reserva mental ou reticência que se assemelha à simulação, desta difere. Naquela, a vontade do agente não é causa do negócio jurídico, mas nesta última, a vontade declarada se objetiva a um determinado proveito, o qual, entretanto, é ocultado pelo declarante ou declarantes. Na reserva mental a vontade não é requisito do negócio.

Nada mais é - a reserva mental - do que o desacordo entre a vontade interna do sujeito e aquela por ele declarada, porém ignorada pela outra parte. Isto é óbvio porque caso a outra parte interessada tomasse conhecimento da mencionada vontade não declarada não haveria, então, a referida reserva. É o que ocorre com as promessas em geral, as evasivas, quando a parte esconde o que declara. Enfim, seria a omissão dolosa de determinada situação, a qual, entretanto, não chegando ao conhecimento da outra parte, constitui uma reserva volitiva do sujeito.

A simulação, de outro lado, é conhecida pela outra parte, sendo ignorada somente por terceiros. Enquanto no dolo, por exemplo, uma das partes é enganada pela outra, na simulação ambas têm conhecimento do vício e só terceiros o ignoram.

Tal vício social, não raramente, ocorre em casos de doação que homem casado faz à concubina sob forma de compra e venda simulada, em violação ao artigo 1177 do Código Civil (artigo 550 do novo Código).

4.8 Fraude contra credores

Segundo e derradeiro dos vícios doutrinariamente chamados de sociais, a fraude contra credores se compõe de dois elementos: um objetivo, definido pelo dano causado ao credor e outro subjetivo, que se traduz pela má-fé, isto é, a intenção de enganar.

A fraude, no âmbito subjetivo, ou seja, na consilium fraudis não dá importância ao propósito de prejudicar credores. Não interessa, pois, a intenção, isto é, o animus nocendi, bastando a consciência do devedor de que desse ato advirão os prejuízos respectivos. Da mesma forma, ao co-autor do fraudador não é exigida a intenção de causar prejuízos, mas basta que tenha conhecimento da insolvência do devedor e dos possíveis danos aos credores.

De acordo com o Direito romano, para que pudesse existir e ser bem sucedida a ação pauliana, exigia-se a prova da intenção de prejudicar, aliada ao dano. Mas, nosso direito contenta-se com o resultado danoso, a fim de que possa ser concedida a revocatória.

Apenas os credores quirografários podem propor a pauliana, pois aqueles que possuem garantia real não desfrutam desse direito.

Por outro lado, têm direito à anulação do negócio jurídico praticado em fraude contra credores só aqueles que já o eram ao tempo anterior ao nascimento do estado de insolvência, porque, se seus créditos forma constituídos posteriormente falta-lhes o direito.

Todavia, quanto aos contratos onerosos, dispõe o artigo 107, do Código Civil (artigo 159 do novo Código Civil) que deverá a insolvência ser notória ou der motivo para ser conhecida da outra parte. Será notória quando conhecida por todos, ou por grande quantidade de pessoas, devido a protestos, publicações de cobranças e presumida quando o adquirente tinha motivos para saber do estado do alienante.

Difere a fraude contra credores da fraude à execução, pois enquanto nesta última o ato é nulo, disciplinada pelo direito público, naquela o ato praticado é apenas anulável. A fraude à execução é incidente do processo, pressupondo demanda e mandamento e aproveita tão somente ao exequente, ao passo que a fraude contra credores aproveita a todos estes e se define como defeito dos atos jurídicos, pertencendo ao campo do direito privado.

4.9 Lesão e estado de perigo

De origem romana, o conceito de lesão foi acolhido pelo direito canônico. Segundo Aderbal da Cunha Gonçalves havia diferença entre os dois sistemas, pois, enquanto o romano via na lesão efeitos políticos e econômicos, entendia o canônico que o fundamento do instituto vigorava em função da ordem moral, pois a desproporção das prestações contraria os princípios morais e, evidentemente, a justiça. Entretanto, em ambos os sistemas a lesão era vista pelo prisma objetivo. (CUNHA GONÇALVES, Aderbal da. O Instituto da Lesão. Salvador; Artes Gráficas, 1949, p.31).

A lesão, agasalhada pelo Novo Código Civil Brasileiro (de 2002), no artigo 157, é o desequilíbrio entre as prestações reciprocamente estipuladas e assumidas, com prejuízo a um dos contratantes.

Segundo os elementos formadores da lesão é fácil notar que ela se origina de negócio jurídico comutativo, porque impossível será dar-lhe guarida existencial em contratos aleatórios.

A lesão não se confunde com a imprevisão. É que, na lesão o ato se apresenta eivado de defeito no momento de sua formação, enquanto na imprevisão apesar de perfeito o contrato, posteriormente ocorre a lesão que era, até então, imprevista. Daí a origem do termo imprevisão, a marcar essa característica.

No direito moderno, porém, a lesão passou a ser pesquisada dentro dos ditames da subjetividade e, ao lado do requisito objetivo, aparece a aferição subjetiva, pois a lesão decorre da exploração do estado de necessidade da parte lesada. A desproporção entre as prestações passa a ser efeito, produzido pela causa que nada mais é do que o domínio sobre a fragilidade econômica do outro contratante.

Não obstante a teoria alemã visse na lesão um vício de ordem subjetivo, o certo é que não foi o instituto analisado como efeito advindo da pessoa do lesado, mas como decorrência da maneira levada a efeito pelo beneficiado, o qual se torna autor de ato ilícito, violador dos bons costumes. De maneira que, pela forma visada pela escola alemã, a lesão seria, obviamente, autêntico ato nulo, por atentar contra os bons costumes.

No direito moderno o elemento subjetivo da lesão é conhecido como dolo de aproveitamento, advindo a nomenclatura do fato de uma das partes aproveitar-se da inexperiência ou fraqueza econômica do outro contratante. Não há necessidade de indução à prática do negócio, bastando o aproveitamento por um dos contratantes, auferindo lucro anormal.

Afirma Caio Mário, ao analisar o instituto da lesão que esta não importa em nulidade do negócio, devendo ser conferido ao lesado um direito de ação sob forma de faculdade alternativa: desfazimento do negócio, ou pedido de complementação da diferença das prestações, com o restabelecimento do equilíbrio. (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições. Op. cit. p.350).

