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Honorários advocatícios e cumprimento de sentença.

O "leading case" do STJ (REsp nº 978.545-MG)

Honorários advocatícios e cumprimento de sentença. O "leading case" do STJ (REsp nº 978.545-MG)

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A tese jurídica reconhece o direito do advogado à percepção de honorários advocatícios na fase executiva do processo sincrético, em valorização da atividade do advogado e do direito do cidadão.

RESUMO:   

O Superior Tribunal de Justiça apresenta o seu primeiro precedente envolvendo o cabimento de honorários advocatícios no cumprimento de sentença.

A tese jurídica externada no julgamento do Recurso Especial n. 978.545-MG reconhece o direito do advogado à percepção de honorários advocatícios na fase executiva do processo sincrético à luz da correta interpretação do art. 20, §4º do CPC, da necessária e obrigatória participação do advogado e em valorização da sua atividade e do próprio direito do cidadão e, por fim, da interpretação da norma considerando o espírito das novas alterações legislativas.

Palavras Chaves: cumprimento de sentença – atividade do advogado – honorários advocatícios

ABSTRACT:

The leading decision conceding the right to legal fees in phase of compliance of decision has been publische, following a judgement of the righ court of justice (STJ).

The juridical thesis impinges on the right of the lawyer to receive legal fees, when the executive phase takes place, according to the code of civil procedure, article 20, § 4º. The thesis is founded on the necessary and mandatory participation of the lawyer on this phase, and it pays homage to lawyers´ work and citizenship, as well as the "ratio legis" of the legislative reforms.

The entire wording of the appeal that caused the judgement of the high corrt of justice is herein presented. Special appeal nº 978.545-MG.

Keywords: Compliance of decision.Lawyer´s work. Legal fees.

SUMÁRIO: 1. O leading case do STJ envolvendo o cabimento de honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença; 2. 1º argumento - A interpretação sistemática do Código de Processo Civil juntamente com o sentir jurisprudencial já definido para a aplicação do §4º do art. 20 traz orientação que deve ser seguida; 3. 2º argumento - O fato do requerimento para efetivação do cumprimento de sentença ser feito por advogado é mais que justificador ao direito de percepção aos honorários de sucumbência em razão da atividade profissional exercida nesta fase – contrariedade à mens legis advinda da redação do art. 475-J do CPC e direito legal previsto no art. 22 da Lei n. 8.906/94; 4. 3º argumento – O próprio espírito condutor das alterações pretendidas com a Lei n. 11.232/05, em especial, em relação ao "novo" processo sincrético e à multa de 10% prevista no art. 475-J do CPC; 5. Conclusão


1. O leading case do STJ envolvendo o cabimento de honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença

O primeiro precedente do Superior Tribunal de Justiça relacionado ao cabimento de honorários advocatícios no cumprimento de sentença tem a seguinte ementa:

"PROCESSO CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. NOVA SISTEMÁTICA IMPOSTA PELA LEI Nº 11.232/05. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS. POSSIBILIDADE. - O fato de se ter alterado a natureza da execução de sentença, que deixou de ser tratada como processo autônomo e passou a ser mera fase complementar do mesmo processo em que o provimento é assegurado, não traz nenhuma modificação no que tange aos honorários advocatícios. - A própria interpretação literal do art. 20, § 4º, do CPC não deixa margem para dúvidas. Consoante expressa dicção do referido dispositivo legal, os honorários são devidos "nas execuções, embargadas ou não". - O art. 475-I, do CPC, é expresso em afirmar que o cumprimento da sentença, nos casos de obrigação pecuniária, se faz por execução. Ora, se haverá arbitramento de honorários na execução (art. 20, § 4º, do CPC) e se o cumprimento da sentença se faz por execução (art. 475, I, do CPC), outra conclusão não é possível, senão a de que haverá a fixação de verba honorária na fase de cumprimento da sentença. - Ademais, a verba honorária fixada na fase de cognição leva em consideração apenas o trabalho realizado pelo advogado até então. - Por derradeiro, também na fase de cumprimento de sentença, há de se considerar o próprio espírito condutor das alterações pretendidas com a Lei nº 11.232/05, em especial a multa de 10% prevista no art. 475-J do CPC. De nada adiantaria a criação de uma multa de 10% sobre o valor da condenação para o devedor que não cumpre voluntariamente a sentença se, de outro lado, fosse eliminada a fixação de verba honorária, arbitrada no percentual de 10% a 20%, também sobre o valor da condenação. Recurso especial conhecido e provido."

A ementa supra foi proferida no julgamento do Recurso Especial n. 978.545-MG, em acórdão da relatoria da Ministra NANCY ANDRIGHI e foi o primeiro julgamento envolvendo o cabimento ou não de honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença (leading case).

A Lei 11.232/05, no tocante à pretensão executiva das obrigações de pagar quantia certa fundada em título executivo judicial, ultimou a intenção do legislador na consolidação de um "procedimento sincrético" (com junção de várias atividades procedimentais – cognição e execução - no mesmo procedimento), movimento iniciado pela Lei 8.952/94 (com a introdução do art. 461 do CPC - tutela específica das obrigações de fazer e não fazer), seguido pela alteração legislativa da Lei 10.444/02 (com o acréscimo do art. 461-A – para execução das obrigações de entregar coisa).

Dentre as discussões que surgiram após a entrada em vigor da Lei 11.232/05, destacou-se uma que envolve o cabimento ou não da condenação em honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença.

O questionamento surgiu da afirmação de que a execução do título judicial que reconheceu a obrigação de pagamento de quantia certa não se daria mais através de ação autônoma de execução, mas, sim, como fase superveniente ao reconhecimento da obrigação que, caso não satisfeita, autorizaria o início de atos, a requerimento do exeqüente (neste ponto, já é importante salientar: representado por um advogado), visando ao "cumprimento da sentença" (art. 475-J do CPC).

