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Ação afirmativa e inclusão social de afro-brasileiros.

A inconstitucionalidade do Estatuto da Igualdade Racial

Ação afirmativa e inclusão social de afro-brasileiros. A inconstitucionalidade do Estatuto da Igualdade Racial

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Sumário: 1. Introdução. 2 Princípio da igualdade. 2.1 O princípio da igualdade na Constituição da República de 1988. 2.2 Igualdade formal e igualdade material. 2.3 A concretização do princípio da igualdade: o favorecimento de grupos raciais é o melhor caminho? 3. Ação afirmativa. 3.1 Origem das ações afirmativas. 3.2 Fundamento constitucional das ações afirmativas. 3.3 Objetivo das ações afirmativas: corrigir distorções sociais? 4. O problema da discriminação e da raça. 4.1 Distinção entre discriminação legítima e ilegítima. 4.2 Inexistência de multiplicidade de raças. 4.3 Inclusão social: abrangência do maior número de pessoas com políticas públicas universais. 5. A inconstitucionalidade do Estatuto da Igualdade Racial 5.1 A proposta de eliminação das desigualdades sociais do Estatuto da Igualdade Racial. 5.2 A violação do princípio da igualdade a partir do favorecimento racial destinado à inclusão social de afro-brasileiros. 5.3 Educação: a única solução para combater a desigualdade. 6. Conclusão. Referência bibliográfica


1. Introdução

Sob um viés jurídico, o princípio da igualdade será abordado de modo a realizar o ideal da igualação jurídica sem, contudo, abandonar a questão da diversidade entre as pessoas. Dessa forma, o princípio em comento deve proporcionar uma nova perspectiva de isonomia, especificamente com finalidades que não acarretem a segregação dos grupos sociais. No mesmo sentido, o seu conteúdo deve centrar-se no respeito à diversidade entre os indivíduos sem o favorecimento de tratamentos injustos ou preconceituosos, mas assegurando-se o respeito à singular forma de ser de cada um.

A igualdade, então, será analisada sob duas vertentes: a igualdade formal e a igualdade material. A primeira é a igualdade que o sistema jurídico confere a todos os cidadãos do Estado, colocando-os em simétrica paridade quanto ao oferecimento de oportunidades e condições no plano legal. A segunda é a igualdade de recursos que somente será atingida se forem empregados meios eficazes que possibilitem a inclusão do maior número de pessoas, de tal forma a mitigar o impacto causado pelas exorbitantes diferenças substanciais entre uns e outros.

A concretização do princípio da igualdade expresso na Constituição depende de ações inclusivas para indivíduos marginalizados que precisam ser favorecidos, desde que esse privilégio abarque a maior quantidade possível de pessoas, e não seja baseado em critérios que enfatizem ou estimulem o isolamento ou a separação de indivíduos em grupos, o que pode acarretar conseqüências difíceis de serem reparadas.

Adiante, será analisada a questão das ações afirmativas, partindo de sua origem até se chegar à sua situação hodierna no paradigma de Estado que fora edificado com a promulgação da Constituição da República de 1988 (CR): o Estado Democrático de Direito. Em seguida, faz-se mister aprofundar o estudo das ações afirmativas passando-se pelo seu fundamento constitucional, no intuito de verificar onde se estrutura esse mecanismo tão utilizado pelo Poder Público.

Assim, pretende-se demonstrar qual é a sua finalidade precípua no que diz respeito à sua adoção, levando-se em conta alguns requisitos que devem ser observados para a sua implementação, principalmente sua transitoriedade. As ações afirmativas primam-se pelo objetivo de atingir a decantada igualdade de oportunidades e condições, atuando como fator propulsor de transformações sociais direcionadas a incluir nas políticas públicas estatais certos grupos que encontram-se alijados pela própria sociedade em que vivem. Nesse sentido, busca-se demonstrar que as ações afirmativas são necessárias para se atingir o princípio constitucional da igualdade e, sobretudo, representam incontestavelmente grandes vantagens para o desenvolvimento do País, precisamente por aproximarem-se do ideal de justiça social.

Apesar da relevância dessas ações na busca da almejada igualdade, é preciso que o Poder Público tenha cautela no momento de executar medidas de cunho afirmativas para corrigir desequilíbrios de ordem social. As ações afirmativas devem se pautar por um critério de abrangência universal, sem adotar um tratamento prioritário que difunda, perigosamente, uma segregação entre grupos sociais. A própria Convenção sobre Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial em seu artigo 1º, nº. 4, aduz com extrema evidência que tais medidas não podem conduzir, por exemplo, ao restabelecimento de direitos separados para grupos raciais, não podendo também, viabilizar o prosseguimento da medida após o alcance de suas metas.

O próximo passo consiste em estabelecer a diferença entre discriminação (separação, exclusão ou segregação de pessoas) legítima e ilegítima e, dessa forma, demonstrar que a criação de ações afirmativas específicas para grupos isolados pode culminar no segundo tipo de discriminação aludido. A discriminação pode ser entendida como gênero, compreendendo as espécies referidas (legítima e ilegítima). Aquela, a própria Constituição se encarrega de estabelecer em situações excepcionais, e esta é uma ação humana (ação ou omissão) que representa a violação dos direitos das pessoas baseada simplesmente em critérios que não tem fundamento e que são despidos de justiça.

Então, objetiva-se provar a inexistência da multiplicidade racial e concluir que o tratamento prioritário por meio de ações afirmativas tendo em vista a cor da pele justificada como elemento que distingue as pessoas em raças, é um fator que contribui eminentemente para ensejar a discriminação ilegítima. A cor da pele é um pressuposto que não tem relevância para distinguir as pessoas e, da mesma forma, não pode ser motivo de ações afirmativas desvirtuadas de seu escopo constitucional. Procura-se, assim, estimular ações que favoreçam a integração social e que evitem a divisão da sociedade em grupos, possibilitando o sepultamento do mito de que existem diversas raças humanas.

Nesse sentido, o resultado esperado é demonstrar que a inclusão social pode ser perseguida de forma salutar, sem ocasionar qualquer tipo de discriminação que, por si só, é uma forma de excluir, segregar ou separar determinada pessoa da comunidade em que ela esteja inserida em função de alguma de suas características, seja pelo sexo, cor da pele, convicções ideológicas ou religiosas, nacionalidade, enfim.

Por derradeiro, o objetivo final é comprovar que, o projeto de lei número 3.198/2000 de autoria do Senador Paulo Paim, do Partido dos Trabalhadores (PT) do Estado do Rio Grande do Sul (RGS), que institui o Estatuto da Igualdade Racial, é um tipo de ação afirmativa com a finalidade de promover a eliminação das desigualdades sociais e econômicas que assolam a maior parte da população brasileira, estabelecendo tratamento prioritário aos afro-brasileiros em razão da cor da pele para incluí-los socialmente, o que enseja a violação do princípio constitucional da igualdade.

Assim, pretende-se finalizar o trabalho apontando uma possível solução através do fortalecimento das bases educacionais mantidas pelo Estado, bem como fazer uma crítica à proposta de eliminação das desigualdades sociais explicitadas pelo Estatuto da Igualdade Racial, analisando o impacto da segregação racial propiciada pela sua aprovação no Congresso Nacional, e certificar que esse tipo de proposta pode favorecer a violação do princípio da igualdade, o que o torna inconstitucional.


2. Princípio da Igualdade

2.1. O princípio da igualdade na Constituição da República de 1988

Dispõe o artigo 5º da Constituição da República (CR) que: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, [...]", sendo enfatizado com primazia a igualdade no rol dos direitos e deveres individuais e coletivos entre os brasileiros.

Carmén Lúcia Antunes Rocha afirma que: "Ao Direito incumbe a criação de fórmula normativa que permita realizar o objetivo da igualação jurídica sem se perder a diversidade humana." (ROCHA, 1990, p. 13) Apesar da magnitude desse preceito, entende-se que a igualdade não pode se limitar à disposição contida na lei, isto é, não basta apenas essa igualdade diante da lei como um paradigma precursor de um tratamento igualitário entre as pessoas. Hodiernamente, faz-se necessário dar um novo contorno à idéia de isonomia, principalmente com finalidades específicas no setor social, econômico e político. O objetivo é facilitar uma mudança de base social para viabilizar a evolução de toda a estrutura do Poder Público com a aplicação do princípio da igualdade, assim como a forma de se comportar os grupos sociais para que haja a igualação em condições e oportunidades, atingindo também o ideal da pluralidade humana, pois assim espera-se que essa igualação favoreça o respeito às diferenças. [1]

A autora citada esclarece que:

A Constituição da República de 1988 refere-se à igualdade já em seu preâmbulo, onde se definem os valores que nortearam os constituintes. Afirmando-se supremos, estabelece-se que os representantes do povo brasileiro reuniram-se para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a Justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos.

[...]

Razões de ordem histórica, que se põem a claro no presente da República Brasileira, conduziram à colocação em foco daquele princípio. A sua indicação preambular tem o sentido da imprescritibilidade de se lhe conferir atenção e eficiência na dinâmica da formulação e da aplicação do direito brasileiro para que a Justiça material venha a ser uma realidade criada pelo sistema jurídico e não uma mentira por ele mantida. Não se pretende, deixa de pronto esclarecido o preâmbulo, qualquer uniformização social, que significa autoritarismo e afronta às condições naturalmente diversas dos indivíduos, mas a erradicação das formas discriminatórias e preconceituosas de convivência sócio-política albergadas pelo Estado por meio de um direito nem sempre suficientemente eficaz na ruptura das desigualações arbitrárias. (ROCHA, 1990, p. 67)

Importante mencionar que o constituinte de 1988 não se ateve apenas a fazer referência a igualdade de forma vaga, explicitando punições para quem violar o princípio da igualdade e incentivar qualquer tipo de discriminação. Pelo contrário, constatou-se uma ampliação do sentido de igualdade, como se pode perceber no artigo 3º, inciso IV, que diz que é preciso: "promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação"; e também no caput do artigo 5º que assegura a igualdade de todos perante a lei, sem distinções de qualquer natureza.

A consolidação substancial do decantado princípio no Título II, que dispõe sobre os direitos e garantias fundamentais, favoreceu incontestavelmente a inclusão desses direitos e garantias aos indivíduos mais necessitados, mesmo estando sua eficácia dependente de normas de conteúdo programático. [2] Além dos artigos supracitados podem ser apontados como exemplos o artigo 7º, inciso XXX, que proíbe a diferença de salários entre homens e mulheres, exercício de funções e critérios de admissão por qualquer motivo; o artigo 12, parágrafo 2º, que proíbe distinções entre os brasileiros natos e naturalizados; o artigo 23, inciso X, que favorece os menos favorecidos no combate à pobreza e aos fatores de marginalização; o artigo 37, inciso VIII, que estabelece o acesso aos cargos, funções e empregos públicos aos portadores de deficiência; o artigo 194, parágrafo 1º, inciso I, que garante seguridade social para todos; artigo 196, que confere o direito à saúde para todos; o artigo 206, inciso I, que proporciona igualdade para todos no ensino. [3]

Tudo isso são metas idealizadas pelo constituinte de 1988 e que devem ser buscadas, uma vez que a Constituição não foi criada para fazer singelas sugestões, mas para estabelecer diretrizes. Não há possibilidade para a especulação ou sondagem do que deve ser feito, muito pelo contrário, verificam-se preceitos mandamentais e impositivos. Os objetivos traçados pela República Federativa do Brasil no artigo 3º da Constituição são evidentemente de observação obrigatória pelo Estado. [4]

2.2. Igualdade formal e igualdade material

A igualdade formal é simplesmente aquela prevista na lei, que assegura tratamento isonômico a todos independente de suas características pessoais, valores ou princípios de vida. Nesse sentido, a lei se encarrega de definir sem prioridades a igualdade num plano horizontal entre os indivíduos que estão sob a sua subordinação. A priori, não haveria pessoas distintas na aplicação da lei, o que implica dizer que sua imperatividade e coercitividade tem a mesma intensidade para qualquer tipo de pessoa.

