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Indenização cumulada com alimentos por morte em acidente com trem urbano

Indenização cumulada com alimentos por morte em acidente com trem urbano

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Eis uma extensa e fundamentada petição inicial de uma ação de indenização, cumulada com alimentos, por danos morais e materiais causados à família de um advogado, vítima fatal de acidente com trem urbano que atingiu seu veículo em um cruzamento mal-sinalizado. A ação se baseia na reponsabilidade objetiva do Estado. Segue também o questionário feito para a perícia.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL DO FORO CENTRAL DE SÃO PAULO.

          MARISTELA FUENTES MELLO NOGUEIRA, brasileira, viúva, do lar; e, ARYANE FUENTES MELLO NOGUEIRA, brasileira, menor impúbere; e, MAYRA FUENTES MELLO NOGUEIRA, brasileira, menor impúbere, devidamente representadas, residentes e domiciliados na rua Antonio Máximo, nº 408, Cesar de Souza, Mogi das Cruzes, por seu Advogado, infra-firmado  (doc.01 e 02), vem, à presença deste Juízo, propor

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR ATO ILÍCITO
c.c. DANOS MORAIS  c.c. ALIMENTOS,
PELO PROCEDIMENTO ORDINÁRIO,

          contra a COMPANHIA PAULISTA DE TRENS METROPOLITANOS, pessoa jurídica de direito público, com sede à Av. Paulista, nº 402, 5º Andar, ou, Av. Francisco Matarazzo, nº 404, Água Branca, São Paulo, e PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE MOGI DAS CRUZES, com sede na Avenida Narciso Yague Guimarães, n° 277, Centro Cívico, Mogi das Cruzes, e, pelos motivos de fato e de direito a seguir declinados.


PRELIMINARMENTE

I

          Requerem a concessão dos benefícios da Assistência Judiciária integral, por serem pobres na acepção jurídica do termo, não tendo condições de dispor de qualquer importância, para recolherem custas e despesas processuais, honorários de Advogados e peritos e demais gastos.

          Ante ao exposto, com fundamento no artigo 5º, inciso LXXIV c.c. artigo 4º, da Lei 1.060/50, sob as cominações da Lei 7.115/83, requerem a concessão da gratuidade da Justiça.


II
ALIMENTOS PROVISIONAIS "INAUDITA ALTERA PARS"

          As Requerentes com a morte do cabeça do casal estão passando por sérias privações financeiras, haja vista que de seus labor advinha a verba para a mantença da família.

          O "de cujus", mantinha um escritório de advocacia e ganhava o eqüivalente a 23 (vinte e três) salários mínimos por mês, ou seja, R$ 3.000,00 (três mil reais), desta importância mantinha o lar; ceifada a sua vida estão as Requerentes à mercê da ajuda dos familiares, passando por sérias privações de ordem financeira, moral, intelectual, fato que não pode prosperar em vista da culpa dos Requeridos.

          A lei processual civil deixa clara a possibilidade de os Requerentes pretenderem a fixação por este Juízo dos alimentos provisionais:

          Art. 852. É lícito pedir alimentos provisionais:
          III - nos demais casos expressos em lei.

          Tem se entendido, que em havendo a prova pré-constituída, podem obter a concessão dos alimentos provisionais, neste caso, a prova para constituir-lhes o direito aos alimentos provisionais está insculpida no Código Civil, mais precisamente nos artigos 400 e 1.537, "verbis":

          Art. 400. Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.

          Art. 1537. A indenização, no caso de homicídio, consiste:
          I - No pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família.
          II - Na prestação de alimentos às pessoas a quem o defunto os devia.

          O homicídio é a prova da obrigação contida no art. 1.537, do Código Civil, única prova pelas Requerentes a ser produzida "initio litis".

          Estes ensinamentos são extraídos das lições de Aguiar Dias, Responsabilidade Civil, Forense, 1960, vol. I, p. 110, citado na Revista dos Tribunais 720:

          "O que o prejudicado deve provar, na ação, é o dano, sem consideração ao seu quantum que é matéria da liquidação. Não basta, todavia, que o autor mostre que o fato de que se queixa, na ação, seja capaz de produzir dano, seja de natureza prejudicial. É preciso que prove o dano concreto, assim entendida a realidade do dano que experimentou, relegando para a liquidação a avaliação do seu montante".
(destaquei e omiti)

          A prova está no resultado (morte), motivo suficiente para o deferimento dos alimentos provisionais, conforme já decidiu o Egrégio Primeiro Tribunal de Alçada Civil, "verbis":

          Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo
          NP.: 00638219-1/00 TP.: AGRAVO DE INSTRUMENTO
          NA.: 638219 PP.2
          CO.: PRESIDENTE VENCESLAU
          DJ.: 01/11/95 OJ.: 4 A. CÂMARA
          DP.: MF 12/NP
          Rel. FRANCO DE GODOI
          DEC.: Unânime

          TUTELA ANTECIPADA - RESPONSABILIDADE CIVIL - ACIDENTE DE TRÂNSITO - COLISÃO DE VEÍCULOS - VÍTIMA FATAL - PRETENSÃO AO RECEBIMENTO DE ALIMENTOS PROVISIONAIS PELA AUTORA GRÁVIDA, ESPOSA DO "DE CUJUS" - CARACTERIZAÇÃO DA VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES CUJO CONCEITO É DIVERSO DAQUELE DE CERTEZA - CONFIRMAÇÃO DO RECEIO DE DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO EM FACE DA CONDIÇÃO PESSOAL DA AUTORA - ARTIGO 273 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - ALIMENTOS PROVISIONAIS CONCEDIDOS - RECURSO IMPROVIDO. RPS/PA

