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A efetividade da implementação do novo mercado nas empresas que operam na BOVESPA.

Popularização do mercado de capitais em decorrência da implementação do referido segmento de negociação

A efetividade da implementação do novo mercado nas empresas que operam na BOVESPA. Popularização do mercado de capitais em decorrência da implementação do referido segmento de negociação

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Objetivo: verificar se com o advento do "Novo Mercado" houve efetiva proteção ao pequeno investidor.

RESUMO

O novo mercado foi um segmento de negociação implementado na Bolsa de Valores de São Paulo com base em estritas regras de governança corporativa.

O modelo adotado pela BOVESPA teve origem no sistema Europeu, criado nos anos 90. Em sua maioria eles eram denominados "Novos Mercados" e este segmento era especialmente destinado a conpanhias de crescimento acelerado.

Com tais regras de governança corporativa, em combinação com regras de listagem bem objetivas, pela transparência que este segmento traz, é um atrativo para o pequeno investidor, que com o perfil conservador, pode vizualizar maior segurança no investimento em ações de empresas com este diferenciado nível de listagem.

ABSTRACT

The "BOVESPA’s new market" is a kind of segment of trading implemented in stock exchange toronto based on strict rules for corporate governanance.

the model adopted by the BOVESPA originated from the European system, created in the 90s. most of them were denominated "new markets" and this segment era especially for companies for growth accelerated.

With such rules of corporate governance in combination with the listing rules and objectives, the transparency (disclosure) that this brings segment, is a magnet for the small investor, that with the profile keeps, can viewed greater safety in investment in stock of companies with the differential level of listing.

RIASSUNTO

Il nuovo mercato è un segmento di negoziazione attuata in Borsa di Sao Paulo, sulla base di norme contrattuali severe per le Il modello adottato dal BOVESPA originati dal sistema europeo, creato negli anni´´90. La maggior parte di loro sono stati denominata "nuovi mercati" E questo segmento era in particolare per le aziende per la crescita accelerata.

Con tali regole di corporate governance in combinazione con la quotazione regole e obiettivi, la trasparenza (disclosure) che porta questo segmento, è un magnete per il piccolo investitore, che con il profilo mantiene, può considerata una maggiore sicurezza degli investimenti in stock di imprese con il differenziale livello di quotazione.

Sumário: 1.Introdução. 2.O mercado de Valores Mobiliários (abordagem histórica). 3.Os princípios do Mercado de Capitais e a CVM. 4.O "novo mercado" . 5.1 Conceito e histórico no Brasil e abordagem comparada. 5.2 Critérios para listagem na BOVESPA. 5.3 CVM e o Novo Mercado. 5.Conclusão. 6.Bibliografia


1.Introdução

Uma das principais ferramentas para tanto é a adoção de uma política de divulgação de informações ampla e transparente, que está na base da boa governança corporativa e é um dos princípios que regem o mercado de capitais [01].

Segundo o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), governança corporativa é um sistema pelo qual as sociedades são dirigidas e monitoradas, envolvendo os acionistas e os cotistas, Conselho de Administração, Diretoria, Auditoria Independente e Conselho Fiscal. As boas práticas de governança corporativa têm a finalidade de aumentar o valor da sociedade, facilitar seu acesso ao capital e contribuir para a sua perenidade [02].

A preocupação da governança corporativa é criar um conjunto eficiente de mecanismos, tanto de incentivos quanto de monitoramento, a fim de assegurar que o comportamento dos executivos esteja sempre alinhado com o interesse dos acionistas [03].

O núcleo das exigências para a empresa listar-se no Novo Mercado é o total comprometimento com as boas práticas da governança corporativa aliado às formalidades especificadas no Regulamento de Listagem do Novo Mercado [04], regramento infralegal que baliza o perfil que a empresa deverá adotar.

A principal característica do Novo Mercado, em relação à legislação ordinária, é a exigência de que o capital social da companhia seja composto somente por ações ordinárias. Porém, esta não é a única. Por exemplo, a companhia aberta participante do Novo Mercado tem como obrigações adicionais [05]:

- Extensão para todos os acionistas das mesmas condições obtidas pelos controladores quando da venda do controle da companhia (tag along).

- Realização de uma oferta pública de aquisição de todas as ações em circulação, no mínimo, pelo valor econômico, nas hipóteses de fechamento do capital ou cancelamento do registro de negociação no Novo Mercado.

-Conselho de Administração com mínimo de 5 (cinco) membros e mandato unificado de até 2 (dois) anos, permitida a reeleição. No mínimo, 20% (vinte por cento) dos membros deverão ser conselheiros independentes.

- Melhoria nas informações prestadas, adicionando às Informações Trimestrais (ITRs) – documento que é enviado pelas companhias listadas à CVM e à BOVESPA, disponibilizado ao público e que contém demonstrações financeiras trimestrais – entre outras: demonstrações financeiras consolidadas e a demonstração dos fluxos de caixa.

- Melhoria nas informações relativas a cada exercício social, adicionando às Demonstrações Financeiras Padronizadas (DFPs) – documento que é enviado pelas companhias listadas à CVM e à BOVESPA, disponibilizado ao público e que contém demonstrações financeiras anuais – entre outras, a demonstração dos fluxos de caixa.

- Divulgação de demonstrações financeiras de acordo com padrões internacionais IFRS ou US GAAP.

- Melhoria nas informações prestadas, adicionando às Informações Anuais (IANs) – documento que é enviado pelas companhias listadas à CVM e à BOVESPA, disponibilizado ao público e que contém informações corporativas – entre outras: a quantidade e características dos valores mobiliários de emissão da companhia detidos pelos grupos de acionistas controladores, membros do Conselho de Administração, diretores e membros do Conselho Fiscal, bem como a evolução dessas posições.

