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A possibilidade da desaposentação no Regime Geral de Previdência Social

A possibilidade da desaposentação no Regime Geral de Previdência Social

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INTRODUÇÃO

É cediço que a previdência social, direito constitucional eleito dentre os direitos sociais, vem sofrendo constantes modificações desde a sua concepção. Podemos dizer que todas estas alterações tiveram como escopo o aperfeiçoamento do sistema de seguridade social, mas também podemos afirmar que nem todas as inovações introduzidas no sistema atenderam às expectativas dos segurados e aposentados sob sua proteção. No ajuste entre o interesse social e o particular, a intenção do legislador e a expectativa do legislado, a insatisfação é algo inevitável.

As contingências sociais, objetos de proteção da previdência social, como fatos que são, reclamam uma constante readequação do sistema, exigindo que legislação, doutrina e jurisprudência se atualizem continuamente. Neste contexto, como nova possibilidade jurídica, surge a desaposentação, que embora não prevista em lei, emerge com força total no âmbito do Direito Previdenciário.

A desaposentação é defendida pela maioria dos doutrinadores, que a conceituam como a possibilidade de renúncia à aposentadoria com a conseqüente liberação do tempo de contribuição do segurado para utilização em uma nova aposentadoria, no mesmo regime ou em regime diverso de previdência. Embora a grande maioria se mostre favorável ao novo instituto, persiste acirrada discussão a respeito de determinados fatores relacionados à desaposentação que precisam ser enfrentados para sua inserção definitiva no ordenamento jurídico. Entre eles, ganham destaque a fragilização da segurança jurídica diante da relativização do ato jurídico perfeito e direito adquirido, o alcance dos efeitos da renúncia e a necessidade de devolução de valores recebidos, a manutenção do equilíbrio financeiro e atuarial do sistema.

A importância de se definir a possibilidade e efeitos da desaposentação torna-se ainda mais urgente quando se verifica que juízes e tribunais têm divergido de opinião, ora vinculando a possibilidade da desaposentação à devolução de valores, ora entendendo-a desnecessária, atentando assim contra a garantia de isonomia outorgada a todos pela Magna Carta.

Através deste trabalho, objetiva-se analisar as questões que envolvem o direito à desaposentação no Regime Geral de Previdência Social. Através do estudo dos aspectos jurídicos e fáticos diretamente relacionados ao instituto, visa-se encontrar uma solução adequada à questão, de maneira a atender às necessidades e direitos dos aposentados, sem, contudo, atribuir prejuízos à coletividade de segurados mantenedora da Previdência Social.


1.HISTÓRICO DO INSTITUTO

A desaposentação é instituto ainda precoce no cenário jurídico. Atualmente, inúmeras petições têm assolado a autarquia previdenciária INSS e o poder judiciário no intuito de fazer valer o objetivo da desaposentação, que, em suma, consiste na possibilidade de renúncia ao benefício já perfectibilizado.

Segundo refere Wladimir Novaes Martinez (2009:23/24) o marco inicial normativo federal da possibilidade da desaposentação é a lei que trata do juiz classista, Lei 6.903/81, que diz em seu artigo 9º:

Ao inativo do Tesouro Nacional ou da Previdência Social que estiver no exercício do cargo de Juiz Temporário e fizer jus à aposentadoria nos termos desta Lei, é lícito optar pelo benefício que mais lhe convier, cancelando-se aquele excluído pela opção.

Em 1987, Martinez através de artigo publicado pela LTr, versou sobre o tema "Renúncia e irreversibilidade dos benefícios previdenciários" e, segundo ele próprio refere, acredita ter sido o pioneiro a tratar do assunto, bem como ter sido o criador do neologismo "Desaposentação", logo após a publicação do mencionado artigo. (2009:24)

Este mesmo autor, em 1988 publicou o artigo intitulado "Reversibilidade da prestação previdenciária", publicado pela editora IOB in Repertório de Jurisprudência da 2ª quinzena de julho de 1988, onde defendeu a irreversibilidade do direito como uma garantia do segurado e não da instituição previdenciária. (MARTINEZ: 2009, p.24).

A questão ganhou maior relevância quando a Lei 8.870/94 revogou o inciso II do art. 81 da Lei 8213/91 que assim dispunha:

Art.81 Serão devidos pecúlios:

II – ao segurado aposentado por idade ou por tempo de serviço pelo Regime Geral de Previdência Social que voltar a exercer atividade abrangida pelo mesmo, quando dela se afastar;

Com a revogação deste inciso, o pecúlio deixou de ser devido aos segurado aposentado por idade ou tempo se serviço que voltasse a exercer atividade que o filiasse obrigatoriamente à previdência social quando dela se afastasse, significando dizer que as contribuições por ele vertidas ao sistema após a aposentação não lhe retornariam mais em benefício algum.

O pecúlio ainda foi mantido para os casos previstos nos incisos I e III do referido artigo, que previam as situações de incapacidade para o trabalho antes da complementação do período de carência e invalidez ou morte decorrente de acidente de trabalho, mas, em 1995, através das leis 9.129 e 9.032, o pecúlio foi totalmente extinto.

A mesma lei que revogou o pagamento de pecúlio nos casos de aposentados com retorno à atividade, também determinou o fim do benefício de abono de permanência em serviço, previsto no Artigo 87 e parágrafo único da Lei de Benefícios. Tal abono consistia numa renda mensal de 25% do valor total da aposentadoria a que o segurado faria jus, se este, ao invés de se aposentar aos 35 anos de serviço se homem, 30 se mulher, optasse por prosseguir na atividade.

Assim, restou claro que a obrigatoriedade da contribuição do segurado que voltasse a exercer atividade laboral após a jubilação não lhe teria retorno algum. Diante disto, a possibilidade de aproveitamento dessas contribuições passou a ser cogitada com maior vivacidade chegando-se a conclusão de que seria possível o aproveitamento do tempo de contribuição posterior à aposentadoria em um novo benefício, caso o segurado renunciasse àquele anteriormente concedid0, chegando-se então à figura da desaposentação.

Em 1996, MARTINEZ publica o artigo intitulado "Direito à Desaposentação", São Paulo: LTr, 1996, in Jornal do 9º CBPS. Em seguida, o de título "Como andam os processos de desaposentação", São Paulo: LTr, 2000, in RPS n.231/137 e "Pressupostos Lógicos da Desaposentação", São Paulo: LTr, 2005, in RPS n. 296/434.

Outros doutrinadores também declinaram sobre o tema, como Ivani Contini Bramante em "Desaposentação e Nova Aposentadoria", publicação feita na Revista de Previdência Social nº 244, março/2001, Fabio Zambitte Ibrahim em "Desaposentação", Rio: Impetus, 2005, entre outros.

Assim, a idéia sobre a possibilidade de utilização das contribuições vertidas pelo segurado após a aposentadoria foi amadurecendo. Diversos doutrinadores, estudiosos e juristas passaram a admitir a possibilidade da renúncia e conseqüente nova aposentadoria através do instituto da desaposentação. Atualmente, embora não haja previsão legal, verifica-se que a desaposentação têm sido possibilitada pela via judicial, através de decisões que demonstram entendimentos ainda não unânimes nos diferentes graus de jurisdição.


