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O controle jurisdicional do mérito do ato administrativo no Estado Democrático de Direito.

Apontamentos para um Direito Administrativo contemporâneo

O controle jurisdicional do mérito do ato administrativo no Estado Democrático de Direito. Apontamentos para um Direito Administrativo contemporâneo

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RESUMO: Aborda-se o constitucionalismo e as suas implicações na teoria dogmática do mérito do ato administrativo, presente ainda hoje, no Estado Democrático de Direito, analisando as possibilidades que possuem os magistrados frente à Administração Pública, assim como a legitimação do Judiciário para enfrentar o mérito do ato administrativo.


1. A FILOSOFIA POLÍTICA DA REVOLUÇÃO FRANCESA E O LIBERALISMO

Da Revolução Francesa, que foi um marco histórico, surgiu o constitucionalismo, como movimento político. Diz Voltaire Schilling que:

Considera-se a Revolução Francesa de 1789 o acontecimento político e social mais espetacular e significativo da História Contemporânea. Foi o maior levante de massas até então conhecido. Assinala o início de uma era nova, um período em que não se aceita mais a dominação da nobreza, nem um sistema de privilégios baseado nos critérios determinados pela nascimento. Só se admite, então, um governo que, legitimado constitucionalmente [01], é submetido ao controle do povo por meio de eleições periódicas. Seu lema "Liberdade, Igualdade, Fraternidade" universalizou-se, tornando-se uma bandeira da humanidade inteira. (Schilling, 1998, p. 68).

Desse grande marco histórico, que abalou a nobreza como se fosse um terremoto político, temos um dos primeiros gérmens do constitucionalismo. É por isso que ele deve ser estudado e valorizado como um fenômeno originante das Constituições e de novos direitos sociais. Ele significou uma ruptura ou uma quebra de paradigmas vigentes, desconsolidando a soberania política do Rei, para a consagração de novos princípios políticos, que se agregaram ao Liberalismo e se fixaram perenemente nele, vindo inclusive a marcar a nossa atual Constituição Federal de 1988, mas não somente ela, pois vários países da América Latina e da Europa importaram o Código Civil de Napoleão, especialmente dentro da ótica privatista do direito civil, que surgiu da reformulação do sistema de poder ocorrida pela revolução.

Do anseio popular de fuga da opressão e da asfixia social surgiu uma Revolução no sistema político, resultando no ataque e na invasão da Bastilha. Dessa invasão decorreu a reconstituição do poder político e daí surgiram movimentos constitucionais para evitar que acontecessem novamente novas arbitrariedades, o que originou o Liberalismo. Daí adveio o resgate da soberania popular e a destruição – o sistema foi quebrado em "cacos de vidro" sob fortes golpes – do Absolutismo. Tal foi à fúria popular que o poder foi retirado do Rei sob forte violência. O direito liberal gerou a legalização de interesses individuais e daí surgiram novos direitos no século XX e XXI no Brasil, relacionados à coletividade. Analisando a valor da liberdade, diz Locke que: "Uma tal liberdade em relação ao poder absoluto e arbitrário é tão necessária à preservação do homem e lhe é tão intimamente ligada, que não é dado ao homem dela se desfazer a não ser que perca juntamente a preservação e a própria vida". ...(Locke, 2002, pg. 35).

É nesse sentido que a Revolução Francesa desencadeou o surgimento de novas doutrinas políticas, e dessas surgiram outras, em um processo de causalidade e superveniência de novas idéias, tais como o neoliberalismo [02]. É assim que devemos considerar que a Revolução Francesa desencadeou uma série de doutrinas políticas, e muitas fracassaram, outras perduram até hoje, e não podemos negar a influência e a importância de uma série de filósofos políticos, tanto para o estímulo da revolução quanto para a formação do Liberalismo, tais como, segundo Schilling, "... John Locke, Montesquieu, Voltaire, Diderot, D´Holbach, D´Alambert, J.J.Rousseau, Condorcet e o filósofo I.Kant, que, em geral, asseguravam ser o Homem vocacionado ao progresso e ao auto-aperfeiçoamento ético".(Schilling, 1998, p. 68). Paulo Bonavides cita a influência de Hegel na Revolução Francesa. (Bonavides, 2001, p. 122). Essas doutrinas marcaram a Ciência Política e não deixam de ser marcos na História do Pensamento Universal e novas formas de conceber o homem, a sociedade, o Direito e a política, buscando a humanização e a universalização dos direitos humanos.