Com o advento do Estado Social, Mônica de Melo citada por Sidney Pessoa Madruga da Silva, assinala que: "[...] o princípio da igualdade passa a ter um novo contorno, incorporando a igualdade material e seguindo no rumo da chamada discriminação positiva." (MELO apud SILVA, 2005, p. 38-39)

Com isso, é possível afirmar que o princípio da igualdade formal evoluiu a ponto de permitir as discriminações legítimas. Renata Malta Vilas-Bôas também citada por Sidney Madruga diz que essa evolução se deu: "[...] para o princípio da igualdade material, o qual decorre da necessidade de tratamento prioritário e diferenciado àqueles grupos ou pessoas que são carecedores da igualdade, em razão de circunstâncias específicas." (VILAS-BÔAS apud SILVA, 2005, p. 41)

Para diferenciar a igualdade formal da igualdade material é indispensável o que aduz Konrad Hesse quando referenciado por Sidney Pessoa Madruga da Silva:

[...] a igualdade jurídica formal pede a realização, sem exceção, do direito existente, sem consideração da pessoa: cada um é, em forma igual, obrigado e autorizado pelas normalizações do direito; ao contrário, é proibido a todas as autoridades estatais, não aplicar direito existente a favor ou à custa de algumas pessoas. Já a igualdade material não consiste em um tratamento igual sem distinção de todos em todas as relações, senão, só aquilo que é igual deve ser tratado igualmente. O princípio da legalidade proíbe uma regulação desigual para fatos iguais; casos iguais devem encontrar regra igual. (HESSE apud SILVA, 2005, p. 41)

Dessa forma, chega-se facilmente a conclusão que é permitido ao Poder Público agir com imediatismo para abrandar os efeitos perversos acarretados pela desigualdade em todas as suas formas. Para concretizar o ideal desejado pelo constituinte, já que a Constituição impõe a realização do que está expresso em seu conteúdo como no caso dos direitos e garantias fundamentais, é necessário conceder um tratamento com maior atenção às minorias solapadas pela ação avassaladora da desigualdade social e econômica, que se embasa no abuso do poder econômico por parte de alguns.

Assim, fica elucidado que apenas a igualdade expressada na lei não satisfaz, conforme as expectativas dos seus subordinados, a consumação do que está literalmente evidente no "papel". É preciso mais do que um texto condensado de normas para proporcionar aquilo que todos esperam de uma República como a brasileira, que apóia-se num sistema de governo democrático e tem como princípio norteador a dignidade da pessoa humana. Os anseios de toda uma nação fundamentam-se na Constituição e, para atender a todos e fazer dela uma nação livre, fraterna e solidária, a ação do Estado priorizando os mais necessitados é salutar. Entretanto, não se deve olvidar de estabelecer padrões para a efetivação do princípio da igualdade, o que pode ocasionar um mal ainda maior. A subjetividade é um fator que deve ser eliminado para não conduzir essa atuação emergencial a um caos social e comprometer o trabalho de inclusão dos que se encontram em estado de penúria.

A igualdade material é uma forma de conferir às pessoas o mínimo existencial num plano concreto, sem que haja tão-somente a abstração da lei. E, atualmente, as ações afirmativas representam esses instrumentos colocados à disposição do Estado para agir com rapidez e lograr os resultados pretendidos no menor tempo possível. Elas surgem como uma peça essencial para fazer com que o princípio da igualdade tenha o valor que dele se espera.

Carmén Lúcia Antunes Rocha, corrobora o exposto ao assinalar que:

[...] não se aspira uma igualdade que frustre e desbaste as desigualdades que semeiam a riqueza humana da sociedade plural, nem se deseja uma desigualdade tão grande e injusta que impeça o homem de ser digno em sua existência e feliz em seu destino. O que se quer é a igualdade jurídica que embase a realização de todas as desigualdades humanas e as faça suprimento ético de valores poéticos que o homem possa desenvolver. As desigualdades naturais são saudáveis, como são doentes sociais e econômicas, que não deixam alternativas de caminhos singulares a cada ser humano único. (ROCHA, 1990, p. 118)

John Rawls, em contrapartida, ao analisar o papel da justiça nas ações do Estado afirma que: "[...] as instituições são justas quando não se fazem distinções arbitrárias entre as pessoas na atribuição de direitos e deveres básicos [...]" (RAWLS, 1997, p. 6) Para Rawls, conforme sua posição utilitarista, o Poder Público não poderia atuar de forma emergencial para efetivar o princípio da igualdade, pois não se pode fazer distinções entre as pessoas, muito menos para incluir aquelas que estão desprovidas do acesso às políticas públicas.

Essa visão utilitarista não pode perdurar num paradigma de Estado Democrático de Direito, pois é essencial a atuação do Estado por meio de ações positivas para fazer valer o princípio da igualdade e da pessoa humana previstos na Constituição. Às vezes, é preciso dar margem à discriminação de forma lícita para atingir o escopo constitucional. Pode-se verificar que a própria Constituição se encarrega em determinados momentos de discriminar, propiciando vantagens para uns em relação a outros. Isso, como se vê, não deixa de ser uma discriminação lícita e é colocada em prática justamente porque a própria lei reconhece que em certos momentos há que se privilegiar alguém em razão de alguma circunstância.

2.3. A concretização do princípio da igualdade: o favorecimento de grupos raciais é o melhor caminho?

Muito se discute acerca do princípio da igualdade expresso no rol dos direitos e garantias fundamentais da Constituição da República. A igualdade assegurada pela lei, como restou demonstrado, não é suficiente para que realmente haja num plano concreto, a efetivação da igualdade. Ao Poder Púbico cabe intervir diretamente com políticas públicas especializadas para segmentos sociais afastados de sua área de atuação, ou que estão fora de sua abrangência. Nessa situação, há verdadeira justiça porque as ações da esfera pública e também privada priorizam parte da população (denominada minorias) enaltecendo esse segmento social prejudicado, se levado em consideração critérios puramente objetivos.

A concretização do princípio da igualdade depende de medidas especializadas, contemplando, provisoriamente, certos segmentos sociais com vantagens em relação a outros. Isso, todavia, não equivale a agir de forma a prejudicar ou abandonar aqueles que estão em melhor situação social e econômica. Obviamente, deve-se manter a atenção a esta parte da sociedade para que não ocorra a inversão dos pólos, e aqueles que eram os excluídos passam a ser os beneficiados e vice-versa.

As políticas públicas devem assumir um caráter universal na perspectiva de abarcar o maior número possível de pessoas, favorecendo a correção das distorções emanadas de dentro da própria sociedade, havendo o privilégio de certos grupos quando isso for imprescindível para o alcance da igualdade material. Entretanto, deve-se estimular ações que favoreçam a integração social e que evitem a divisão da sociedade em grupos de maneira definitiva.

O maior problema de tudo isso é a questão racial e o tratamento prioritário com políticas públicas direcionadas tão-somente a grupos raciais, precisamente aos afro-brasileiros, assim definidos pelo projeto de lei nº. 3.198/2000 de autoria do Senador da República Paulo Paim do Partido dos Trabalhadores (PT) do Estado do Rio Grande do Sul (RGS). [5]

Segundo Mônica Grin, em artigo redigido no livro coordenado por Peter Fry e outros, estão implícitas duas abordagens no referido projeto de lei:

[...] a primeira refere-se à mudança nas bases universalistas das políticas públicas – tal como definidas na Constituição republicana brasileira – ao estabelecer uma nova concepção de titularidade de direitos cujo fundamento encontra-se no grupo no caso (sic), na ‘raça’, e não no indivíduo - ; e a segunda refere-se à validação de uma ‘raça’, os afro-descendentes, cujos pressupostos fundamentam-se na ancestralidade, em um passado de escravidão, numa cultura e religiosidade próprias e em características genômicas específicas. (GRIN, 2007, 295-296)

Esse projeto de lei criado para reconhecer a existência de uma raça oprimida e desfavorecida ao longo da história deste País, e retribuir aos descendentes dessa mesma raça com políticas públicas especializadas, apesar de tudo, representa eminente perigo por propiciar a fragmentação da sociedade em diversos grupos raciais.

Quando o Poder Público atua por meio de ações afirmativas direcionadas a certos grupos, não há preferência quanto à raça ou características pessoais de seus destinatários. O autor do projeto, Senador Paulo Paim, expõe as razões que o levaram a propor esse projeto de lei apontando: "[...] aos que nos questionam por que somos autores do Estatuto, respondemos: para, de uma vez por todas, coibir práticas racistas; fazer justiça para com os injustiçados; melhorar a vida dos negros. Foi para isso que o Estatuto da Igualdade Racial foi pensado e construído." [6]

Corroboram o entendimento de que o projeto de lei criado pelo ilustre senador pode causar um problema ainda maior quanto à eliminação ou abrandamento das desigualdades sociais e econômicas conforme as palavras de Mônica Grin em artigo de sua autoria publicado na obra coordenada por Peter Fry:

Se o poder público nessa ordem deve ter suas estruturas modificadas para implantar políticas públicas orientadas pela dimensão racial, a fim de corrigir ou reparar injustiças de uma em relação à outra, aqueles que por uma ‘fatalidade’ são ‘brancos’, ainda que pobres e excluídos, serão os ‘negros de amanhã’.

Um estatuto cujo maior objetivo é corrigir as desigualdades e a injustiça estará renovando a injustiça, só que agora com a cor da pele trocada. Os ‘brancos’ pobres, nesse caso, não seriam alvos igualmente prioritários de políticas sociais, pela única razão de pertencerem a uma ‘raça’ que foi responsabilizada coletivamente ou culpada de perpetrar injustiças contra a ‘raça negra’. (GRIN, 2007, p. 298-299)

A igualdade material para ser atingida requer uma atuação universal do Poder Púbico, o que significa uma abrangência de todas as pessoas que estejam em situações alarmantes do ponto de vista social e econômico. É claro que aqueles que estão em estado crítico precisam, emergencialmente, da assistência do Estado, sem que haja, no entanto, preferências quanto à questão racial. Num determinado grupo, por exemplo, pode haver pessoas que encontram-se urgentemente necessitadas da ação das esferas pública e privada e que pertencem a grupos raciais diferentes. Se se considerar que o critério a ser adotado for a preferência pelo pertencimento a certo grupo racial, aqueles que não forem afro-brasileiros, certamente estarão sujeitos à própria sorte, pois não há amparo legal e muito menos interesse por parte das entidades públicas em acolhê-los.