2.CONCEITO

A desaposentação consiste na possibilidade de o segurado, que verteu contribuições após a jubilação, renunciar ao seu benefício de aposentadoria obtendo com isso a liberação do tempo de contribuição já utilizado na concessão desta. Assim, uma vez liberado o período de contribuição, efetuaria-se a soma deste com as contribuições vertidas após a aposentação, constituindo-se então tempo maior de contribuição para nova jubilação mais vantajosa no mesmo regime de previdência da aposentadoria renunciada ou em regime diverso.

Neste sentido, assevera Fabio Zambitte Ibrahim, afirmando que a desaposentação

[...] traduz-se na possibilidade de o segurado renunciar à aposentadoria com o propósito de obter benefício mais vantajoso, no regime geral de previdência ou em regime próprio de previdência, mediante a utilização de seu tempo de contribuição. ( 2007:35)

Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lázari (apud MARTINEZ: 2009, p. 42) não destoam muito, definindo a desaposentação como:

[...] o direito do segurado ao retorno à atividade remunerada com o desfazimento da aposentadoria por vontade do titular, para fins de aproveitamento do tempo de filiação em contagem para uma nova aposentadoria, no mesmo ou em outro regime previdenciário

Já Wladimir Novaes Martinez, de forma mais abrangente, inclui em seu conceito questões procedimentais vinculadas à desaposentação, asseverando que:

Desaposentação é o ato administrativo formal vinculado, provocado pelo interessado no desfazimento da manutenção das mensalidades da aposentadoria, que compreende a desistência com a declaração oficial desconstitutiva. Desistência correspondendo à revisão jurídica do deferimento da aposentadoria anteriormente outorgada ao segurado. (2009:32)

Rodrigo Cardozo (apud MARTINEZ: 2009, p.43), embora se referindo mais ao servidor público, destaca que a renúncia refere-se exclusivamente às parcelas mensais advindas do benefício de aposentadoria e não ao direito em si, conceituando que a "Renúncia à aposentadoria consiste na desistência do beneficiário em perceber seus vencimentos de inatividade, sendo, portanto, apenas uma abdicação dos frutos advindos da aposentação".

Dos conceitos atribuídos ao instituto, pode se extrair que o real objetivo da desaposentação é a reutilização do tempo já computado para concessão de um benefício, em outro. O ato através do qual a liberação deste tempo torna-se possível é a renúncia. Embora alguns optem pelo termo desfazimento ou desistência, nota-se que não existe dúvida de que há a necessidade de anular a aposentadoria anterior para requerimento de nova. Alguns doutrinadores, como Martinez e Rodrigo Cardozo, destacam que a renúncia alcança apenas as mensalidades advindas do benefício e não o benefício em sí, entretanto, discordamos deste entendimento, pois, se assim fosse, na concessão do novo benefício se estaria diante de cumulação indevida, uma vez que o benefício anterior estaria apenas suspenso.


3.DA POSSIBILIDADE DA RENÚNCIA

A legislação regulamentadora do RGPS, Decreto Lei 3.048/99, ao tratar do benefício de aposentadoria dispõe, em seu Artigo 181 – B e parágrafo único, que:

Art.181-B. As aposentadorias por idade, tempo de contribuição e especial concedidas pela previdência social, na forma deste Regulamento, são irreversíveis e irrenunciáveis. (Artigo acrescentado pelo Decreto nº 3.265, de 29/11/99)

Parágrafo único. O segurado pode desistir do seu pedido de aposentadoria desde que manifeste essa intenção e requeira o arquivamento definitivo do pedido antes do recebimento do primeiro pagamento do benefício, ou de sacar o respectivo Fundo de Garantia do Tempo de Serviço ou Programa de Integração Social, ou até trinta dias da data do processamento do benefício, prevalecendo o que ocorrer primeiro. (Parágrafo único acrescentado pelo Decreto nº 4.729, de 9/06/2003)

Da interpretação do caput com o parágrafo único, entende-se que, após o recebimento do primeiro pagamento do benefício ou saque do FGTS, sem manifestação do segurado acerca da intenção de desistir do benefício, o mesmo torna-se irreversível e irrenunciável. A redação anterior deste parágrafo limitava o prazo para desistência em até 30 dias após o deferimento do benefício, passado este período não poderia mais o segurado desistir.

Corrobora esta posição do legislador a análise conjunta dos artigos 11, § 3º e Art. 18, § 2 da Lei 8213/91, que asseveram:

Art. 11, § 3º.O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social– RGPS que estiver exercendo ou que voltar a exercer atividade abrangida por este Regime é segurado obrigatório em relação a essa atividade, ficando sujeito às contribuições de que trata a Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, para fins de custeio da Seguridade Social. (Incluído pela Lei nº 9.032, de 1995)

Art. 18, § 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social– RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus à prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997

Enquanto o primeiro trata de determinar a obrigação de contribuir ao segurado aposentado que volta a exercer atividade como empregado, doméstico ou contribuinte individual, com o fim expresso de custeio da Seguridade Social, o segundo, dá ciência de que em razão dessa atividade o aposentado não terá direito a prestação alguma da Previdência Social, com exceção do salário família e da reabilitação profissional.

Portando, caso o segurado proceda ao recebimento da primeira mensalidade do benefício ou saque do FGTS estará demonstrando seu consentimento em relação ao benefício concedido, atribuindo ao ato administrativo status de ato perfeito.

Considera-se que o ato administrativo é perfeito quando vencidas as fases necessárias a sua produção. Nesse sentido, Di Pietro (2006:234) diz que "Ato perfeito é aquele que está em condições de produzir efeitos jurídicos, porque já completou todo o seu ciclo de formação". Ainda, esta mesma doutrinadora nos ensina que não se confundem perfeição e validade, a primeira diz respeito às etapas de formação do ato, exigidas por lei para que ele produza efeitos, a segunda diz respeito à conformidade do ato com a lei.

A partir deste conceito podemos concluir que o ato concessório da aposentadoria, a partir do deferimento, pode ser considerado perfeito, uma vez que a concessão é o último ato praticado pela administração para a existência da aposentadoria. Válido, pois a atividade plenamente vinculada da administração pública reveste o ato de legalidade.

A conclusão inevitável a que chegamos até aqui é a de que a aposentadoria, como ato administrativo perfeito e válido, não impugnado pelo segurado, adquire status de irreversível e irrenunciável. Esta é a interpretação lógica que vêm sendo aplicada pela autarquia INSS em sua atividade administrativa. No entanto, a maior parte da doutrina tem atacado este artigo, ora alegando que ele exorbita a abrangência da lei 8.213/91, ora defendendo que as garantias de irrenunciabilidade e irreversibilidade do ato perfeito são garantias do segurado em face da autarquia.