- Realização de reuniões públicas com analistas e investidores, ao menos uma vez por ano.

- Apresentação de um calendário anual, do qual conste a programação dos eventos corporativos, tais como assembléias, divulgação de resultados etc.

- Divulgação dos termos dos contratos firmados entre a companhia e partes relacionadas.

- Divulgação, em bases mensais, das negociações de valores mobiliários e derivativos de emissão da companhia por parte dos acionistas controladores.

- Manutenção em circulação de uma parcela mínima de ações, representando 25% (vinte e cinco por cento) do capital social da companhia.

- Quando da realização de distribuições públicas de ações, adoção de mecanismos que favoreçam a dispersão do capital.

- Adesão à Câmara de Arbitragem do Mercado para resolução de conflitos societários.


2. O mercado de Valores Mobiliários (abordagem histórica)

Segundo dados estatísticos da CVM [06], antes da década de 60, os brasileiros investiam principalmente em ativos reais (imóveis), evitando aplicações em títulos públicos ou privados. A um ambiente econômico de inflação crescente - principalmente a partir do final da década de 1950 - se somava uma legislação que limitava em 12% ao ano a taxa máxima de juros, a chamada Lei da Usura, também limitando o desenvolvimento de um mercado de capitais ativo.

Essa situação começa a se modificar quando o Governo que assumiu o poder em abril de 1964 iniciou um programa de grandes reformas na economia nacional, dentre as quais figurava a reestruturação do mercado financeiro quando diversas novas leis foram editadas.

Entre aquelas que tiveram maior importância para o mercado de capitais podemos citar a Lei nº 4.537/64, que instituiu a correção monetária, através da criação das ORTN, a Lei nº 4.595/64, denominada lei da reforma bancária, que reformulou todo o sistema nacional de intermediação financeira e criou o Conselho Monetário Nacional e o Banco Central e, principalmente, a Lei nº 4.728, de 14.04.65, primeira Lei de Mercado de Capitais, que disciplinou esse mercado e estabeleceu medidas para seu desenvolvimento.

A introdução da legislação acima referida resultou em diversas modificações no mercado acionário, tais como: a reformulação da legislação sobre Bolsa de Valores, a transformação dos corretores de fundos públicos em Sociedades Corretoras, forçando a sua profissionalização, a criação dos Bancos de Investimento, a quem foi atribuída a principal tarefa de desenvolver a indústria de fundos de investimento.

Com a finalidade específica de regulamentar e fiscalizar o mercado de valores mobiliários, as Bolsa de Valores, os intermediários financeiros e as companhias de capital aberto, funções hoje exercidas pela CVM, foi criada uma diretoria no Banco Central - Diretoria de Mercado de Capitais.

Ao mesmo tempo, foram introduzidos alguns incentivos para a aplicação no mercado acionário, dentre as quais destacamos se destacam os Fundos 157, criados pelo Decreto Lei nº 157, de 10.02.1967. Estes fundos eram uma opção dada aos contribuintes de utilizar parte do imposto devido, quando da Declaração do Imposto de Renda, em aquisição de quotas de fundos de ações de companhias abertas administrados por instituições financeiras de livre escolha do aplicador.

Com o grande volume de recursos carreados para o mercado de acionário, principalmente em decorrência dos incentivos fiscais criados pelo Governo Federal, houve um rápido crescimento da demanda por ações pelos investidores, sem que houvesse aumento simultâneo de novas emissões de ações pelas empresas. Isto desencadeou o "boom" da Bolsa do Rio de Janeiro quando, entre dezembro de 1970 e julho de 1971, houve uma forte onda especulativa e as cotações das ações não pararam de subir.

Após alcançar o seu ponto máximo em julho de 1971, iniciou-se um processo de realização de lucros pelos investidores mais esclarecidos e experientes que começaram a vender suas posições. O quadro foi agravado progressivamente quando novas emissões começaram a chegar às bolsas, aumentando a oferta de ações, em um momento em que muitos investidores, assustados com a rapidez e a magnitude do movimento de baixa, procuravam vender seus títulos.

O movimento especulativo, conhecido como "boom de 1971", teve curta duração mas suas conseqüências foram vários anos de mercado deprimido, pois algumas ofertas de ações de companhias extremamente frágeis e sem qualquer compromisso com seus acionistas, ocorridas no período, geraram grandes prejuízos e mancharam de forma surpreendentemente duradoura a reputação do mercado acionário.

Apesar disso, notou-se uma recuperação das cotações, a partir de 1975, devido a novos aportes de recursos (as reservas técnicas das seguradoras, os recursos do Fundo PIS/PASEP, adicionais do Fundo 157 e a criação das Sociedades de Investimento Decreto Lei nº 1401 para captar recursos externos e aplicar no mercado de ações), além de maiores investimentos por parte dos Fundos de Pensão.

Ao longo do tempo, vários outros incentivos foram adotados visando incentivar o crescimento do mercado, tais como: a isenção fiscal dos ganhos obtidos em bolsa de valores, a possibilidade de abatimento no imposto de renda de parte dos valores aplicados na subscrição pública de ações decorrentes de aumentos de capital e programas de financiamento a juros subsidiados efetuados pelo BNDES - Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social aos subscritores de ações distribuídas publicamente.