O princípio liberal surgiu como uma doutrina política que buscou a garantia da supressão da arbitrariedade e a renovação da decisão política com fundamento em uma conceitualização paradigmática do homem como um ser particular, dotado de direitos subjetivos. O espírito humano, atormentado pelas crises políticas do abuso do poder administrativo e governamental, queria conter o poder real. Era necessário aliviar os fardos das sociedades perdidas em lutas infrutíferas de sangue e dor, cicatrizar e aliviar o corpo social, construindo um novo Direito, capaz de remodelar e unir os fragmentados pedaços do Absolutismo, quebrado a golpes de indignação, para formar um novo modelo de Estado, política e sociedade. Sobre as dificuldades na renovação do Direito, diz Ihering que:

Sempre que o direito existente esteja defendido pelo interesse, o direito novo terá de travar uma luta para impor-se, uma luta que muitas vezes dura séculos e cuja intensidade se torna maior quando os interesses constituídos se tenham corporificado em forma de direitos adquiridos. Sempre que isso acontece, cada uma das partes que se defrontam ostenta em seus estandartes a divisa da majestade do direito. Uma invoca o direito histórico, o direito do passado, e a outra, o direito sempre em formação e constantemente rejuvenescido, o direito inato da humanidade à contínua renovação. Encontramo-nos diante de um conflito intrínseco, contida na própria idéia do direito. E esse conflito assume proporções trágicas para aqueles que, depois de ter empenhado todas as suas forças e todo o seu ser em prol de uma convicção, vêem-se condenados pelo julgamento supremo da História. Todas as grandes conquistas da história do direito, como a abolição da escravatura e da servidão, a livre aquisição da propriedade territorial, liberdade de profissão e de consciência, só puderam ser alcançadas através de séculos de lutas intensas e ininterruptas. O caminho percorrido pelo direito em busca de tais conquistas muitas vezes está assinalado por torrentes de sangue, sempre pelos direitos subjetivos pisoteados. ... (Ihering, 2003, p.31).

Obtendo a preço de muita luta e suor esse novo direito, surgiu o princípio liberal, como uma doutrina filosófica que buscava incidir nos fundamentos da política e estimular a formação da legalização e particularização dos direitos subjetivos, como estudaremos a seguir. O Liberalismo, composto de uma série de idéias que tiveram gestação no Iluminismo e seus grandes pensadores. Surgiram uma série de direitos subjetivos, e o governo teve de reconhecer a existência de impedimentos a sua atuação. Isso não quer dizer que o Liberalismo Político tenha resolvido todos os problemas do Estado, sido capaz de sanar todas as dificuldades da Administração Pública; no imo do Estado Liberal, ainda residiam sérios problemas, mas que nada eram comparados com as crises do período anterior. É que nenhum sistema político é perfeito e a tendência da humanidade é seguir o princípio do progresso, mas mesmo este é lento, e por isso o Direito tende a se tornar cada vez mais sofisticado à medida que o tempo passa e se notam as falhas das teorias políticas. Isso, porém, não nos dá o direito de renegar a fundamental priorização de novos interesses ocorrida na doutrina liberal, estimulada e surgida em John Locke e fomentada na Revolução Francesa. Diz André Copetti que:

Mas foi na França, em reação aos ordenamentos medievais e absolutistas, à sua pluralidade de poderes concorrentes e à oposição histórica e secular entre a liberdade do indivíduo e o absolutismo do monarca, que se estruturou de forma mais completa o Estado Liberal de Direito, no qual se refletiu a pugna da liberdade e da propriedade contra o despotismo na área continental européia. (Copetti, 2000, p.53).

É nesse sentido que devemos compreender o princípio do Liberalismo como uma doutrina que teve repercussões políticas, econômicas e jurídicas, fundamentando uma nova maneira de conceber as relações jurídicas entre o Estado e os governados. Ainda devemos realçar, em relação ao Liberalismo, a sua dupla face, tanto política quanto econômica, e também as suas principais características, tais como a liberdade, o individualismo, o capitalismo, a propriedade e a legalidade. Baseado nessas características, o Liberalismo gerou a reestruturação do Estado e a recontextualização do significado ontológico da filosofia política, amoldando a realidade social em novos prismas, dentro de um enfoque privatista e elitista, ensejando o desenvolvimento de novas doutrinas políticas nos séculos subseqüentes, lembrando um gérmen da democracia, assim como a Magna Carta de 1215 foi uma semente do constitucionalismo, e a Revolução Francesa de 1789 foi a terra no qual se alojou a semente do Liberalismo político e econômico, com sua visão renovadora.