Para alguns doutrinadores não seriam devidos honorários advocatícios nesta fase de cumprimento ao entendimento de que, sendo mera continuação do processo já existente, não se lhe aplicaria o comando do art. 20 do CPC, mesmo quando se verificasse resistência pelo executado através do incidente da impugnação.

Todavia, vozes começaram a se levantar contra este entendimento. Um dos primeiros artigos jurídicos que realmente elegeram o tema como objeto de estudo concluindo pelo cabimento dos honorários foi elaborado pelo Prof. Dr. Adv. Dierle Nunes em artigo intitulado "Honorários de sucumbência na nova fase de cumprimento de sentença estruturada pela Lei n. 11.232/05" (In Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1098, 4 jul. 2006. Disponível em: jus.com.br/artigos/8593. acesso em: 25 out. 2006).

Mas faltava ainda o exame da questão pelo Judiciário.

Foi, neste momento, que o destino me presenteou com uma oportunidade ímpar.

Não me lembro com certeza da data. Estava lecionando em curso de pós-graduação sobre a Lei 11.232/05 analisando as implicações jurídicas que surgiram em razão das novas regras procedimentais de satisfação das obrigações de pagar quantia certa, dentre elas a incidência ou não de honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença.

Como estudioso da matéria e, principalmente, em defesa das prerrogativas do exercício da advocacia, sempre defendi em sala de aula o cabimento total e irrestrito do dever de condenação em honorários advocatícios no momento em que se inicia a fase de cumprimento por provocação do exeqüente (ocasião em que se exige a participação técnica e essencial do advogado).

Neste momento, uma colega, Dra. Heliane Silveira Loredo, em processo sob seu patrocínio e em razão da atividade por ela exercida depois de transcorrido o prazo para cumprimento voluntário da obrigação, informou sobre a publicação de decisão interlocutória de indeferimento do seu pedido para condenação em pagamento de honorários advocatícios.

No caso concreto, o executado não chegou a oferecer sua "impugnação" (nome técnico ao incidente de defesa do executado no cumprimento de sentença) e, em razão disso, o juízo a quo entendeu pelo não cabimento dos honorários advocatícios.

Diante disso, resolvemos defender a tese do cabimento dos honorários. O momento não poderia ter sido melhor. A novidade da matéria e a rapidez como as decisões judiciais, na seara recursal, normalmente são proferidas em Minas Gerais permitiam deduzir que rapidamente teríamos uma decisão do TJMG. Como a decisão do TJMG confirmou o afastamento da incidência dos honorários advocatícios, foi possível levar a discussão para solução definitiva do STJ através de recurso especial (REsp 978.545-MG), defendendo a tese, na defesa das prerrogativas dos advogados e no direito constitucional ao advogado (Art. 133, CRFB/88), que a todo cidadão é assegurado para defesa adequada de seus direitos fundamentais.

Conforme asseverou o então 2º Vice-Presidente do TJMG, Des. CARREIRA MACHADO, em decisão de admissão do recurso especial, "a matéria sugere inequívocas implicações na esfera jurisdicional e a solução do impasse desponta como decisão de grande relevo no cenário jurídico".

No STJ, em acórdão capitaneado pelo judicioso voto da Ministra NANCY ANDRIGHI, no julgamento do Recurso Especial n. 978.545-MG, à luz das novas regras processuais de otimização da eficiência da execução e em manifesto reconhecimento da valorização da atividade do advogado, restou definido que "esgotado in albis o prazo para cumprimento voluntário da sentença, torna-se necessária a realização de atos tendentes à satisfação forçada do julgado, o que está a exigir atividade do advogado e, em conseqüência, nova condenação em honorários, como forma de remuneração do causídico em relação ao trabalho desenvolvido na etapa do cumprimento de sentença".

Segundo a Ministra, "do contrário, o advogado trabalhará sem ter assegurado o recebimento da respectiva contraprestação pelo serviço prestado, caracterizando ofensa ao art. 22 da Lei n. 8,906/94 – Estatuto da Advocacia, que garante ao causídico a percepção dos honorários de sucumbência".

Os fundamentos jurídicos utilizados no acórdão proferido podem ser sistematizados em pelo menos 03 argumentos:


2. 1º argumento - A interpretação sistemática do Código de Processo Civil juntamente com o sentir jurisprudencial já definido para a aplicação do §4º do art. 20 trazem orientação que deve ser seguida

À luz do voto proferido pela Ministra NANCY ANDRIGHI, um dos fundamentos considerados para se concluir pelo cabimento da condenação de honorários advocatícios no cumprimento de sentença, encontra-se alicerçado na própria interpretação dos dispositivos legais do Código de Processo Civil, em especial, do seu art. 20, §4º, uma vez que, segundo seu entendimento, "a própria interpretação literal do art. 20, §4º, do CPC não deixa margem para dúvidas. Consoante expressa dicção do referido dispositivo legal, os honorários são devidos nas execuções, embargadas ou não".

O Código de Processo Civil, como regra geral de imposição de sucumbência, estabelece:

"Art. 20 (...)".

"§ 4º Nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, e nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo anterior".

Não é crível que uma norma ultrapassaria os limites do razoável para impor interpretação totalmente diferente da interpretação antes dada, apenas porque estamos, agora, diante de um processo sincrético.

O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, em 07/10/1998, quando do julgamento por sua Corte Especial do REsp 140.403/RS, já teve a oportunidade de uniformizar o seu entendimento:

"EXECUÇÃO. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. ART. 20, §4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI NO 8.952/94. 1. A nova redação do art. 20, do Código de Processo Civil deixa induvidoso cabimento de honorários de advogado em execução, mesmo não embargada. Não fazendo a lei, para esse fim, distinção entre execução fundada em título judicial e execução fundada em titulo extrajudicial" (STJ, REsp nº 140.403/RS, Min. Rel. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 07/10/1998, DJ. 05/04/1999).