3. Ação afirmativa

3.1. Origem das ações afirmativas

Joaquim Benedito Barbosa Gomes (2001) evidencia que a declaração de preceitos jurídicos por si mesmos mostra-se insuficiente para contornar situações sociais que estão arraigadas à cultura de cada Estado soberano, principalmente na concepção da coletividade, pois como se verifica, a uma certa parcela de indivíduos é cabível a função de oprimir e, a outra, função consideravelmente de inferioridade ou dependência. Assim, é preciso se certificar que a mudança dessa situação somente será satisfatória se houver uma postura Estatal que se afaste ao máximo da neutralidade no que diz respeito às questões de ordem social. [7]

Essa atuação ativista do Estado, segundo o autor supracitado (2001), deu origem as Ações afirmativas, difundidas com pioneirismo nos Estados Unidos da América e depois estendidas ao mundo inteiro conforme a conveniência de cada País que a adotou. No Brasil, todavia, as ações afirmativas têm sido empregadas com certa timidez devido à resistência encontrada no que tange à sua admissão. [8]

O surgimento das ações afirmativas deu-se num contexto de instabilidade social nos Estados Unidos. Assevera Roberta Fragoso Menezes Kaufmann [9] que:

As ações afirmativas surgiram em um momento social marcado pela iminência de grave conflito civil. Não houve relevante construção teórica prévia, nem dos negros, nem de brancos, nem de partidos de esquerda, nem de direita, sobre as justificativas do princípio da igualdade, a partir de considerações sobre as modalidades de justiça compensatória ou de justiça distributiva, dentre outras questões jurídico-filosóficas. Mesmo porque, o primeiro Presidente dos Estados Unidos que efetivamente adotou política pública concretizadora da integração, Richard Nixon, era um republicano cujo maior apoio na campanha adveio dos eleitores conservadores dos estados sulistas, contrários às medidas de integração. Enquanto os democratas Kennedy e Johnson nada fizeram em termos integrativos, coube a um republicano conservador adotar essas medidas. (KAUFMANN, 2007)

A referida autora (2007) afirma, ainda, que atualmente há vários autores que estudam as ações afirmativas entendendo que essas medidas emergenciais surgiram a partir da evolução do princípio constitucional da igualdade. O Estado passa a agir efetivamente na criação de políticas públicas com a edificação do paradigma do Estado Social, relegando sua postura de Estado neutro. Entretanto, Kaufmann (2007) deixa bem claro que, se as ações afirmativas surgiram num modelo de Estado Social, isso representaria uma grande contradição, pois como se sabe, os Estados Unidos são o exemplo mais evidente no mundo inteiro de um País que se estrutura no modelo de Estado Liberal. [10]

É importante destacar também o entendimento exposto por Sidney Pessoa Madruga da Silva ao afirmar que quanto às ações afirmativas: "[...] ainda que não se restrinjam exclusivamente aos Estados Unidos da América, foi a partir desse país que as políticas de ação afirmativa ganharam espaço e relevo no cenário mundial [...]". (SILVA, 2005, p.66) O autor aludido expõe, ainda, que no momento em que as ações afirmativas foram inauguradas elas tinham por objetivo: "[...] assegurar, sobretudo aos negros, uma parcela maior e mais justa de representatividade na sociedade americana, com destaque para as áreas de educação e do emprego." (SILVA, 2005, p.66)

No Brasil, por outro lado, as ações afirmativas como ressalta Joaquim Benedito Barbosa Gomes (2001), têm sido superficialmente discutidas do ponto de vista prático. Kaufmann (2007), na mesma linha, ratifica as palavras proferidas pelo eminente autor ao dizer que neste País os debates limitam-se a copiar os tipos de ações afirmativas propostas pelo Estado norte-americano, apenas se fazendo meras adaptações conforme o caso concreto. Kaufmann aduz que há um grande erro no que se refere à implementação de ações afirmativas no Brasil, uma vez que os índices sociais são extremamente desfavoráveis aos negros brasileiros se fosse feita uma comparação com os daquele País, o que representa segundo a autora, uma forma precipitada e superficial de correção dos problemas sociais no Brasil. [11]

Para Álvaro Ricardo de Souza Cruz (2003) as ações afirmativas surgem como um instrumento elaborado pelo Poder Público de forma transitória para corrigir deformações sociais e evitar que elas cheguem à sua fase mórbida, que é a discriminação. Cruz prossegue afirmando que o não reconhecimento da existência de ações afirmativas implica negar as vantagens que essas medidas trouxeram para o interesse público com a atuação imediata do Estado em certos setores de sua inteira responsabilidade. [12] Assim, o Estado deve agir utilizando-se de medidas emergenciais, denominadas ações afirmativas, cuja duração é efêmera, para viabilizar a inclusão social de certos grupos desprovidos de oportunidades e condições, no intuito de atingir a igualdade entre todos eles.

3.2. Fundamento constitucional das ações afirmativas

O artigo 3º da Constituição da República dispõe o seguinte:

Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Marco Aurélio Mendes de Farias Mello (2002), na obra coordenada por Ives Gandra da Silva Martins, demonstra a fundamentação constitucional da ação afirmativa através de uma interpretação do mencionado artigo, e constata que este instrumento garante a efetivação da igualdade. O eminente Ministro do Supremo Tribunal Federal pondera que:

Do artigo 3º vem-nos luz suficiente ao agasalho de uma ação afirmativa, a percepção de que o único modo de se corrigir desigualdades é colocar o peso da lei, com a imperatividade que ela deve ter em um mercado desequilibrado, a favor daquele que é discriminado, que é tratado de forma desigual. Neste preceito são considerados como objetivos fundamentais de nossa República: primeiro, construir [...] uma sociedade livre, justa e solidária; segundo, garantir o desenvolvimento nacional [...], não a uma atitude simplesmente estática, mas a uma posição ativa; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; e por último, no que nos interessa, promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça e sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Pode-se afirmar, sem receio de equívoco, que se proíbe a discriminação, para uma igualização meramente eficaz, dinâmica, já que os verbos ‘construir’, ‘garantir’, ‘erradicar’ e ‘promover’ implicam, em si, mudança de ótica, ao denotar ‘ação’. Não basta não discriminar. É preciso viabilizar – e encontrar, na Carta da República, base para fazê-lo – as mesmas oportunidades. Há de ter-se como página virada o sistema simplesmente principiológico. A postura deve ser, acima de tudo afirmativa. (MELLO, 2002, p. 39)

Mello deixa expresso claramente que para resolver os problemas enfrentados pelo Poder Público de maneira imediata é fazer valer as disposições normativas do próprio texto constitucional através de sua força imperativa. Dessa forma, a velha máxima segundo a qual se deve tratar os desiguais de forma desigual na medida de suas desigualdades para se atingir a igualdade, ganha concretude. O objetivo, como se percebe, é assegurar no menor tempo possível a inclusão social daqueles que se encontram marginalizados e, concomitantemente, promover medidas eficazes para consolidar a situação estabelecida em decorrência dos efeitos das ações afirmativas adotadas.

Há, também, discussões teóricas que buscam esclarecer a natureza das ações afirmativas para se entender se elas têm caráter reparatório ou distributivo. Sidney Pessoa Madruga da Silva elucida que: "[...] a justiça compensatória teria o condão de restabelecer a relação de igualdade antes posta em desequilíbrio em função da classe dominante, mediante a adoção de políticas e programas destinados aos desfavorecidos socialmente." (SILVA, 2005, p.94) O autor, então, conclui que: "Compensa-se, portanto, a violação de direitos e vantagens que deixaram de ser destinados às minorias, ‘reparando-se’ a atual geração pela desigualdade estabelecida em desfavor de seus antepassados." (SILVA, 2005, p.94)

Todavia, existem argumentos contrários a esse sistema de compensação que indagam quem seriam os legitimados para receber benefícios com aspecto indenizatório. A preocupação é identificar aqueles que foram vítimas da opressão da sociedade ou do próprio Estado. E, posteriormente, penalizar os verdadeiros culpados pelo mal causado sem, contudo, beneficiar terceiros, uma vez que a reparação do dano deve ser limitada às pessoas vitimadas. [13]

Por outro lado, existem aqueles que defendem o sistema distributivo pautado na igualdade de oportunidades eqüitativas em contraposição à igualdade prevista na lei (igualdade formal). Nesse modelo, assegura-se aos indivíduos plenas oportunidades de acesso aos serviços essenciais prestados pelo Poder Público como: educação, saúde, emprego e outros direitos conferidos ao cidadão.

Esse sistema também sofreu severas críticas como ressalta Silva: "[...] embora a tese da justiça distributiva seja sustentada pela grande maioria dos partidários das ações afirmativas, os seus detratores não se furtam em sublinhar as falhas do (sic) argumentos distributivistas [...]" (SILVA, 2005, p. 97)

Para concluir essa discussão teórica, é imprescindível enfatizar as palavras de Álvaro Ricardo de Souza Cruz ao atestar que:

[...] as ações afirmativas não se sustentam com base na teoria de compensação, e, por conseguinte, não podem ser vistas como mero mecanismo de redistribuição de bens e oportunidades, sob pena de chegarmos às conclusões absurdas acima mencionadas.

Sendo assim, rejeitadas as teorias compensatórias e (re)distributivas (utilitarismo), fixamos finalmente posição favorável à tese pela qual as ações afirmativas se legitimam com base nos princípios do pluralismo jurídico e da dignidade da pessoa humana, estruturadas no paradigma do Estado Democrático de Direito.

[...]

A neutralidade, preconizada pelos liberais, aprofunda e agudiza o problema de uma sociedade que impede a participação de todos. As idéias compensatórias fundadas em concepções convencionais de moral, bem como as idéias utilitárias não se sustentam, posto não levarem em conta aspectos efetivos dos direitos essenciais à humanidade. (CRUZ, 2003, p.181-182)

3.3. Objetivo das ações afirmativas: corrigir distorções sociais?

As ações afirmativas constituem-se em mecanismos criados pelo Estado ou pela iniciativa privada com aspecto de obrigatoriedade ou até mesmo de uma faculdade, e são direcionadas à inclusão de pessoas que se encontram em estado de isolamento social por algum motivo, seja em função de alguma de suas características pessoais ou em função de sua situação sócio-econômica. [14] Essas medidas assumem um papel de discriminar licitamente certas pessoas ou grupo de pessoas com o objetivo de ampará-las e inseri-las em meio à vida social, garantindo-lhes, sobretudo, o direito à participação sem qualquer restrição na esfera pública e privada. Assim, assevera Álvaro Ricardo de Souza Cruz que: "As ações afirmativas são, pois, discriminações lícitas que podem amparar/resgatar fatia considerável da sociedade que se vê tolhida no direito fundamental de participação na vida pública e privada." (CRUZ, 2003, p. 182)

Com efeito, as ações afirmativas têm por objetivo promover a efetivação da almejada igualdade de oportunidades e de condições através de políticas públicas afirmativas, propiciando uma transformação no contexto social de tal forma a acabar ou pelo menos mitigar o aviltamento de direitos e garantias fundamentais subtraídos dos indivíduos. Essas políticas representam a necessidade de eliminação da perpetuidade das práticas discriminatórias que assolam o País há muito tempo, precisamente desde o período que remonta à época colonial. Além disso, existe o objetivo de alcançar o ideal pregado pela Constituição da República de 1988 de implantar o pluralismo e a diversidade. [15]

Nesse sentido Joaquim Benedito Barbosa Gomes (2002) aponta que: "Figura também como meta das ações afirmativas a implantação de uma certa ‘diversidade’ e de uma maior ‘representatividade’ dos grupos minoritários nos mais diversos domínios de atividade pública e privada." [16] O referido autor (2002) então conclui que: "[...] o efeito mais visível dessas políticas, além do estabelecimento da diversidade e representatividade propriamente ditas, é o de eliminar as ‘barreiras artificiais e invisíveis’ [...]" [17]

Assim, o eminente Ministro arremata que: "[...] a ação afirmativa tem como objetivo não apenas coibir a discriminação do presente, mas sobretudo eliminar [...] os efeitos persistentes (psicológicos, culturais e comportamentais), da discriminação do passado, que tendem a se perpetuar." (GOMES, 2001, p. 47) Segundo Joaquim Barbosa, ao concluir sua exposição, "Esses efeitos se revelam na chamada ‘discriminação estrutural’, espelhada nas abismais desigualdades sociais entre grupos dominantes e grupos marginalizados." (GOMES, 2001, p. 47)

Em complemento, Marco Aurélio Mendes de Farias Mello expõe que: "Urge uma mudança cultural, uma conscientização maior por parte dos brasileiros; falta a percepção de que não se pode falar em Constituição Federal sem levar conta, acima de tudo, a igualdade." (MELLO, 2002, p. 40)

É preciso que as ações afirmativas também sejam elaboradas sob um viés de conscientização, enfatizando a importância de haver a participação dos grupos sociais nos diversos setores, independente de ser público e privado. Para efetivar a igualdade não bastam apenas proposições de políticas públicas afirmativas se não existe um trabalho eficaz de conscientização dos afetados por tais medidas.