Foi dentro desse quadro de estagnação e tentativa de recuperação do mercado acionário que, em 1976, foram introduzidas duas novas normas legais, ainda em vigor: a Lei nº 6.404/76, nova Lei das Sociedades Anônimas que visava modernizar as regras que regiam as sociedades anônimas, até então reguladas por um antigo Decreto-Lei de 1940 e a Lei nº 6.385/76, segunda Lei do Mercado de Capitais que, entre outras inovações, que criou a CVM e introduziu no mercado uma instituição governamental destinada exclusivamente a regulamentar e desenvolver o mercado de capitais, fiscalizar as Bolsa de Valores e as companhias abertas.

Não obstante todos esses incentivos, o mercado de capitais não teve o crescimento esperado, ainda que em alguns momentos tenha havido um aumento na quantidade de companhias abrindo seu capital e um volume razoável de recursos captados pelas empresas através de ofertas públicas de ações tenha ocorrido durante a década de 1980.

Apesar da experiência pioneira para atrair capitais externos para aplicação no mercado de capitais brasileiro, representada pelo Decreto-Lei nº 1.401/76, o processo de internacionalização do mercado chega ao país no final da década de 1980, sendo seu marco inicial a edição da Resolução do CMN nº 1.289/87 e seus anexos.

A partir de meados da década de 1990, com a aceleração do movimento de abertura da economia brasileira, aumenta o volume de investidores estrangeiros atuando no mercado de capitais brasileiro. Além disso, algumas empresas brasileiras começam a acessar o mercado externo através da listagem de suas ações em bolsas de valores estrangeiras, principalmente a New York Stock Exchange, sob a forma de ADR´´-s - American Depositary Reciepts com o objetivo de se capitalizar através do lançamento de valores mobiliários no exterior.

Ao listar suas ações nas bolsas americanas, as companhias abertas brasileiras foram obrigadas a seguir diversas regras impostas pela SEC - Securities and Exchange Commission, órgão regulador do mercado de capitais norte-americano, relacionadas a aspectos contábeis, de transparência e divulgação de informações, os chamados "princípios de governança corporativa".

A partir daí, as empresas brasileiras começam a ter contato com acionistas mais exigentes e sofisticados, acostumados a investir em mercados com práticas de governança corporativa mais avançadas que as aplicadas no mercado brasileiro. Ao número crescente de investidores estrangeiros soma-se uma maior participação de investidores institucionais brasileiros de grande porte e mais conscientes de seus direitos.

Com o passar do tempo, o mercado de capitais brasileiro passou a perder espaço para outros mercados devido à falta de proteção ao acionista minoritário e a incertezas em relação às aplicações financeiras. A falta de transparência na gestão e a ausência de instrumentos adequados de supervisão das companhias influenciavam a percepção de risco e, conseqüentemente, aumentavam o custo de capital das empresas.

Algumas iniciativas institucionais e governamentais foram implementadas nos últimos anos com o objetivo de revitalizar o mercado brasileiro de capitais, aperfeiçoando a sua regulamentação, e assegurando maior proteção ao investidor e a melhoria das práticas de governança das empresas brasileiras. Destacam-se entre elas a aprovação da Lei nº 10.303/01 e a criação do Novo Mercado e dos Níveis 1 e 2 de Governança Corporativa pela Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa).


3. Os princípios do Mercado de Capitais e a CVM.

A Comissão de Valores Mobiliários, como órgão regulador, tem várias atribuições, que são expressamente previstas na Lei n.º 6.385, de 07.12.1976, que criou este órgão.

Basicamente as funções da CVM são: normativa, fiscalizadora, educativa e coercitiva.

A leitura atenta da lei que criou a CVM, Lei n.º 6.385, de 07.12.1976, permite uma compreensão clara da importância de seu papel na criação de um mercado com o porte e a sofisticação do que hoje se tem no Brasil. As responsabilidades que lhe foram atribuídas, comparadas com o quadro institucional anterior à sua criação, permitem que se avalie o desafio que lhe foi proposto.

Nos termos da legislação, o exercício das atribuições da CVM tem como objetivo [07]:

1- Estimular a formação de poupança e sua aplicação em valores mobiliários;

2 - Promover a expansão e o funcionamento eficiente e regular do mercado de ações e estimular as aplicações permanentes em ações do capital social de companhias abertas sob controle de capitais privados nacionais;

3 - Assegurar o funcionamento eficiente e regular dos mercados de bolsa e de balcão;

4 - Proteger os titulares de valores mobiliários e os investidores do mercado contra: emissões irregulares de valores mobiliários e atos ilegais de administradores e acionistas das companhias abertas, ou de administradores de carteira de valores mobiliários;

5 - Evitar ou coibir modalidades de fraude ou manipulação destinada a criar condições artificiais de demanda, oferta ou preço dos valores mobiliários negociados no mercado;

6 - Assegurar o acesso do público a informações sobre os valores mobiliários negociados e as companhias que os tenham emitido;

7 - Assegurar a observância de práticas comerciais equitativas no mercado de valores mobiliários;

8 - Assegurar a observância, no mercado, das condições de utilização de crédito fixadas pelo Conselho Monetário Nacional.

Ao lado das atribuições, a Lei ofereceu à Instituição os meios materiais e institucionais necessários ao cumprimento de sua missão, notadamente: o poder normativo, através do qual a CVM regula a atuação dos diversos agentes do mercado; e o poder punitivo, através do qual, assegurado o direito de ampla defesa, permite a penalização de quem descumpre as normas baixadas pelo órgão ou de quem pratica atos fraudulentos no mercado.