Paralelamente ao dolo de aproveitamento (elemento subjetivo da lesão), pode-se apontar o estado de perigo, também definido pelo Código Civil de 2002, a entrar em vigor em 2003, artigo 156, que nada mais é do que o momento em que o agente emite declaração de vontade para salvar-se de perigo de dano grave, conhecido da outra parte e assim, assumindo obrigação excessivamente onerosa. Essa situação se define quando o declarante tenta salvar-se, ou procura salvar seu descendente, ascendente, ou cônjuge e está expressa no novo Código Civil, a entrar em vigor em 2003, no artigo 156.

Outrossim anote-se que, o novo Código Civil (de 2002 a entrar em vigor em 2003), incluiu a lesão entre os defeitos dos negócios jurídicos, no artigo 157.

Sem dúvida que a preocupação, na lesão, é a desigualdade das prestações em determinado negócio jurídico, constante de contrato comutativo. poderá ser invocada, até mesmo, em partilha de bens, conforme preleciona Hélio Borghi, posto embora não se trate, o partilhamento, de negócio jurídico e sim de ato jurídico em sentido estrito, o certo é que a lesão foi, originariamente, concebida pelas Constituições de Diocleciano e de Maximiano, previsto o instituto para os casos de venda e compra, com exclusão dos contratos aleatórios e gratuitos.

Prossegue o autor dizendo que o percentual aferido por lei, a fim de que se caracterize a lesão começou como, por exemplo, em menos da metade do justo valor, percentagem essa ainda vigente no Direito italiano; ou até sete dozeavos, como ocorre no Direito francês; ou, por fim, em um quinto do valor corrente ou justo como está expresso na Lei de Proteção à Economia Popular brasileira. É preciso frisar ainda que a parte que se houve com aproveitamento tenha se valido da inexperiência, da leviandade ou da premente necessidade da outra na conclusão do negócio. Assim, traçados estão os elementos objetivos e subjetivos como hoje é vista a lesão. (BORGHI, Hélio. A Lesão no Direito Civil. São Paulo; LEUD, 1988, p.5).

4.10 Ato jurídico inexistente

No direito brasileiro a lei substantiva não faz referência ao ato jurídico inexistente, pois o equipara ao ato nulo. É que, segundo a opinião unânime dos autores brasileiros e estrangeiros, o ato inexistente é o nada, motivo pelo qual não há necessidade de definí-lo ou de apresentação de comentários a respeito de seus efeitos, porque esses efeitos não existem. Se o ato não existe, não é passível de nulidade. Não se anula aquilo que não existe. Ele não chega a formar-se por faltar-lhe elemento essencial à sua constituição e, assim, não é realidade, porque inexiste.

O Código Civil não alude a essa categoria de ineficácia do negócio jurídico, a qual integrava o Projeto Bevilaqua. Mas, a doutrina cogita do ato inexistente e a jurisprudência, por vezes, tem acolhido a teoria.

Há, até mesmo, entendimento no sentido de que a distinção entre ato nulo e inexistente é bizantina e que a expressão ato inexistente não passa de contraditio in adjectio, porquanto, no mesmo instante em que se trata de algo existente, impõe-se sua negação pela inexistência.

Inclusive, os que opinam contrariamente ao acolhimento da doutrina sobre atos inexistentes atestam que a teoria da nulidade oferece toda a matéria necessária ao estudo, tanto dos atos nulos, como dos inexistentes.

Carvalho Santos, colecionando lições de Windscheid, ensina que o negócio jurídico nulo não existe em direito, mas existe de fato. Um corpo sem alma, mas não deixa de ser um corpo. Entretanto, se há falta de elemento essencial à formação desse corpo, o ato não chega a se formar no mundo do direito, por inexistência do material necessário à constituição do fato. (CARVALHO SANTOS, J.M. Op.cit.p.328).

As questões relacionadas à inexistência do ato são de ordem fática, enquanto as alusivas às nulidades são pesquisadas no campo jurídico. Daí a divisão entre as quaestio facti e as quaestio iuris. As primeiras se referem à análise da inexistência do ato e as segundas dizem respeito à perquirição dos vícios que integram esses atos.

Portanto, os elementos constitutivos do negócio jurídico são aqueles referentes à vontade e ao objeto. Daí a conclusão a que se chega no sentido de que, quando houver existências de vontade e do objeto, embora conturbada aquela, o ato se exterioriza. Mas, se essa vontade não se forma por falta de seu elemento psíquico - querer - como ocorre nos casos de coação irresistível originada pela vis absoluta, inexistente é o ato. Por outro lado, quando a coação é levada a efeito através da grave ameaça, denominada vis compulsiva, embora viciada a vontade, o ato produzido pelo agente coagido existe, embora lastreado em vício.

Por toda essa colocação é certo que o casamento realizado mediante coação moral é anulável, mas é inexistente aquele em que o coagido se presta, apenas, como autômato nas mãos do coator, este autor da força física e desencadeador do resultado.

Nulo, por exemplo, sob outra ótica, é o casamento contraído perante autoridade incompetente, mas inexistente é o matrimônio se a pessoa que presidiu o ato nem mesmo era autoridade. No primeiro caso se pesquisa a quaestio iuris, porém no segundo o alvo da análise é a quaestio facti.

Por isso que Caio Mário da Silva Pereira adverte que, quando o objeto é ilícito ou impossível, o negócio é nulo, entretanto se falta elemento essencial à sua formação, definir-se-o-á como inexistente. A incapacidade de consentir induz à nulidade do negócio, mas na falta de consentimento ele inexiste. (PEREIRA, Caio Mario da Silva, Op. cit. v. I, 1989, p.445).

Portanto, os negócios jurídicos anuláveis e nulos dependem de sentença para o decreto da nulidade, operando o decisum para os efeitos ex nun e ex tunc, respectivamente, não sendo necessária todavia, qualquer decisão judicial para declarar a invalidade do ato inexistente, pois este é o nada.

4.11 Ato jurídico nulo

Houve época em que o ato jurídico somente era considerado nulo quando nele se constatasse alguma lesão. Assim, no código de Napoleão, os artigos 1305 e 1306 mantiveram esse princípio, dispondo que a lesão simples dá direto à rescisão em favor do menor não emancipado contra qualquer convenção.