          A prova pré-constituída é suficiente para o deferimento dos alimentos provisionais, já que toda a vida da família girava em torno do "de cujus", e as Requeridas encontram-se na lastimável condição de credoras, como ensinam NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA ANDRADE NERY:

          "Fixação dos alimentos provisionais. Diferentemente dos alimentos provisórios da LA 4.° , os alimentos provisionais podem ser pedidos por quem não tem prova constituída de sua qualidade de credor. A cautelar será concedida, provisória (CPC 854 pár. ún.) e/ou definitivamente, em virtude das provas de periculum in mora e fumus boni iuris demonstradas pelo requerente. O credor de alimentos pode, em caso de descumprimento da obrigação por parte do devedor, ajuizar ação de execução de alimentos provisórios, provisionais e definitivos, conforme seja o título de que disponha  (CPC 732, 733; LA 13) ".
(Código de Processo Civil Comentado, 2ª ed., Editora Revista dos Tribunais, p. 1.151. Grifei)

          "O alimentando tem o ônus de demonstrar apenas, initio litis, o dever de alimentar do acionado, impendendo ao magistrado nesse caso a fixação provisória". (Ac. unân. da 6ª Câm. do TJRS de 24.6.86, no agr. 586.016.396, Rel. Des. Adalberto Libório Barros; RJTJRS 118/223)

          [ALEXANDRE DE PAULA, Código de Processo Civil Anotado, Vol. III - arts. 566 a 889, 6ª edição, RT. Destaquei]

          Ademais, estão as Requerentes desde o mês de junho de 1997, sem contar com os rendimentos do cabeça do casal, que, eqüivaliam a R$ 3.000,00 (Três mil reais) por mês, caso estivesse vivo, correspondendo atualmente a 23 (vinte e três) salários mínimos.

          Passados 17  (DEZESSETE) meses, deixou de suprir aos seus entes na importância de R$ 51.000,00  (CINQÜENTA E UM MIL REAIS BRUTOS) e, como se comprova, estão passando sérias necessidades após a morte do cabeça do casal, esta tormenta acentuou-se com a morte do cabeça do casal, inclusive, cheques que estão sendo protestados, etc.

          Isto posto, com fundamento no artigo 273, I, 461, § 3º, 852, III, todos do Código de Processo Civil, requerem deste Juízo em determinar às Requeridas o pagamento do valor acima declinado, proporcionalmente, antecipando a tutela, bem como a fixação da soma eqüivalente a 23 (VINTE E TRÊS) salários mínimos, a serem pagos mensalmente, até o julgamento final da ação, destinados às postulantes, e principalmente para a mantença da família que conta com duas filhas menores, à título de alimentos provisionais, determinando às Requeridas procedam o depósito mensal em Juízo, através de Guia Judicial.


FATOS

          O "de cujus" no dia 02.06.97, no período compreendido entre às 8: 00 e 9:00 horas da manhã, foi colhido por uma composição de trens da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), quando atravessava a passagem de nível da avenida Caravelas em Mogi das Cruzes.

          Estava o "de cujus" conduzindo seu veículo Chevette, placas BJB 7120, e ao atravessar a passagem de nível teve sua vida ceifada, aos 36 (trinta e seis) anos de idade, embora tenha sido retirado das ferragens com vida, o choque causou hemorragia interna, devido ao politraumatismo.

          As Requerentes, mais precisamente a mãe das menores, viveu noites sem dormir, acudindo as filhas em tenra idade, clamando pelo pai, ídolo maior, afinal, todas as tardes ao chegar de seu escritório corriam para seus braços, e à partir daquele fatídico dia não mais teriam para quem correr.

          Ã Requerente, além da dor provocada pela ausência do marido tão amado, companheiro de todas as horas, restou o mais imenso dos sofrimentos, que seria suportar o apelo das filhas chamando o pai, por noites afora.

          A Requerente, restava ainda a dor profunda causada pelos nossos administradores, por se deparar com várias notícias no jornais da região, mostrando o veículo de seu marido e, por ter conhecimento do descaso da Administração (de forma geral) na mantença das condições das composições e de todo o trecho em que circulam os trens.

          Instaurado o inquérito policial acenam para a avaria dos instrumentos impossibilitando acionamento da cancela, entretanto, o procedimento administrativo proposto contra o funcionário GERSON APARECIDO PALANCA, imputou-lhe a omissão, ocasionando na sua demissão; e segundo suas afirmações não lhe foi concedido nenhum treinamento para o serviço, e para a execução dos serviços são necessários dois (02) vigias.

          A testemunha Ademir de Sousa (fl.114), afirma que por inúmeras vezes foi solicitado à Prefeitura de Mogi das Cruzes que dois (02) vigias exercessem tal função, e que a cancela quebra constantemente.

          Já o testemunho do motoqueiro que passava no local (Marcos Roberto), afirmou estar ouvindo os sinais sonoros, e o vigia encontrava-se no interior da guarita, e pelo que se deduz a cancela não estava funcionando.

          Tanto é que, no mesmo instante do "de cujus", tentou atravessar, quase sendo atropelado, e o vigia não esboçou qualquer reação, tal como: acenar, sair da guarita, para tentar impedir a travessia de veículos.