Gisele Lemos Kravchychyn, em artigo publicado no site Jus Navegandi, refere que um Decreto, como norma subsidiária que é não pode restringir a aquisição de um direito do aposentado, prejudicando-o, quando a lei quedou-se omissa. Segundo ela, não podem prosperar os argumentos de irrenunciabilidade e irreversibilidade da aposentadoria, que constituem garantias em favor do segurado, quando da pretensão de tolhimento do benefício pelo concessor do mesmo, não cabendo sua utilização em desfavor do aposentado, quando o mesmo optar pela desaposentação.(Desaposentação. Fundamentos jurídicos, posição dos tribunais e análise das propostas legislativas . Disponível em: http://jus.com.br/artigos/10741 >Acesso em: 25 julho 2008)

MARTINEZ, referindo-se ao conteúdo do Art. 181-B, diz que:

[...] uma ordem imperativa para os servidores da Previdência Social, reafirma a definitividade, irreversibilidade (sic) e irrenunciabilidade. Afirmações que não ofendem o fenômeno da desaposentação, porque a definitividade jamais será afetada (ela é apenas transportada), a irreversibilidade diz respeito à autarquia e não à pessoa e ninguém renuncia ao tempo de serviço ou à aposentadoria, mas à percepção de suas mensalidades.(2009:52)

De fato, a proteção constitucional do direito adquirido e da coisa julgada, garantidos pela Constituição Federal de 1988, tem o evidente propósito de resguardar direitos individuais e coletivos, mantendo-os a salvo de eventuais mudanças legislativas. Entretanto, não se pode dizer que a ordem contida no Art. 181-B do Decreto 3.048/99 diz respeito à proteção do segurado em face da autarquia, porque a interpretação do caput deste artigo deve ser feita em conjunto com o parágrafo único do mesmo artigo e assim resta claro que, excetuados os casos descritos no parágrafo único (desistência do titular em 30 dias ou antes do saque da primeira mensalidade ou FGTS), o legislador quis atribuir às aposentadorias o caráter irreversível e irrenunciável. Ademais, não haveria razão de tal disposição dirigir-se à autarquia, pois a atividade plenamente vinculada da administração de qualquer maneira impede-a de praticar qualquer ato não previsto em lei e não há hipótese legal de reversão da aposentadoria na legislação previdenciária. Quanto à irrenunciabilidade, não poderia a administração renunciar a aposentadoria, pois não detém a sua titularidade. A renúncia compete exclusivamente ao titular.

A renúncia é tida como o modus operandi da desaposentação, o meio pelo qual o segurado poderá obter a liberação do tempo de contribuição já utilizado na concessão de seu benefício. A questão controversa reside no fato de que, embora o legislador tenha querido macular a aposentadoria de irreversível e irrenunciável, o entendimento já consolidado é o de que a aposentadoria é direito patrimonial e, portanto, disponível, não podendo o seu exercício ser restringido pela administração pública.

Como referiu Martinez, "A rigor, todos os direitos são renunciáveis, o limite maior de sua abdicação é o interesse público e a possibilidade de afetação de terceiros" (2009: 47).

No Superior Tribunal de Justiça, o entendimento da aposentadoria como direito disponível já está sedimentado, como se pode abstrair da seguinte decisão:

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RENÚNCIA A BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. POSSIBILIDADE. DIREITO PATRIMONIAL DISPONÍVEL. ABDICAÇÃO DE APOSENTADORIA POR IDADE RURAL PARA CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR IDADE URBANA.

1. Tratando-se de direito patrimonial disponível, é cabível a renúncia aos benefícios previdenciários. Precedentes.

2. Faz jus o Autor à renúncia da aposentadoria que atualmente percebe – aposentadoria por idade, na qualidade de rurícola – para o recebimento de outra mais vantajosa – aposentadoria por idade, de natureza urbana.

3. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 310.884/RS, Quinta Turma, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJ de 26/9/05)

Reafirmando o posicionamento do STJ acerca da possibilidade de renúncia à aposentadoria, o Ministro do STJ Paulo Gallotti, em decisão proferida no Recurso Especial nº 557231-RS, assevera:

É firme a compreensão desta Corte de que a aposentadoria, direito patrimonial disponível, pode ser objeto de renúncia, revelando-se possível, nesses casos, a contagem do respectivo tempo de serviço para obtenção de nova aposentadoria, ainda que por outro regime de previdência.

Pode-se concluir, portanto, que o legislador, ao inserir as restrições no Art. 181-B do Decreto 3048/99 ao direito de renúncia e reversão da aposentadoria, interveio, de maneira equivocada, na órbita dos direitos disponíveis do segurado. Tal direito, considerado patrimonial e, portanto, disponível, não pode sofrer limitações impostas pela administração pública, tendo como limite maior de sua abdicação tão somente o interesse público e a possibilidade de afetação de terceiros, como bem disse Martinez. (2009:47)


4.ESPÉCIES DE DESAPOSENTAÇÃO

O pedido de renúncia à aposentadoria pode ter objetivos distintos. Há a hipótese do aposentado pelo RGPS que deseja renunciar ao benefício para obter novo júbilo no mesmo regime. Há o caso daquele aposentado pelo RGPS que verteu contribuições para RPPS e, portanto, pretende aposentar-se neste regime. Mas também há de se cogitar a hipótese do aposentado que simplesmente deseja mudar seu status de aposentado para ativo.

Em cada uma das hipóteses de desaposentação a análise deve ser individualizada, como faremos a seguir.

4.1.NO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL PARA APROVEITAMENTO DO TEMPO NO MESMO REGIME

É o caso do aposentado pelo regime geral de previdência que continuou a exercer atividade remunerada abrangida pelo regime. Neste caso, embora aposentado, o exercício de atividade abarcada pelo regime torna-o contribuinte obrigatório, conforme artigo 11, § 3º da Lei 8.213/91.

O rol dos segurados considerados obrigatórios pelo RGPS encontra-se no Artigo 11 da Lei 8.213/91 e no Decreto 3048/99 no Artigo 9º.

4.2. NO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL PARA APROVEITAMENTO DO TEMPO EM REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA

A lei nº 9.796/99 dispõe sobre a compensação financeira entre o Regime Geral de Previdência Social e os regimes de previdência dos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, nos casos de contagem recíproca de tempo de contribuição para efeito de aposentadoria e dá outras providências.

Nesta espécie de desaposentação o segurado deseja renunciar à sua aposentadoria junto ao RGPS para obter certidão recíproca de tempo de contribuição e averbá-la em RPPS a que está vinculado.

4.3.POR VONTADE NÃO JUSTIFICADA DO TITULAR

Existe a possibilidade de o aposentado desejar renunciar a sua aposentadoria por motivos pessoais, que talvez não queira revelar. Como direito patrimonial, portanto, disponível, em princípio, não haveria motivo relevante para exigir-se do segurado uma motivação, uma vez que a renúncia é ato unilateral do titular do direito.