Todavia, com o decorrer do tempo o princípio das nulidades integrou, como regra autônoma, a parte geral do Direito Civil, independentemente da existência ou não de constatação de lesão. O Código Civil enumera as nulidades no artigo 145 (artigo 166 do Código Civil a entrar em vigor) e dispõe no artigo 146 que as nulidades previstas naquele poderão ser alegadas pelo interessado e pelo Ministério Público quando a este couber intervir, impondo ao juiz o dever de declará-las e a proibição de supri-las, ainda que a pedido das partes.

Por isso Albaladejo define o negócio jurídico nulo como aquele que, devido a um defeito não é apto para produzir seus efeitos próprios. (ALBALADEJO, Manuel. op. cit. p.400).

No direito positivo brasileiro o Código Civil dividiu as nulidades em relação à personalidade, ao objeto, à forma, à solenidade legal e, finalmente, à tipicidade da norma. De maneira que o negócio poderá ser declarado nulo: ou porque o agente não dispunha de vontade válida para praticá-lo; ou porque não foi adequada a formalidade usada; ou porque foi preterida alguma solenidade imposta pela lei; ou, finalmente, porque a ação voluntária se tipificou em determinado texto legal, de imposição da nulidade. De qualquer maneira, a ação perpetrada contra um desses dispositivos mencionados será nula de pleno direito. A dificuldade maior a respeito da pesquisa do negócio jurídico nulo se prende à incapacidade do sujeito, nos termos do item I, do artigo 145, especificamente no tratamento alusivo aos menores, por isso que procuramos dar uma posição a respeito desses incapazes, quanto aos negócios jurídicos por eles praticados.

Dessa forma, o ponto primordial do trabalho versará sobre o ato nulo perpetrado por (certos) menores absolutamente incapazes e, evidentemente, a validade ou não desse procedimento em relação à sociedade de um modo geral e principalmente aos terceiros de boa fé. Antes, porém, teceremos alguns comentários sobre as demais nulidades.

A nulidade pode ser plena ou parcial. É plena quando abrange a totalidade do ato e parcial quando ofende somente parte dele, limitando-se a determinadas partes ou a certas cláusulas, caso em que, a parte válida não será atingida pelo vício.

4.12 Atos de objeto ilícito ou impossível

Diz-se que o ilícito é o antijurídico, mas o termo não restringe o negócio à norma tão somente, pois abrange toda a ação que atenta contra os bons costumes, a moral e a ordem pública. É necessário seja aferida, na prática do negócio, a moralidade do motivo, a fim de que não surjam ações que levem ao absurdo; que ofendam princípios básicos da vida social. Quando há ofensa ao senso ético ou comum, à consciência pública, à honestidade, ao pudor, o negócio não poderá produzir efeitos. Às vezes, o negócio jurídico é levado a efeito em fraude à lei, porém com aparência de conformidade com o direito. Mas se o fim colimado for fútil ou torpe, evidentemente, não será reconhecido pelo direito. Acontecem, freqüentemente, casos de contrato para a vida conjugal por tempo determinado, os quais, além de ilícitos, ainda ferem os bons costumes.

4.13 Atos jurídicos que não revestem forma legal.

Para a prática de determinados atos jurídicos certas formalidades são exigidas pelo direito. Dessa maneira, depende de forma especial, dentre outros, o casamento, o contrato de compra e venda de imóveis, o testamento, a venda judicial de bens de menores e interditos etc. Para segurança das partes contratantes a lei impõe a nulidade aos atos praticados sem desobediência à formalidade legal. Contudo, como já visto, em certos casos a nulidade de determinadas cláusulas não obriga a nulidade do negócio.

Outrossim não poderá o comprador de um imóvel pretender fazer valer seu direito à propriedade, objeto a transação, se não efetuou o negócio através de escritura pública devidamente registrada no cartório competente, tendo sido tal imóvel vendido a terceiro, na forma legal e levado por este ao registro respectivo. Terá o primeiro contratante, apenas, ação de indenização por perdas e danos contra o alienante mas, para efeito de compra e venda, na forma legal, seu documento é nulo.

Igualmente nula é a venda de bens de menores em desobediência às formalidades legais. Nulo é o casamento se não foram obedecidas as formalidades impostas pela lei, pois a preterição de formalidade retira do ato perfeito um dos requisitos à sua formação legal.

4.14 Preterição de solenidade legal.

Muitas vezes acontece que um negócio jurídico é constituído com as formalidades legais, mas carente de algum dos elementos extrínsecos ou solenes que a lei reputa necessários à sua validade. É o que ocorre, por exemplo, com a compra e venda de bens de menores sem a devida autorização judicial, ou quando o casamento é celebrado sem a devida publicação dos editais, ou quando o titular que lavrou a escritura de venda e compra de imóvel não estava em exercício de seu cargo ou quando a sentença foi proferida por juiz sem exercício. Portanto acontece o ato, com as formalidades legais, mas despido de determinadas solenidades que a lei reputa imprescindíveis à sua formação.

Da mesma forma os tribunais têm tornado nulos certos exames periciais elaborados por peritos não compromissados.

E esse rigor formal não se justifica somente ad probationem, ou seja, como simples meio de prova, porém o que se tem em conta, logicamente, é a garantia das partes envolvidas no negócio e, até mesmo, terceiros de boa fé. Po isso, o rigor ad solenitatem, como requisito elementar do ato é meio garantidor às partes no negócio.

4.15 Ato que a lei declara nulo ou nega efeito

Determinadas leis trazem em si a sanção da nulidade aos atos praticados contra seus dispositivos. Elas se protegem, impondo a nulidade do negócio jurídico que atenta contra seus enunciados. Dessarte, são vários os textos que assim estão redigidos (artigos 207, 208, 1125, todos do Código Civil).

Analisando o artigo 207 (artigo 1.548 do Novo Estatuto), Clóvis Bevilaqua assevera que, sendo a nulidade de ordem pública, pode ser pedida por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público e, por defeito de redação do Código isso não foi dito claramente.

O artigo 208 é taxativo no sentido de que a nulidade ali prevista ficará sanada se o vício não for alegado dentro de dois anos. Essa ressalva demonstra que o ato nulo, aqui, se equipara ao anulável, pois se distancia da técnica da nulidade absoluta, para se transformar em nulidade híbrida.