Em razão da forte opressão política que ocorreu antes da Revolução Francesa e durante ela, era necessário legalizar e constitucionalizar um rol de liberdades individuais que se fundamentassem com sistemas de limitação do poder. É daí que surgiram as normas constitucionais limitativas, que José Afonso da Silva define como sendo "... as que contém os elementos limitativos do poder, consubstanciando especialmente o elenco dos direitos democráticos e individuais do homem, bem como as garantias constitucionais desses direitos". (Silva, 1998, p. 183). Houve o que poderíamos chamar de constitucionalização de direitos subjetivos, legalização da liberdade natural e positivação de normas de proteção do cidadão; dessa forma, o que hoje existe em nossa Constituição Federal, nos artigo 5 e 17, não deixa de ter surgido expressamente com o advento do constitucionalismo liberal. A marca mais forte desse movimento foi à busca da liberdade, a realização de uma utopia. O mundo político anterior a 1789 era regido pela insegurança jurídica, pela inexistência de garantias constitucionais de proteção dos direitos contra o monarca, pela monopolização do poder em uma só pessoa, pela centralização, personalização e individualização do Estado e inexistência da democracia, pois que não haviam eleições e nem meios do povo conter, reter e influenciar no poder de decisão do monarca.

A revolução rompeu com as mordaças que puseram no povo, fez com que os pés das pessoas perdessem suas algemas políticas, de forma tão significativa quanto à abolição da escravatura no Brasil. É por isso que o Liberalismo idealizava a liberdade, e o povo sempre a quis, mesmo porque ela é um direito natural do homem e não precisa estar positivada para que tenha existência na consciência política das pessoas.

Abordando a importância da representação política, John Locke diz que "A liberdade do indivíduo na sociedade não deve estar subordinada a qualquer poder legislativo que não aquele estabelecido pelo consentimento da comunidade, nem sob o domínio de qualquer vontade ou restrição de qualquer lei, a não ser aquele promulgado pelo legislativo conforme o crédito que lhe foi confiado". (Locke, 2002, p. 35). A representação política adveio como forte meio de assegurar a legalização de direitos e garantias, aumentando a liberdade em razão da existência do direito subjetivo. São os fenômenos da positivação dos direitos e da constitucionalização das liberdades. Nesse momento da História do Direito, a opressão do Absolutismo não tinha mais tanto poder. É evidente que essa fase histórica não desencadeou uma liberdade absoluta, pois que esta nem hoje temos, mas não deixou de ser o rompimento dos grilhões que prendiam o povo.

O Liberalismo consolidou muitas coisas que eram consideradas utópicas, que eram parte do imaginário social e que representavam os sonhos das pessoas. Pois tais sonhos se concretizaram. Não que todos tenham se consolidado, mas o primeiro passo foi dado.O monarca não podia mais prender as pessoas na Bastilha sem motivar suas decisões, sem explicar a razão pelo qual a pessoa estava lá, como fazia anteriormente. Antes da Revolução, não havia direito ao contraditório e a ampla defesa e nem relações diretas entre o governo e os cidadãos. O que havia era a imposição de interesses, e quem não os seguisse poderia ser morto ou torturado. É daí que o risco era sempre presente na vida das pessoas e não havia nem ao menos meios de se evitar isso. É por isso que a liberdade conquistada pelo Liberalismo foi o pilar fundamental pelo qual essa doutrina se estruturou.

Ao lado dessa liberdade de direitos, havia um forte individualismo. A conquista de direitos de liberdade havia se concretizado; haviam leis e doutrinas que afirmavam a sua importância, mas um óbice a isto era o forte individualismo presente na época. Dessa forma, devemos considerar que grande parte da liberdade obtida foi formal e não substancial [03]. Grande parte da liberdade obtida adveio da limitação do poder, ou seja, o Estado não poderia agir como bem quisesse com as pessoas, deveria ser controlado. Nesse ponto, efetivamente, houve um fortíssimo progresso, a liberdade que as pessoas tinham de não serem desrespeitadas, mas a liberdade de intervir na política do Estado não estava no mesmo patamar. É por isso que a liberdade política era relativa, que não era assim tão ampla. O efeito da revolução foi à garantia de direitos subjetivos, mas não a existência de direitos sociais, o que são coisas diferentes. Uma coisa é ser respeitado, outra é ser respeitado e poder manifestar sua decisão sobre a política.