Deste precedente jurisprudencial uniformizador e da leitura dos votos proferidos, extraem-se os seguintes ensinamentos que servem como justificadores da tese jurídica sustentada neste artigo, a saber:

a) a manutenção da condenação em honorários serve como mais um ponto para desencorajar a inércia do devedor que deve cumprir a sua obrigação;

b) o dever ao pagamento da sucumbência sempre foi devido na justificativa do inadimplemento e na necessidade da atuação do advogado para fazer valer os direitos do exeqüente, e não no fato de existir ou não defesa por parte do executado.

Neste particular, vale frisar que, em relação a este argumento, a própria relatora deixou claro que "o fato da execução agora ser um mero ‘incidente’ do processo não impede a condenação em honorários, como, aliás, ocorre em sede de exceção de pré-executividade, na qual esta Corte admite a incidência da verba".

Acrescenta-se, ainda, que esta interpretação literal também pode ser feita à luz de uma interpretação sistemática.

CARLOS MAXIMILIANO [01] ensina:

"Consiste o Processo Sistemático em comparar o dispositivo sujeito a exegese, com outros do mesmo repositório ou de leis diversas, mas referentes ao mesmo objeto".

"Por umas normas se conhece o espírito das outras. Procura-se conciliar as palavras antecedentes com as conseqüentes, e do exame das regras em conjunto deduzir o sentido de cada uma".

Outro ponto importante deve ser enfrentado: a Lei 11232/05 também não fez, de forma expressa, qualquer restrição ao direito do advogado do exeqüente ao recebimento dos honorários.

Se não há previsão legal neste sentido, deve ser aplicada a norma do art. 475-R do CPC, que determina aplicação subsidiária das normas que regem o processo de execução de título extrajudicial.

Prevalecem, então, as normas dos arts. 651 e 710 que, para satisfação da obrigação, exigem o pagamento de honorários advocatícios. Vejamos os textos em referência:

"Art. 651. Antes de arrematados ou adjudicados os bens, pode o devedor, a todo tempo, remir a execução, pagando ou consignando a importância da dívida, mais juros, custas e honorários advocatícios".

"Art. 710. Estando o credor pago do principal, juros, custas e honorários, a importância que sobejar será restituída ao devedor".


3. 2º argumento - O fato do requerimento para efetivação do cumprimento de sentença ser feito por advogado é mais que justificador ao direito de percepção dos honorários de sucumbência em razão da atividade profissional exercida nesta fase – contrariedade à mens legis advinda da redação do art. 475-J do CPC e direito legal previsto no art. 22 da Lei n. 8.906/94

Conforme restou constado pela douta Ministra NANCY ANDRIGHI, "esgotado in albis o prazo para cumprimento voluntário da sentença, torna-se necessária a realização de atos tendentes à satisfação forçada do julgado, o que está a exigir atividade do advogado e, em conseqüência, nova condenação em honorários, como forma de remuneração do causídico em relação ao trabalho desenvolvido na etapa do cumprimento da sentença".

É certo que não se falará mais em processo de conhecimento e em processo de execução quando se tratar de execução de títulos executivos judiciais.

Também é induvidoso que o cumprimento de sentença, se não existir o pagamento voluntário pelo executado, prescindirá da provocação do interessado por via da elaboração de uma peça técnica (redigida e apresentada por um advogado).

Veja-se o texto da lei:

"Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação."

HUMBERTO THEODORO JÚNIOR [02] ensina:

"Embora não dependa a execução de instauração de uma nova ação (actio iudicati), o mandado de cumprimento da sentença condenatória, nos casos de quantia certa, não será expedido sem que o credor o requeira. É que lhe compete preparar a atividade executiva com a competente memória de cálculo, com base na qual o devedor realizará o pagamento, e o órgão executivo precederá, à falta de adimplemento, à penhora dos bens a expropriar".

A fase de cumprimento de sentença, nestes casos, exigirá a presença de um advogado. Então, é evidente que esta presença precisa ser remunerada à luz de tudo que já se interpretou em relação ao Código de Processo Civil.

Veja-se o próprio texto constitucional:

"Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei".

MARIO CHIAVARIO [03], sobre a importância do advogado, ensina:

"(...) a presença de sujeitos capazes de esclarecer com consciência e conhecimento de causa no emaranhado de questões que a realidade processual impõe assistência; nem sempre a pessoa diretamente interessada é suficientemente provida de conhecimento das leis e de experiência no campo processual; sem contar que uma conduta processual consciente pode encontrar obstáculo na mesma componente emocional, que frequentemente caracteriza a participação pessoal no processo". (tradução livre)

Então, não se pode negar a aplicação da Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da OAB) que, em seu art. 22, expressamente estabelece:

"Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários advocatícios convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência".

DIERLE JOSÉ COELHO NUNES [04], exímio processualista e autor de diversas obras e artigos jurídicos, já enfrentando as recentes alterações do CPC, em um de seus estudos, "Honorários de sucumbência na nova fase de cumprimento de sentença estruturada pela Lei nº 11.232/05", ensina:

"Assim, o exercício de uma defesa técnica pelos advogados consiste em garantia do cidadão exigindo desses profissionais uma atualização constante e mesmo um reforço de seu papel institucional de modo a subsidiar ao leigo uma defesa plena, que produzirá um reforço da sua própria cidadania".

"E a importância da defesa técnica subsidiada pelo advogado ganha enorme importância no contexto reformista de aumento de poderes dos juízes e de implementação de novas técnicas processuais, especialmente na fase executória".

"E, dentro dessa ótica de análise, precisa-se verificar a questão dos honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença".

As conclusões de seu exaustivo trabalho são esclarecedoras e merecem ser transcritas:

"A participação do advogado no sistema processual brasileiro não pode ser vista como uma meramente acidental em face de sua indispensabilidade constitucionalmente assegurada (art. 133, CRFB/88)".

"O exercício da atividade técnica de defesa não pode ser desvalorizada e nem mesmo suprimida sob pena de se esvaziar uma garantia que o cidadão brasileiro possui".

"A partir desse pressuposto constitucional percebe-se a necessidade de se reforçar, conjuntamente com a ênfase do papel da magistratura, o papel da advocacia".