4.16 Atos praticados pelos absolutamente incapazes

O artigo 5º, do Código Civil (artigo 3º do Código Civil de 2002), define os incapazes nos ítens I a IV. Interessa-nos porém o estudo dos atos dos menores absolutamente incapazes. Mas ainda que resumidamente mencionaremos sobre os atos praticados pelos demais incapazes.

4.17 Atos praticados pelo menor de dezesseis anos

Com relação ao menor de dezesseis anos, é certo que a sua falta de discernimento quase sempre é uma fictio legis, pois não raramente ele tem inteligência desenvolvida. Essa idade é o limite entre a incapacidade absoluta e a relativa, em face do suposto desenvolvimento mental do menor e de sua reduzida aptidão.

A incapacidade do menor, no direito antigo, era aferida em razão da puberdade, então sendo denominados impúberes e púberes, respectivamente, os absolutamente e relativamente incapazes.

Na Alemanha a capacidade começa aos sete anos de idade. O ato do menor de sete anos é nulo, não admitindo prova em contrário, juris et de jure, não podendo nem mesmo receber liberalidade.

Nos Estados Unidos da América do Norte, como na Inglaterra, a maioridade começa aos vinte e um anos. Ela é progressiva, pois o sujeito a atinge gradativamente à medida que se aproxima dos vinte e um anos, nos termos do artigo 301 do Código Civil. O menor de dezesseis anos pode alistar-se na armada, desde que obtenha consentimento de seu representante legal. O homem de catorze anos e a mulher de dezesseis podem dispor, por última vontade, de sua propriedade. Os contratos nocivos, entretanto, são nulos e os vantajosos são válidos.

A nulidade, pelos motivos expostos, fica sujeita à constatação de prejuízos ao incapaz. (ESPÍNOLA, Eduardo, Manual do Código Civil Brasileiro, Rio de Janeiro; Jacintho Ribeiro dos Santos, 1932, p.301).

No Japão a maioridade começa aos vinte e um anos. O menor deve ter consentimento do representante legal para os atos da vida civil, exceto quando o procedimento não lhe causar prejuízo. (ESPÍNOLA, Eduardo, Op. cit. p.30).

No Código Civil brasileiro está prevista a maioridade aos vinte e um anos (a qual passará para os 18 anos no Novo Estatuto Civil a entrar em vigor no ano de 2003, artigo 4º, inciso I), cessando, todavia, a incapacidade do menor se, aos dezoito anos (dezesseis pelo artigo 5º § único, I do novo Código) for emancipado, contrair matrimônio, exercer emprego público efetivo, colar grau científico em curso de ensino superior ou montar estabelecimento civil ou comercial com economia própria, nos termos do artigo 9º.

Dessarte, os atos praticados pelo menor de dezesseis anos são nulos e anuláveis aqueles concluídos entre dezesseis e os vinte e um anos.

Entretanto, como já se afirmou, é muito comum apresentar o menor de dezesseis anos a inteligência e capacidade aptas para discernir a respeito de situações ligadas à gerência de sua pessoa e de seus bens.

O mesmo ocorre, indubitavelmente, com certos menores mesmo abaixo dos dezesseis anos, como aqueles que se auto gerem em diversos ato de sua vida civil, com absoluta regularidade, mesmo tendo idade de doze, treze, quatorze ou quinze anos, como quer demonstrar o presente trabalho.

No entanto, como a imposição deve ser respeitada é óbvio que tais menores somente poderão praticar determinados atos se representado devidamente, mesmo para se beneficiarem, como ocorre com as ações de investigação de paternidade por eles requeridas.


CAPÍTULO V

Sumário. 5.1. Direito Comparado. 5.2. A boa fé. 5.3. Incapacidade absoluta e atos jurídicos efetivos. 5.4. Menores absolutamente incapazes e autonomia privada. 5.5. Atos dos menores absolutamente incapazes e seus reflexos.

5.1. Direito comparado

Ao se fazer uma conceituação analítica dos direitos de outras civilizações, podemos constatar que, em várias legislações os atos dos menores absolutamente incapazes são nulos em regra.

O Código Civil italiano, no Titulo XII, artigo 427 e seguintes, adverte que o negócio jurídico praticado pelo incapaz de entender ou de querer será anulado a não ser que tenha ocasionado ou possa ocasionar prejuízo à pessoa daquele. Aduz também, expressamente no artigo 1306 que, os absolutamente incapazes, embora em regra não possam praticar atos jurídicos patrimoniais entre vivos, podem entretanto realizar outros como ocupação, tomada de posse, invenção de tesouro etc. (Código Civil Italiano. Tradução de Souza Diniz. Rio de Janeiro; Distribuidora Record Editora, 1961).

No direito português a incapacidade, como pondera Alves Moreira, se divide em natural e legal. Todas as pessoas que não têm discernimento são destituídas de capacidade legal. São os menores de sete anos, os interditos em virtude de alienação mental, os pródigos. A incapacidade natural é reservada aos alienados de todo o gênero (MOREIRA, Guilherme Alves, Instituições de Direito Português, Lisboa, Garnier, v. I, 1908, p.397).

Na Suíça, o Código Civil, no seu artigo 16 decreta a incapacidade absoluta para aqueles reconhecidamente incapazes de discernimento e aos menores, desde que não possam agir razoavelmente. O legislador suíço define a incapacidade de discernimento no artigo 16 e dispõe no artigo 17 que o ato do incapaz de discernimento não produz efeitos jurídicos. (Código Suíço, Tradução de Souza Diniz, Rio de janeiro; Distribuidora Récord Editora, 1961: "Quem for incapaz de discernimento não pode, com observância de exceções legais, estabelecer, pelos seus atos, efeitos jurídicos").

O Código Civil Alemão, no artigo 105, dispõe que a declaração de vontade de um incapaz é nula (Código Civil Alemão, Tradução de Souza Diniz, Rio de janeiro, Distribuidora Récord Editora, 1960).

Prossegue o direito positivo germânico asseverando taxativamente, em seu parágrafo 104 que, é incapaz de negócio aquele que não completou sete anos de idade e, também, aquele que se encontra em estado de perturbação mental, com exclusão da determinação da vontade e, ainda, aquele que foi interditado.

Portanto, de acordo com o Direito Alemão, se o ato foi praticdo por pessoa capaz ele não se invalida, como também não se invalida aquele ato perpetrado pelo incapaz quando não lhe cause prejuízo, desde que na conduta desse incapaz, como visto, haja a vontade provida de seus elementos - o querer e a consciência de ação - pois inexistindo o primeiro não há ação e do juizo de valor sobre o segundo depende a formação da vontade negocial (a autonomia privada).