As penalidades possíveis de serem aplicadas pelo Colegiado da CVM, após constatada, em inquérito administrativo, a prática de irregularidades, correspondem à advertência, multa, suspensão ou inabilitação para o exercício do cargo e suspensão ou cassação da autorização ou do registro, além da proibição temporária por prazo determinado, não só para a prática de atividades ou operações para os integrantes do sistema de distribuição, como também para atuar como investidor, direta ou indiretamente, no mercado.

A Lei n.º 9.457, de 05 de maio de 1.997, ao mesmo tempo em que ampliou o leque de penalidades possíveis de serem aplicadas pela CVM, instituiu também o Termo de Compromisso, que possibilita a suspensão do procedimento administrativo, desde que o acusado interrompa a prática do ato ilícito e indenize os prejudicados.

Foi criada, ainda, a figura da atenuante na aplicação de penalidades, quando se verificar arrependimento eficaz ou arrependimento posterior, mediante circunstância de qualquer pessoa, espontaneamente, confessar o ilícito ou prestar informações relativas à sua materialidade.

Não pode deixar de ser mencionado que a CVM tem a responsabilidade de denunciar ao Ministério Público a ocorrência de indícios de ilícito penal nos processos em que apura irregularidades no mercado. Mecanismo semelhante permite o encaminhamento do processo à Secretaria da Receita Federal quando da ocorrência de indícios de ilícito fiscal.

A lei assegura também à CVM o direito de participar de processos judiciais que envolvam matéria de interesse do mercado de valores mobiliários. Segundo a legislação, a Autarquia será sempre intimada a, em querendo, manifestar-se nesses processos, juntando parecer, ou oferecendo esclarecimentos.

A adoção pela CVM do sistema de auto-regulação para determinadas atividades no mercado de valores mobiliários objetiva aumentar a eficiência da atividade regulatória, evitando a centralização excessiva do poder de editar normas e fiscalizar seu cumprimento.

A auto-regulação está fundamentada nos seguintes pressupostos:

- A ação eficaz do órgão regulador sobre os participantes do mercado de valores mobiliários implica custos excessivamente altos quando se busca aumentar a eficiência e abrangência dessa ação.

- Uma entidade auto-reguladora, pela sua proximidade das atividades de mercado e melhor conhecimento das mesmas, dispõe de maior sensibilidade para avaliá-las e normatizá-las, podendo agir com maior presteza e a custos moderados.

- A elaboração e o estabelecimento, pela própria comunidade, das normas que disciplinam suas atividades fazem com que a aceitação dessas normas aumente e a comunidade se sinta mais responsável no seu cumprimento, diminuindo-se a necessidade de intervenção do órgão regulador.

Esses pressupostos refletem a preocupação de reduzir o porte e de tornar mais eficiente a atuação do órgão regulador, já que só poderia ter uma ação sensível, ágil e eficaz caso duplicasse inúmeras funções desempenhadas por entidades privadas existentes no mercado de valores mobiliários. Adicionalmente, o maior zelo na observância das normas, decorrente da participação em sua elaboração e da consciência da importância de sua preservação, implica menor dispêndio de recursos nas tarefas de acompanhamento e fiscalização de seu cumprimento.

Por outro lado, na delegação de poderes de normatização e fiscalização, o órgão regulador conserva competências residuais que lhe permitem evitar possíveis inconvenientes da auto-regulação, como a complacência em relação a assuntos de interesse público, a tendência à autoproteção dos regulados, a leniência na imposição de sanções e atitudes tolerantes, decorrentes do desejo de evitar publicidade adversa aos negócios.


4. O "novo mercado".

A inspiração veio dos Estados Unidos, mais precisamente da Nasdaq que, na metade da década de 90, emergia como grande rival da Bolsa de Nova York. Ações das companhias em estágio de crescimento nela listadas se valorizavam mais que as de empresas grandes, inseridas na economia tradicional. Fascinante de tão bem sucedido, o modelo parecia perfeito aos olhos das empresas européias de pequeno e médio porte que atuavam nos setores de tecnologia, internet e biotecnologia. Elas enfrentavam fortes restrições de crédito e buscavam uma outra fonte de recursos para financiar o seu crescimento. Foi assim que, a partir de 1996, começaram a pipocar pelas bolsas do Velho Continente os segmentos especialmente destinados a companhias de crescimento acelerado. Em sua maioria, eles eram chamados de "novos mercados".

Acompanhando o movimento internacional, essas iniciativas levaram a recordes nas ofertas iniciais de ações (IPOs), e seus primeiros anos foram marcados por valorizações sem precedentes. Mas a flexibilidade nas regras de listagem concedida a essas companhias e, na maior parte dos casos, a sua tenra idade acabaram por levar os investidores a aplicar grandes descontos sobre os preços dos papéis, muitos dos quais passaram a valer poucos centavos. Desencadeou-se, então, um processo de seleção natural e as poucas sobreviventes acabaram migrando para os segmentos tradicionais — o que acelerou o fim dos tais novos mercados.

Foi assim que esses outros "novos mercados" — homônimos do nosso, mas diferentes na essência, principalmente por conta das regras de listagem mais flexíveis — morreram na praia depois da euforia provocada pelas elevadas projeções de lucro que se fazia para a "nova economia". Hoje, após mais de meia década, o sucesso de uma outra iniciativa — a do Alternative Investment Market [08](AIM), da Bolsa de Londres — inspira a criação de novos segmentos diferenciados, agora reformulados como mercados de acesso, nos moldes do nosso projeto de um Bovespa Mais.