A correção das deformidades que aviltam as minorias segregadas pelo descaso da própria sociedade e, também do Estado, depende da necessidade de se promover ações de cunho afirmativas para erradicar os desequilíbrios sociais e econômicos entre as pessoas, desde que sejam satisfatórias para atender todo o interesse público.

Então, é importante destacar o que estabelece Friedrich Müller ao afirmar que:

[...] a exclusão de grandes grupos populacionais da participação, disponível de acordo com o patamar de desenvolvimento alcançado pela respectiva sociedade e nesse sentido típico para a mesma, leva aqui, mesmo no caso do ‘desprivilegiamento em só um setor parcial’, a uma ‘reação em cadeia de exclusões’ e, por igual, também à ‘pobreza política’.

Fala-se então de exclusão no sentido de que esses grupos populacionais dependem (negativamente) das prestações dos mencionados sistemas funcionais da sociedade, sem que tenham simultaneamente acesso às mesmas (no sentido positivo). Inversamente, o estado de bem-estar social (welfare state) é concebido por meio do conceito sociológico da inclusão. É certo que a diferenciação funcional da sociedade moderna gera uma diferença nítida entre inclusão, mas acaba solapando a diferenciação pelo fato de não incluir grandes contingentes populacionais ‘na comunicação dos sistemas funcionais’. (MÜLLER, 2003, p. 93)

Para concretizar as normas expressas na Constituição, que é fruto do Poder Constituinte Originário, portanto, criação da soberania popular para assegurar a qualquer pessoa, brasileira ou estrangeira, nata ou naturalizada, sem distinção de qualquer natureza entre uma e outra, direitos e garantias fundamentais à sua sobrevivência, deve-se ressaltar as precisas palavras do eminente professor Bruno Wanderley Júnior:

A Constituição é assim a expressão máxima da vontade de um povo. É indubitavelmente o instrumento indispensável para que um povo possa garantir a efetividade de seus objetivos fundamentais, o exercício soberano de seu poder social e o respeito aos direitos que, em sua concepção, são imprescindíveis para dar dignidade e harmonia a cada um e a todos os membros de sua coletividade. (WANDERLEY JÚNIOR, p.13-14)

Como se pode perceber, todas as pessoas devem receber o mesmo tratamento por parte do Estado, conforme disposição intangível da própria Constituição. Isso, evidentemente, é lógica decorrente da nova ordem constitucional instaurada a partir de 1988, que estabeleceu de forma explícita o princípio da igualdade.

Resumindo, as ações afirmativas na condição de medidas emergenciais e temporárias, destinam-se a corrigir deformidades entrelaçadas no cotidiano social e econômico, primando-se pela inclusão daqueles que foram alijados de participarem em igualdades de oportunidades e de condições da atuação tanto da esfera pública quanto da privada.


4. O problema da discriminação e da raça

4.1 Distinção entre discriminação legítima e ilegítima

A realização de uma análise do caput do artigo 5º da Constituição Republicana e tudo aquilo que nele está contido, evidencia que a própria disposição do artigo não abre espaço para a desigualdade por razões atinentes às características subjetivas ou qualquer outra singularidade relacionadas aos indivíduos. Porém, há possibilidade de se discriminar em função da situação material das pessoas, coisas ou até mesmo de outras circunstâncias. [18]

Nesse sentido, alude Manuel Gonçalves Ferreira Filho ao ser citado por Lenise Antunes Dias [19] que:

O princípio da igualdade não proíbe de modo absoluto as diferenciações de tratamento. Veda apenas aquelas diferenciações arbitrárias. Assim, o princípio da igualdade no fundo comanda que só se façam distinções com critérios objetivos e racionais adequados ao fim visado pela diferenciação. (FERREIRA FILHO apud DIAS, 2004)

Então, como demonstrou Lenise Antunes Dias (2004), para não haver prejuízos ao princípio da igualdade, o aspecto que cria a discriminação deve necessariamente estar vinculado à pessoa, alguma coisa ou alguma circunstância passível desse tipo de discriminação, não podendo se estabelecer essa desigualdade se for constatado que o aspecto diferencial não se baseia nessas hipóteses que foram mencionadas. [20]

Alexandre de Moraes, também aludido por Lenise Antunes Dias, ao ponderar sobre a discriminação legítima assevera que:

Para que as diferenciações normativas possam ser consideradas não-discriminatórias, torna-se indispensável que exista uma justificativa objetiva e razoável, de acordo com os critérios e juízos valorativos genericamente aceitos, cuja exigência deve aplicar-se em relação à finalidade e efeitos da medida considerada, devendo estar presente por isso uma razoável relação de proporcionalidade entre os meios empregados e a finalidade perseguida, sempre em conformidade com os direitos e garantias constitucionalmente protegidos. (MORAES apud DIAS, 2004)

Por outro lado, a discriminação ilegítima, segundo Celso Antônio Bandeira de Mello também mencionado por Lenise Antunes Dias, ocorre quando a lei priorizar especificamente de forma vantajosa ou não, tendo em vista características subjetivas de certos indivíduos ou grupos de indivíduos, sem que sejam observados padrões racionais entre a diferença que se pretende criar e a forma com a qual são tratados aqueles que foram privilegiados pelo favorecimento. [21]

Em que pese as palavras do autor supracitado, a discriminação ilegítima, na ótica de Álvaro Ricardo de Souza Cruz (2003) é uma ação humana (ação ou omissão) que representa a violação dos direitos das pessoas, sendo baseada simplesmente em critérios sem fundamento e despidos de essência de justiça. O autor ressalta que se discrimina por questões ligadas à pessoa como também por outros fatores circunstanciais e subjetivos. Assim, as condutas estruturadas numa opinião previamente formada ou numa tradição cultural injustificada dão suporte para esse tipo de discriminação. [22]

Para finalizar, a discriminação legítima é aquela que pode ser verificada por meio de previsão legal excepcionalmente para casos extremos, e caso isso não fosse assegurado, poderia haver uma grande injustiça, dificilmente reparável. A discriminação ilegítima, em contrapartida, é aquela tendente a separar (segregar) pessoas e colocá-las à margem da sociedade em função de questões de ordem pessoal ou circunstâncias peculiares.

Em alguns momentos, é evidente que o Poder Público para satisfazer os interesses públicos, pode atuar de forma suprema para realizar o que dele se espera, justamente para assegurar a todos os cidadãos condições mínimas de sobrevivência. Por isso, conceder benesses a alguns indivíduos oprimidos pela própria sociedade, tratando-os discriminadamente, é a maneira ideal de concretizar a igualdade.

4.2. Inexistência de multiplicidade de raças

A idéia de que existem diversas raças começou a ser difundida no mandato presidencial de Fernando Henrique Cardoso (FHC). Logo após sua eleição foi criado o Grupo de Trabalho Interministerial para a Valorização da Raça Negra, representado naquele tempo por pessoas da comunidade afro-brasileira. No ano de 1996, FHC lançou o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH), que instituía medidas para a abertura dessa concepção multirracial. Dentre elas, pode-se destacar a que conferia ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) a determinação de adoção de critérios que possibilitavam a inclusão dos mulatos, pardos e pretos como membros da comunidade negra. [23]

A partir disso, FHC adotou políticas públicas embasadas no reconhecimento de empecilhos que são motivados por um argumento de que o racismo inviabilizava a progressão social, econômica e cultural dos negros. Ali Kamel (2006) afirma que foi no governo de FHC que se operou essa mudança e se iniciou essa transição paradigmática ao incentivar a discussão de questões raciais no Brasil, e que o presidente contemporâneo prossegue incentivando o mesmo modelo do anterior. Kamel (2006) ressalta que durante o atual governo criou-se o Ministério da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e também para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana, o projeto que introduz a política de cotas raciais nas Universidades Federais e, por fim, o presidente atual posicionou-se favoravelmente acerca da elaboração do Estatuto da Igualdade Racial, que estabelece imposições às pessoas de se auto-declararem como pertencentes a certo grupo racial. [24]

Ali Kamel (2006) demonstra sua insatisfação ao afirmar que neste País jamais verificou-se óbices institucionais quanto à progressão social de negros, pois é evidente que pelo sistema de mérito no ingresso ao serviço público e vagas nas instituições destinadas ao ensino público, tanto negros quanto brancos pobres sofrem na mesma intensidade. O autor sustenta que o Estado deve assegurar a boa qualidade da educação aos pobres para que eles mesmos, por seus próprios méritos, derrubem a pobreza. Isso, segundo Kamel (2006), pode fazer com que se desencadeiem conseqüências horrendas quando os brancos perceberem que estão sendo preteridos. [25]

Apesar de se considerar a existência de uma diversidade de raças no País, é preciso expor o que esses autores pensam sobre a inexistência de múltiplas raças para se chegar à conclusão pretendida. Assim, Ali Kamel (2006) insiste que por cerca de 30 anos os geneticistas entendem que todos os seres humanos são iguais, o mesmo não ocorrendo com os animais, conforme exemplo dado pelo autor. [26] O autor então conclui que isso não acontece com a beleza humana, sendo, por isso, uma grande sorte.

As razões que o levam a pensar dessa forma estruturam-se numa argumentação de cunho científico. Segundo Kamel:

[...] o que a ciência diz é que as diferenças entre indivíduos de um mesmo grupo serão sempre maiores do que as diferenças entre os dois grupos, considerados em seu conjunto. No grupo de negros haverá indivíduos altos, baixos, inteligentes, menos inteligentes, destros, canhotos, com propensão a doenças cardíacas, com proteção genética contra o câncer, com propensão genética ao câncer etc. No grupo de brancos, igualmente, haverá indivíduos altos, baixos, inteligentes, menos inteligentes, destros, canhotos, com propensão a doenças cardíacas, com proteção genética contra o câncer, com propensão genética ao câncer etc. A única coisa que variar entre os dois grupos é a cor da pele, o formato do nariz e a textura do cabelo, e, mesmo assim, apenas porque os dois grupos já foram selecionados a partir dessas diferenças. Em tudo o mais, os dois grupos são iguais. Na comparação odiosa, dois bassês são geneticamente mais homogêneos do que um dogue alemão e, por isso, formam duas raças distintas. Com os homens, isso não acontece. (KAMEL, 2006, p. 44)

A ciência comprovou que o genoma humano é composto por aproximadamente 25 (vinte e cinco) mil genes e que, as diferenças mais notáveis entre as pessoas, como cor da pele, a textura dos cabelos, a forma do nariz, enfim, se determinam por um pequeno conjunto de genes, precisamente numa fração de 0,005 de todo o genoma humano. Com isso, é possível concluir que sob o ponto de vista da genética não há multiplicidade de raças humanas como muitos dizem e que, o conceito de raça segundo o geneticista Craig Venter citado por Kamel, é uma ficção social e não um conceito científico. [27]