          De qualquer modo, é notório o descaso da operadora de trens, assim como da Prefeitura local, em manter as instalações em adequadas condições de uso, também com funcionários suficientes, evidente que tentarão amenizar as declarações, mas o fato é que a vida de um brilhante e promissor advogado, sobretudo de um ser humano foi estirpada, por culpa exclusiva das Requeridas.


DIREITO

CULPA SOLIDÁRIA

          É evidente que as Requeridas procurarão eximir-se da culpa, ou na melhor das hipóteses minimizá-la, porém, é incontroversa que a responsabilidade é solidária.

          Em princípio, cumpre salientar de que a Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes, mantém somente um (01) funcionário para acionar o mecanismo de alerta aos motoristas, quando os serviços necessitam de dois.

          Este funcionário contratado para tal ato, cuida do equipamento de acionamento da cancela, ou seja, atua o funcionário na qualidade de preposto da Prefeitura, ora Requerida, deste modo, sobressai-se também a responsabilidade da 2a Requerida, já que deriva de ato de seu funcionário:

          "Justifica-se a responsabilidade do preposto ou patrão pela circunstância de que, "ao recorrer aos serviços do preposto, o empregador está prolongando a sua própria atividade, de tal modo que a culpa do preposto é como conseqüência da sua própria culpa", no dizer de AGUIAR DIAS e SERPA LOPES  (CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, Responsabilidade civil, 2ª ed., Rio, Forense, 1990, nº 82, pág. 103). Harmonizando-se com o posicionamento doutrinário, a jurisprudência acabou fixando-se no reconhecimento de que "é presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto"   (Súmula nº 341 do STF). Assim, a responsabilidade civil aquiliana do preponente, prevista no art. 1.521, inc. III, da lei civil, pressupõe que: a) tenha a vítima sofrido um prejuízo  (dano), por fato do preposto; b) tenha o preposto cometido o fato lesivo no exercício de suas funções, ou seja durante o trabalho ou por ocasião dele; c) tenha havido culpa do preposto; d) exista relação de dependência ou subordinação entre o causador do dano e o patrão ou preponente"
(cf. MARIA HELENA DINIZ, Curso de direito civil, São Paulo, Saraiva, 1984, v. VII, pág. 348; CAIO MÁRIO, ob. cit., nº 82, pág. 104; WLADIMIR VALLER, A reparação do dano moral no direito brasileiro, Campinas, E. V. Editora, 1994, pág. 82)

          O funcionário   (Gerson Aparecido Palanca), entre outros, era mantido na passagem de nível pela Prefeitura, somente para executar o acionamento do mecanismo da passagem de nível, ou tomar qualquer outra medida preventiva, e, segundo consta em suas declarações, o cabo de aço que aciona a cancela enroscou, somando com a neblina, não foi possível avisar o motorista, o que culminou na morte do promissor Advogado.

          Com a morte do advogado, o preposto da 2a Requerida (GERSON APARECIDO PALANCA), foi denunciado pela Promotoria Pública de Mogi das Cruzes, como incurso no artigo 121, § 3º, do Código Penal, uma vez que o representante do "Parquet", entendeu ter havido a culpa exclusiva do preposto (cópia anexa), que, inclusive, deverá ser admitida como prova emprestada.

          Ora, a declaração do funcionário assinala a total ausência de manutenção do equipamento, quer seja da segurança imprescindível, quer pelo total descaso para com as composições de trens circulantes, de qualquer modo, permanece a responsabilidade da 1a Requerida, na qualidade de PERMITENTE, uma vez que a sua obrigação é de averiguar as condições dos equipamentos cedidos.

          Por outro lado, ainda que haja a existência de contrato entre as Requeridas, é dever da 1a Requerida (CPTM) manter o adequado funcionamento do material de segurança, ademais, esta obrigação, mesmo que exista contrato com outras previsões, está expressa no Regulamento dos Transportes Ferroviários:

          DECRETO N. 1.832 – DE 4 DE MARÇO DE 1996.

          Aprova o Regulamento dos Transportes Ferroviários

          Art. 10. A Administração Ferroviária não poderá impedir a travessia de suas linhas por outras vias, anterior ou posteriormente estabelecidas, devendo os pontos de cruzamento ser fixados pela Administração Ferroviária, tendo em vista a segurança do tráfego e observadas as normas e a legislação vigentes.

          § 1º A travessia far-se-á preferencialmente em níveis diferentes, devendo as passagens de nível existentes ser gradativamente eliminadas.

          § 2º Em casos excepcionais, será admitida a travessia no mesmo nível, mediante condições estabelecidas entre as partes.

          § 4º O responsável pela execução da via mais recente assumirá todos os encargos decorrentes da construção e manutenção das obras e instalações necessárias ao cruzamento, bem como pela segurança da circulação local.

          Art. 13. A Administração Ferroviária é obrigada a manter a via permanente, o material rodante, os equipamentos e as instalações em adequadas condições de operação e de segurança, e estar aparelhada para atuar em situações de emergência.

          Art. 58. Os contratos de concessão e de permissão deverão conter, obrigatoriamente, cláusula contratual prevendo a aplicação das seguintes penalidades pelas infrações deste Regulamento:

          II – por violação dos artigos 3º, 4º, inciso I, 6º, 10, 12, 13, 14, 17, § 5º, 24, 29, 31, 32, 44, 46, 47, 48, 54 e 56, multa do tipo II.

          .............................................