Nesta esteira podemos imaginar o cidadão que simplesmente deseja transmutar-se do status de aposentado para ativo, ou daquele que deseja retornar ao serviço ativo em cargo público inacumulável. Fabio Zambitte Ibrahin (2007:73), a respeito, aduz:

[...] é perfeitamente possível a extensão da desaposentação para outras hipóteses, em especial o servidor que deseja retornar ao serviço ativo em cargo público não compatível com aquele em que se jubilou.

Não se pode obrigar o segurado a permanecer aposentado, a administração carece de interesse. A insistência na manutenção de um benefício contrariamente a vontade do titular consiste em restrição indevida a direito patrimonial disponível.


5.EFEITOS DA RENÚNCIA E A MANUTENÇÃO DO EQUILIBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL

Admitida a possibilidade da renúncia à aposentadoria, surge a questão da necessidade ou não da devolução dos valores recebidos a título de renda mensal durante o período de vigência do benefício que se pretende renunciar. Este fator inerente ao direito de renúncia alcança o interesse de toda a sociedade, pois como dispõe o Artigo 195 da CRFB/88, a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta.

Cabe estabelecer qual o alcance dos efeitos da renúncia, se ex tunc, haverá a obrigação de devolução dos valores recebidos pelo beneficiário durante todo o período em que esteve aposentado, se ex nunc,deixará de haver esta obrigação.

A questão é complexa, pois não se restringe exclusivamente ao direito patrimonial disponível do beneficiário, mas atinge todo o sistema financeiro e atuarial da previdência social, o qual, por expressa disposição legal, deve ser conservado.

Diz o Artigo 201 da CRFB "A previdência Social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial [...]". Segundo nos explica Fabio Zambitte Ibrahim (2007: 8), o equilíbrio atuarial "demanda o balanceamento de massa, isto é, a correlação adequada entre contribuições, massa de trabalhadores e requisitos de elegibilidade de benefícios". Melhor elucidando, Martinez (apud FABIO ZAMBITTE IBRAHIN, 2007, p.23) explica que o equilíbrio atuarial compreende as ideais matemáticas - como taxa de contribuição, experiência de risco, expectativa média de vida, tábuas biométricas, margem de erro, etc.- e as relações biométricas que, de igual modo, possibilitam estimar as obrigações pecuniárias em face do comportamento da massa e o nível da contribuição e do benefício.

Significa dizer então, que o valor das contribuições, o período de carência e tempo de contribuição exigido para a concessão dos benefícios foram estipulados com base em uma análise atuarial. Assim, para a concessão da aposentadoria integral, por exemplo, exigiu-se tempo de contribuição suficiente para possibilitar à autarquia garantir ao segurado uma renda mensal de 100% do seu salário de benefício durante sua vida, estimada com base na tabela de mortalidade do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). De igual modo calculou-se que, no caso da aposentadoria proporcional, exigindo-se tempo de contribuição menor a renda mensal do benefício também teria de ser menor, 70% pelas regras atuais.

Por meio destas análises é que aos administradores do regime previdenciário é possível a adoção de medidas eficazes para correção de desvios, preservando a segurança, confiabilidade e liquidez do sistema e assim evitando sua falência.

O RGPS adotou como forma de funcionamento financeiro o de repartição simples e não o de capitalização. Explica Feijó Coimbra (apud MARINA VASQUES DUARTE: 2008, p.35) que o sistema de capitalização inspira-se em técnicas de seguro e poupança onde o esforço de cada indivíduo e cada geração conflui para a realização de fundos, que administrados de maneira correta, permitiriam a entrega das prestações no devido tempo. Já pelo sistema de repartição, o volume das quantias arrecadadas em cada período servirá para o custeio das prestações que devidas forem no mesmo período. Como observa Duarte (2008, p.35), a prevalência do sistema de repartição no atual sistema brasileiro decorre da adoção do princípio da solidariedade insculpido no art. 195, inciso II da CRFB. Portanto, o trabalhador não financia a sua previdência, mas a seguridade social como um todo.

A importância de se analisar o sistema financeiro do RGPS reside no fato de que alguns autores têm defendido que, em razão de o sistema ser o de repartição, não haveria necessidade de devolução dos valores recebidos para a efetivação da desaposentação.

Sobre o tema, Ibrahin (2007:60/61) assevera que, para o adequado deslinde da questão, convém atentar para as duas espécies de desaposentação, isto é, aquela feita no mesmo regime previdenciário em razão da continuidade laborativa e outra resultante do intento de averbação de tempo de contribuição em outro regime previdenciário. No primeiro caso, diz Ibrahin:

[...] não há que se falar em restituição de valores percebidos, pois o benefício de aposentadoria, quando originariamente concedido, foi feito com o intuito de permanecer durante o restante da vida do segurado. Se este deixa de receber as prestações vindouras, estaria, em verdade, favorecendo o regime previdenciário.

A desaposentação não se confunde com a anulação do ato concessivo do benefício, por isso, não há que se falar em efeito retroativo do mesmo, cabendo tão-somente sua eficácia ex nunc. A exigência de restituição de valores recebidos dentro do mesmo regime previdenciário implica em obrigação desarrazoada, pois se assemelha ao tratamento dado em caso de ilegalidade na obtenção da prestação previdenciária.

E segue, dizendo que "A desaposentação em mesmo regime previdenciário é, em verdade, um mero recálculo do valor da prestação em razão das novas cotizações do segurado".

No caso da desaposentação para obtenção de certidão para averbação e regime diverso, diz Ibrahin (2007:62) que:

[...] sendo o regime financeiro adotado o de repartição simples, como nos regimes previdenciários públicos em nosso país, não se justifica tal desconto, pois o benefício não tem sequer relação direta com a cotização individual, já que o custeio é realizado dentro do sistema de pacto intergeracional, com a população atualmente ativa sustentando os benefícios dos hoje inativos.

Com a devida vênia, nos filiamos à corrente de entendimento contrária a posição de Ibrahin, pois, ainda que, como mencionado pelo autor, não haja relação direta entre o benefício auferido e a cotização individual, é óbvio que o sistema terá prejuízo em ter de repassar para o regime instituidor valores contribuídos pelo segurado, pois, durante todo o período em esteve jubilado, percebeu mensalidades. Admitindo esta hipótese de repasse ao regime instituidor sem devolução de quantias, quem então financiou a aposentadoria deste segurado?

Compartilham deste entendimento Marina Vasques Duarte, Roberto Luis Luchi Demo, André Santos Novaes e Wladimir Novaes Martinez.

Diferente raciocínio deve ser feito no caso da desaposentação e nova aposentação dentro do mesmo regime, pois neste caso, entendemos viável o processo sem a restituição de quantias. Entretanto, há que se considerar, além da existência ou não de prejuízo ao sistema, também a justeza e garantia de isonomia da operação, pois no caso de uma renúncia à aposentadoria proporcional para obtenção de uma integral, o segurado leva vantagens sobre aquele que não se aposentou proporcionalmente e seguiu contribuindo para atingir o direito à integralidade, uma vez que aquele percebeu benefício durante o período em que contribuiu para alcançar o tempo necessário a aposentadoria integral, e este não.