"A postura belicosa de juízes com advogados ou vice-versa não poderia ser mais equivocada na atualidade em face da necessária interdependência de todos os sujeitos processuais no sistema de aplicação de tutela".

"Essa constatação impõe uma análise adequada da fixação dos honorários que garantem ao advogado a prática de seu múnus, especialmente embasado nos precedentes da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça".

"E, nesse aspecto, impõe-se a fixação de honorários na fase de cumprimento de sentença com ou sem o manejo pelo devedor de impugnação em face do inadimplemento do devedor."

"Tal fixação deverá ocorrer no momento em que o juízo possuir elementos objetivos para tal fixação".

"Obviamente que a remuneração do advogado deverá ser fixada de modo proporcional à atividade desenvolvida pelo procurador tanto na fase de conhecimento quanto na fase de cumprimento da sentença".

"Por outro lado, a supressão dos honorários na fase de cumprimento irá de encontro com os objetivos da reforma, especialmente com a busca da satisfação do credor em tempo razoável".

ARAKEN DE ASSIS, uma das maiores autoridades sobre execução, encerra a discussão:

"É omissa a disciplina do ‘cumprimento de sentença’ acerca do cabimento dos honorários advocatícios. No entanto, harmoniza-se com o espírito da reforma e, principalmente, com a onerosidade superveniente do processo para o condenado que não solve a dívida no prazo de espera de quinze dias – razão pela qual suportará, a titulo de pena, a multa de 10% (art. 475-J, caput) -, a fixação de honorários a favor do exeqüente, senão no ato que deferir a execução, no mínimo na oportunidade do levantamento do dinheiro penhorado ou do produto da alienação dos bens. Os honorários já contemplados no título judicial (e sequer em todos) se referem ao trabalho desenvolvido no processo de conhecimento, conforme se infere das diretrizes contempladas no art. 20, §3º, para sua fixação na sentença condenatória. E continua em vigor o art. 710: retornam as sobras do executado somente após a satisfação do principal, dos juros, da correção, das despesas processuais e dos honorários advocatícios. Do contrário, embora seja prematuro apontar o beneficiado com a reforma, já se poderia localizar o notório perdedor: o advogado do exeqüente, às voltas com difícil processo e incidentes, a exemplo da impugnação do art. 475-L, sem a devida contraprestação".

Dentro deste sistema jurídico e, principalmente, diante destas considerações, é que não se pode pensar, numa visão simplista, que está abolida a oportunidade de recebimento do direito aos honorários advocatícios ainda que na fase de cumprimento de sentença.

Entender diferente é, data maxima venia, contrariar a mens legis que inspirou o advento do art. 475-J do CPC e todo o sentido do processo sincrético bem como negar vigência ao art. 22 da Lei n. 8.906/94.


4. 3º argumento – O próprio espírito condutor das alterações pretendidas com a Lei n. 11.232/05, em especial, em relação ao "novo" processo sincrético e à multa de 10% prevista no art. 475-J do CPC, justifica a condenação em honorários advocatícios nesta fase

Por fim, e levando em consideração aquilo que a própria Ministra NANCY ANDRIGHI ressalvou como "maior motivo para que se fixem honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença" deve-se considerar o "próprio espírito condutor das alterações pretendidas com a Lei n. 11.232/05".

A Exposição de Motivos n. 34, do Projeto de Lei n. 3253/04, que deu origem à Lei 11.232/05, feita pelo então Ministro da Justiça MÁRCIO THOMAZ BASTOS foi bastante enfática ao afirmar que:

"Com efeito: após o longo contraditório no processo de conhecimento, ultrapassados todos os percalços, vencidos os sucessivos recursos, sofridos os prejuízos decorrentes da demora (quando menos o ''damno marginale in senso stretto'' de que nos fala Ítalo Andolina), o demandante logra obter alfim a prestação jurisdicional definitiva, com o trânsito em julgado da condenação da parte adversa. Recebe então a parte vitoriosa, de imediato, sem tardança maior, o ''bem da vida'' a que tem direito? Triste engano: a sentença condenatória é título executivo, mas não se reveste de preponderante eficácia executiva. Se o vencido não se dispõe a cumprir a sentença, haverá iniciar o processo de execução, efetuar nova citação, sujeitar-se à contrariedade do executado mediante ''embargos'', com sentença e a possibilidade de novos e sucessivos recursos.

Para, ao fim, colocar como solução defendida no novo projeto a necessidade de que ao "final do processo de conhecimento, após um ´tempus iudicati´, sem necessidade de um ´processo autônomo` de execução (afastam-se princípios teóricos em homenagem à eficiência e brevidade)" apresenta-se um "processo ´sincrético`" visando aumentar a "carga de eficácia da sentença".

Foi neste contexto que a Ministra NANCY ANDRIGHI, inclusive uma das signatárias do anteprojeto de Lei oferecido pelo IBDP – Instituto Brasileiro de Direito Processual que deu origem à Lei 11.232/05, asseverou em seu voto que:

"Realmente, a segunda onda de reformas do CPC/1973, a chamada ‘reforma da reforma’, foi centrada no processo de execução, tendo como objetivo maior a busca por resultados, tomando a prestação jurisdicional mais célere e menos burocrática, antecipando a satisfação do direito reconhecido na sentença".

"Nesse contexto, de nada adiantaria a criação de uma multa de 10% sobre o valor da condenação para o devedor que não cumpre voluntariamente a sentença se, de outro lado, fosse eliminada a fixação da verba honorária, arbitrada no percentual de 10% a 20%, também sobre o valor da condenação".


5. Conclusão

O Superior Tribunal de Justiça, cumprindo sua missão constitucional de ser o órgão jurisdicional responsável em garantir a unidade e uniformidade na interpretação do Direito federal em âmbito nacional, em acórdão da lavra da Ministra NANCY ANDRIGHI, no julgamento do Recurso Especial n. 978.545-MG, exerce o seu primeiro julgamento envolvendo o cabimento de honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença.