O primeiro desses novos mercados foi estabelecido na França, em 1996. Era o Nouveau Marché, com requisitos de entrada mais brandos que os do segmento tradicional da Bolsa de Paris. Naquele mesmo ano, nasceu a Easdaq, sediada em Bruxelas e aberta a empresas de tecnologia de toda a Europa. Em 1997, a novidade foi adotada na Alemanha (Neuer Markt) e na Holanda (Niewe Markt). Em 1998, diversas bolsas menores, como as de Zurique (Suíça), Copenhague (Dinamarca) e Estocolmo (Suécia), formaram uma aliança denominada Euro.nm, que as unia ao Neuer Markt e ao Nouveau Marché, numa primeira tentativa de formar uma bolsa pan-européia. Em 1999, período áureo dos novos mercados, a Itália também criou o seu, e chamou-o de Nuovo Mercato.

De acordo com estudos publicados pelas universidades de Bocconi [09], na Itália, de Manchester e Sheffield, na Inglaterra, e de Tilburg, na Holanda, entre janeiro de 1998 e março de 2000, foram registrados 430 IPOs nos novos mercados europeus, metade deles no Neuer Markt — onde as regras de governança e transparência, ao contrário do que ocorria nos outros casos, eram mais rígidas. O Nouveau Marché vinha em segundo lugar, em termos de relevância. Essas aberturas de capital levantaram mais de € 23,5 bilhões em recursos e a capitalização de mercado dessas companhias somava € 234 bilhões.

Nesse mesmo período, a valorização das ações foi de estrondosos 561%, de acordo com o índice EuroNM All-shares, que acompanhava a evolução das ações listadas nesses mercados. Foi por essa capacidade de atrair novas companhias e ampliar a representatividade dos setores da economia na bolsa de valores que o Neuer Markt foi eleito como referência pela equipe contratada pela Bovespa para reinventar o "produto ação" no Brasil, no início de 1999.

Apesar de apresentar requisitos de listagem menos severos que os do mercado tradicional — como um patamar reduzido de lucratividade nos dois exercícios anteriores ao IPO —, o Neuer Markt compensava essa flexibilidade com regras mais duras em termos de transparência — como a obrigatoriedade de publicação dos balanços de acordo com um dos principais padrões internacionais vigentes (o IFRS ou o US Gaap) —, e de governança — como a exigência de um período mínimo de seis meses em que a negociação das ações detidas por executivos e proprietários ficaria interditada (lock-up). Foi essa a principal fonte do sucesso da iniciativa alemã, que acabou repercutindo também no setor tradicional da bolsa ao estimular novas aberturas de capital.

Mas, a partir da metade do ano 2000, quando as facilidades de financiamento via emissão de ações e as histórias de jovens empreendedores que amanheciam bilionários começaram a estimular o surgimento de empresas com planos de negócios menos sólidos que os das pioneiras, os investidores deram um passo para trás e passaram a julgar de maneira mais dura toda e qualquer iniciativa da chamada nova economia. A partir daí, a queda no preço das ações chegou a mais de 80%. Muitas companhias viram seus papéis caírem a menos de € 1 e optaram por fechar o capital. Quando a esse movimento se somaram escândalos envolvendo o mau uso de informações privilegiadas (insider trading) e também a falência de algumas empresas, a imagem dos novos mercados estava arranhada para sempre.

A heterogeneidade no desempenho pós-abertura de capital das companhias listadas nos novos mercados europeus teve papel fundamental nessa virada de expectativas, em que as desvalorizações foram puxadas por um ceticismo cada vez maior quanto à sua capacidade de geração de valor futuro. A pesquisa de Laura Botazzi e Marco Da Rin [10], da Universidade de Bocconi, na Itália, revela que "as companhias listadas no Neuer Markt também foram as que mais corresponderam às expectativas dos investidores. Elas apresentaram incrementos nas vendas, nos ativos e no número de empregados duas vezes maiores do que aquelas listadas no Nouveau Marché — graças, especialmente, ao fato de os descontos sobre os preços das ações no momento da abertura de capital aplicados no Neuer Markt terem sido consideravelmente menores que os de seus concorrentes".

Essa diferença de desempenho se deu não apenas porque as companhias do novo mercado alemão captaram mais recursos no IPO — e, portanto, puderam investir mais em seu crescimento —, mas também porque a exigência de publicação de demonstrativos financeiros, de acordo com os padrões internacionais, as forçou a adotar estruturas mais sólidas de relacionamento com investidores e também a melhorar a qualidade dos controles internos e, conseqüentemente, de suas informações financeiras, aumentando o preparo para lidar com a volatilidade dos mercados

Embora homônimos do nosso Novo Mercado, os modelos Europeus partiam de um conceito diferente: tinham regras de listagem mais flexíveis

Na opinião do professor Antonio Gledson, em seu artigo científico "Can Voluntary Market Reforms Improve Corporate Governance? Evidence from Firm’s Migration to Premium Markets in Brazil" [11] que sugeriu o modelo do Neuer Markt como referência para a criação do Novo Mercado brasileiro, dois aspectos contribuíram significativamente para a sua derrocada: a regra que proibia a migração de companhias já listadas em outros segmentos da bolsa e a restrição a empresas que não fossem consideradas "de crescimento", naquele tempo altamente concentradas no setor de Tecnologia da Informação e de internet. "Quando, em meados de 2002, a bolsa alemã tentou endurecer ainda mais as regras, o estrago já estava feito. A única solução foi igualar os requisitos aos do mercado tradicional e salvar as companhias que realmente sobreviveram à turbulência, transferindo-as para a bolsa regular."