A cor da pele não serve de parâmetro nem mesmo para se definir a ancestralidade entre os indivíduos, não se podendo garantir que uma pessoa que seja negra tenha a totalidade ou a maior parte de seus ancestrais advindos do continente africano. O geneticista Sérgio Pena, mencionado por Ali Kamel, através da utilização de marcadores moleculares de origem geográfica, analisou o patrimônio genético dos habitantes do Município mineiro de Queixadinha, e constatou que da população negra local 27% têm ancestralidade predominantemente não-africana. O geneticista também analisou a população branca nacional e certificou que 87% dos brancos têm pelo menos 10% de ancestralidade africana. Então, conclui-se que no Brasil há brancos com ancestralidade predominantemente africana como também negros com ancestralidade predominantemente européia. [28]

Ali Kamel enfatiza que:

Raça, até aqui, foi sempre uma construção cultural e ideológica para que uns dominem outros. A experiência histórica demonstra isso. No Brasil, dos últimos anos, o Movimento Negro parece ter se esquecido disso e tem revivido esse conceito com o propósito de melhorar as condições de vida de grupos populacionais. A estratégia está fadada a nos levar a uma situação que nunca vivemos: o ódio racial. Onde quer que o conceito de raça tenha prevalecido antagonismos insuperáveis surgiram entre os grupos, e deram origem muitas vezes a tragédias. (KAMEL, 2006, p. 47)

Não bastasse isso, alguns sociólogos defendem com fervor o conceito de raça, reconhecendo que mesmo com a comprovação científica de inexistência de raça, a cor da pele é fator determinante para a discriminação e para a desigualdade. Entretanto, Ali Kamel (2006) indaga: como acreditar que essa pseudo crença possa existir se está provado a inexistência da diversidade racial? Para este autor o uso da noção de raça contribui para reforçar esse mito e não o contrário, isto é, para sepultá-lo. Nesse sentido, Kamel (2006) encerra a discussão afirmando que a variedade de raças não existe e que essas discriminações quanto à cor da pele são "odiosas", "irracionais", "delirantes", "criminosas". [29]

Célia Maria Marinho Azevedo (2004) salienta que o racismo não se origina da questão da raça, tanto no aspecto biológico quanto cultural. O racismo, que nada mais é do que uma sobreposição de raças segundo os seus defensores, surge historicamente das diferentes realidades na contemporaneidade, sendo sistematizado como a reiteração de um discurso na medida em que as ciências sociais impuseram a noção de raça como um fator verossímil. A referida autora (2004) elucida que o racismo é o grande responsável pela criação da raça, operando, dessa forma, a consubstanciação de um problema social e cultural de racialização. [30] Azevedo então conclui que: "Este processo de racialização das pessoas que compõem uma dada sociedade alcança pleno sucesso sobretudo quando conta com o apoio formal do Estado na construção de uma ordem racial explícita." (AZEVEDO, 2004, p. 32)

Combater o racismo implica necessariamente pugnar pela desracialização dos anseios e também das ações sociais. Para que isso se efetive mister se faz refutar a categorização de raças, o que não faz o Estatuto da Igualdade Racial ao oferecer tratamentos diferentes em função da raça. Não se pode em momento algum oficializar a política racial para erradicar o racismo, isso foi o que Celia Maria afirmou. [31] Azevedo encerra sua idéia ao explicitar que: "[...] precisamos desconstruir esta devastadora ficção científica das raças que agora se quer impor uma vez mais, porém, na roupagem atrativa e ilusória da ‘discriminação positiva’" (AZEVEDO, 2004, p. 50)

As discriminações positivas, denominadas ações afirmativas, são mecanismos de correção de aberrações sociais que excluem parte da população (minorias) da participação na esfera pública e privada. São utilizadas para concretizar o princípio da igualdade, não podendo, porém, basear-se em critérios de inclusão social de indivíduos marginalizados devido à cor de suas peles. Mesmo em outras situações, parece que a ilustre autora infelizmente não concorda com a adoção de ações afirmativas para a efetivação da igualdade material, o que certamente é um equívoco.

Celia Maria aponta duas ordens de políticas anti-racistas:

A primeira posição define-se por um anti-racismo universalista. Como aqui não se reconhecem particularismos sociais ou culturais, há apenas dois tipos de medidas anti-racistas: medidas repressivas para coibir o racismo; e medidas preventivas, inscritas em políticas sociais cujo alvo é a redução das desigualdades e da exclusão social. Estas medidas requerem um tratamento idêntico ou igualitário para todos os indivíduos de uma mesma sociedade. Por isso, não há aqui qualquer possibilidade para se pensar o espaço público como diferenciado em termos de ‘raça’.

A segunda posição define-se por um anti-racismo diferencialista. O reconhecimento de particularismos sociais, culturais e étnicos fundamenta-se em duas proposições: primeiramente afirma-se a existência de diferenças de raça, na medida em que os grupos estigmatizados interiorizam e promovem uma auto-definição em termos raciais; em segundo lugar, afirma-se que o próprio racismo é diferencialista, sendo a sua tendência a de isolar ou eliminar tudo o que possa alterar ou ameaçar a cultura dominante. Em decorrência, defende-se o reconhecimento das diferenças étnicas no espaço público, o que significa propor a racialização oficial dos grupos oprimidos de modo a inscrevê-los em políticas de ação afirmativa. (AZEVEDO, 2004, p. 68)

Por outro lado, Azevedo (2004) aduz que na tentativa de se resolver o entrave entre as duas políticas anti-racistas, deve haver: "[...] a criação de oportunidades para os segmentos da população historicamente discriminada – sem no entanto perder o sentido universal de humanidade." (AZEVEDO, 2004, p. 73)

4.3. Inclusão social: abrangência do maior número de pessoas com políticas públicas universais

A universalização das políticas públicas sem haver qualquer distinção entre os seus receptores é a maneira mais adequada de proporcionar-lhes um tratamento justo. O incentivo a essas medidas que não deixam de ser emergenciais deve pautar-se por abranger uma quantidade significativa de indivíduos, sem beneficiar ninguém de forma isolada por fatores fenótipicos como faz, por exemplo, o Estatuto da Igualdade Racial.

Não resta dúvida de que em determinados momentos, o Poder Público na perspectiva de promover o bem-estar social, não pode assumir uma postura subserviente quanto àqueles que estejam, urgentemente, necessitados de amparo. Para isso, a ação imediata através de seu aparato para corresponder ao princípio da dignidade da pessoa humana previsto na Constituição da República, mostra-se extremamente precisa e eficaz.

Nesse contexto, surgem as ações afirmativas como mecanismos de se estabelecer essa atuação Estatal embasada no ideal de promoção da igualdade material e, também, na correção das deformidades que assolam certos grupos sociais que se encontram em situações precárias dentro da sociedade. Esse ostracismo acarretado pelo aviltamento social e econômico, dá margem à necessidade de se tratar prioritariamente essas pessoas em função dessa emergência.

Como se sabe, esse privilégio deve persistir até que seja alcançada a normalidade, isto é, a inclusão dos indivíduos isolados da vida social por questões de oportunidade e condições. O objetivo precípuo consiste na concretização do princípio da igualdade, pois se houver excesso resultante do favorecimento transitório, pode haver a inversão dos pólos e aqueles que antes eram acolhidos podem ficar prejudicados.

Dessa forma, a pigmentação da pele, por comprovação científica, não serve de embasamento para justificar a criação de ações afirmativas como o referido Estatuto, ações estas voltadas para a inclusão de segmentos sociais marginalizados. O ideal é promover medidas universais com maior abrangência possível para corrigir as distorções emanadas de dentro da própria sociedade, sem que haja o privilégio de certos grupos em detrimento de outros, principalmente quanto a fatores inexistentes do ponto de vista científico como é a raça.

Com efeito, os pobres que vivem à margem da sociedade e, por isso, excluídos das ações estatais são pessoas de múltiplas cores: pretos, pardos, brancos, amarelos, índios, cafuzos, caboclos, etc. Logo, estar-se-ia fomentando uma grande injustiça ao se criar mecanismos para atingir a igualdade material com o desenvolvimento de programas assistenciais restritos a certas pessoas devido à cor de suas peles.

A cor da pele é um fator que não tem relevância para distinguir as pessoas e, da mesma forma, não pode ser motivo de ações afirmativas desvirtuadas de seu escopo constitucional. Deve-se estimular ações que favoreçam a integração social e que evitem a divisão da sociedade em grupos, possibilitando a eliminação da lenda de que existem diversas raças humanas. Assim, essa prática é inconstitucional na medida em que propicia a discriminação ilegítima, isto é, aquele tipo de discriminação que vilipendia o direito constitucional à igualdade ao tratar uma pessoa em piores condições do que a outra e, pior, levando-se em conta critérios que dizem respeito às características particulares delas.

Peter Fry e os demais coordenadores da obra intitulada "Divisões perigosas: políticas raciais no Brasil contemporâneo" abordam que:

O novo racialismo a que assistimos no Brasil contemporâneo é um empreendimento de restauração do conceito de raças humanas. Os racialistas começam desvalorizando o princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei e terminam atribuindo identidades raciais a cada pessoa. A divisão da sociedade em raças oficiais, ou seja, em grupos raciais catalogados pelo Estado, é o alicerce para um sistema de preferências e privilégios legais concedidos a título de ‘reparação’. Na sociedade racializada, os direitos universais à educação, à saúde e ao emprego passam a um plano secundário. (FRY et al., 2007, p. 21)

Assim, o ideal é fomentar a implementação de políticas públicas universais para proporcionar a todos de um modo geral a garantia do mínimo existencial. Para resolver os problemas que criam um disparate incomensurável entre as pessoas de diferentes classes sociais, o Poder Público precisa se valer da máxima de que se deve tratar os desiguais de maneira desigual na medida de suas desigualdades para atingir a igualdade. É preciso que hajam medidas voltadas para promover o bem de todos sem qualquer tipo de preconceito conforme dita o artigo 3º da Constituição, e que segundo José Carlos Miranda, na obra coordenada por Peter Fry e outros, devem ser: "[...] medidas que vão no sentido de mais igualdade, de ampliação dos serviços públicos de qualidade para todos." (MIRANDA, 2007, p. 322)


5. A inconstitucionalidade do Estatuto da Igualdade Racial

5.1. A proposta de eliminação das desigualdades sociais do Estatuto

Tramita na Câmara dos Deputados em Brasília, com regime de prioridade, o projeto de lei 3.198/2000 de autoria do Senador Paulo Paim do PT do Rio Grande do Sul, que dispõe sobre o Estatuto da Igualdade Racial. Referido projeto de lei, salienta Mônica Grin (2007), já foi aprovado sem qualquer restrição na outra casa do Legislativo federal (Senado Federal) sob o número PLS nº. 213 (2003). A proposta desse projeto consiste basicamente em estabelecer direitos para segmentos sociais taxados de "afro-brasileiros". [32] O inciso III do artigo 2º do Estatuto da Igualdade Racial define os afro-brasileiros como: "as pessoas que se classificam como tais ou como negros, pretos, pardos ou definição análoga."

Assim, o Estatuto da Igualdade Racial foi criado "[...] para combater a discriminação racial e as desigualdades raciais que atingem os afro-brasileiros, incluindo a dimensão racial nas políticas desenvolvidas pelo Estado.", conforme o artigo 1º. Também é importante ressaltar o que afirma o artigo 5º do referido projeto de lei: "A participação dos afro-brasileiros, em condições de igualdade e oportunidade, na vida econômica, social, política e cultural, do País será promovida, prioritariamente, [...]". [33] (grifo nosso)

A preocupação do autor do projeto resume-se em assegurar tão-somente aos afro-brasileiros condições mínimas de existência com preferência sobre os demais cidadãos, porque na visão do aludido senador da República, "[...] Não foi dado aos negros o direito à terra, à educação e nem sequer ao trabalho remunerado." O referido Senador ressalta que "[...] De dominados os negros passaram a excluídos. Situação que permanece até os dias de hoje."