A maneira como se compreendia o significado da Política foi modificada pela Revolução, que instituiu a representação, mas isso não assegurou a universalização dos direitos de atuação na vida política, pois a ideologia predominante era a de que o constitucionalismo seria unicamente um meio de limitação ao poder do Estado. Não que essa ideologia política fosse filosoficamente desprovida de sentidos positivos; ao contrário, as normas constitucionais limitativas foram um pilar fundamental de toda a evolução do sistema normativo da França após a Revolução.

Apesar das liberdades terem sido conquistadas, o cenário político da época era individualista. Os representantes, baseando-se em seus interesses, faziam com que as pessoas pobres e de baixa instrução não tivessem nenhum acesso ao poder político e com que a representação se tornasse um instrumento das vontades individuais dos políticos. Abordando a questão do Liberalismo, diz Voltaire Schilling que:

Tratava-se, pois, de substituir a antiga diferenciação social de nobres e plebeus por outra, mais moderna, quiçá revolucionária, baseada no mérito pessoal e no talento individual. As novas forças emergentes, oriundas do dinamismo econômico, desejavam controlar o poder e participar politicamente. Não pretendiam, no entanto, engajar todo o povo na nova sociedade almejada. Somente os que se revelassem talentosos, os ricos e os proprietários de um modo geral é que seriam chamados para o seleto clube dos novos dirigentes sociais [04]. Não importava mais a origem do nascimento, mas sim suas qualidades. (Schilling, 1998, p. 93 e 94).

Tendo sido a Revolução Francesa desencadeada pelo desgosto dos burgueses e do povo com o regime monárquico, era natural que, depois que obtivessem o poder, os burgueses buscassem o predomínio político, de forma que houve o favorecimento político dos ricos proprietários de terras, e por isso o poder ficou na mão dos ricos. A criação da Assembléia Constituinte e a Constituição Francesa de 1791 foram marcos vitais para o Liberalismo. Porém, os ricos agiam com um individualismo moral, pensando em se manter com as suas prerrogativas, de forma que podemos dizer que as preocupações com os direitos e a deslegitimação do individualismo político somente ocorreriam séculos após, de forma a fazer com que o individualismo dos nobres perdesse terreno.

Devemos conceber que o poder político que adveio da Revolução ficou concentrado na mão dos ricos, ou seja, dos grandes proprietários de terra. Na França do século XIX, se analisarmos a divisão de terras, notaremos que a maior parte da população vivia em zonas rurais, e que a nobreza e o clero concentravam quase 30 % das terras, mas representavam aproximadamente 2% da população [05]. Com a acumulação desproporcional de terras no clero e na nobreza, é evidente que a burguesia e o povo queriam novas condições.

Depois da revolução, a liberdade política era proporcional à riqueza e as terras. Foi dessa forma que se estruturou o liberalismo. A liberdade econômica assegurava a liberdade política. A renda e a propriedade representavam liberdade, valor, status, honra e poder. É por isso que se pode dizer que o Liberalismo era materialista (Schilling, 1998, p. 94) pois, mesmo com a vitória popular, a política ainda era campo seleto dos ricos, das pessoas presas aos interesses materiais.

Se o individualismo é a face espiritual do liberalismo, a propriedade é a sua expressão material [06]. Só é livre o proprietário. As instituições existentes, especialmente o Estado, devem assegurar primordialmente o direito à propriedade. (...) Dispor de seus bens como bem entender e estar consciente de que nenhuma autoridade poderá usurpa-lo ou confisca-lo sem justa indenização, é a maior garantia de liberdade que um súdito pode ambicionar junto ao seu soberano. É o pleno usufruto dessa propriedade que torna o homem livre. (Schilling, 1998, p. 93).

Analisando isso sociologicamente, se nota o valor que a sociedade francesa atribuía ao status social da pessoa, a propriedade e a riqueza material, a tal ponto de só permitir que fossem representantes os ricos, como se isso fosse condição para a qualidade da representação. Segundo as ideologias da época, é como se as condições materiais fossem um certificado da capacidade intelectual e da qualidade e valor moral do político, de forma que com isto ele teria a qualificação necessária para atuar no Estado.