De todos os empreendimentos daquela época, o único sobrevivente é o Alternative Investments Market (AIM), da Bolsa de Londres, criado em 1995. Seu grande diferencial foi, justamente, não ter considerado que as companhias de crescimento estavam restritas aos setores de tecnologia, internet e biotecnologia. Além de incluir um grande número de companhias de mineração e fontes alternativas de energia, o AIM oferece incentivos fiscais significativos aos investidores pessoa física e, embora tenha regras de listagem muito flexíveis, pega pesado nos requisitos de governança. Até dezembro de 2006, o segmento reunia cerca de 1.580 companhias e já havia inspirado a criação de similares na Austrália (Australia Pacific Exchange) e na Irlanda (Irish Enterprise Exchange).


5. Critérios para listagem na BOVESPA:

O Novo Mercado é um segmento de listagem destinado à negociação de ações emitidas por companhias que se comprometam, voluntariamente, com a adoção de práticas de governança corporativa adicionais em relação ao que é exigido pela legislação.

Cabe destacar que tais exigências extras, são de natureza contratual e de adesão, e a relação jurídica é entre a BOVESPA e a companhia.

A valorização e a liquidez das ações são influenciadas positivamente pelo grau de segurança oferecido pelos direitos concedidos aos acionistas e pela qualidade das informações prestadas pelas companhias. Essa é a premissa básica do Novo Mercado.

A entrada de uma companhia no Novo Mercado ocorre por meio da assinatura de um contrato e implica a adesão a um conjunto de regras societárias, genericamente chamadas de "boas práticas de governança corporativa", mais exigentes do que as presentes na legislação brasileira.

Essas regras, consolidadas no Regulamento de Listagem do Novo Mercado [12], ampliam os direitos dos acionistas, melhoram a qualidade das informações usualmente prestadas pelas companhias, bem como a dispersão acionária e, ao determinar a resolução dos conflitos societários por meio de uma Câmara de Arbitragem, oferecem aos investidores a segurança de uma alternativa mais ágil e especializada.

A principal inovação do Novo Mercado, em relação à legislação, é a exigência de que o capital social da companhia seja composto somente por ações ordinárias. Porém, esta não é a única. Por exemplo, a companhia aberta participante do Novo Mercado tem como obrigações adicionais:

- Extensão para todos os acionistas das mesmas condições obtidas pelos controladores quando da venda do controle da companhia (tag along).

- Realização de uma oferta pública de aquisição de todas as ações em circulação, no mínimo, pelo valor econômico, nas hipóteses de fechamento do capital ou cancelamento do registro de negociação no Novo Mercado.

- Conselho de Administração com mínimo de 5 (cinco) membros e mandato unificado de até 2 (dois) anos, permitida a reeleição. No mínimo, 20% (vinte por cento) dos membros deverão ser conselheiros independentes.

- Melhoria nas informações prestadas, adicionando às Informações Trimestrais (ITRs) – documento que é enviado pelas companhias listadas à CVM e à BOVESPA, disponibilizado ao público e que contém demonstrações financeiras trimestrais – entre outras: demonstrações financeiras consolidadas e a demonstração dos fluxos de caixa.

- Melhoria nas informações relativas a cada exercício social, adicionando às Demonstrações Financeiras Padronizadas (DFPs) – documento que é enviado pelas companhias listadas à CVM e à BOVESPA, disponibilizado ao público e que contém demonstrações financeiras anuais – entre outras, a demonstração dos fluxos de caixa.

- Divulgação de demonstrações financeiras de acordo com padrões internacionais IFRS ou US GAAP.

- Melhoria nas informações prestadas, adicionando às Informações Anuais (IANs) – documento que é enviado pelas companhias listadas à CVM e à BOVESPA, disponibilizado ao público e que contém informações corporativas a quantidade e características dos valores mobiliários de emissão da companhia detidos pelos grupos de acionistas controladores, membros do Conselho de Administração, diretores e membros do Conselho Fiscal, bem como a evolução dessas posições.

- Realização de reuniões públicas com analistas e investidores, ao menos uma vez por ano.

- Apresentação de um calendário anual, do qual conste a programação dos eventos corporativos, tais como assembléias, divulgação de resultados etc.

- Divulgação dos termos dos contratos firmados entre a companhia e partes relacionadas.

- Divulgação, em bases mensais, das negociações de valores mobiliários e derivativos de emissão da companhia por parte dos acionistas controladores.

- Manutenção em circulação de uma parcela mínima de ações, representando 25% (vinte e cinco por cento) do capital social da companhia.

- Quando da realização de distribuições públicas de ações, adoção de mecanismos que favoreçam a dispersão do capital.

- Adesão à Câmara de Arbitragem do Mercado para resolução de conflitos societários.

5.1. A CVM E O NOVO MERCADO:

Como já delineado anteriormente, a adesão ao "Novo Mercado" é de natureza contratual e a relação jurídica é entre a BOVESPA e a companhia.

A CVM adota os fundamentos da auto-regulação para determinadas atividades no mercado de valores mobiliários, isso objetiva aumentar a eficiência da atividade regulatória, evitando a centralização excessiva do poder de editar normas e fiscalizar seu cumprimento.

A auto-regulação está fundamentada nos seguintes pressupostos [13]:

- A ação eficaz do órgão regulador sobre os participantes do mercado de valores mobiliários implica custos excessivamente altos quando se busca aumentar a eficiência e abrangência dessa ação.

- Uma entidade auto-reguladora, pela sua proximidade das atividades de mercado e melhor conhecimento das mesmas, dispõe de maior sensibilidade para avaliá-las e normatizá-las, podendo agir com maior presteza e a custos moderados.