          Multa do tipo II: quinhentas vezes o valor básico unitário

          Art. 54. A Administração Ferroviária adotará as medidas de natureza técnica, administrativa e educativa destinadas a:

          I – preservar o patrimônio da empresa;

          II – garantir a regularidade e normalidade do tráfego;

          IV – prevenir acidentes;

          V – garantir a manutenção da ordem em suas dependências;

          Art. 60. Cometidas simultaneamente duas ou mais infrações de natureza diversa, aplicar-se-ão, cumulativamente, as penalidades correspondentes a cada uma.

          O artigo 13 do Regulamento é taxativo: "A Administração Ferroviária é obrigada a manter a via permanente, o material rodante, os equipamentos e as instalações em adequadas condições de operação e de segurança...", e esta obrigação, pelo que se depreende do Regulamento é exclusiva da 1a Requerida.

          Independentemente de contrato, é obrigação da 1a Requerida na qualidade de operadora do sistema ferroviário zelar pela segurança da passagem de nível, fazer constantes inspeções, evidentemente deve haver a colaboração dos funcionários da 2a Requerida; embora seja notório o natural descuido com os trens, tal imposição é derivada do regulamento, devendo ambas exercer a fiscalização em todos os equipamentos de segurança, nela incluindo-se o equipamento da passagem de nível.

          Ainda que o funcionário seja municipal, deve a 1a Requerida manter constante vigilância em suas instalações, e assim não o faz, haja vista as deploráveis condições em que trafegam as composições de trem, segundo reportagem do jornal "O ESTADO DE SÃO PAULO" de 10 de julho de 1997: "TRENS CIRCULAM SEM CONTROLAR TRÁFEGO" (doc. anexo), segundo narrado ao Promotor de Justiça e Cidadania, a Companhia, Dr. Fernando Capez, estaria obrigando os maquinistas a circularem sem o apoio dos controladores.

          Estes são os descasos da CPTM, pois outra denúncia novamente veio à tona, o Sindicato dos Ferroviários (doc.46, fl. 133), afirma a inexistência de qualquer tipo de manutenção por parte da 1a Requerida para com os equipamentos de segurança, deixando desprezada a Zona Leste (Diário de Mogi, Cidades, p. 3), área em que ocorreu o sinistro letal.

          Pode-se deduzir, que o preposto da 2a Requerida não acionou o equipamento para baixar a cancela para alertar sobre a passagem do trem, entretanto, ainda que não tenha cumprido sua obrigação, os maquinistas da 1a Requerida, declararam à reportagem do jornal "O ESTADO DE SÃO PAULO", sobre a obrigatoriedade em circular sem apoio do controle de tráfego, isto é, inexistindo controle de tráfego, torna-se impossível saber dos horários de circulação dos trens, para evitar as tragédias, entretanto, a ausência de manutenção nos equipamentos (fato notório), evidentemente colaborou nesta tragédia.

          Em qualquer hipótese, ambas concorreram para a morte do Advogado, por descumprir com a manutenção dos equipamentos, por estar a composição de trens em velocidade incompatível e possivelmente atrasada, uma vez que não há respeito com os horários, e, principalmente por não oferecer treinamento aos operadores das cancelas; ao passo que a 2a Requerida, conhecedora de tais fatos, mantinha somente um funcionário, quando há necessidade de dois (02) funcionários, e por não atender ao comunicado de seu preposto, dentre outras coisas mais, mas o fato é de que houve uma morte, causada pela somatória de omissões das Requeridas.

          Ainda que a 1a Requerida pretenda eximir-se da responsabilidade de indenizar as Requerentes, esta pretensão certamente afrontará as decisões dos Tribunais:

          "À empresa ferroviária cumpre sinalizar devidamente as passagens de nível para alertar os motoristas sobre a aproximação dos trens, pouco ou nada importando a preferência destes na passagem. Provado que a passagem ferroviária não era sinalizada, ocorre a culpa "in re ipsa", decorrente do fato de terem os prepostos da empresa agido com negligência, nos termos do art. 1.521, III, do CC".
(1° TACSP - 6ª Câm. Ap. Rel. Juiz Minhoto Júnior - 21.8.81 - RT 559/148).

          "Ao manter guarita no cruzamento, com guarda incumbido da sinalização, a ferrovia assumiu inequivocamente a obrigação de zelar pela segurança no local. A prova colhida no curso da instrução é conclusiva no sentido de que no momento do acidente o cruzamento não se encontrava sinalizado da forma usual e devida. E foi essa omissão a causa determinante do acidente. Nem mesmo se culpa concorrente se haveria de cogitar".
(1° TACSP - 1ª C.Esp. - Apel. - Rel. Elliot Akel - j. 19.7.89 - JTACSP 122/24 ).

          "ACIDENTE FERROVIÁRIO – Responsabilidade civil – Atropelamento de menor ao atravessar ferrovia em local e à frente do trem em movimento – Evento que, inobstante imprudente a vítima, decorreu da falta de adequada sinalização, fiscais, obstáculos, muros ou alambrados na localidade – Negligência da companhia no exercício de seu poder de polícia caracterizada – Indenização devida – Voto vencido.
Se a companhia ferroviária não provê com adequada sinalização, fiscais, obstáculos, muros ou alambrados, decorrendo daí atropelamento que tenha vítima imprudentemente atravessado a ferrovia em local inadequado e à frente do trem em movimento."
(1º TACIVIL, Grupo Especial de Câm.; Bem. Infr. nº 416.767-5/01; Rel. Juiz Ferraz de Arruda; j. 04.04.1990; maioria de votos, RT 673/87)