A orientação jurisprudencial não poderia trazer norte melhor, uma vez que aliam, na interpretação da norma, várias regras de hermenêutica, de efetivação da atividade executiva e, principalmente, da valorização da atividade do advogado e do próprio direito do cidadão pois, valorando a atividade profissional do advogado tem por valorizada a própria defesa do cidadão.

A tese jurídica externada no julgamento do Recurso Especial n. 978.545-MG, que reconhece o direito do advogado à percepção de honorários advocatícios na fase executiva do processo sincrético, de modo que "deve o juiz fixar, na fase de cumprimento de sentença, verba honorária, nos termos do art. 20, §4º, do CPC", mostra-se valiosíssimo precedente jurisprudencial em favor da valorização da atividade profissional do advogado e, por isso, deve ser propagado, difundido e, mais que tudo, defendido.


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Anexo

Exmo. Desembargador PRIMEIRO VICE-PRESIDENTE do egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais

Recurso especial originário do agravo de instrumento n. 1.0024.06.146118-2/001, julgado pela 12ª Câmara Cível do TJMG - UFS

A questão jurídica discutida neste recurso é matéria nova que talvez provoque o primeiro julgamento do STJ sobre a incidência ou não de honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença.

Este simples esclarecimento demonstra a importância deste julgamento pelo STJ, não só para a defesa dos interesses da recorrente como, também, para ensejar a melhor aplicação do Direito e a uniformização do pensamento jurisprudencial sobre a interpretação da norma infraconstitucional (FUNÇÃO PRIMORDIAL DO STJ).

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXX, já qualificada nos autos do agravo de instrumento n. 1.0024.06.146118-2/001, em que contende com YYYYYYYYYYYYYYY, também já qualificada, não se conformando com o v. acórdão de fls., interpõe RECURSO ESPECIAL com fundamento no permissivo da alínea "a", inciso III, do art. 105, da Constituição da República, consoante o incluso articulado.

Requer que o recurso seja admitido a fim de que o Tribunal ad quem possa conhecê-lo e provê-lo.

Deixa de recolher o preparo por estar a recorrente sob o pálio da Lei de Assistência Judiciária.

Belo Horizonte, 28 de novembro de 2006.

RAZÕES DO RECURSO ESPECIAL

Recorrente:XXXXXXXXXXXX

Recorrida:YYYYYYYYYYYY

Agravo de instrumento n. 1.0024.06.146118-2/001.

12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais

Colendo Superior Tribunal de Justiça

Eminentes Ministros

Tempestividade

O acórdão foi publicado no dia 11/11/2006, sábado, estabelecendo o dies a quo em 13/11/2006, terça-feira, e o dies ad quem em 28/11/2006, terça-feira. Logo, a tempestividade é inconteste.

Exposição do Fato e do Direito

Os fatos que dão ensejo à presente irresignação recursal são simples e dizem respeito à aplicação da novel legislação que alterou o procedimento executivo – Lei 11.232/05.

Trata-se de recurso especial interposto contra o acórdão que confirmou a decisão de primeira instância, afastando o direito da recorrente em ver acrescido ao valor devido na fase executiva, após o transcurso de tempo para o cumprimento voluntário, o valor devido a título de honorários advocatícios para a fase de cumprimento de sentença.

A eg. 12ª Câmara Cível do TJMG, pela via do acórdão recorrido, assim fundamentou seu entendimento:

"Isto porque, o novo procedimento, chamado cumprimento de sentença, inserto nos art. 475-I a 475-R, suprime definitivamente o processo de execução de sentença, salvo em relação às condenações por quantia certa impostas à Fazenda Pública, passando esta a ser uma etapa final do processo de conhecimento, ou seja, dispensa-se a formação de um processo autônomo de execução".

"Dessa forma, sendo a ação de execução de título judicial continuidade do processo de conhecimento, tenho que não é cabível a fixação de honorários advocatícios no caso de a mesma não ser impugnada, com ocorre no caso em discussão".

A ementa proferida no acórdão foi a seguinte:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO - FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - NOVA LEI DE EXECUÇÃO N. 11.232/05 - FIXAÇÃO DOS HONORÁRIOS NO DESPACHO INICIAL DA EXECUÇÃO - EXECUÇÃO NÃO EMBARGADA - IMPOSSIBILIDADE. - Sendo a ação de execução de título judicial continuidade do processo de conhecimento, incabível a fixação de honorários advocatícios no caso de a mesma não ser impugnada, ante a nova sistemática do processo de execução instaurado pela lei n. 11.232/05".

É contra esta decisão que se recorre.

Demonstração de cabimento do recurso especial

1) Esclarecimentos iniciais importantes

Ab initio, diante da peculiaridade da questão jurídica discutida neste inconformismo e para não se levantar qualquer dúvida sobre o cabimento do recurso extremo, mister se faz tecer alguns esclarecimentos.

Esclarecimento inicial I – não há necessidade de revolvimento do conjunto fático-probatório para exame do presente inconformismo

Deve-se ressaltar que o presente recurso, para ser examinado, não exige o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos.

O que se discute nestes autos é, apenas e tão somente, a aplicação ou não do art. 20, §4º, do CPC, diante do advento da Lei 11.232/05, bem como a melhor interpretação dos arts. 475-J, 475-R, 651 e 710, todos do CPC.

Para o conhecimento do presente recurso especial, o eg. STJ não deverá examinar o conjunto fático-probatório (o que foi feito pelo acórdão recorrido).

O que se pretende aqui não é outra coisa, senão e tão somente, levar ao conhecimento deste Colendo Tribunal Superior a incorreta aplicação que o TJMG deu aos arts. 475-J, 475-R, 651, 710 e 20, §4º, todos do CPC, por considerar inadmissível a condenação em honorários advocatícios na fase executiva ao singelo argumento de que não houve impugnação.

A controvérsia posta neste caso é típica discussão sobre questão de direito e, em nenhum momento, pretende-se reexaminar a questão fática.

Como V. Exas poderão perceber, a contrariedade ao dispositivo legal aplicável à espécie será demonstrada pela simples análise do acórdão recorrido.