Interessante notar que o próprio senador Paulo Paim reconhece a comprovação científica de que a cor não é um fator determinante para mensurar a capacidade dos indivíduos, mas por outro lado, ele afirma incoerentemente que: "[...] ela é apenas uma diferença, assim como o tamanho dos pés, a (sic) como a cor dos olhos, como a altura, como a forma dos cabelos." Está consolidado entre os geneticistas que a cor da pele, textura dos cabelos, formatura do nariz, enfim, influi para distinguir uma pessoa da outra em apenas uma fração de 0,005 dos 25 mil genes que constituem o corpo humano, o que se mostra evidentemente insignificante para se afirmar, como fez o ilustre senador, que a cor da pele "é apenas uma diferença". É uma diferença inexistente levando-se em conta o índice apresentado pela ciência.

Ressalta-se, ainda, que há informações infundadas segundo as quais os negros compõem a maioria da população brasileira e são os mais necessitados em termos sociais e econômicos. Segundo Paulo Paim [34], os:

[...] institutos de pesquisas vinculados ao governo federal mostraram que os negros são os mais pobres, os menos escolarizados, são os que recebem os menores salários quando empregados e constituem a maioria esmagadora dos trabalhadores lançados na informalidade e no desemprego. (PAIM, 2003)

Assim, esse tal Estatuto no intuito de recompensá-los por meio de macabro tratamento prioritário devido à cor de suas peles, pretende adotar políticas públicas somente para esse grupo que se reconhece como membros de certa raça. Então, o senador conclui que:

O Estatuto é um conjunto de ações afirmativas, reparatórias e compensatórias. Sabemos que esses tipos de ações devem emergir de todos e de cada um. Devem partir do Governo, do Legislativo, da sociedade como um todo e do ser humano que habita em cada um de nós. Felizmente isso vem acontecendo. Talvez pudessem ser mais numerosas, mas temos presenciado ações afirmativas. São frentes de luta contra o racismo na educação, no mercado de trabalho, nos meios de comunicação e em diversas outras áreas. (PAIM, 2003)

Entretanto, Ali Kamel (2006) contesta as palavras de Paulo Paim dizendo que o problema não se encontra na questão racial, mas no vexatório nível cultural, social, bem como na situação econômica da sociedade como um todo. Apresentando dados estatísticos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Kamel aponta que os amarelos estudam em média 10,7 anos; os brancos 8,4 anos; e os negros 6,4 anos. Kamel (2006) diz que os amarelos ganham mais porque estudam mais, não havendo nenhuma relação com a cor. [35]

Kamel, então, demonstra como ocorre a desigualdade entre as pessoas no País ao se perguntar:

[...] como pode um negro e um pardo com o mesmo nível educacional ganhar menos do que um branco? Não pode. Nem as estatísticas mostram isso. O que elas mostram é que negros e pardos, com o mesmo número de anos na escola que brancos, ganha menos. Isso não quer dizer que tenham recebido a mesma educação. Basta acompanhar este exemplo hipotético: um negro, por ser pobre, estudou 12 anos, provavelmente em escolas públicas de baixa qualidade e, se entrar na universidade, não terá outra opção senão estudar em faculdade privada caça-níqueis (o Programa Universidade Para Todos, o ProUni, do governo federal, destinado a dar bolsas a estudantes carentes, não resolve o problema, mas o perpetua); o branco, por ter melhores condições financeiras, estudou também 12 anos, mas fazendo o percurso inverso, estudou em boas escolas privadas e cursará a universidade numa excelente escola pública. A diferença salarial decorre disto e não do racismo: ‘Você é negro, pago um salário menor.’ Infelizmente, não há estatística que meça quanto ganham cidadãos de cores diferentes com igual qualificação educacional. Da mesma forma, não é correta a afirmação de que os brancos e negros, em funções iguais, ganhem salários desiguais. O IBGE não mede isso. Não há tabela mostrando que marceneiros brancos ganhem mais que marceneiros negros. O que ele faz é estratificar os segmentos em categorias: com carteira, sem carteira, domésticos, militares, funcionários públicos estatutários, por conta própria e empresários. Ou por setores: indústria, comércio, agricultura etc. Mas nunca por função ou ofício ou nível hierárquico. (KAMEL, 2006, p. 61)

Nesse sentido, Ali Kamel (2006) finaliza ao asseverar que os instrumentos da sociedade que se destinam à exclusão tornam vítimas os pobres de um modo geral, sejam eles brancos, negros, pardos, amarelos ou índios. E Kamel (2006) diz que o principal meio de difusão da miséria entre os indivíduos é a péssima qualidade da educação ministrada pela rede pública de ensino. [36]

Outro detalhe que deve ser observado, conforme observa Kamel (2006), são os dados eloqüentes que apontam os brancos como a maior parte da população com 51,4% de indivíduos e os negros com 48%. Esses dados indicam, ainda, que dos 56,8 milhões de pobres no Brasil, 34,2% são brancos e 65,8% são negros. [37]

O referido autor (2006) ao analisar os dados do IBGE, afirma que os negros representam 5,9% da população e não 48%, e que os brancos são realmente 51,4% da nação. O grande problema diz respeito aos pardos que são 42% de toda a população e não foram mencionados. Kamel (2006) ressalta que dos 56,8 milhões de pobres no País, os negros são 7,1% e não 65,8%; os brancos são 34,2% de fato; e os pardos 58,7%. Dessa forma, ele assevera que se a pobreza for representada por cor no País ela é parda. Ali Kamel (2006) entende que os asseclas que sustentam a tese de que no Brasil os negros são incontestavelmente alijados pelos brancos, procuram justificar seus interesses para que haja a criação de políticas públicas específicas que os favoreçam. A partir da fusão com os pardos, edificou-se esse dado inexato com o escopo de serem os negros favorecidos por uma falsa realidade. E isso pode ser ratificado ao se efetuar a soma do percentual de pobres que são pardos (58,7%) com o de negros (7,1%) e se chegar facilmente ao resultado de 65,8% de negros supostamente pobres. [38]

Ali Kamel então pondera que:

Somar pardos e negros, portanto, seria apenas um erro metodológico se não estivesse na base de uma injustiça sem tamanho. Porque todas as políticas de cotas e ações afirmativas se baseiam na certeza estatística de que os negros são 65,8% dos pobres, quando, na verdade, eles são apenas 7,1%. Na hora de entrar na universidade ou no serviço público, os negros terão vantagens. Os pardos, não. Do ponto de vista republicano, isso é grave. Na hora de justificar as cotas [e também ações afirmativas], os pardos são usados para engrossar (e como!) os números. Na hora de participar do benefício, são barrados. Literalmente. (KAMEL, 2006, p. 51-52)

E do outro lado, aparece o nobre Senador Paulo Paim do PT do Rio Grande do Sul, afirmando sobre o projeto de lei que tramita na Câmara dos Deputados, que:

Às vezes somos criticados por defendermos os negros, os índios, os idosos – aposentados ou não, as crianças, as mulheres, a livre opção sexual, os sem-teto, os sem-terra, os desempregados, os assalariados, os marginalizados, enfim, aqueles discriminados, sejam brancos, negros, índios ou qualquer outra etnia. Que nos critiquem, pois essa é a crítica da hipocrisia. Crítica daqueles que não querem que a raça humana seja, efetivamente, só uma. Onde todos tenham lugar ao sol, abrigados pela sombra da mãe natureza. (PAIM, 2003)

Ora, o senador afirma desejar o reconhecimento de uma única raça humana. Então para quê criar um Estatuto da Igualdade Racial? Pelo que parece, o Estatuto é para (des)igualar raças, ou seja, promover a raça negra e se olvidar dos pardos (principalmente), dos índios, dos amarelos e dos brancos, de tal forma que, segundo o Senador, "[...] todos tenham lugar ao sol, abrigados pela sombra da mãe natureza". [39] Essa é a proposta do projeto de lei que foi aprovado no Senado Federal e está na iminência de ser votado na Câmara dos Deputados.

5.2. A violação do princípio da igualdade a partir do favorecimento racial destinado à inclusão social de afro-brasileiros

A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial da qual o Brasil é signatário, foi ratificada em 27 de março de 1968, orientando os Estados-membros a basearem-se no princípio da dignidade humana e também na igualdade de todos os seres humanos. Busca-se a promoção do respeito universal assim como a observância dos direitos humanos e fundamentais inerentes a todo indivíduo, sem submetê-lo à discriminação de qualquer gênero, seja de raça, sexo, idioma ou religião. [40]

Nesse contexto, dispõe o artigo 1º que:

Para fins da Presente Convenção, a expressão ‘discriminação racial’ significará toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto ou resultado anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício em um mesmo (em igualdade de condição) de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública. (Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial)

No mesmo sentido, o artigo 2º deixa bem claro que: "Esta Convenção não se aplicará às distinções, exclusões, restrições e preferências feitas por um Estado-parte entre cidadãos e não-cidadãos." Este Tratado, como se vê, não se destina a estabelecer qualquer forma de discriminação e, onde a houver, o dispositivo mencionado diz que tal Convenção internacional não será aplicada.

E é interessante frisar que a referida Convenção, da qual o País é signatário, não proíbe a adoção de medidas emergenciais como as ações afirmativas, que são criadas para a efetivação da igualdade material enquanto escopo precípuo do atual modelo de Estado brasileiro. Considerando isso, a aludida Convenção dispõe em seu artigo 1º, nº. 4, que:

Não serão consideradas discriminação racial as medidas especiais tomadas com o único objetivo de assegurar o progresso adequado de certos grupos raciais ou étnicos ou de indivíduos que necessitem da proteção que possa ser necessária para proporcionar a tais grupos ou indivíduos igual gozo ou exercício de direitos humanos e liberdades fundamentais, contanto que tais medidas não conduzam, em conseqüência, à manutenção de direitos separados para diferentes grupos raciais e não prossigam após terem sido alcançados os seus objetivos. (grifo nosso)

O Estado não pode discriminar arbitrariamente para não ocasionar um alargamento ainda maior das desigualdades que afligem a população. A sua incumbência é a consecução das normas programáticas expressas na Constituição, dentre as quais promover o bem de todos os cidadãos sem discriminá-los por suas características pessoais. Obviamente, que em casos extremos e se valendo de padrões de razoabilidade e proporcionalidade, o Estado deve intervir para diminuir ou acabar com as desigualdades por meio de políticas públicas específicas e, assim, concretizar um ideal: a igualdade material. [41]

O Estatuto da Igualdade Racial representa uma monstruosidade no aspecto jurídico e também conceitual. Primeiro, porque compele as pessoas a aderirem à condição de brancos ou afro-brasileiros em todo documento oficial, além de não reconhecer a descendência das populações indígenas que certamente foram as mais oprimidas durante todos os tempos.

Em seguida, há literalmente a clara destinação de benefícios limitados somente aos negros em todos os setores de atuação direta e imediata do Estado, caracterizando a manutenção de direitos separados como dispõe a Convenção. O que o projeto de lei que institui o Estatuto persegue é o direito à reparação aos afro-brasileiros a ser custeada por outras categorias sociais, tidas como as verdadeiras culpadas pela desigualdade social e econômica.