          Superior Tribunal de Justiça
          TRIBUNAL: STJ ACÓRDÃO RIP: 00024015 DECISÃO: 28-06-1994
          PROC: RESP NUM: 0038232 ANO: 93 UF: RJ TURMA: 04
          RECURSO ESPECIAL
          P U B L I C A Ç Ã O
          DJ DATA: 22/08/1994 PG: 21266

          E M E N T A
- RESPONSABILIDADE CIVIL. MORTE RESULTANTE DE ACIDENTE POR COMPOSIÇÃO FERROVIÁRIA. - DEVER DE INDENIZAR DA EMPRESA FERROVIÁRIA QUE NÃO TOMOU AS MEDIDAS DE SEGURANÇA ADEQUADAS E EXIGÍVEIS, DEIXANDO DE CONSERVAR CERCAS, MUROS, CANCELAS OU SINAL NECESSÁRIOS A PROTEÇÃO DOS TRANSEUNTES.. REGULAMENTO APROVADO PELO DECRETO N. 2089/63, ARTS. 10 E 70, PAR-3... - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA RESTABELECER A DECISÃO DE INFERIOR INSTÂNCIA.

          R E L A T O R
MIN: 0132 - MINISTRO ANTONIO TORREÃO BRAZ

          O B S E R V A Ç Ã O
POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO RECURSO.

          VEJA:
RESP, 1259/RJ, RESP, 3720/SP,  (STJ)

          R E F E R Ê N C I A
LEG: FED DEC: 002089 ANO: 1963
ART: 00010 ART: 00070 PAR: 00003 .

          C A T Á L O G O
CV0245 RESPONSABILIDADE CIVIL
TRANSPORTE FERROVIARIO
RESPONSABILIDADE
OBJETIVA
ACIDENTE DE TRÂNSITO - Responsabilidade civil. Imprudência do causador do sinistro caracterizada. Inobservância de norma regulamentar de trânsito pela vítima que não exclui a responsabilidade daquele por não ter sido a causa motivadora do evento.

          (1º TACSP - Ap. 436.161-9 - 3º C. Esp. julho/90 - Rel. Juiz Antônio de Pádua Ferraz Nogueira - J. 17.07.90 - RT 661/96)

          O descaso das Requeridas em fiscalizar e proporcionar treinamento para o funcionário, além de zelar por todos os equipamentos, aliado a omissão do preposto, bem como de todos os responsáveis da Companhia, uma vez que não há controle e nem conhecimento dos horários dos trens, insere-se plenamente no preceito constitucional da responsabilidade pelos danos proporcionados, prevista na CF:

          Art. 37. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e, também, ao seguinte:

          § 6º. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

          O texto constitucional, como bem salienta o saudoso Hely Lopes Meirelles consagrou a teoria da culpa administrativa:

          "A teoria da culpa administrativa representa o primeiro estágio da transição entre a doutrina subjetiva da culpa civil e a tese objetiva do risco administrativo que a sucedeu, pois leva em conta a falta do serviço para dela inferir a responsabilidade da Administração. É o estabelecimento do binômio falta de serviço-culpa da Administração. Já aqui não se indaga da culpa subjetiva do agente administrativo, mas perquire-se a falta objetiva do serviço em si mesmo, como fato gerador da obrigação de indenizar o dano causado a terceiro"..
(Direito Administrativo Brasileiro, 20a edição, Malheiros, p. 557)

          O Supremo Tribunal Federal, já decidiu que a teoria do risco administrativo caracteriza-se pelo dano dos agentes públicos, conforme acórdão da lavra do emérito Ministro CELSO DE MELLO:

          "A teoria do risco administrativo, consagrada em sucessivos documentos constitucionais brasileiros desde a Carta Política de 46, confere fundamento doutrinário à responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos a que os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou por omissão. Essa concepção teórica, que informa o princípio constitucional da responsabilidade civil do Poder Público, faz emergir, da mera ocorrência de ato lesivo causado à vítima pelo Estado, o dever de indenizá-la pelo dano pessoal e/ou patrimonial sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes públicos estatais ou de demonstração de falta de serviço público.

          Os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem a) a alteridade do dano, b) a causalidade material entre o eventus damni e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, c) a oficialidade da atividade causal e lesiva, imputável a agente do Poder Público, que tenha, nessa condição funcional, incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional  (RTJ 140/636) e d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal  (RTJ 55/503, RTJ 71/199, RTJ 91/377, RTJ 99/1155 e RTJ 131/417)...".

          [RT 733/130]

          "RESPONSABILIDADE CIVIL – ACIDENTE CAUSADO POR VEÍCULO DE PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO – INVERSÃO DO ÔNUS DE PROVA POR FORÇA DE PRECEITO CONSTITUCIONAL – LITISDENUNCIADO – Por força do disposto no art. 37, § 6º, da CF, cabe à pessoa jurídica de direito público, uma vez demonstrado o nexo causal entre o ato de seu agente e o dano causado ao particular, responder pelo prejuízo. No caso concreto, nem a pessoa jurídica ou seu agente, litisdenunciado, lograram provar culpa exclusiva ou concorrente do particular."
(TRF 1ª R. – AC 90.01.00298-6 – DF – 3ª T. – Rel. Juiz Adhemar Maciel – DJU 06.08.90)

          "ACIDENTE DE TRÂNSITO – ATROPELAMENTO EM VIA URBANA – Responsabilidade objetiva do Município pelo ato danoso do preposto, na forma do art. 37, § 6º, da Constituição, porquanto não evidenciada culpa exclusiva da vítima. Dano moral arbitrado com eqüidade, sendo correta a forma de pensionamento mensal, que deve ficar limitado a 12 prestações anuais, com termo final à data em que a vítima completaria 25 anos. Honorária bem estabelecida. Apelos improvidos, com modificação parcial da sentença, em reexame necessário."
(TARS – AC 195.177.662 – 3ª C. Cív. – Rel. Luiz Otávio Mazeron Coimbra – J. 24.04.96)

          Tendo a omissão das Requeridas causado a morte de um membro tão importante para as Requerentes, deve ser reconhecida a culpa solidária de ambas e, concomitantemente devem ser condenadas.