Advém da Revolução Francesa o famoso e clássico princípio da legalidade, inscrito na nossa atual Constituição no artigo 5º, II, da seguinte forma: "ninguém será obrigado a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei". O código penal o institui no seu artigo 1º: "Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal". Tal é a importância histórica desse princípio que a Constituição Federal de 1988 declara-o como um dos primeiros e principais princípios democráticos e o Código Penal manifesta-o como seu primeiro artigo. Decorre deste princípio que só pode haver obrigação jurídica e só pode ser imputado a alguém que aquilo que estiver previsto em lei previamente vigente a conduta ou omissão. É assim que todo crime exige lei prévia e não pode haver criminalização de condutas sem que hajam leis que assim disponham.

A legalidade surgiu como um instrumento de limitação do poder. O Estado estaria submetido a normas jurídicas, não podendo violar direitos. O direito a vida, a locomoção, a dignidade, a honra seriam respeitados, pois em lei estariam regulados e disciplinados. É da Revolução Francesa que surgiu a legalidade como meio de contenção do poder administrativo do governo político. Rousseau diz que:

Se indagais em que consiste justamente o maior bem de todos, que tal deve ser o fim de todo sistema de legislação, achá-lo-eis resumido nestes dois objetos principais, a liberdade e a igualdade; a liberdade, porque toda a dependência particular é outra tanta força tirada ao corpo do Estado; a igualdade, porque sem ela não pode subsistir a liberdade. (Rousseau, 2003, p. 58).

Esse filósofo político diz também que... "É precisamente porque a força das coisas tende sempre a destruir a igualdade, que a força da legislação devem sempre tender a conservá-la". ... (Rousseau, 2003, p. 59). Este filósofo quer dizer que a legislação deve preservar a ordem das coisas, a própria liberdade e a igualdade. Concebe a lei como uma fortaleza dos direitos subjetivos, de forma que a entende como instrumento necessário para que isso ocorra. As leis visariam à proteção da liberdade e da igualdade, de forma que garantiriam a conservação da ordem.

John Locke, sobre o Poder Legislativo, diz que:

Por ser o objetivo primordial de o homem formar sociedade o desfrute da propriedade em paz e segurança, e sendo as leis estabelecidas seu grande instrumento e meio, a primeira providencia positiva e fundamental de todas as comunidades é justamente estabelecer o poder legislativo; e a primeira lei natural básica que deve nortear até o próprio poder legislativo consiste na preservação da sociedade e, até onde seja compatível como o bem público, de todos seus membros. O poder legislativo não é, pois, somente o poder supremo da comunidade, mas sagrado e intocável, nas mãos a que a comunidade o confiou; nem pode um edito, seja de quem for, concebido como de qualquer modo ou apoiado por qualquer poder, ter a força e a validade de lei se não tiver sanção do poder legislativo eleito pela comunidade; faltando isso, a lei não teria o que é imprescindível à sua natureza de lei: o consentimento da sociedade sobre a qual ninguém tem o poder de legislar, a não ser por seu próprio consentimento e autoridade que outorga. (Locke, 2002, p. 98).

John Locke também afirma que "O poder do legislativo tem seus limites restritos ao bem geral da sociedade. E não tem outro objetivo senão a preservação, e, portanto, não poderá nunca destruir, escravizar ou propositadamente empobrecer os cidadãos". (Locke, 2002, p. 99 e 100). Indo contra o absolutismo, diz Locke que:

O poder absoluto arbitrário ou o governo sem leis fixas estabelecidas não se harmonizam com os fins da sociedade e do governo, por cujas vantagens os homens abandonam a liberdade do estado de natureza, se não fosse para preservar-lhes a vida, a liberdade e a propriedade e, para garantir-lhes, com suas normas estabelecidas de direito e de propriedade, a paz e a tranqüilidade. Não é viável imaginar que quisessem, posto que pudessem fazê-lo, conceder a um ou a mais homens um poder arbitrário sobre as pessoas e as propriedades, que pusesse nas mãos do magistrado a força para executar tiranicamente a própria vontade. Fazer isso seria, seria colocar-se em condição pior que o estado de natureza, quando tinham ao menos a liberdade de defender o próprio direito contra as agressões e dispunham da mesma força para sustenta-lo, fosse tal direito por um só homem ou por muitos. (Locke, 2002, p. 101). [07]

John Locke manifesta um forte apreço pelo Poder Legislativo, porque o concebia como meio de alcançar os direitos subjetivos das pessoas, mas concebia-o como um executor do interesse público, de forma que assim ele teria legitimidade. Considerava as leis como representantes do interesse social e como meios mais adequados de resolver conflitos do que o estado de natureza. O Legislativo seria o maior dos 3 poderes, porque nele a sociedade viveria fortemente, e ele idealizava a proteção da paz, da segurança, da vida, da liberdade e da propriedade pelas leis, de forma que somente o legislador teria competência para cria-las, conforme o princípio da legalidade. Também devemos realçar o valor que ele tinha pelas leis, que considerava como legítimas expressões da sociedade.