Em cada caso, há que se fazer uma análise exclusiva. A questão é complexa e merece tratamento em tópico específico, como será feito a seguir.


6. NECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO DO RECEBIDO

Embora grande parte dos doutrinadores e juristas se manifeste a favor da desaposentação, quando se trata de fixar entendimento sobre a necessidade de devolução ou não dos valores recebidos há extrema disparidade.

Como Fabio Zambitte Ibrahin, cujo posicionamento já foi mencionado, muitos outros se manifestam contrários a devolução de valores, fundamentando suas decisões no sistema financeiro de repartição simples adotado pelo RGPS e no caráter alimentar das mensalidades da aposentadoria, principalmente. Outros são favoráveis à devolução por entenderem que existe a necessidade de restituição do status quo ante. E assim, segue-se a discussão no intuito de definir posição que atenda ao direito individual do aposentado, mas também não prejudique o direito dos terceiros mantenedores do sistema de seguro social.

Verifica-se que a análise deve ser feita especificamente em cada espécie de desaposentação, pois que a finalidade de cada uma é que vai determinar a necessidade ou não de restituição dos valores recebidos.

6.1.DENTRO DO MESMO REGIME

A maior parte da doutrina tem se manifestado contrária a devolução dos valores recebidos quando a desaposentação visa a uma nova aposentação dentro do mesmo regime. Entretanto, há que se considerar que existem diferenças quando o segurado pretende renunciar a uma aposentadoria integral para que seja acrescido tempo de contribuição posterior em uma nova jubilação ou quando o benefício a ser renunciado é uma aposentadoria proporcional para a obtenção de uma integral.

6.1.1.NA APOSENTADORIA INTEGRAL

A obrigatoriedade de contribuição do segurado que, após aposentado, volta a exercer atividade abrangida pelo RGPS fez surgir a idéia de incorporação destas contribuições para a melhoria da renda mensal em uma nova aposentadoria. Assim, em razão da fórmula utilizada para cálculo da renda mensal das aposentadorias, quanto mais tempo de contribuição e idade o segurado tiver, menor é o fator previdenciário incidente sobre seu salário de benefício. Igualmente, como o cálculo do salário de benefício é feito com base na média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo (Artigo 29, I da Lei 8213/91), quanto maior a quantidade de maiores salários o segurado tiver, maior será a média. Por esta razão, torna-se interessante e vantajoso ao segurado desaposentar-se para incorporar maior tempo de contribuição ao tempo já considerado na concessão de sua aposentadoria.

Como citado anteriormente, Fabio Zambitte Ibrahim considera desnecessária a devolução dos valores, pois segundo ele, sendo o regime financeiro adotado o de repartição simples, não se justifica tal desconto, pois o benefício não tem sequer relação direta com a cotização individual. Diz ainda que a desaposentação em mesmo regime previdenciário é, em verdade, mero recálculo do valor da prestação em razão das novas cotizações do segurado.

Também entende desnecessária a devolução dos valores recebidos Carlos Alberto Pereira de Castro (2003:490), segundo refere, "[...] não há a necessidade de devolução dessas parcelas, pois, não havendo irregularidade na concessão do benefício recebido, não há o que ser restituído".

Como observa Martinez (2009:111)

Não são poucos os estudiosos que entendem não haver o ônus da restituição do recebido; muitos deles pensam no fato de que esse período de percepção do benefício em manutenção será compensado com a menor expectativa de vida do segurado (registro a ser considerado pelo regime instituidor).

Partilhando desta corrente de entendimento pela não devolução de valores tem se mostrado o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, como se pode depreender de trecho do relatório proferido pelo Ministro Paulo Galotti na apreciação do Recurso Especial 557.231-RS (Documento 1002410-EMENTA/ACÓRDÃO – Site certificado – DJ 16/06/2008):

O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o ato de renunciar ao benefício tem efeitos ex nunc e não envolve a obrigação de devolução das parcelas recebidas, pois, enquanto aposentado, o segurado fez jus aos proventos.

Divergindo, Marina Vasques Duarte (apud MARTINEZ: 2009, p.112) defende a restituição do que foi recebido da Previdência Social como meio de não lhe causar prejuízo.

Compartilha de posicionamento semelhante, Roberto Luis Luchi Demo, ao considerar que:

Se o beneficiário não indenizar "algo" ao sistema previdenciário, para fins de nova contagem do tempo de contribuição já utilizado, a equação previdenciária não fecha: a retribuição será maior que a contribuição, arrostado a relação custo-benefício sob a perspectiva do equilíbrio atuarial. (2003, p.24).

Na esteira deste pensamento, vem a propósito, o ensinamento de André Santos Novaes (2003, p.8), considerando que a desaposentação exige necessariamente a devolução dos valores recebidos da Previdência Social, sob pena de se configurar enriquecimento ilícito e prejuízo para o sistema previdenciário.

O Tribunal Regional Federal da quarta região tem entendido que se faz necessária a devolução dos valores recebidos quando a nova aposentadoria se operar no mesmo regime da aposentadoria renunciada. O que fundamenta seu posicionamento é a disposição do Art. 18, § 2º da Lei de Benefícios que expressamente dispõe que o aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social – RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado. Vejamos recente decisão proferida:

PREVIDENCIÁRIO. REAPOSENTAÇÃO. INVIABILIDADE. ART. 18, § 2º, DA LEI Nº 8.213/91.

1. Conquanto seja possível, consoante o entendimento jurisprudencial corrente, a renúncia à aposentadoria deferida pelo INSS (por se tratar de direito patrimonial, logo disponível), não é dado ao segurado agregar tempo posterior ao jubilamento para obter novo benefício no mesmo regime em bases mais favoráveis.

2. De acordo a sistemática vigente, o segurado aposentado que continuar a exercer atividade vinculada ao Regime Geral de Previdência Social deve recolher as contribuições previdenciárias correspondentes, fazendo jus apenas ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado, nos termos do art. 18, § 2º, da Lei nº 8.213/91.

3. Deferida a aposentadoria, resta configurado ato jurídico perfeito, de modo que não se pode pretender o desfazimento unilateral para nova fruição no mesmo regime.

4. Inviável, pois, a pretensão da parte autora visando, em data muito posterior ao início de sua aposentadoria por invalidez, quando somente então estariam preenchidos os requisitos exigidos para a aposentadoria por idade, o cancelamento daquele benefício em curso e o deferimento deste, mais vantajoso. (APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO,Processo: 2008.71.04.001727-0/RS, TURMA SUPLEMENTAR, Relator GUILHERME PINHO MACHADO, D.E. 27/07/2009)

De posição mais tênue, Wladimir Novaes Martinez (2009:112) entende que há a necessidade de restabelecimento do status quo ante, mas que o montante a ser restituído pelo desaposentante deve limitar-se ao necessário para manutenção equilíbrio financeiro e atuarial.