Para Simon Schwartzman (2007), na obra coordenada por Peter Fry e outros, é perceptível a violação do princípio constitucional da igualdade, principalmente da igualdade perante a lei, com a criação de uma nova espécie de cidadãos (afro-brasileiros), que são aqueles que se dizem como tais, os negros, os pardos e também aqueles de definição semelhante. Os demais foram relegados para outra categoria e não podem participar das políticas públicas porque estão fora da concessão desses benefícios propiciados pelo Poder Público. [42]

Peter Fry e Yvonne Maggie (2007) mencionam que o Estado deve se abster de legislar sobre matéria referente à raça, porque passa-se a perpetuar justamente aquilo que deveria ser destruído, que é a crença de uma diversidade racial. E ratificam que não se pode acabar com o racismo se se incentivar políticas que acabam por reforçar essa concepção mitológica, assim como estabelece o dito artigo 1º, nº. 4 da Convenção. [43]

Demétrio Magnoli (2007), também na obra coordenada por Fry, expõe que o tal projeto de lei é uma outra Constituição e que ele solapa o princípio de cidadania da República. O autor ainda diz que a nação deixa o status de um contrato social para ser uma espécie de confederação de raças, pois o Estatuto subtrai a definição de igualdade tanto no sentido político quanto no sentido jurídico entre os cidadãos. Tendo em vista o Estatuto, essa confederação de raças não é nada mais do que duas nações divididas pela escravidão enquanto fato histórico. [44]

Para encerrar esta discussão, é importante destacar que José Roberto F. Militão, em artigo publicado na obra supracitada, entende que o Estatuto viabiliza:

[...] a violação do princípio geral da isonomia e da desconsideração de raças, se possível fosse em face da Carta Magna, beneficiaria a quem detém poder. A outra é a que a divisão da humanidade em raças é a negação da ciência, violação da ética social e rompimento de princípios republicanos que exigimos preservar: somos humanos e iguais em direitos e obrigações. A crença em raça não pode ser admitida para a diferenciação institucional da cidadania. (MILITÃO, 2007, p. 331)

Na mesma linha, o referido autor assevera que: "Na condição de combatentes contra o racismo devemos ter por nosso interesse maior a incondicional destruição da idéia de ‘raças’, e não a sua consolidação institucional." (MILITÃO, 2007, p. 331-332) Ele prossegue dizendo que: "Conforme a Carta Magna, o Estado somente pode legislar tendo por objeto a pessoa humana e suas nuances características e diferenças inatas, excluso o termo ‘raças’, que não pode ser acatado como ‘diferença’ humana." (MILITÃO, 2007, p. 332)

Finalmente, é preciso recorrer ao excelente trabalho desenvolvido e publicado por Ali Kamel para concluir que: "[...] se aprovado, o estatuto deixará para trás, de uma vez por todas, o Brasil que conhecemos e criará um outro país, cindido racialmente, em que a noção de raça, base de todo o racismo, estará no centro de tudo, quando deveria estar definitivamente enterrada." (KAMEL, 2006, p.97)

5.3. Educação: a única solução para combater a desigualdade

De acordo com Sérgio Pena (2007), no livro coordenado por Fry e outros, fazer uma sociedade livre do racismo em que a singularidade de cada pessoa seja assegurada de tal forma a permitir, por livre e espontânea vontade, uma identidade plural, é o essencial para um Estado Democrático. Conforme a ciência tem demonstrado, isso é possível e não está distante da realidade. Cada indivíduo possui a sua característica, o que lhe torna peculiar em relação ao outro, e que lhe proporciona seu próprio trajeto de vida. Não é o que muitos entendem por lhes parecer uma visão minoritária, que reage pregando contra o anseio de se reconhecer, pelo menos num plano social, a concepção de diversidade racial. Esqueceram-se, porém, que esta visão fundamenta-se em argumentos científicos que comprovam que a idéia de raça não passa de ficção. Espera-se um dia que essa visão taxada de maléfica sob o ponto de vista social prevaleça e predomine. É claro que com a suposta aprovação do Estatuto da Igualdade Racial, o sepultamento da mitologia da multiplicidade racial pode perdurar por algum tempo. [45]

A panacéia salvadora para combater a desigualdade social e econômica, segundo aponta Ferreira Gullar (2007) na aludida obra, é priorizar o setor educacional (principalmente o público) que atende a maior parte da população. O ensino de qualidade deve ser oferecido a todos os brasileiros pobres, independente da cor da pele de cada um deles: negros, pardos, brancos, amarelos ou índios. [46]

Roque José Ferreira (2007), também em artigo publicado nesse magnífico trabalho publicado sob a coordenação de Peter Fry e outros, afirma que a trilha que deve ser seguida é a luta diária pelas reivindicações do ensino público e, também, do sistema de saúde de nível minimamente satisfatório. Além disso, deve-se garantir também reforma agrária, empregos com salários que proporcionem a dignidade humana, bem como a melhoria do serviço público como um todo. Isso certamente pode ocasionar um impacto que desperte a população negra a compreender que todos os pobres, dentro desse sistema capitalista estruturado na livre iniciativa privada e no acúmulo de capital, estão propensos a sucumbirem independe da cor de cada um deles. Essas lutas do cotidiano social conferem a possibilidade de formação de um mecanismo político que conscientize todos os brasileiros a alcançarem os objetivos elencados na Constituição da República. [47]

Ali Kamel (2006) informa que alguns políticos dizem que o problema na educação não se trata de dinheiro, pois o País investe nas três esferas de governo (federal, estadual e municipal) cerca de 4% do Produto Interno Bruto (PIB) e, assim, o Brasil não estaria tão distante dos países desenvolvidos. Um estudo realizado em 2005 pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (ODCE), comprovou que em alguns países ricos como Alemanha, EUA, Austrália, Itália e Holanda, os investimentos nesse setor representam, respectivamente, 4,4%, 5,3%. 4,4%, 4,6% e 4,6% do PIB. [48]

Todavia, um fato é ocultado quanto se analisa esses investimentos no setor da educação. Não se considera o contingente populacional e a dimensão do PIB dos países envolvidos na análise. Os países ricos têm um PIB exorbitante e uma quantidade ínfima de estudantes, e o pobre do Brasil tem um PIB paupérrimo se comparado a eles e uma enorme quantidade de estudantes. [49]

Conforme aduz Kamel (2006), o problema não é a escassez de recursos a serem destinados à educação, porém, a prioridade dada na gestão deles. O governo federal gasta aproximadamente cerca de 8 bilhões com a educação e mais de 19 bilhões com medidas tidas como emergenciais. É dispensável a obtenção de mais recursos financeiros para investir na educação, é preciso apenas reestruturar o orçamento e alocar uma quantidade maior de verbas nesta área. Com o redimensionamento daquelas medidas emergenciais para atender tão-somente aos necessitados e empregar uma fatia ainda maior no sistema educacional, isso se torna o meio mais eficaz para concretizar, mesmo que a longo prazo, o princípio constitucional da igualdade e acabar de vez com a miséria. [50]

Para concluir, Ali Kamel aponta que se não houver mudança na condução do País no aspecto social, econômico, político e também jurídico: "(...) vamos continuar tendo uma legião de pobres que dependerá sempre de uma esmola do governo. Mas esta esmola, jamais tirará os pobres da pobreza." (KAMEL, 2006, p. 138) Kamel continua na mesma linha de raciocínio ao afirmar que se essa situação persistir, isso: "[...] será um dos fatores que os manterão pobres. Porque cada dinheiro drenado da educação é um estímulo para que pobres permaneçam pobres." (KAMEL, 2006, p. 138)


6. Conclusão

O trabalho desenvolvido buscou demonstrar que a discriminação é uma forma de excluir, segregar ou separar determinada pessoa da comunidade em que ela esteja inserida em função de alguma de suas características, seja pelo sexo, cor da pele, convicções ideológicas ou religiosas, nacionalidade, enfim.

E o projeto de lei número 3.198/2000, de autoria do senador Paulo Paim do Partido dos Trabalhadores (PT) do Estado do Rio Grande do Sul (RGS), que institui o Estatuto da Igualdade Racial contribui para a disseminação da discriminação. Esse projeto é uma afronta ao princípio da igualdade na medida em que visa a criar mecanismos de inclusão social e econômica tão-somente para os "afro-brasileiros", aqueles que assim se denominam, os negros, os pardos e os de definição análoga.

Evidentemente que a proteção de grupos raciais com políticas públicas específicas sob o fajuto argumento de que é preciso recompensá-los pelo massacre sofrido ao longo da história, contribuirá para desencadear um conflito hostil entre as pessoas que serão separadas umas das outras.

A pigmentação da pele, por comprovação científica, não serve de embasamento para justificar a criação de ações afirmativas como pretende o referido Estatuto, ações estas voltadas para a inclusão de segmentos sociais especializados como os tais afro-brasileiros. O ideal é promover medidas universais com maior abrangência possível para corrigir as distorções emanadas de dentro da própria sociedade, sem que haja o privilégio de certos grupos em detrimento de outros, principalmente para retribuir aqueles que se consideram pertencentes a "raças" oprimidas.

A cor da pele é um fator que não tem relevância para distinguir as pessoas e, da mesma forma, não pode ser motivo de ações afirmativas que desrespeitam o texto constitucional. Deve-se estimular ações que favoreçam a integração social e que evitem a divisão da sociedade em grupos, possibilitando o esquecimento da inverdade de que existem diversas raças humanas. Como se enfatizou, essa prática é inconstitucional na medida em que propicia a discriminação ilegítima, isto é, aquele tipo de discriminação que vilipendia o direito constitucional à igualdade ao tratar uma pessoa em piores condições do que a outra.

Para se chegar a esta conclusão, foi preciso elucidar com maior profundidade, alguns pontos que são tratados pelo Estatuto da Igualdade Racial. O primeiro deles é a igualdade propriamente dita que é a base do projeto de lei aludido. Na tentativa de concretizar essa garantia fundamental explicitada pela Constituição e promover a eliminação dos desequilíbrios sociais e econômicos que assolam a maior parte da população brasileira, o Estatuto prevê tratamento preferencial aos afro-brasileiros para incluí-los nas ações afirmativas criadas pelo Poder Público. Constatou-se, nesse sentido, que não haveria a efetivação desse ideal almejado pela Constituição, mas a inversão de pólos, ou seja, quem era tido como excluído passa a ser amparado e quem recebia auxílio será excluído.

Em seguida, ao analisar as ações afirmativas e sua pertinência do ponto de vista constitucional, constatou-se que esses mecanismos postos à disposição do Estado para a correção de deformidades sociais e econômicas, devem ser utilizados com proporcionalidade e razoabilidade conforme o caso concreto até que a causa que originou a ação afirmativa desapareça. E mais, de acordo com a fonte bibliográfica levantada, as ações afirmativas que não forem direcionadas a universalizar os benefícios que são concedidos podem provocar situações catastróficas.

O tratamento favorecido em razão de características singulares inerentes a cada pessoa não pode ser objeto de assistência Estatal, sob pena de configurar a discriminação ilegítima. A ciência, precisamente a Genética, tornou pacífico o entendimento da inexistência de uma multiplicidade racial e, a raça, por mais que muitos insistam, é uma só: a humana. Insistir nessa crença, como se verificou, é uma forma de angariar vantagens para determinado grupo de pessoas para colocá-los em destaque.