- A elaboração e o estabelecimento, pela própria comunidade, das normas que disciplinam suas atividades fazem com que a aceitação dessas normas aumente e a comunidade se sinta mais responsável no seu cumprimento, diminuindo-se a necessidade de intervenção do órgão regulador.

Esses pressupostos refletem a preocupação de reduzir o porte e de tornar mais eficiente a atuação do órgão regulador, já que só poderia ter uma ação sensível, ágil e eficaz caso duplicasse inúmeras funções desempenhadas por entidades privadas existentes no mercado de valores mobiliários.

Adicionalmente, o maior zelo na observância das normas, decorrente da participação em sua elaboração e da consciência da importância de sua preservação, implica menor dispêndio de recursos nas tarefas de acompanhamento e fiscalização de seu cumprimento.

Por outro lado, na delegação de poderes de normatização e fiscalização, o órgão regulador conserva competências residuais que lhe permitem evitar possíveis inconvenientes da auto-regulação, como a complacência em relação a assuntos de interesse público, a tendência à autoproteção dos regulados, a leniência na imposição de sanções e atitudes tolerantes, decorrentes do desejo de evitar publicidade adversa aos negócios.


6. Conclusão:

Cabe salientar que a essência da governança corporativa está na ponderação dos poderes dos majoritários, em detrimento dos minoritários.

Quando duas ou mais pessoas se dispõem a aplicar seus esforços e capitais em um determinado empreendimento por meio de uma sociedade, o fazem com o objetivo de, após determinado tempo, se apropriar dos lucros do negócio, os quais serão repartidos entre os sócios-empreendedores.

Da mesma forma, quem investe em uma companhia aberta deseja participar dos lucros que vierem a ser obtidos. Seja subscrevendo ações em um aumento de capital, seja adquirindo-as no mercado, o investidor está buscando aplicar seus recursos em uma empresa que consiga bons resultados em suas atividades, para participar do seu rateio depois.

Por isso, a Lei das S.A. estabelece que um dos direitos essenciais de qualquer acionista de uma companhia, seja ela aberta ou fechada, é o de participar dos lucros sociais, sob a forma de dividendos (art. 109, inciso I, da Lei das S.A.).

É importante lembrar que nem todos os acionistas participam destes lucros em igualdade de condições, uma vez que certas espécies e classes de ações podem conferir aos seus titulares vantagens econômicas em relação aos titulares de outras.

Nos casos em que ficar caracterizada a alienação de controle de companhia aberta, o novo controlador tem a obrigação de realizar oferta pública para adquirir as ações pertencentes aos acionistas minoritários titulares de ações com direito a voto (art. 254-A da Lei das S.A.).

Dessa forma, a Lei das S.A. confere aos acionistas minoritários com participação no capital votante o direito ao tag along, como é usualmente conhecida no mercado a possibilidade atribuída ao minoritário de alienar suas ações ao novo controlador, por ocasião da transferência do controle de companhia aberta.

Nos termos da Instrução CVM n° 361/2002, os destinatários da oferta pública por alienação de controle são apenas os minoritários titulares de ações com direito a voto pleno e permanente. Ou seja, os titulares de ações preferenciais sem direito a voto ou com voto restrito não têm direito de exigir que o novo controlador também adquira as ações por eles detidas.

Além disso, conforme a mesma Instrução, ainda que tais acionistas tenham adquirido o direito de voto em função do não pagamento de dividendos, eles não passam a ter direito de participar da oferta pública por alienação de controle, uma vez que o direito a voto por eles adquirido não tem caráter permanente.

Nada impede, porém, e muitas companhias já vêm procedendo desta forma, que seja incluído no estatuto social um dispositivo estendendo expressamente o direito ao tag along aos titulares de ações sem direito a voto, os quais, assim, também poderiam vender as ações de sua propriedade na oferta pública por alienação de controle.

O preço a ser pago na oferta pública aos acionistas minoritários, na forma prevista na Lei das S/A deve corresponder a, no mínimo, 80% (oitenta por cento) do valor, por ação, pago aos acionistas que alienaram o bloco de controle.

No regramento do "Novo Mercado" é garantido 100% do valor, ou seja, há a extensão para todos os acionistas das mesmas condições obtidas pelos controladores quando da venda do controle da companhia.

Entretanto, questionamos se tal festejada proteção ao minoritário é realmente efetiva e se no regramento não existe lacunas que permitam uma atuação maléfica aos minoritários.

Como ilustração para a presente conclusão, ousamos exemplificar com um cases [14] que foram internacionalmente discutidos, com imensa repercussão tanto através da imprensa, quando no ambiente acadêmico.

A Lei das S.As nacional não permite que haja diferenciação de direitos de voto entre portadores de ações ordinárias. Mesmo assim, o mercado brasileiro acaba de descobrir uma maneira de criar "filhotes" para as ações ordinárias e, assim como nas Preferenciais, diferenciar os seus atributos.

As primeiras a conseguir o feito foram as gestoras de recursos GP Tarpon e Claritas. Por meio de holdings controladoras sediadas nas Bermudas, território britânico localizado próximo à península da Flórida, elas abriram o capital listando ações na Bolsa de Luxemburgo.

Livres da Lei das S.As, puderam criar ações com direito a voto — nos moldes das nossas ONs — de classes distintas. As de classe B pertencem aos controladores e conferem amplos direitos de voto, enquanto as de classe A são as únicas oferecidas ao mercado, têm direitos restritos de voto e aterrissam na Bovespa sob a forma de Brazilian Depositary Receipts (BDRs). Com isso, seus principais acionistas conseguem assegurar o controle da gestora sem a obrigação de manter uma participação representativa no capital — o que lhes permite usufruir de boa margem para alavancar recursos no mercado.