5.2. A boa fé

São dois os aspectos sob os quais a boa fé deve ser estudada: o psicológico e o ético ou moral. Psicologicamente é o pensamento de quem acredita estar agindo de acordo com as normas de conduta. Esse elemento subjetivo faz com que o agente acredite estar pautando a sua conduta corretamente. É o animus correctus daquele que crê em sua consciência.

Do ponto de vista ético ou moral, objetivamente, ela se constitui na lealdade, franqueza, honestidade. É a conformidade entre o pensar e o agir, ou seja, a lealdada da conduta refletida nos efeitos.

A boa fé tem fundamentos sociais que se traduzem no direito que lhe dá suporte. Tanto é que os romanos já definiam o direito como: honestae vivere, alterum non laedere, suum cuique tribuere (viver honestamente, não lesar a ninguém, dar a cada um o que é seu). O viver honestamente que pregavam os romanos estava inserido no conceito de boa fé, consubstanciada pelos elementos subjetivos e objetivos.

Sob a ótica jurídica, a boa fé pode ser vista por duas faces: uma subjetiva e outra objetiva. Quando dizemos que o possuidor está de boa fé, queremos afirmar a boa fé subjetiva, mas, senos pronunciamos a respeito do contractus bonae fidei, estamos nos referindo à boa fé no âmbito objetivo, em virtude do encontro de vontades.

Quando a honradez se apresenta na formação os negócios jurídicos, suprem-se, sanam-se os vícios até mesmo de certos atos nulos que passam a convalidar, como no casamento (artigo 221 do Código Civil - artigo 1561 do Novo Estatuto), com direito à indenização, no caso do artigo 547 (artigo 1255 do Código Civil de 2002).

A boa fé apaga a existência do dolo, que nada mais é do que o querer praticar um ilícito.

Por isso, existindo a boa fé, inexistente é o dolo. Se, porém, analisarmos o dolo ao lado da doutrina finalista da ação, evidentemente concluiremos que a boa fé, ao invés de excluir o dolo, tornará inexistente o conhecimento potencial da ilicitude do fato. Ela afeta o elemento discernimento e não o querer, propriamente dito. Na realidade é ela causa extintiva da culpabilidade face ao conhecimento falso, ou falta de conhecimento do caráter ilícito da ação.

Nelson Hungria, no Direito Penal, invocando lições de Manzini, ensina que, qualquer que seja o motivo levado pelo agente, em determinados casos, é ele salvo pela boa fé, que se opõe ao dolo e se traduz pela razoável crença na legitimidade do evento voluntariamente causado. (HUNGRIA Nelson, Comentários ao Código Penal, 3ª ed.Rio de Janeiro, Forense, 1955).

Na mesma proporção, no Direito Civil a boa fé está delineada em torno do querer e do discernimento. Ela exclui o querer ilícito, motivo pelo qual o sujeito, quando assim age, crê na normalidade de seu comportamento. A boa fé é o bálsamo do sujeito honrado, diante dos textos frios da lei.

A boa fé é a lealdade do sujeito no arquitetamento de seus planos; é a manutenção dessa mesma lealdade e lisura na dinamização dos negócios jurídicos em geral.

O Direito Civil italiano também informa que o contrato deve ser feito de boa fé e obriga, não só o que nele está expresso, mas, também, a todas as conseqüências que, segundo a equidade, o uso, ou a lei consagram. (LODOVICO BARASSI, op. cit. p.156: "I contratti debbono essere seguiti di buona fede, ed obligano non solo a quanto medesimi espresso, ma anche a tutte le consequence che secondo l''equità, l''uso o la legge derivano" ).

Da mesma forma o Código suíço anota, no artigo 3º, que a boa fé se presume na prática do ato (CÓDIGO Suíço, op. cit. artigo 3º).

No direito brasileiro, a boa fé, antes acenada apenas de maneira sutil e implícita, agora já surge de maneira expressa e como verdadeiro sustentáculo de negócios jurídicos praticados com eventuais falhas quer no conteúdo quer formais. Vejam-se a propósito os artigos 113, do Novo Código Civil e 4º, III, do Código de Defesa do Consumidor.

Aliás, a respeito do novo Código Civil, acentua Silvio de Salvo Venosa que o diploma orienta o legislador para, ao procurar o sentido de uma manifestação de vontade, ter sempre em mira os princípios de boa fé, regra geral dos contratos bem como a orientação dos costumes que cerca ma realização do negócio. (VENOSA, Silvio de Salvo, Direito Civil, Parte Geral, ed. Atlas, S.Paulo, 2002, p.403).

Portanto, duas situações importantes pode-se pronunciar a respeito do assunto: o princípio geral da boa fé e sua definição técnico-jurídica. Enquanto a primeira se traduz no direito abstrato, a outra é aferida em relação aos tipos normativos adequados.

A boa fé muitas vezes não só protege o direito de cada um que dela é portador, mas, em vários casos, é fonte criadora de direitos. Ela é forma de viver do homem civilizado, daquele a quem repugna o prejuízo alheio. É um dos índices de que, mais e mais, o homem se afasta de sua origem imperfeita. Sua origem é tão remota quanto o homem o é. Basta considerar as leis antigas, tais como o Código de Hamurabi e de Manu que dela já se ocupavam.

A boa fé se acha lastreada na eqüidade, motivo pelo qual ela embasa um direito justo. É ela uma ética jurídica. Na acepção ética tem ela alcance maior do que na concepção psicológica. Por isso, sob todos os prismas como o normativo, psicológico, o do princípio geral da boa fé, ou pelo lado ético, o negócio jurídico praticado pelo menor absolutamente incapaz mas que tem discernimento geral, deve adquirir validade se nele imperou a boa fé.

5.3 Incapacidade absoluta e atos jurídicos efetivos

O Código Civil Brasileiro, no artigo 145, I, define que o ato jurídico praticado por pessoa absolutamente incapaz é nulo, no que é seguido pelo Novo Código (de 2002, artigo 166, caput).

Daí decorrer que, segundo a própria norma, o negócio jurídico praticado por menor absolutamente incapaz tem existência embora os seus efeitos sejam fulminados pela lei, portanto não se trata de um inexistente jurídico.