Adiante, foi frisado que o problema da desigualdade entre as pessoas é devido a fatores sociais e econômicos e não à questão da discriminação racial como alguns cientistas sociais têm dito. Somente com investimentos maciços no setor educacional se pode fazer este País mais justo, fraterno e solitário de acordo com a Constituição de 1988. Comprovou-se, com isso, que os recursos destinados à essa área são de cerca de 4% do Produto Interno Bruto (PIB), proporcionalmente irrisórios se levado em conta a quantidade de estudantes brasileiros. Outra grande parcela do PIB brasileiro é despendido com medidas emergenciais e que acabam por alimentar os problemas atuais, isto é, tornando os pobres ainda mais dependentes de subsídios do Estado para sobreviverem.

O objetivo final, portanto, foi demonstrar que o artigo quinto do Estatuto da Igualdade Racial é inconstitucional ao dispor que os afro-brasileiros serão priorizados com ações afirmativas por serem vítimas de um longo processo histórico de discriminação racial e que, por isso, devem ser recompensados por todas as opressões que culminaram com a marginalização desse grupo de pessoas, fazendo com que as ações estatais direcionadas para área educacional, econômica e, principalmente, social, favoreçam-nas pelo simples fato de necessitarem mais do que as outras devido à cor da pele delas, pois somente dessa maneira se atingiria a sonhada igualdade material.

Como se procurou enfatizar, isso enseja a discriminação ilegítima por tratar diferentemente as pessoas em função da cor da pele, além de viabilizar o processo de segregá-las em grupos e dificultar, ainda mais, a ação do Estado no combate às desigualdades por existirem diversos segmentos carentes de ações afirmativas.


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Notas

1. ROCHA, Carmén Lúcia Antunes. O princípio constitucional da igualdade. Belo Horizonte: Editora Lê, 1990, p. 14.

2. SILVA, Sidney Pessoa Madruga. Discriminação positiva: ações afirmativas na realidade brasileira. Brasília: Brasília jurídica, 2005, p.49.

3. SILVA, Sidney Pessoa Madruga. Discriminação positiva: ações afirmativas na realidade brasileira. Brasília: Brasília jurídica, 2005, p. 48-49.

4. ROCHA, Carmén Lúcia Antunes. O princípio constitucional da igualdade. Belo Horizonte: Editora Lê, 1990, p. 69.

5. Esse projeto tramitou e foi aprovado no Senado Federal com a seguinte numeração: PLS nº. 213 (2003). Na Câmara dos Deputados sua numeração é esta apontada no texto.

6. BRASIL. Projeto de lei do Senado nº. 213 (2003). Substitutivo ao Projeto de Lei do Senado, do Sr. Paulo Paim, sobre a instituição do Estatuto da Igualdade Racial, em defesa dos que sofrem preconceito ou discriminação em função de sua etnia, raça e/ou cor. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/paulopaim/pages/vida/publicacoes/texto/Estatuto_da_Igualdade_Racial_Novo.pdf>. Acesso em: 19/3/2008.

7. GOMES, Joaquim Benedito Barbosa. Ação afirmativa e princípios constitucionais da igualdade: o direito como instrumento de transformação social. A experiência dos EUA. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 37.

8. GOMES, Joaquim Benedito Barbosa. Ação afirmativa e princípios constitucionais da igualdade: o direito como instrumento de transformação social. A experiência dos EUA. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 37-38.

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10. KAUFMANN. Roberta Fragoso Menezes. Ações afirmativas à brasileira: necessidade ou mito? A implementação para negros como mecanismo concretizador de direitos fundamentais. Uma análise histórico-jurídico-comparativa do negro nos Estados Unidos da América e no Brasil. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/10070>. Acesso em: 15/6/2008.

11. KAUFMANN. Roberta Fragoso Menezes. Ações afirmativas à brasileira: necessidade ou mito? A implementação para negros como mecanismo concretizador de direitos fundamentais. Uma análise histórico-jurídico-comparativa do negro nos Estados Unidos da América e no Brasil. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/10070>. Acesso em: 15/6/2008.

12. CRUZ, Álvaro Ricardo de Souza. O direito à diferença: as ações afirmativas como mecanismo de inclusão social de mulheres, negros, homossexuais e portadores de deficiência. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 173.

13. SILVA, Sidney Pessoa Madruga. Discriminação positiva: ações afirmativas na realidade brasileira. Brasília: Brasília jurídica, 2005, p. 94.

14. CRUZ, Álvaro Ricardo de Souza. O direito à diferença: as ações afirmativas como mecanismo de inclusão social de mulheres, negros, homossexuais e portadores de deficiência. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 185.

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16. GOMES, Joaquim Benedito Barbosa. O debate constitucional sobre as ações afirmativas. Disponível em: <http://mundojuridico.adv.br/cgi_upload/texto028.doc>. Acesso em: 14/3/2008.

17. GOMES, Joaquim Benedito Barbosa. O debate constitucional sobre as ações afirmativas. Disponível em: <http://mundojuridico.adv.br/cgi_upload/texto028.doc>. Acesso em: 14/3/2008.

18. DIAS, Lenise Antunes. Da desigualdade legítima. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/5467 . Acesso em: 18/6/2008.

19. DIAS, Lenise Antunes. Da desigualdade legítima. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/5467. Acesso em: 18/6/2008.

20. DIAS, Lenise Antunes. Da desigualdade legítima. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/5467. Acesso em: 18/6/2008.

21. DIAS, Lenise Antunes. Da desigualdade legítima. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/5467. Acesso em: 18/6/2008.

22. CRUZ, Álvaro Ricardo de Souza. O direito à diferença: as ações afirmativas como mecanismo de inclusão social de mulheres, negros, homossexuais e portadores de deficiência. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 41.

23. KAMEL, Ali. Não somos racistas: uma reação aos querem nos transformar em uma nação bicolor.Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 34-35.

24. KAMEL, Ali. Não somos racistas: uma reação aos querem nos transformar em uma nação bicolor.Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 39.

25. KAMEL, Ali. Não somos racistas: uma reação aos querem nos transformar em uma nação bicolor.Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 40.

26. "Tomemos o exemplo dos cães. Todos sabemos que há várias raças da espécie canina. Elas são bem diferentes entre si, tanto na aparência quanto no comportamento: há raças bem diferentes maiores e menores, compridas e curtas, inteligentes e obtusas, dóceis e agitadas. Qualquer um saberá dizer, de longe, qual é o bassê e qual é dogue alemão. Pois bem, o que faz o bassê e o dogue alemão serem raças diferentes é que bassês se parecem mais com bassês, do ponto de vista da genética, do que com dogues alemães. Reúna um grupo de bassês: haverá animais mais compridos que outros, mais altos que outros, com focinhos mais pontudos que outros. Mas a variabilidade entre bassês será menor do que bassês e dogues alemães." (KAMEL, Ali. Não somos racistas: uma reação aos querem nos transformar em uma nação bicolor.Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 44).

27. VENTER, Craig. apud KAMEL, Ali. Não somos racistas: uma reação aos querem nos transformar em uma nação bicolor.Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 45.

28. PENA, Sérgio. apud KAMEL, Ali. Não somos racistas: uma reação aos querem nos transformar em uma nação bicolor.Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 46.

29. KAMEL, Ali. Não somos racistas: uma reação aos querem nos transformar em uma nação bicolor.Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 45.

30. AZEVEDO, Celia Maria Marinho. Anti-racismo e seus paradoxos: reflexões sobre cota racial, raça e racismo. 2 ed., São Paulo: Annablume, 2004, p. 31-32.

31. AZEVEDO, Celia Maria Marinho. Anti-racismo e seus paradoxos: reflexões sobre cota racial, raça e racismo. 2 ed., São Paulo: Annablume, 2004, p. 50.

32. GRIN, Mônica. O Estatuto da Igualdade Racial: uma questão de princípio. In: FRY, Peter et al.. Divisões perigosas: políticas raciais no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2007, p. 295.

33. BRASIL. Projeto de lei do Senado nº. 213 (2003). Substitutivo ao Projeto de Lei do Senado, do Sr. Paulo Paim, sobre a instituição do Estatuto da Igualdade Racial, em defesa dos que sofrem preconceito ou discriminação em função de sua etnia, raça e/ou cor. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/paulopaim/pages/vida/publicacoes/texto/Estatuto_da_Igualdade_Racial_Novo.pdf>. Acesso em: 19/3/2008.

34. BRASIL. Projeto de lei do Senado nº. 213 (2003). Substitutivo ao Projeto de Lei do Senado, do Sr. Paulo Paim, sobre a instituição do Estatuto da Igualdade Racial, em defesa dos que sofrem preconceito ou discriminação em função de sua etnia, raça e/ou cor. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/paulopaim/pages/vida/publicacoes/texto/Estatuto_da_Igualdade_Racial_Novo.pdf>. Acesso em: 19/3/2008.

35. KAMEL, Ali. Não somos racistas: uma reação aos que querem nos transformar numa nação bicolor. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 60.

36. KAMEL, Ali. Não somos racistas: uma reação aos que querem nos transformar numa nação bicolor. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 66.

37. KAMEL, Ali. Não somos racistas: uma reação aos que querem nos transformar numa nação bicolor. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 49.

38. KAMEL, Ali. Não somos racistas: uma reação aos que querem nos transformar numa nação bicolor. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 49.

39. BRASIL. Projeto de lei do Senado nº. 213 (2003). Substitutivo ao Projeto de Lei do Senado, do Sr. Paulo Paim, sobre a instituição do Estatuto da Igualdade Racial, em defesa dos que sofrem preconceito ou discriminação em função de sua etnia, raça e/ou cor. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/paulopaim/pages/vida/publicacoes/texto/Estatuto_da_Igualdade_Racial_Novo.pdf>. Acesso em: 19/3/2008.

40. ONU. Convenção Internacional sobre Todas as Formas de Discriminação Racial. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/comissoes/cdhm/instrumentos/discriminaçaoracial.html/?searchterm=Convençao%20sobre%20a%20eliminaçao%20de%20todas%20as%20%20formas%20de%20discriminaçao%20racial>. Acesso em: 27/3/2008.

41. EMILIANO, Eurípedes de Oliveira. As ações afirmativas e a concretização do valor constitucional da igualdade. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/11296>. Acesso em: 24/5/2008.

42. SCHWARTZMAN. Simon. Das estatísticas de cor ao Estatuto da Raça. In: FRY, Peter et al.. Divisões perigosas: políticas raciais no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2007, p. 108-109.

43. FRY, Peter; MAGGIE, Ivone. Política social de alto risco. In: FRY, Peter et al.. Divisões perigosas: políticas raciais no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2007, p. 281.

44. MAGNOLI, Demétrio. Constituição do racismo. In: FRY, Peter et al.. Divisões perigosas: políticas raciais no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2007, p. 286.

45. PENA, Sérgio. Ciências, bruxas e raças. In: FRY, Peter et al.. Divisões perigosas: políticas raciais no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2007, p. 47.

46. GULLAR, Ferreira. Somos todos irmãos. In: FRY, Peter et al.. Divisões perigosas: políticas raciais no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2007, p. 307.

47. FERREIRA, Roque José. Movimento negro: combater ou capitalizar? In: FRY, Peter et al.. Divisões perigosas: políticas raciais no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2007, p. 312.

48. KAMEL, Ali. Não somos racistas: uma reação aos que querem nos transformar numa nação bicolor. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 133-134.

49. KAMEL, Ali. Não somos racistas: uma reação aos que querem nos transformar numa nação bicolor. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 134.

50. KAMEL, Ali. Não somos racistas: uma reação aos que querem nos transformar numa nação bicolor. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 13.


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SIQUEIRA JÚNIOR, Luiz Márcio. Ação afirmativa e inclusão social de afro-brasileiros. A inconstitucionalidade do Estatuto da Igualdade Racial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2745, 6 jan. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18192. Acesso em: 26 abr. 2024.