DANO MATERIAL

          Efetivamente as Requerentes sofreram danos materiais com a vida do cabeça do casal e pai, ceifada por ato negligente das Requeridas, a primeira por não manter os equipamentos de segurança, exsurgindo sua responsabilidade solidária (art.10, Decreto 1.832/96) ; a segunda, por manter um funcionário relapso, e sem treinamento, e ainda por cima não tomou qualquer atitude preventiva procurando evitar a tragédia, resultando na morte do promissor advogado, pelo ato omissivo.

          Eis que, com a culpa concorrente comprovada, os preceitos do Código Civil, devem ser aplicados, principalmente a previsão do artigo 159:

          Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

          A verificação da culpa e a avaliação da responsabilidade regulam-se pelo disposto neste Código, arts. 1.518 a 1.532 e 1.537 a 1.553.

          Causaram prejuízos às Requerentes, além da dor proporcionada, estão à mercê da boa vontade dos parentes, o que não ocorreria caso estivesse vivo o marido, o pai, o amigo.

          Nem há que se falar que estarão as Requeridas a indenizar duas vezes pelo fato da ocorrência do mesmo incidente, pois um único evento pode motivar várias indenizações:

          "UM ÚNICO EVENTO PODE CONSTITUIR UM LEQUE DE PREJUÍZOS DE NATUREZA DIVERSA, A JUSTIFICAR, CADA UM, UMA VERBA REPARATÓRIA, SEM MARGEM A OCORRÊNCIA DE REPARAR DUAS VEZES A MESMA PERDA"

          (RT 613/184; 616/195; 604/5l; 586/188; 553/199,...)


DANO MORAL

          Com a edição da Carta ocorrida em 1988, entendeu o legislador, sobre a possibilidade da cumulação da dano material e do moral, a indenização resultante de ato ilícito, foi elevada a matéria constitucional:

          Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

          X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

          O dano moral, enquanto conceito sofre muitas variações, mas certamente a perda na proporção relatada, provoca a mudança profunda no estado emocional das pessoas, tais alterações experimentadas pelas Requerentes enquadram-se no contexto de dano moral, pois a repercussões na esfera pessoal são muitas, até porque comparando a lesão indiscutivelmente ocorrida, a outras lesões, o dano experimentado é de grandes proporções  (houve morte), dessa forma o bem jurídico merece a prestação jurisdicional em condenação bem agravada, como bem assinala TERESA ANCONA LOPEZ DE MAGALHÃES:

          "Para Agostinho Alvim dano, em sentido amplo, é a lesão a qualquer bem jurídico, e aí se inclui o dano moral, em sentido estrito é a lesão ao patrimônio, e patrimônio é o conjunto de relações jurídicas de uma pessoa, apreciáveis em dinheiro.

          Segundos os Mazeud, baseando-se em Lalou, a diferença entre dano moral e patrimonial dever corresponder à grande divisão dos direitos em patrimoniais (direitos reais e pessoais) e extrapatrimoniais (direitos da personalidade e de família).

          Portanto, a definição de dano moral tem de ser dada sempre em contraposição a dano material, sendo este o que lesa bens apreciáveis pecuniariamente e aquele, ao contrário, o prejuízo a bens ou valores que não têm conteúdo econômico.

          ...........................................

          Ora, o dano moral é sempre conseqüência de uma lesão a um direito, qualquer que seja sua origem, patrimonial ou não. Além disso o que deve servir de medida da dano não é o patrimônio é a pessoa que tanto pode ser lesada no que é, quanto pode ser lesada no que tem".

          [DANO ESTÉTICO (Responsabilidade Civil), RT, 1980, p.8/9 - grifei e omiti]

          Não bastasse a previsão constitucional, o Superior Tribunal de Justiça, houve por entender a cabida da cumulatividade das indenizações, uniformizando a jurisprudência, resultando na Súmula 37:

          37 - São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato.

          A propósito:

          Superior Tribunal de Justiça
TRIBUNAL: STJ ACÓRDÃO RIP: 00032034 DECISÃO: 16-08-1994
PROC: RESP NUM: 0040812 ANO: 93 UF: RJ TURMA: 03
RECURSO ESPECIAL

          P U B L I C A Ç Ã O
DJ DATA: 12/09/1994 PG: 23761

          E M E N T A
CIVIL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - ACIDENTE FERROVIÁRIO - MORTE DECORRENTE DE ACIDENTE FERROVIÁRIO - DANO MORAL E MATERIAL - CUMULAÇÃO.
I - ADMISSÍVEL A INDENIZAÇÃO, POR DANO MORAL E DANO MATERIAL, CUMULATIVAMENTE, AINDA QUE DERIVADOS DO MESMO FATO.
II - INCIDÊNCIA DA SUMULA N. 37, DO STJ.
III - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

          R E L A T O R
MIN: 1085 - MINISTRO WALDEMAR ZVEITER

          O B S E R V A Ç Ã O
POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO ESPECIAL E LHE DAR PROVIMENTO.