E se tal manifestação de vontade não é ato inexistente, não criando um vácuo jurídico, mas ao contrário solidifica e preenche uma existência factual de que decorrem e se sustentam múltiplas outras relações de direito, surge daí a oportunidade de se aferir a intrigante possibilidade de que surta efeitos, ao contrário do raciocínio a ser aplicado ao ato inexistente, cuja falta total de estrutura jamais deixaria sequer chegar ao tal ponto analítico (análise de seus efeitos).

Como diz Pontes de Miranda, existem vontades concordantes que entram no mundo jurídico, nulamente ou ineficazmente, mas entram. (Tratado de Direito Privado, Parte Geral, 1ª ed. 200, Bookseller, Campinas, Tomo 3, p.70) Não se trata, absolutamente, de se querer dar ao trabalho a pretensão de conferir efeitos jurídicos, indistintamente, a determinadas ações humanas em procedimento literalmente contra legem.

Acontece que se procura abordar tema de suma importância ligado ao fenômeno que traduz a celebração, socialmente aceita, de atos jurídicos por menores absolutamente incapazes na vida corrente, uma verdade que campeia nos segmentos sociais na atualidade, inclusive com acentuado crescimento no setor econômico notadamente das relações de consumo.

De lege lata realmente não se concebe a prática de negócios jurídicos por quem não está investido da respectiva capacidade, até porque diz o artigo 84 do Código Civil que, a celebração de atos jurídicos por menores será feita mediante a representação (pelos pais, tutores ou curadores) em se tratando de incapacidade absoluta; e mediante assistência (pelas pessoas designadas pela lei) se for caso de incapacidade relativa.

De acordo com o artigo 82, verifica-se que um dos requisitos para a validade do ato jurídico é a capacidade do agente, daí inferindo que, faltando a capacidade de exercício, o praticante do ato deverá estar devidamente representado ou assistido.

A mens legis decorre do escopo de não se emprestar validade à vontade do menor pois lhe falta total ou parcialmente o discernimento necessário para contratar de acordo com a sua conveniência. A norma, verifica-se, é de proteção social em especial do próprio incapaz contra a sua falta de maturidade.

5.4 Menores absolutamente incapazese autonomia privada

O sentido da lei, conforme verificado, fez defeso ao menor absolutamente incapaz que exerça pessoalmente a autonomia privada por intermédio de negócios jurídicos. Para a definição do que vem a ser autonomia privada, postulado de inspiração eminentemente liberal em face do capitalismo, lançamos mão de textos de autores a seguir:

A autonomia privada ou liberdade negocial traduz-se no poder reconhecido pela ordem jurídica ao homem, prévia e necessariamente qualificado como sujeito jurídico, de juridicizar a sua actividade (designadamente, a sua actividade económica), realizando livremente negócios jurídicos e determinando os respectivos efeitos. (Ana Prata, "A tutela constitucional da autonomia privada", Coimbra/Portugal: Livraria Almedina, p.11)

Com la expressión <<autonomia privada>> he designado el poder atribuido por la ley a los idividuos de crear normas jurídicas en determinados campos a ellos reservados. (Luigi Ferri, "La autonomia privada", traduzido para o espanhol por Luis Sancho Mendizabal,in Editora Revista de Derecho Privado, Madrid: 1969).

Nem é por acaso que a Constituição Federal expressa no artigo 1º, IV, segunda parte, a tutela da livre iniciativa, aí podendo ser compreendidos, resquícios da consagração do princípio da autonomia da vontade humana e, em decorrência, da vontade privada. A propósito, inclusive, o jurista Wolgran Junqueira Ferreira comenta o dispositivo com muita propriedade. (FERREIRA, Wolgran Junqueira. Comentários à Contituição de 1988. 1. ed. Campinas-SP: Julex Livros, 1989, p. 86. "Um dos fundamentos da sociedade aberta, justa e solidária que a Constituição em seu primeiro artigo pretende que se construa no Brasil, tem como um dos alicerces a livre iniciativa. Esta decorre da própria liberdade do ser humano, partindo-se do princípio onde uma tarefa pode ser satisfatoriamente preenchida pela iniciativa do indivíduo ou de pequenas unidades sociais, a realização desta tarefa deve ser deixada à iniciativa do indivíduo ou das pequenas unidades socais")

Na opinião do doutrinador italiano Luigi Ferri, o negócio jurídico é fonte de norma jurídica (p.ex. o contrato faz lei entre as partes) e a autonomia privada seria, então, verdadeiro poder normativo. O exercício da autonomia privada pressupõe a autonomia da vontade. Para Silvio Rodrigues (Direito Civil, vol. 3, 20ª edição, S.Paulo, Saraiva, 1991, p.15) a autonomia da vontade consiste "na prerrogativa conferida aos indivíduos de criarem relações na órbita do direito, desde que se submetam às regras impostas pela lei e que seus fins coincidam com o interesse geral, ou não o contradigam".

De tudo decorre, então, que para que o homem possa praticar negócios jurídicos e fazer atuar sua vontade autônoma nos diversos setores da vida em sociedade, necessário que a lei confira efeitos à expressão dessa vontade, o que não ocorre com os menores absolutamente incapazes. Se assim, encerra-se a questão por vontade do legislador, ao verificar-se que reina e eiva da nulidade absoluta no ato jurídico praticado por menor impúbere (artigo 145, I, do Código Civil de 1916 e 166, I, do novo Estatuto).

Como visto, manifesta-se a doutrina tradicional no sentido de que se o ato jurídico é nulo, não produz efeitos na órbita jurídica e não pode ser ratificado, inclusive sendo certo que a nulidade é imprescritível e sua declaração produz efeitos ex tunc. Esse portanto o tratamento legal dispensado ao ato - nulo - praticado por menores absolutamente incapazes e contra o qual os doutrinadores pouco opõem óbices.

Mas não obstante a meridiana clareza que a solução legal - simplista demais - empresta ao tema, cabe analisar se ela realmente se adequa ao cotidiano da vida dos incapazes, o que não parece uma solução acolhida pela realidade social, por isso que a exigir reavaliações que o trabalho está se propondo a operar.