A questão da legalidade do ato, manifestada por Carlos Alberto Pereira de Castro não serve como motivo para justificar a não devolução dos valores, pois, em tese, todos os benefícios concedidos pela previdência são legais e válidos face à atividade plenamente vinculada da administração pública.

Neste caso, em que tanto a desaposentação quanto a nova aposentadoria dão-se no mesmo regime, nos parece que não haveria prejuízo em a instituição previdenciária admitir tal procedimento sem a necessidade de restituição dos proventos. Em verdade, o segurado verteu novas contribuições para o regime e não haveria prejuízo em estes valores passarem a integrar o período base de cálculo do benefício. Entretanto, do ponto de vista legal, a vedação expressa do Art. 18, § 2º da Lei de Benefícios parece não deixar dúvidas quanto à intenção do legislador de que as contribuições do aposentado não reverteriam em seu próprio benefício, exceto na forma de salário família e reabilitação profissional. Assim, enquanto não houver a supressão desta vedação legal entendemos que a renúncia deve operar-se com efeito ex tunc .

6.1.2. NA APOSENTADORIA PROPORCIONAL

Diferente situação é do segurado que aposentado na forma proporcional, deseja renunciar ao benefício para obtenção de aposentadoria integral.

Neste caso, o segurado valeu-se da possibilidade de aposentadoria antecipada para já ir percebendo o benefício enquanto vertia contribuições para atingir o tempo mínimo para aposentadoria integral.

Como bem observa Roberto Luis Luchi Demo (apud MARTINEZ: 2009, p.109), não seria justo que um segurado recebesse aposentadoria proporcional por cinco anos e ela se transformasse na integral sem nada devolver e outro segurado tivesse pagado por 35 anos.

Neste caso, entendemos justo que o segurado restitua ao sistema o total recebido nos cinco anos em que esteve aposentado proporcionalmente, de modo a igualar-se àquele segurado que não optou pela proporcional e contribuiu cinco anos a mais para aposentar-se na forma integral.

6.2.PARA OBTENÇÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO

Há a situação do segurado que deseja se desaposentar para obter Certidão Recíproca de Tempo de Contribuição (CTC) com o fim de averbá-la em regime diverso do de origem. Neste caso, diverge a doutrina, parte defendendo a não devolução dos proventos, parte manifestando-se a favor da devolução total, e ainda outros defendendo a devolução parcial ou do necessário.

Neste caso, deve-se atentar para o fato de que, fornecendo certidão recíproca de tempo de contribuição ao segurado, o RGPS terá de compensar financeiramente o RPPS em que o segurado será aposentado, conforme determina a Lei de Compensação, nº 9796/99 que assim determina:

Art. 4º Cada regime próprio de previdência de servidor público tem direito, como regime instituidor, de receber do Regime Geral de Previdência Social, enquanto regime de origem, compensação financeira, observado o disposto neste artigo.

§ 1º O regime instituidor deve apresentar ao Regime Geral de Previdência Social, além das normas que o regem, os seguintes dados referentes a cada benefício concedido com cômputo de tempo de contribuição no âmbito do Regime Geral de Previdência Social:

I - identificação do servidor público e, se for o caso, de seu dependente;

II - o valor dos proventos da aposentadoria ou pensão dela decorrente e a data de início do benefício;

III - o tempo de serviço total do servidor e o correspondente ao tempo de contribuição ao Regime Geral de Previdência Social.

§ 2º Com base nas informações referidas no parágrafo anterior, o Regime Geral de Previdência Social calculará qual seria a renda mensal inicial daquele benefício segundo as normas do Regime Geral de Previdência Social.

§ 3º A compensação financeira devida pelo Regime Geral de Previdência Social, relativa ao primeiro mês de competência do benefício, será calculada com base no valor do benefício pago pelo regime instituidor ou na renda mensal do benefício calculada na forma do parágrafo anterior, o que for menor.

§ 4º O valor da compensação financeira mencionada no parágrafo anterior corresponde à multiplicação do montante ali especificado pelo percentual correspondente ao tempo de contribuição ao Regime Geral de Previdência Social no tempo de serviço total do servidor público.

§ 5º O valor da compensação financeira devida pelo Regime Geral de Previdência Social será reajustado nas mesmas datas e pelos mesmos índices de reajustamento dos benefícios da Previdência Social, mesmo que tenha prevalecido, no primeiro mês, o valor do benefício pago pelo regime instituidor.

Assim, a base de cálculo da compensação, segundo o parágrafo 3º do artigo 4º da Lei 9796/99, será o valor do benefício pago pelo regime instituidor ou a renda mensal do benefício segundo as regras da Previdência Social, o que for menor. Após apurado o valor base, a compensação equivalerá à multiplicação desse valor pelo percentual que o tempo de contribuição ao regime geral representa no tempo de serviço total do servidor público.

Esta é a sistemática considerada para obtenção do valor a ser transferido pelo RGPS ao RPPS, de maneira que não haja prejuízo nem ao regime de origem, nem ao regime instituidor. É o montante transferido ao RPPS somado ao total de contribuições vertidas para este regime que possibilitará o pagamento do benefício ao segurado.

Não é difícil vislumbrar o prejuízo que o não ressarcimento de valores acarretará ao RGPS, caso este forneça ao segurado a certidão almejada. Vejamos o seguinte exemplo: determinado segurado obteve benefício de aposentadoria no RGPS, que calculou o valor de sua renda mensal a partir da média de suas contribuições, tempo de contribuição vertido e expectativa de sobrevida. Este segurado, logo após aposentar-se, foi aprovado em concurso público estadual e passou a exercer as atribuições do cargo público. Ficou no cargo por 15 anos, concomitantemente usufruindo de sua aposentadoria junto ao RGPS. Com os 15 anos de atividade no setor público, surge a possibilidade de aposentar-se no RPPS, no entanto, para atingir o tempo mínimo necessário, precisa utilizar-se do tempo laborado com vinculação ao RGPS. Dirige-se ao INSS e requer a renúncia de sua aposentadoria e a expedição de Certidão de Tempo de Contribuição para que possa utilizá-la no RPPS. A utilização da certidão emitida pelo RGPS no RPPS gera a obrigação da compensação previdenciária, em que o regime de origem terá de repassar ao regime instituidor os valores que o segurado verteu para o RGPS, de acordo com o cálculo mencionado no §4º, Art. 4º da Lei 9796/99.

Grosso modo, significa dizer que, as contribuições que o segurado verteu para o RGPS serão repassadas ao regime instituidor. Então pergunta- se: os 15 anos de aposentadoria que o segurado percebeu do RGPS serão custeados por quem?