          VEJA:
RESP 15.646-SP  (STJ).

          R E F E R Ê N C I A
LEG: FED SUM: 000037 ANO: ****  (STJ).

          C A T Á L O G O
CV0240 RESPONSABILIDADE CIVIL
DANOS MORAIS
CUMULAÇÃO COM DANOS MATERIAIS

          "RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – Indenização. Acidente de veículo ocorrido por falta de serviço da municipalidade, provocando perda de membro inferior esquerdo do autor. Responsabilização objetiva caracterizada. Cumulação da indenização por dano material com a derivada de dano moral. Admissibilidade. Fato do autor não ter estimado a dor moral que não impedia o fizesse o próprio julgador. Provido o recurso adesivo do autor para incluir na condenação a indenização por dano moral.  (1º TACSP – Ap. sum. 586.379-8 – 8ª C. – Rel. Juiz Manoel Mattos – J. 04.01.95)  (RT 722/191) ".

          "RESPONSABILIDADE CIVIL – ATROPELAMENTO – RESPONSABILIDADE DA EMPRESA POR ATO DO PREPOSTO – PENSIONAMENTO DO VIÚVO PELA MORTE DA ESPOSA – ARTS. 159, 1.521 E 1.537, II, DO CC – Reconhecida nas instâncias ordinárias a ocorrência do dano patrimonial representado pela ausência da esposa do lar, onde contribuía com o trabalho doméstico para a economia da família, assim como a culpa do preposto da ré, aplicam-se os arts. 159, 1.521 e 1.537, II, do CC, cuja incidência não se restringe às hipóteses em que comprovada a dependência econômica entre a vítima e o pensionado.  (STJ – Ag. Rg. no AI 23.772-7-RJ – 4ª T – Rel. Min. Sálvio de Figueiredo – DJU 26.10.92)  (RJ 185/98) ".

          "RESPONSABILIDADE CIVIL – HOMICÍDIO – DANO MORAL – INDENIZAÇÃO – CUMULAÇÃO COM A DEVIDA PELO DANO MATERIAL – Os termos amplos do art. 159 do CC hão de entender-se como abrangendo quaisquer danos, compreendendo, pois, também os de natureza moral. O Título VIII do Livro III do CC limita-se a estabelecer parâmetros para alcançar o montante das indenizações. De quanto será devida indenização cuida o art. 159. Não havendo norma específica para a liquidação, incide o art. 1.553. A norma do art. 1.537 refere-se apenas aos danos materiais, resultantes do homicídio, não constituindo óbice a que se reconheça deva ser ressarcido o dano moral. Se existe dano material e dano moral, ambos ensejando indenização, esta será devida como ressarcimento de cada um deles, ainda que oriundos do mesmo fato. Necessidade de distinguir as hipóteses em que, a pretexto de indenizar-se o dano material, o fundamento do ressarcimento, em verdade, é a existência do dano moral..  (STJ – REsp 4.236-RJ – 3ª T – Rel. p/o Ac. Min. Eduardo Ribeiro – DJU 01.07.91)  (RJ 168/94) ".


O QUANTUM INDENIZATÓRIO

          A vítima fatal da colisão era Advogado, com futuro promissor, com renda mensal equivalente a 23 (vinte e três) salários mínimos, ou seja, R$ 3.000,00 (três mil reais) por mês.

          Segundo pesquisa recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a probabilidade de vida do brasileiro subiu para 70 (setenta) anos. A vítima faleceu aos 36 (trinta e seis) anos de idade, tinha como expectativa de vida mais 34 (trinta e quatro) anos, considerando a idade e os rendimentos, a indenização, "data venia", deverá ser:

          a) Indenização pela morte  (dano material):

          34 (anos) x 12 = 408 meses x 23  (s.m.) = 9.384 (nove mil trezentos e oitenta e quatro) salários mínimos x R$ 130,00 = R$ 1.219.920,00 (um milhão, duzentos e dezenove mil novecentos e vinte reais) ;

          b) Dano moral:

          O referente a 5.000 (cinco mil) salários mínimos, atualizados até a época do efetivo pagamento;

          c) Alimentos mensais (pensão vitalícia) = a serem fixados em 23 (vinte e três) salários mínimos por mês, divididos proporcionalmente entre as Requeridas, às Requerentes (menores), os alimentos deverão ser pagos até os 24 (vinte e quatro) anos de idade das menores, posto que, após cumprido o curso superior certamente obterão independência financeira, e posteriormente deverão ser pagos à viúva, reconhecido o direito de acrescer.

          d) Juros compostos à partir do evento;

          e) As prestações vencidas e vincendas, relativas à pensão alimentícia deverão ser calculadas com base no salário mínimo à época da liquidação;

          f) Aplicação dos artigos 644 e 645 c.c. 287, ambos do Código de Processo Civil.

          Os cálculos acima, "data venia", refletem não só a expectativa de vida da vítima, com seus prováveis rendimentos, assim como a dor moral, e aqui justifica-se o "quantum" pretendido, a dor moral não tem preço, é certo que a jurisprudência vem fixando o valor da dor moral analogicamente, ora na Lei de Telecomunicações, ou na Lei de Imprensa, no entanto, não existe padrão legal determinado, muito menos pode ser cogitado de que o processo não é fruto de enriquecimento, porém a perda da vida do cabeça do casal não pode ser motivo de empobrecimento, pobreza em todos os sentidos (moral, convivência, educação, etc.), portanto, a indenização pode ser fixada na proporção pretendida, principalmente quando a culpa da Requeridas exsurge dos autos.