Como já se fez escrever, não se abordaram os negócios jurídicos celebrados pelos menores relativamente incapazes por já existir disposição normativa a respeito (artigos 154 e seguintes do Código Civil e o instituto da ratificação dos artigos 148 e seguintes do Código Civil, respectivamente artigos 180 e 172 do Código Civil de 2002).

5.5 Atos dos menores absolutamente incapazes e sua validade

Volvendo ao tema, tem-se que numa rápida mas verdadeira e álgida observação da vida em sociedade daqueles menores absolutamente incapazes, logo se perceberia que a pretensão de que todos os negócios jurídicos por eles praticados fossem anulados, obviamente esbarraria no provocar de um caos nas relações jurídicas mais simples, para não falar em verdadeira pane de setores econômicos das atividades sociais, notadamente no comércio, onde o menor figura com certa freqüência num dos polos das respectivas relações jurídicas. Até porque a própria Constituição Federal em seu artigo 227 previu e assegurou aos menores, quaisquer que seja a sua idade, o direito à convivência comunitária, aí compreendida, obviamente, a prática dos atos de sua vida civil, desde que não lhes acarrete prejuízo moral ou material.

Medite-se na simplicidade que reflete a situação de um menor absolutamente incapaz sozinho, independentemente de representação, tomar um ônibus, ir ao cinema, adquirir bens de pequeno valor em bares, lanchonetes, comprar roupas, calçados, livros, eletroeletrônicos... E os comerciantes ou prestadores de pequenos serviços, como pessoas livres para negociar, no outro lado daquelas relações jurídicas, jamais tiveram a preocupação de exigir o que a lei determina, ou seja, que o menor esteja, nesses casos, sempre acompanhado de seu representante para poder concluir o ato. Não há nos repertórios e precedentes judiciais causas ajuizadas por comerciantes, empresas de transporte, outros prestadores de pequenos serviços etc, cujo objeto seja anular atos que praticaram com menores.

Por que a lei não teria emprestado validade a tais atos ? Pretende que, tão simples, sejam sempre anulados ? A falta de discernimento do menor é tão grave a esse ponto ? Entende o legislador que a sociedade repudia esses atos e o terceiro de boa fé, no íntimo, jamais o aceitaria ? Os bons costumes são violados ? Evidente que as respostas são todas no sentido negativo.

Impossível, por outro lado, comentar tão importante assunto sem fazê-lo em cotejo com o instituto da representação (art.116, do Código Civil ).

De modo que, dir-se-ia, então, que são válidos aqueles negócios jurídicos praticados pelos menores absolutamente incapazes porque, não obstante então desacompanhados dos pais ou representantes legais, estariam eles na verdade representados implícita ou tacitamente por estes, de quem, assim, seriam meros longa manus. Vale dizer, os pais é quem na verdade praticariam tais atos jurídicos entretanto se servindo dos filhos menores que atuariam como autômatos em prol dos referidos ascendentes.

Mas aí caberia uma pergunta: como ficaria a situação nas hipóteses em que os menores, ao praticar atos jurídicos estivessem, por qualquer motivo (falecimento, ausência, declaração judicial) sem representante legal, ainda que momentaneamente ? Obviamente que a tese - longa manus - se esvaziaria, inclusive porque, repise-se, o menor não atua como autômato, pois ele age com discernimento, adquirindo o que quer e precisa, quando quer, por preço compatível, enfim numa relação jurídica amplamente informada pela vontade das partes e dominada pela autonomia privada.

Pelos mesmos motivos nem se diga que o menor, em situações tais, se equipararia à figura do Núncio, cuja tarefa, para Silvio de Salvo Venosa, pode consistir no simples ato de entrega de documento ou na reprodução, de viva voz, da declaração de alguém. Em ambos os casos o mensageiro coopera na conclusão do negócio jurídico, mas não atua em nome e por conta do verdadeiro titular.(VENOSA, Silvio de Salvo, Direito Civil, Parte Geral. 2. ed. São Paulo, Atlas, 2002, p.375)

O Código Civil Português adotou expressamente, em seu artigo 127, um sistema de excepções à incapacidade dos menores, conferindo validade aos atos praticados pelos maiores de dezesseis anos em determinados casos, próprios da vida corrente, àqueles concernentes às despesas e disposições de pequena importância e àqueles relativos à profissão, arte ou ofício do incapaz.

Para uma adequada discussão do problema e encaminhamento de solução em nível hipotético, seria necessária a adoção de uma - ou todas - dentre três vertentes temáticas: incapacidade, nulidade e contratos, certo que no plano destes últimos, em regra, se situam aqueles negócios jurídicos de que se fala.

Também porque não é absurdo dizer que há fatos jurídicos que são fruto da vontade do homem, produzem efeitos na orla do Direito mas para os quais no entanto é despicienda a capacidade de gozo ou exercício (descoberta de tesouro, a edificação, a plantação); bem assim igualmente há nulidades que, ao contrário da regra ditada pela doutrina, podem ser sanadas (artigos 208, do Código Civil, 1554 do Código Civil de 2002, 245, CPC e 572, CPP). Em outras palavras, a falta de capacidade legal não é óbice intransponível para as relações de direito, do mesmo modo que há atos nulos que produzem efeitos.

Por isso que mais atraente o estudo da questão pelo flanco das relações contratuais. Nelas melhor se concentra a discussão na medida em que neste campo se pode aferir se tais atos jurídicos são realmente fruto da vontade do menor contraente, se trazem comutatividade proporcionando-lhe a prévia e correta observação acerca da equivalência das prestações, se inexiste ilicitude de objeto, se deixam de infringir normas com relação à forma, se tem função social e se, notadamente, deixam de atentar contra os interesses sociais e do próprio menor. Enfim se o menor quis e efetivamente conseguiu contratar como outra pessoa qualquer. Afastada porém fica a idéia, obviamente, naqueles casos em que o negócio jurídico é formal ou solene, assim se tornando imprescindível a figura do representante legal quando num dos polos se posiciona o menor absolutamente incapaz (outorga de uma escritura pública de transferência de propriedade p.ex.)

Mas as respostas com pertinência à discussão sobre a formação válida do contrato como anteriormente mencionado, evidentemente são todas no sentido positivo. Por isso que não há como negar eficácia aos negócios jurídicos celebrados pelos menores absolutamente incapazes.