Esclarecimento inicial II a relevância do julgamento a ser realizado – formação de leading case

Ab initio, já se chama a atenção para a importância deste julgamento, não apenas em relação ao interesse das partes em litígio, mas, também, para a função das decisões judiciais no sentido de uniformização de um entendimento jurisprudencial.

A questão que será objeto de discussão, acredita-se, é bastante nova, a ponto de, talvez, se tornar o primeiro precedente jurisprudencial sobre o assunto.

Até porque, discutir-se-á a interpretação das normas processuais a luz da novel legislação (Lei 11.232/05), que só entrou em vigor em 24/07/2006.

Ou seja, trata-se de matéria nova que talvez provoque desta turma julgadora o primeiro julgamento sobre o assunto aqui discutido que é a incidência ou não de honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença.

Este simples esclarecimento já demonstra a importância deste julgamento pelo STJ não só para a defesa dos interesses do recorrente como, também, para ensejar a melhor aplicação do Direito e a uniformização do pensamento jurisprudencial sobre a interpretação da norma infraconstitucional (FUNÇÃO PRIMORDIAL DO STJ).

2) Contrariedade e negativa de vigência, interpretação divergente (Art. 105, III, "a" e "c", da CF).

O acórdão recorrido ofende ao art. 475-J do CPC e nega vigência aos arts. 475-R, 20, §4º; 651 e 710, todos do CPC.

RODOLFO DE CAMARGO MANCUSO ensina:

"Contrariamos a lei quando nos distanciamos da mens legislatoris, ou da finalidade que lhe inspirou o advento; e bem assim quando a interpretamos mal e assim lhe desvirtuamos o conteúdo. Negamos-lhe vigência, porém, quando declinamos de aplicá-la, ou aplicamos outra, aberrante da fattispecie; quando nossa exegese implica admitir que é branco onde está escrito preto quando, finalmente, procedemos de forma delirante, como se não houvesse aquele texto a regular a espécie". [04]

Já tivemos a oportunidade de estudar [06]:

"O juízo de admissibilidade exercido pelo Tribunal a quo fica restrito aos requisitos procedimentais estabelecidos pelo artigo 26 da Lei 8038/90, não lhe sendo permitido adentrar no mérito, competência exclusiva das Cortes Superiores".

"No caso do recurso especial, por exemplo, não cabe ao tribunal a quo dizer se houve ou não a violação ao texto infraconstitucional, ou se as normas aplicadas à espécie eram ou não cabíveis. Este exame é de competência exclusiva do Superior Tribunal de Justiça, caso contrário, insista-se, estaremos exigindo, ao arrepio da técnica e da lógica, que o recurso seja procedente para ser admissível".

"Entender de forma diferente é permitir a invasão de competência por parte da Corte local e confundir os pressupostos de admissibilidade do recurso com seu próprio mérito, ao exigir, para sua admissão, a procedência do mérito do recurso, matéria cuja apreciação constitucionalmente está afeta à Corte Superior".

O art. 475-J trata sobre o processo sincrético dos títulos executivos judiciais que apresentam obrigação de pagar quantia certa instituindo a figura jurídica da multa de 10% mas, sem excluir a possibilidade de condenação em honorários advocatícios. O acórdão recorrido contraria ao referido dispositivo legal ao interpretá-lo em contrariedade à mens legis que inspirou a sua origem. Manter o entendimento do acórdão recorrido é desconhecer a intenção do legislador que pretendeu criar um novo modo coercitivo para forçar o cumprimento da obrigação sem que, com isso, existisse mera substituição do pagamento de honorários pela incidência da multa.

O art. 20, §4º, que tem aplicação subsidiária por força do art. 475-R do CPC, dispõe que a sucumbência no processo de execução (aqui mera fase executiva) serão devidos mesmo que inexista embargos, ao estabelecer expressamente que "nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo anterior". O acórdão recorrido, ao afastar a incidência dos honorários advocatícios, ao singelo argumento de que inexistiu impugnação, nega vigência ao conteúdo legislativo do art. 20, §4º, do CPC.

Já os arts. 651 e 710 também tiveram sua vigência negada ao desconsiderar o seu conteúdo que só autorizava o encerramento da atividade executiva com o pagamento dos honorários advocatícios. Conforme a doutrina de RODOLFO DE CAMARGO MANCUSO, supra mencionada, desconsiderar a existência de um texto legal, que poderia orientar o julgamento, é negar vigência à sua aplicação. Exatamente o que se viu no acórdão recorrido, ao decotar os honorários advocatícios.

Nesses casos, a teor do artigo 105, III, "a", da Constituição da República, o recurso especial torna-se o único instrumento posto à disposição da parte para modificar a decisão do tribunal a quo.

Razões para o pedido de reforma do acórdão recorrido

Ofensa e negativa de vigência de lei federal – cabimento do recurso especial com fundamento na alínea a, III, art. 105 da CF

É certo que o legislador, com o advento da Lei 11232/05, impôs, também à condenação por quantia certa contra devedor solvente, a regra do sincretismo processual.

Não se falará mais de processo de conhecimento e superveniente processo de execução mas, sim, de processo de conhecimento que seguirá, se for o caso, em uma fase executiva.

Todavia, e é este o ponto que se discutirá neste recurso, esse sincretismo processual não afasta o dever legal que o executado terá de pagar honorários advocatícios nesta fase, ainda que não exista impugnação.

Para demonstrar este dever e o conseqüente direito do patrono do exeqüente aos honorários advocatícios, apresenta-se pelo menos 03 argumentos, qualquer um deles suficiente, por si só, para provocar o provimento deste recurso.

1º argumento - O fato do requerimento para efetivação do cumprimento de sentença ser feito por advogado, não afasta o seu direito aos honorários de sucumbência – contrariedade à mens legis advinda da redação do art. 475-J do CPC

Não há nenhuma dúvida de que não se falará mais em processo de conhecimento e em processo de execução quando se tratar de execução de títulos executivos judiciais.