          É incontroverso porém, de que é preciso quebrar as barreiras na hora de fixar o dano moral, pois, o muito para o Judiciário, é pouco para as Requerentes, todavia, caso não assim não entenda, requer seja fixado "quantum", em conformidade com o artigo 1.553, do Código Civil e que deverão ser liquidados na forma do art. 607, do CPC, conjugando-os com outros permissivos legais, para fixar o dano material e moral experimentados pela morte do varão, em favor da mulher e as duas filhas, assim como a pensão mensal vitalícia de caráter alimentar a ser fixada, porém, fixando-a a salários mínimos, conforme entendimento do Excelso Pretório:

          "RESPONSABILIDADE CIVIL - Indenização decorrente de acidente de veículo. Reparação de ganhos que a vítima poderia auferir. Fixação da pensão com base no salário mínimo. Art. 7º, IV, da CF. É inaplicável a proibição da vinculação ao salário mínimo, prevista na parte final do art. 7º, IV, da CF, com base de cálculo e atualização de pensão em ação de indenização por ato ilícito.  (STF - RE 140.940-1 - SP - 1º T - Rel. Min. Ilmar Galvão - DJU 15.09.95) ".


PEDIDO

          A pretensão das Requerentes está amparada no artigo 5º, X; 37, § 6º, ambos da CF; c.c. art. 76, 159, 400, 1.521, 1.537, 1.553, do Código Civil; artigo 100, 287, 292, 603, 607, 644, 645, 852, do Código de Processo Civil.

          Entretanto, caso este Juízo entenda diferente sobre os valores constantes do pedido indenizatório, requer sejam admitidos como genéricos, na forma do artigo 286, do Código de Processo Civil, e, a liquidação proceda-se na forma de arbitramento, com a aplicação dos artigos 1.553, do Código Civil e 607, do Código de Processo Civil, para condenar a indenizar as Requerentes, em conformidade com o entendimento deste Juízo, assim como determinar às Requeridas a constituição de patrimônio, nos termos do art. 602, CPC.

          Ante ao exposto, requer:

          1) A citação das Requeridas, nos endereços declinados na preambular, nas pessoas de seus representantes legais, determinando-se a expedição de mandado de citação à 2a por Carta Precatória, e, em ambos os casos, por intermédio de Oficial de Justiça, gozando das benesses do artigo 172 e parágrafos do CPC, para, querendo, apresentem a defesa que lhes aprouver, no prazo legal;

          2) A intimação do representante do Ministério Público para intervir no feito, nos termos do artigo 82, do CPC;

          3) Provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidas, depoimento pessoal dos representantes legais das Requeridas, perícias, vistorias, oitiva de testemunhas arroladas, juntada de novos documentos, etc.

          4) Seja arbitrado liminarmente os alimentos provisionais "initio litis", determinando o depósito em Juízo, através de Guia Judicial;

          5) Seja deferido os benefícios da Assistência Judiciária integral.

          Por derradeiro, sejam o pedidos julgados PROCEDENTES, declarando e reconhecendo a culpa solidária das Requeridas, consequentemente da ação, para cominar às Requeridas o pagamento da indenização pretendida acrescida de custas e despesas processuais, honorários de advogado, honorários de Perito, se houver, com juros e correção monetária, e demais cominações legais, despesas com testemunhas, etc., determinando a expedição de Precatório, no ponto em que couber, em conformidade com o art. 100, da CF/88, em favor das Requerentes, por ser tratar de crédito alimentar, determinando, entretanto, o pagamento imediato e integral do dano moral.

          Atribui-se à causa o valor inestimável de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), para todos os efeitos legais.

          Termos em que, pedem deferimento.

          São Paulo, 15 de setembro de 1998.


RICARDO LUÍS RODRIGUES DA SILVA
Advogado - OAB/SP 117.241


QUESITOS

          1) É possível o Sr. Perito apurar se a neblina impossibilita a visão do sinal semafórico existente no local? Explique?

          2) O alerta sonoro existente no cruzamento é audível no interior de qualquer veículo? E também no interior da composição de trens?

          3) É recomendável que somente uma pessoa trabalhe nas cancelas? Por quê?

          4) Os sinais sonoros são audíveis no interior da composição? Os sinais luminosos são visíveis? Qual a distância aproximada que se pode ouvi-lo e vê-lo?

          5) É possível o Sr. Perito estimar se a velocidade da composição de trens (considerando 40 km/hora) possibilita o estancamento?

          6) O mecanismo de acionamento das cancelas é de difícil manuseio? O cabo de aço facilmente escapa? O mecanismo que aciona a catraca é bem conservado?

          7) Os cabos de aço estão em boa condição de uso?

          8) O sistema de segurança têm manutenção regular? É possível o Sr. Perito diligenciar junto às Requeridas para trazer elementos de quando foi efetuada a manutenção?

          9) Qual a altura recomendável do levantamento da cancela para propiciar uma boa segurança?

          10) A forma atual das cancelas impede a circulação de veículos?

          11) É possível o Sr. Perito afirmar se é oferecido treinamento aos vigias? É necessário tal cautela?

          12) Pode o Sr. Perito afirmar se houve negligência das Requeridas? Baseado em que elementos?


Autores


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

Indenização cumulada com alimentos por morte em acidente com trem urbano. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 29, 1 mar. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16102. Acesso em: 30 mar. 2024.