Embora Fabio Zambitte Ibrahim (2007:62) tenha razão ao afirmar que no sistema de repartição simples não há relação direta com a cotização individual, sendo o custeio com a população atualmente ativa sustentando os benefícios dos hoje inativos, não se pode ignorar o fato de que será também a população ativa que terá de custear os valores a serem compensados ao sistema instituidor. E, embora não haja relação direta entre o benefício pago e a cotização individual, por obvio, há uma correspectividade entre as contribuições do segurado e a transferência de valores através da aposentadoria, assim não fosse, não haveria razão de existir o fator previdenciário. Ao transferir as reservas acumuladas pelo segurado para outro regime, sem manter quantia que corresponda ao período já transferido através da aposentadoria, logicamente haverá prejuízo ao sistema e a conta terá de ser paga pela sociedade.

Na doutrina, podemos citar Marina Vasques Duarte como defensora da restituição integral do recebido e Wladimir Novaes Martinez como defensor da devolução do necessário à manutenção do equilíbrio financeiro e atuarial.

Embora as razões até então expostas tenham o condão de fundamentar a necessidade de devolução dos valores para a emissão de CTC de modo a conservar o equilíbrio financeiro e atuarial do RGPS, verifica-se que o posicionamento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região têm sido contrário à necessidade de devolução, vejamos alguns julgados:

PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA. RENÚNCIA. EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PARA APROVEITAMENTE EM REGIME PREVIDENCIÁRIO DIVERSO. CONTAGEM RECÍPROCA. DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS RECEBIDAS.

1. Segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, a aposentadoria é direito patrimonial disponível, sendo, em tese, possível a renúncia.

2. A renúncia da aposentadoria não atinge o tempo de contribuição, de modo que viável seu aproveitamento em outro regime previdenciário.

3. No caso de renúncia da aposentadoria junto ao RGPS para aproveitamento no regime estatutário não há necessidade de devolução dos valores recebidos (AR 200204010280671. Rel. p/ acórdão Des. Nylson Paim de Abreu. 3ª Seção do TRF4, DE 27-10-2008)

"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. RENÚNCIA. EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO. CONTAGEM RECÍPROCA. DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS RECEBIDAS.

1. Segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, a aposentadoria é direito patrimonial disponível, sendo possível a renúncia.

2. A renúncia da aposentadoria não atinge o tempo de contribuição, de modo que viável seu aproveitamento em outro regime previdenciário.

3. No caso de renúncia da aposentadoria junto ao RGPS para aproveitamento no regime estatutário não há necessidade de devolução dos valores recebidos. AR 200204010280671. Rel. p/ acórdão Des. Nylson Paim de Abreu. 3ª Seção do TRF4, DE 25-07-2008. (AC n.º 2003.72.05.00.70.22-4/SC, TRF/4ª Região, Turma Suplementar, Relator Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. de 09-03-2007)

Este posicionamento tem como precedente o entendimento que vem sendo adotado no Superior Tribunal de Justiça, vejamos:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA NO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL.DIREITO DE RENÚNCIA. CABIMENTO. POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DECERTIDÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO PARA NOVA APOSENTADORIA EM REGIMEDIVERSO. NÃO- RIGATORIEDADE DE DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS.EFEITOS EX TUNC DA RENÚNCIA À APOSENTADORIA. JURISPRUDÊNCIA DO STJ.AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.

1. A renúncia à aposentadoria é perfeitamente possível, por ser ela um direito patrimonial disponível. Sendo assim, se o segurado pode renunciar à aposentadoria, no caso de ser indevida a acumulação, inexiste fundamento jurídico para o indeferimento da renúncia quando ela constituir uma própria liberalidade do aposentado. Nesta hipótese, revela-se cabível a contagem do respectivo tempo de serviço para a obtenção de nova aposentadoria, ainda que por outro regime de previdência. Caso contrário, o tempo trabalhado não seria computado em nenhum dos regimes, o que constituiria uma flagrante injustiça aos direitos do trabalhador.

2. O ato de renunciar ao benefício, conforme também já decidido por esta Corte, tem efeitos ex tunc e não implica a obrigação de devolução das parcelas recebidas, pois, enquanto esteve aposentado, o segurado fez jus aos seus proventos. Inexistindo a aludida inativação onerosa aos cofres públicos e estando a decisão monocrática devidamente fundamentada na jurisprudência desta Corte, o improvimento do recurso é de rigor.

3. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 328101 / SC AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL, Relator (a) Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, DJe 20/10/2008 RT vol. 879 p. 206)

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. RECURSO CONTRÁRIO À JURISPRUDÊNCIA DO STJ. POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO PELO RELATOR EX VI DO ARTIGO 557, CAPUT, CPC. PREVIDENCIÁRIO. RENÚNCIA À APOSENTADORIA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. DESNECESSIDADE. DECISÃO MANTIDA.

1. A teor do disposto no artigo 557, caput, do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei nº 9.756/1998, poderá o relator, monocraticamente, negar seguimento ao recurso na hipótese em que este for manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou contrário à jurisprudência dominante no respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior.

2. No caso concreto, o provimento atacado foi proferido em sintonia com o entendimento de ambas as Turmas componentes da Terceira Seção, segundo o qual, a renúncia à aposentadoria, para fins de aproveitamento do tempo de contribuição e concessão de novo benefício, seja no mesmo regime ou em regime diverso, não importa em devolução dos valores percebidos, "pois enquanto perdurou a aposentadoria pelo regime geral, os pagamentos, de natureza alimentar, eram indiscutivelmente devidos" (REsp 692.628/DF, Sexta Turma, Relator o Ministro Nilson Naves, DJU de 5.9.2005).

3. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 926120 / RS, Relator (a) Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA,DJe 08/09/2008)

Este posicionamento sedimentado no Superior Tribunal de Justiça assenta-se na legalidade das parcelas recebidas do benefício a ser renunciado. Para elucidar, transcrevemos parte do relatório exarado pela Ministra Laurita Vaz do STJ, no julgamento do Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.107.638-PR (2008/0280515-4):

[...] é firme no âmbito desta Corte Superior de Justiça o entendimento no sentido de que a renúncia à aposentadoria, para fins de concessão de novo benefício, seja no mesmo regime ou em regime diverso, não implica em devolução dos valores percebidos, pois, enquanto esteve aposentado, o segurado fez jus aos seus proventos.

Efetivamente, não há dúvida de que as mensalidades pagas a título de aposentadoria foram devidas, com exceção dos casos em que se constata alguma irregularidade administrativa ou fraude. Entretanto, a questão a ser analisada é mais abrangente, pois, como é sabido, a seguridade social é financiada por toda sociedade, de forma direta e indireta e a manutenção do equilíbrio financeiro e atuarial é critério eleito pela CRFB a ser observado. Assim, embora a aposentadoria seja um direito patrimonial e, portanto, disponível, a previdência é direito social. É necessário que a análise não se restrinja a legalidade ou ilegalidade da questão, mas abranja cálculos financeiros e atuariais que possibilitem o exercício do direito de renúncia sem que haja prejuízo de terceiros.


CONCLUSÃO

Após estudo dos principais aspectos da desaposentação no Regime Geral de Previdência Social, é inelutável concluir pela sua possibilidade. A análise legislativa leva a ilação de que, embora o legislador tenha tido o expresso intuito de revestir o instituto da aposentadoria de irrenunciabilidade e irreversibilidade, o reconhecimento da natureza jurídica do benefício como patrimonial e, portanto, disponível, faz sucumbir esta pretensão.