Todavia, também é induvidoso que o cumprimento de sentença, se não existir o pagamento voluntário pelo executado, prescindirá da provocação do interessado por via da elaboração de uma peça técnica.

Veja-se o texto da lei:

"Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação."

HUMBERTO THEODORO JÚNIOR [07] ensina:

"Embora não dependa a execução de instauração de uma nova ação (actio iudicati), o mandado de cumprimento da sentença condenatória, nos casos de quantia certa, não será expedido sem que o credor o requeira. É que lhe compete preparar a atividade executiva com a competente memória de cálculo, com base na qual o devedor realizará o pagamento, e o órgão executivo precederá, à falta de adimplemento, à penhora dos bens a expropriar".

Ou seja, a fase de cumprimento de sentença, nestes casos, exigirá a presença de um advogado. Então, é evidente que esta presença precisa ser remunerada à luz de tudo que já se interpretou em relação ao Código de Processo Civil.

Veja-se o próprio texto constitucional:

"Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei".

MARIO CHIAVARIO [08], sobre a importância do advogado, ensina:

"(...) a presença de sujeitos capazes de esclarecer com consciência e conhecimento de causa no emaranhado de questões que a realidade processual impõe assistência; nem sempre a pessoa diretamente interessada é suficientemente provida de conhecimento das leis e de experiência no campo processual; sem contar que uma conduta processual consciente pode encontrar obstáculo na mesma componente emocional, que frequentemente caracteriza a participação pessoal no processo". (tradução livre)

DIERLE JOSÉ COELHO NUNES [09], exímio processualista e autor de diversas obras e artigos jurídicos, já enfrentando as recentes alterações do CPC, em um de seus estudos, "Honorários de sucumbência na nova fase de cumprimento de sentença estruturada pela Lei nº 11.232/05", ensina:

"Assim, o exercício de uma defesa técnica pelos advogados consiste em garantia do cidadão exigindo desses profissionais uma atualização constante e mesmo um reforço de seu papel institucional de modo a subsidiar ao leigo uma defesa plena, que produzirá um reforço da sua própria cidadania".

"E a importância da defesa técnica subsidiada pelo advogado ganha enorme importância no contexto reformista de aumento de poderes dos juízes e de implementação de novas técnicas processuais, especialmente na fase executória".

"E, dentro dessa ótica de análise, precisa-se verificar a questão dos honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença".

As conclusões de seu exaustivo trabalho são esclarecedoras e merecem ser transcritas:

"A participação do advogado no sistema processual brasileiro não pode ser vista como uma meramente acidental em face de sua indispensabilidade constitucionalmente assegurada (art. 133, CRFB/88)".

"O exercício da atividade técnica de defesa não pode ser desvalorizada e nem mesmo suprimida sob pena de se esvaziar uma garantia que o cidadão brasileiro possui".

"A partir desse pressuposto constitucional percebe-se a necessidade de se reforçar, conjuntamente com a ênfase do papel da magistratura, o papel da advocacia".

"A postura belicosa de juízes com advogados ou vice-versa não poderia ser mais equivocada na atualidade em face da necessária interdependência de todos os sujeitos processuais no sistema de aplicação de tutela".

"Essa constatação impõe uma análise adequada da fixação dos honorários que garantem ao advogado a prática de seu múnus, especialmente embasado nos precedentes da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça".

"E, nesse aspecto, impõe-se a fixação de honorários na fase de cumprimento de sentença com ou sem o manejo pelo devedor de impugnação em face do inadimplemento do devedor."

"Tal fixação deverá ocorrer no momento em que o juizo possuir elementos objetivos para tal fixação".

"Obviamente que a remuneração do advogado deverá ser fixada de modo proporcional à atividade desenvolvida pelo procurador tanto na fase de conhecimento quanto na fase de cumprimento da sentença".

"Por outro lado, a supressão dos honorários na fase de cumprimento irá de encontro com os objetivos da reforma, especialmente com a busca da satisfação do credor em tempo razoável".

ARAKEN DE ASSIS, uma das maiores autoridades sobre execução, encerra a discussão:

"É omissa a disciplina do ‘cumprimento de sentença’ acerca do cabimento dos honorários advocatícios. No entanto, harmoniza-se com o espírito da reforma e, principalmente, com a onerosidade superveniente do processo para o condenado que não solve a dívida no prazo de espera de quinze dias – razão pela qual suportará, a titulo de pena, a multa de 10% (art. 475-J, caput) -, a fixação de honorários a favor do exeqüente, senão no ato que deferir a execução, no mínimo na oportunidade do levantamento do dinheiro penhorado ou do produto da alienação dos bens. Os honorários já contemplados no título judicial (e sequer em todos) se referem ao trabalho desenvolvido no processo de conhecimento, conforme se infere das diretrizes contempladas no art. 20, §3º, para sua fixação na sentença condenatória. E continua em vigor o art. 710: retornam as sobras do executado somente após a satisfação do principal, dos juros, da correção, das despesas processuais e dos honorários advocatícios. Do contrário, embora seja prematuro apontar o beneficiado com a reforma, já se poderia localizar o notório perdedor: o advogado do exeqüente, às voltas com difícil processo e incidentes, a exemplo da impugnação do art. 475-L, sem a devida contraprestação".

Dentro deste sistema jurídico e, principalmente, diante destas considerações, é que não se pode pensar, numa visão simplista, de que está abolida a oportunidade de recebimento do direito aos honorários advocatícios ainda que na fase de cumprimento de sentença.

Entender diferente e confirmar o teor do acórdão recorrido é, data máxima venia, contrariar a mens legis que inspirou o advento do art. 475-J do CPC e todo o sentido do processo sincrético.

2º argumento - A interpretação sistemática do Código de Processo Civil juntamente com o sentir jurisprudencial já definido para a aplicação do §4º, do art. 20, traz orientação que deve ser seguida

CARLOS MAXIMILIANO [10], sobre a interpretação sistemática, ensina:

"Consiste o Processo Sistemático em comparar o dispositivo sujeito a exegese, com outros do mesmo repositório ou de leis diversas, mas referentes ao mesmo objeto".