Até porque, novamente levando-se em conta a teoria da vontade, não há como negar que os impúberes efetivamente têm vontade, agem orientados por ela e pautam os atos jurídicos que praticam pelo discernimento e a orientação que sem dúvida a mesma lhes proporciona, certo ainda que, esporadicamente, o próprio direito positivo a considera. Veja-se, a propósito, o artigo 28, § 1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, ao tratar da colocação em família substituta, em que se expressa que... sempre que possível, a criança ou adolescente deverá ser previamente ouvido e a sua opinião devidamente considerada.

Com efeito, o menor absolutamente incapaz, ao implementar seu desejo de adquirir algum bem ou serviço colocado à sua disposição no mercado de consumo em geral, efetivamente o faz sob uma orientação psíquica somente sua em que se norteia livre e espontaneamente sobre o que quer, quando quer, porque quer, onde encontrar e a que custo alcançará o seu desígnio, este de coerência moral, de seu regular interesse (vontade privada) e sem o destempero da má fé de qualquer das partes. Não pode, absolutamente, sob esse prisma, ser comparado a pessoas cuja incapacidade total seja relacionada com problemas de ordem psico-somática. Daí presente sem dúvida o elemento volitivo essencial e constitutivo do negócio jurídico então praticado e com relação ao qual, assim, inexistirão restrições sociais, de costumes e conseqüentemente jurídicas.

O importante, repita-se, segundo o já citado SILVIO DE SALVO VENOSA, é que, superada a questão do elemento volitivo no polo em que se situa o incapaz no ato negocial, se tenha sempre em mira os princípios de boa fé, regra geral dos negócios jurídicos enquanto contratos, bem como a orientação dos costumes que cercam a realização do ato. (Direito Civil, Parte Geral, ed. Atlas, São Paulo, 2002, p.403).

E como diz CLAUDIA LIMA MARQUES, a idéia de contrato vem sendo moldada, desde os romanos, tendo sempre como base as práticas sociais, a moral e o modelo econômico da época. O contrato, por assim dizer, nasceu da realidade social. Efetivamente, sem os contratos de troca econômica, especialmente os contrato de compra e venda, de empréstimo e de permuta, a sociedade atual de consumo não existiria como a conhecemos. O valor decisivo do contrato está portanto, em ser o instrumento jurídico que possibilita e regulamenta o movimento de riquezas dentro da sociedade. (CONTRATOS NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, 3ª edição, ed. Revista dos Tribunais,, São Paulo, p.35).

Bem se vê, portanto, que ocorre a movimentação maior da economia no seio social, notadamente pelos pequenos e informais contratos, pois estes exercem maior influência na geração dos negócios nas relações de consumo, especialmente as comerciais.

Se assim, forçoso reconhecer a influência que os atos jurídicos contratuais praticados por menores absolutamente incapazes exercem em tudo aquilo praticamente que gira envolvendo coisas de pequeno valor.

Praticamente quase tudo que é de pequeno valor econômico individualmente considerado e produzido para vender em grande escala é voltado para o consumo de crianças e adolescentes.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do que se abordou, concluímos que o negócio jurídico praticado por aqueles menores absolutamente incapazes mas que ostentam discernimento em suas ações produz efeitos.

A respectiva orientação legal ditada pelo Direito Civil brasileiro vem contrariando não somente os nítidos princípios jurídicos relativos ao conceito de vontade e incapacidade, como anotamos, mas também, ainda mais, as conclusões filosóficas e naturais encampadas pelo próprio corpo social quando se trata de aferir os negócios realizados na vida cotidiana por menores absolutamente incapazes.

A prática o revela nos atos de vida corrente nos quais se verifica a atuação absolutamente normal daqueles nas pertinentes relações comerciais no dia a dia, inclusive com o estímulo implementado por legítimos e ponderados segmentos sociais, como a família e a mídia em evidentemente orientação histórica e idelógica do capitalismo, que não sobrevive sem o consumo.

De outro lado, a quase que ausência de precedentes judiciais a respeito, seja julgados conferindo validade àqueles negócios jurídicos ou lhes repelindo eficácia igualmente indica a aceitação geral - chegando quase à indiferença - de tais atos pela sociedade.

É evidente, como sinalizamos que, não basta que a vontade do incapaz na prática daqueles atos esteja com traços bem nítidos da presença de seus elementos estruturais - o querer e a consciência de ação - assim igualmente refletida a presença da autonomia privada; é preciso também que tais atos se revistam do manto purificador da boa fé e que, especialmente, não traga qualquer prejuízo ao menor. Também é impossível conceber a idéia de total validade a atos ou negócios jurídicos formais praticados pelos referidos incapazes pois com relação a estes, que exigem forma ou solenidade, impossível será a participação do menor senão por intermédio do representante legal.

Assim, como em algumas civilizações estrangeiras conforme já anotado, nada impede que o legislador brasileiro insira no direito civil positivo o caráter de anulabilidade - e não nulidade - daqueles negócios jurídicos praticado por menores absolutamente incapazes, nas condições expostas. Até porque, repise-se, estaria nada mais do que chancelando os regulares, previsíveis e extremamente bem controlados hábitos da própria sociedade em nítida revelação de que os costumes e o interesse geral já agasalharam essa regra de conduta.

Nem se diga, como já fizemos anotar, que o instituto da representação, como dispositivo da parte geral então a ser utilizado em sentido implícito, supra a deficiência legislativa e resolva o problema em referência. É que, nos casos em que ausente por qualquer motivo essa representação - tácita - torna à dúvida a realidade factual, novamente sendo necessário que se lance mão das conclusões e soluções que, em síntese, o trabalho apresenta.

Concluindo, fica estampada a idéia então de que os atos ou negócios jurídicos denominados da vida corrente (nem todos indistintamente, excluindo-se como anotado, os formais ou solenes em que a representação é imprescindível) praticados por menores absolutamente incapazes (alguns também, porque aqueles de muito tenra idade ou de incapacidade total comparada às dos indivíduos com problemas de ordem psico-somática se excluem do conceito) são válidos porque esteiados nos princípios da autonomia privada, costumes e boa fé, condicionados porém à circunstância de não trazerem qualquer prejuízo moral ou material ao incapaz.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MELO, Reinaldo Lucas de. Atos jurídicos imperfeitos. Praticados por menores absolutamente incapazes. Validade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2070, 2 mar. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12362. Acesso em: 28 mar. 2024.