A tentativa de se evitar a desaposentação com base na argumentação de imutabilidade do ato jurídico perfeito não foi suficiente a impedir a entrada deste instituto no cenário jurídico através da doutrina e jurisprudência. Análise teleológica destas garantias constitucionais demonstra que elas se dispõem à proteção da sociedade frente aos desmandos estatais e, assim, não podem servir como obstáculos ao exercício de direito pelo indivíduo.

Embora a doutrina e jurisprudência sejam uníssonas em admitir a possibilidade da desaposentação, quando a análise requer a fixação da necessidade ou não de devolução dos proventos percebidos há notório desentendimento. Parte defende veementemente a não devolução, sustentando a tese na afirmação de que o regime financeiro de repartição simples adotado pelo RGPS não possibilita a manutenção de uma relação direta entre as contribuições do segurado e seus benefícios e, por esta razão, a não devolução dos valores não geraria prejuízo ao sistema. Ainda, os defensores deste entendimento aduzem que não há razão para se exigir do segurado a devolução, uma vez que, enquanto perdurou a aposentadoria pelo regime geral, os pagamentos foram indiscutivelmente devidos.

Em contrapartida, aqueles que entendem devida a devolução dos proventos recebidos fundamentam sua tese no entendimento de que a não devolução dos valores causaria prejuízo ao sistema financeiro e atuarial. No que se refere à desaposentação e nova aposentação no mesmo regime, resguardando a necessidade de devolução, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região têm defendido que a disposição do Art. 18, § 2º da Lei 8.213/1991, que dispõe que o aposentado que permanecer em atividade sujeita ao RGPS, ou a ele retornar, não fará jus à prestação alguma da Previdência Social, impede que a desaposentação se efetive sem a restituição ao status quo ante.

A unanimidade de entendimento acerca da possibilidade da desaposentação torna mais que urgente a necessidade de um posicionamento concreto e comum acerca de seus efeitos. A discussão não deve centrar-se especificamente na legalidade da questão, mas também levar em conta que o RGPS, como sistema de seguro social, precisa manter o equilíbrio financeiro para sua liquidez e assim continuar garantindo proteção à sociedade.

Como já assentado, a renúncia é possível ao aposentado, pois não há previsão legal em contrário. Esta mesma ausência legislativa, que possibilita a pessoa fazer tudo aquilo que não é proibido, tem efeito contrário em relação à administração pública, em razão de que a atividade plenamente vinculada à lei impede a admissão da desaposentação pela autarquia INSS.

A análise acerca deste novel instituto deve ser pautada de ponderação, pois não se pode, simplesmente, ignorar a legislação pertinente ou conotá-la de interpretação tendenciosa, como fazem alguns doutrinadores. Se há a imposição legal de irrenunciabilidade e irreversibilidade é porque efetivamente o legislador, embora extrapolando os limites da lei que estava regulamentando, teve a intenção de revestir a aposentadoria destas características. Esta posição se reforça pela interpretação conjunta dos artigos 11, § 3º e Art. 18, § 2 da Lei 8213/91, que tanto determinam a obrigação de contribuir ao segurado aposentado que volta a exercer atividade, quanto lhe dão ciência de que em razão dessa atividade, não terá direito a prestação alguma por parte da Previdência Social, com exceção do salário família e da reabilitação profissional.

A questão deve ser vista por dois ângulos: legitimidade e possibilidade. Declarar que não restituição de valores não importará em prejuízo ao instituto em qualquer hipótese parece atitude um tanto desarrazoada, pois, embora não haja correlação direta entre o benefício pago e a cotização individual, por obvio, há uma conexão entre as contribuições do segurado e a transferência de valores através da aposentadoria, assim não fosse, não haveria razão de existir a fórmula do fator previdenciário.

Para uma definição acerca da necessidade da restituição, há que se analisar a finalidade da desaposentação. Partindo desta premissa, através do presente estudo, pudemos concluir que, se a finalidade da desaposentação é a nova aposentação no mesmo regime e a aposentadoria a ser renunciada trata-se de aposentadoria integral, o fato de as reservas do segurado permanecerem no mesmo regime e considerando a existência de novas cotizações, não haveria prejuízo ao sistema em possibilitar a desaposentação sem a devolução dos valores percebidos. No entanto, se a aposentadoria a ser renunciada trata-se de proporcional para obtenção de integral, há a necessidade de devolução do total recebido nos cinco anos em que o segurado esteve aposentado proporcionalmente, de modo a igualar-se àquele segurado que não optou pela proporcional.

O fato de não haver prejuízo para o sistema pelos fundamentos já narrados, não significa dizer que o procedimento é legal, pois, enquanto existir a vedação legal expressa no Art. 18, § 2º da Lei 8.213/91, a desaposentação e nova aposentação no mesmo regime sem a restituição do status quo ante não será possível.

Na espécie de desaposentação em que se pretende a obtenção de CTC para averbação em regime previdenciário diverso, embora não se aplique o impeditivo legal do Art. 18, § 2º da Lei 8.213/91, entendemos necessária a devolução total dos valores percebidos de modo a preservar o equilíbrio financeiro e atuarial. Ao transferir as reservas acumuladas pelo segurado para outro regime, sem manter quantia que corresponda ao período já transferido através da aposentadoria, logicamente haverá prejuízo ao sistema e a conta terá de ser paga pela sociedade.

E, como última possibilidade de desaposentação, temos a hipótese do segurado que pretende renunciar a sua aposentadoria simplesmente para retornar à condição de ativo ou por outra razão qualquer que não queira mencionar. Admitida a possibilidade de renúncia, também é de se admitir que a desaposentação possa se dar sem objetivo específico, mesmo porque não se pode forçar alguém a estar aposentado contra sua vontade, ainda que esta vontade não seja revelada. Neste caso específico entendemos que não há a necessidade de restituição imediata dos valores, até por que não há a intenção de obtenção de CTC. Solucionaria-se a situação com a suspensão do benefício e a emissão de uma certidão narratória do tempo de contribuição do segurado junto ao RGPS. Deste modo, somente quando ele efetivamente resolvesse utilizar este tempo no RPPS é que surgiria a necessidade de devolução.

A hermenêutica jurídica impõe que se aplique razoabilidade às decisões, de modo a atender aos anseios dos segurados e beneficiários, sem, contudo, inviabilizar o bom funcionamento do sistema. Ao lado da análise legislativa, deve ser realizada a análise da viabilidade financeira e atuarial do sistema e, por meio de cálculos matemáticos, possibilitar a garantia do exercício do direito de renúncia, sem que o exercício deste direito resulte em prejuízos para toda a sociedade.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, Sabrina Coppi. A possibilidade da desaposentação no Regime Geral de Previdência Social. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2354, 11 dez. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14000. Acesso em: 28 mar. 2024.