"Por umas normas se conhece o espírito das outras. Procura-se conciliar as palavras antecedentes com as conseqüentes, e do exame das regras em conjunto deduzir o sentido de cada uma".

O Código de Processo Civil, como regra geral de imposição de sucumbência, estabelece:

"Art. 20 (...)".

"§ 4º Nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, e nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo anterior".

Não é crível que uma norma ultrapassaria os limites do razoável para impor interpretação totalmente diferente da interpretação antes dada, apenas porque estamos, agora, diante de um processo sincrético.

O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, em 07/10/1998, quando do julgamento por sua Corte Especial do REsp 140.403/RS, já teve a oportunidade de uniformizar o seu entendimento:

"EXECUÇÃO. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. ART. 20, §4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI NO 8.952/94. 1. A nova redação do art. 20, do Código de Processo Civil deixa induvidoso cabimento de honorários de advogado em execução, mesmo não embargada. Não fazendo a lei, para esse fim, distinção entre execução fundada em titulo judicial e execução fundada em titulo extrajudicial" (STJ, REsp nº 140.403/RS, Min. Rel. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 07/10/1998, DJ. 05/04/1999).

Deste precedente jurisprudencial uniformizador e da leitura dos votos proferidos, extrai-se os seguintes ensinamentos que servirão como justificadores da tese jurídica sustentada neste recurso, a saber:

a) a manutenção da condenação em honorários serve como mais um ponto para desencorajar a inércia do devedor que deve cumprir a sua obrigação;

b) o dever ao pagamento da sucumbência sempre foi devido na justificativa do inadimplemento e na necessidade da atuação do advogado para fazer valer os direitos do exeqüente, e não no fato de existir ou não defesa por parte do executado.

3º argumento - Aplicação subsidiária do procedimento relativo aos títulos executivos extrajudiciais

Outro ponto importante deve ser enfrentado: a Lei 11232/05 também não fez, de forma expressa, qualquer restrição ao direito do advogado do exeqüente ao recebimento dos honorários.

Se não há previsão legal neste sentido, deve ser aplicada a norma do art. 475-R do CPC que determina aplicação subsidiária das normas que regem o processo de execução de título extrajudicial.

Neste particular, prevalece, então, a norma do art. 651 e 710 que, para satisfação da obrigação, exige o pagamento de honorários advocatícios. Vejamos os textos em referência:

"Art. 651. Antes de arrematados ou adjudicados os bens, pode o devedor, a todo tempo, remir a execução, pagando ou consignando a importância da dívida, mais juros, custas e honorários advocatícios".

"Art. 710. Estando o credor pago do principal, juros, custas e honorários, a importância que sobejar será restituída ao devedor".

Conclusão e pedidos

Diante do exposto,

- seja pela contrariedade ao art. 475-J do CPC;

- seja pela negativa de vigência dos arts, 475-R, 651, 710 e 20, §4º, todos do CPC e do art. 22 da Lei n. 8.906/94.

requer e aguarda que o presente recurso especial oferecido seja admitido, visto que presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de sua admissibilidade, e que, ao final, seja-lhe dado provimento para restabelecer a correta interpretação da norma, reformando o acórdão recorrido e reconhecendo o direito da recorrente à condenação de honorários advocatícios, uma vez que necessária a provocação, por advogado, do judiciário, via petição devidamente instruída, para requerimento de penhora e avaliação em honorários advocatícios a ser arbitrado diretamente por V. Exas, se assim entenderem.

Pede deferimento.

Belo Horizonte, 28 de novembro de 2006.


Notas

  1. In Hermenêutica e Aplicação do Direito. 19ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 104.
  2. In As Novas Reformas do Código de Processo Civil. Forense: Rio de Janeiro, 2006. p. 144.
  3. In Processo e garanzie della persona. Milano: Giuffrè, 1984. v. II, p. 135-136.
  4. In NUNES, Dierle José Coelho. Honorários de sucumbência na nova fase de cumprimento de sentença estruturada pela Lei nº 11.232/05 . Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1098, 4 jul. 2006. Disponível em: <jus.com.br/artigos/8593>. Acesso em: 16 ago. 2006.
  5. In Recurso Extraordinário e Recurso Especial. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991. p. 106/107.
  6. In Recurso Especial e Extraordinário – Doutrina e Prática. Belo Horizonte: Editora Mineira, 2002. p. 81/82.
  7. |In As Novas Reformas do Código de Processo Civil. Forense: Rio de Janeiro, 2006. p. 144.
  8. In Processo e garanzie della persona. Milano: Giuffrè, 1984. v. II, p. 135-136.
  9. In NUNES, Dierle José Coelho. Honorários de sucumbência na nova fase de cumprimento de sentença estruturada pela Lei nº 11.232/05 . Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1098, 4 jul. 2006. Disponível em: <>. Acesso em: 16 ago. 2006.
  10. In Hermenêutica e Aplicação do Direito. 19ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 104.

Autor

  • Bernardo Ribeiro Câmara

    Bernardo Ribeiro Câmara

    advogado em Belo Horizonte(MG), mestre em Direito Processual pela PUC Minas, especialista em Direito de Empresa pelo CAD/UGF, assessor técnico e professor da Escola Superior de Advocacia, professor universitário de graduação (Centro Universitário de Sete Lagoas, Centro Universitário Newton Paiva e Faculdade de Direito Arnaldo Janssen) e pós-graduação (PUC Minas e UNIUBE), professor do Centro de Aperfeiçoamento Jurídico (CEAJUFE), coordenador da Pós-Graduação em Direito Civil e Processual Civil do Centro Universitário de Sete Lagoas (UNIFEMM)

    é co-autor dos livros "Recurso especial e extraordinário: doutrina e prática" e "Os recursos cíveis e seu processamento nos tribunais".

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CÂMARA, Bernardo Ribeiro. Honorários advocatícios e cumprimento de sentença. O "leading case" do STJ (REsp nº 978.545-MG). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2103, 4 abr. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12565. Acesso em: 29 mar. 2024.