As assets [15]não foram as únicas a encontrar um caminho para concentrar os direitos de voto de seus controladores diferente daquele mais tradicionalmente utilizado no Brasil — a emissão de ações preferenciais. Em junho, a produtora de açúcar e etanol Cosan anunciou o plano de listar a empresamãe Cosan Limited, também baseada no paraíso fiscal das Bermudas, na Bolsa de Valores de Nova York (Nyse). No IPO, serão vendidos papéis do tipo ONA, que estarão representados na forma de ações para negociação na Nyse e de BDRs na bolsa paulista. Terão direito a um voto por ação. Mas a oferta contemplará também ações de classe B, que contarão com poder de voto multiplicado por dez e serão monopólio de uma família, controladora das duas companhias.

Os atuais acionistas da Cosan S.A, listada no Novo Mercado da Bovespa e detentora de ações que dão os mesmos direitos de voto para todos, serão convidados a converter seus papéis pelos da Cosan Limited.

Não há dúvidas de que a proposta apresentada pela Cosan ameaça o equilíbrio de interesses entre majoritários e minoritários reivindicado durante muitos anos no Brasil — e hoje assegurado pela companhia, que aderiu ao "Novo Mercado".

A censura é contra a discrepância entre a participação econômica e o poder de decisão.

Um dos maiores receios é de que a Cosan tenha aberto o precedente para que outras empresas, inclusive as que ainda se aprontam para um IPO, sigam a mesma rota. Em vez de obedecerem à máxima de que, nos dias atuais, para fazer um IPO, é preciso aderir ao Novo Mercado, elas podem preferir as leis de Bermudas e livrar-se tanto do segmento especial como da nossa lei societária.

Vale considerar que o paraíso fiscal tem atrativos que vão muito além da economia de impostos, como a ausência de dividendos mínimos obrigatórios. No caso da Cosan, a migração para a holding significaria, praticamente, a conversão de uma ON em PN, sendo que esta "ação preferencial" não ofereceria sequer os dividendos privilegiados que algumas companhias asseguram para os papéis desse tipo.

"Será que o Novo Mercado continuará sendo uma garantia para o investidor?"

A emissão de classes de ações com poderes distintos de voto é corriqueira em outras jurisdições. Faz parte de uma família de instrumentos societários que se convencionou chamar de Control Enhancing Mechanisms (CEMs). Esses mecanismos incluem, além dos papéis com supervoto, recursos como as estruturas piramidais de controle e as ações sem voto e com preferências — exatamente como as nossas PNs.


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Advogado e consultor jurídico militante em São Paulo, especialista em Direito Empresarial pela Escola Superior de Advocacia da OAB/SP, pós graduado com extensão em Direito Internacional das relações econômicas pela FGV/SP, aluno participante de estudos avançados de extensão universitária na London Business School (Londres - UK) com ênfase em Direito Empresarial Internacional.


Notas

  1. Mosquera, Roberto Quiroga "Os princípios informadores do Direito do Mercado Financeiro e de Capitais" in Aspectos atuais do Direito do Mercado Financeiro e de Capitais, São Paulo: Dialética, 1999, p. 263 a 270.
  2. In: http://www.ibgc.org.br/
  3. In: http://www.ibgc.org.br/
  4. In: http://www.bovespa.com.br/pdf/RegulamentoNMercado.pdf
  5. In: Regulamento de Listagem do Novo Mercado (infra)
  6. In: www.cvm.gov.br
  7. In www.cvm.gov.br
  8. In http://www.londonstockexchange.com/en-gb/products/companyservices/ourmarkets/aim_new
  9. http://www.unibocconi.it/
  10. In http://www.eco.unipmn.it/eventi/innovarepercompetere/bottazzi-darin-vcfic.pdf
  11. In http://virtualbib.fgv.br/dspace/handle/123456789/1513
  12. http://www.bovespa.com.br/pdf/RegulamentoNMercado.pdf
  13. In http://www.cvm.gov.br/indexpo.asp
  14. In http://www.bovespa.com.br/Principal.asp
  15. Conceito de Ativo Fixo e espécies Conceito empregado em contabilidade para definir dentro de uma determinada empresa, quais são os bens e direitos desta empresa que não sofrem movimentação constante. Fazem parte do patrimônio desta empresa, chamados Bens Patrimoniais. Ativo Fixo possui como sinônimo a expressão Ativo Imobilizado. Já "Ativo Permanente" possui uma conotação mais ampla, pois segundo o disposto na Lei Brasileira 11.638 de 2007, que sobrescreve a Lei Braisleira 6.404 de 1976, se divide em:Investimentos;Ativo Imobilizado;Ativo Intangível;Ativo Diferido

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  • Rodrigo Gasparini

    Rodrigo Gasparini

    Advogado e consultor jurídico militante em São Paulo, especialista em Direito Empresarial pela Escola Superior de Advocacia da OAB/SP, pós graduado com extensão em Direito Internacional das relações econômi-cas pela FGV/SP, aluno participante de estudos avançados de extensão universitária na London Business School (Londres - UK) com ênfase em Direito Empresarial Internacional.

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GASPARINI, Rodrigo. A efetividade da implementação do novo mercado nas empresas que operam na BOVESPA. Popularização do mercado de capitais em decorrência da implementação do referido segmento de negociação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2152, 23 maio 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12849. Acesso em: 29 mar. 2024.