Do conjunto da revolução, das idéias de Locke, Rousseau e dos Iluministas, surgiu o princípio da legalidade, gerando obrigações para os cidadãos e para o Estado, sendo a lei escrita e formal um meio que gerou uma nova operacionalização do Direito, pois ela gerou o princípio da segurança jurídica, e também promoveu a valorização do princípio do contraditório, da ampla defesa, do interesse público e de outros princípios.

É assim que a Lei surge como um instrumento jurídico-político, um verdadeiro pacto político, um meio de se evitar o estado de natureza, e no Liberalismo se manifestou como meio de conter e limitar o poder, de forma que ele fosse exercido legitimamente pelos representantes, com o fim de promover o interesse público, circunscrevendo a Administração Pública na legalidade.


2. O ESTADO SOCIAL

Com a consolidação do liberalismo político e a afirmação da soberania popular, houve uma reconceitualização dos modelos políticos dos Estados e novos referenciais foram surgindo no tempo. A mentalidade particularista, individualista e elitista foi diminuindo. O constitucionalismo social começou a surgir.

O liberalismo político havia resolvido sérios problemas, tais como a inexistência de garantias de direitos individuais e a instauração da representação política, fazendo com o patamar dos direitos subjetivos se realçasse, mas a esfera dos direitos sociais estava longe de se concretizar.

Foi somente no século XX que o constitucionalismo começou a formar sistemas jurídicos fundamentados na idéia de proteção dos direitos coletivos. Com o Estado Social surgiram os direitos coletivos, principalmente o direito do trabalho, e com este, se abriram largos passos para a diminuição das desigualdades sociais. A afirmação liberalista de que os direitos individuais tinham valor não era suficiente para resolver e sanar os problemas sociais. Era necessário um Estado ou uma Administração Pública intervencionista, que buscasse resolver os problemas sociais e gerir a organização político-administrativa do Estado com uma teleologia diferente da do direito liberal. Era necessário que o Estado deixasse de ser focado em uma ótica privatista-civilista, para analisar a ordem jurídica e o ordenamento político e jurídico com uma visão volvida ao direito público, ao reconhecimento de uma nova axiologia jurídico-constitucional.

É daí que surgiu a questão da interação entre os direitos privados e os direitos públicos, de forma a constitucionalizar os direitos sociais e publicizar toda uma série de interesses axiologicamente direcionados a melhoria das prestações sociais. O Estado Liberal não foi um estado interventor, até mesmo porque sua ótica individualista não permitia a coletivização dos interesses. Foi com o advento do constitucionalismo social que todos os direitos subjetivos passaram a ser direitos públicos subjetivos, e que a constitucionalização dos interesses privados mesclou os interesses do direito público com as próprias determinações ideológicas do Estado Social. A questão do interesse público, da ordem e da justiça social, da paz e da segurança nacional se realçaram, até mesmo em razão da 1ª e da 2ª guerra mundial. A respeito do direito social, diz José Afonso da Silva que:

A Revolução de 1848 já inscreve no texto de sua Constituição provisória o direito de trabalho. Depois, a Constituição do México de 1917 sistematiza, pela primeira vez [08], o conjunto de direitos econômicos e sociais do homem. Em seguida, a Revolução Soviética proclama a "Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado". E veio a Constituição de Weimar e consigna, ao lado dos direitos individuais, os direitos sociais e econômicos. Assim, numa forma transacional e de compromisso, as constituições contemporâneas, palmilhando a trilha da Constituição de Weimar, trazem sempre um capítulo sobre a ordem econômica e social, como elementos sócio-ideológicos, ao lado de uma declaração dos direitos individuais, como elementos limitativos do poder, e um conjunto de normas estruturadoras do Estado e de seus órgãos, como elementos orgânicos, entre outras normas formais ou de aplicabilidade e determinadoras da rigidez e defesa da constituição (normas de estabilização constitucional). (Silva, 1998, p. 181 e 182).

É com a Constituição do México de 1917 que adveio o constitucionalismo social, positivando direitos econômicos e sociais. Ele buscou romper com a miséria existente em vários países, inclusive na América Latina, de forma a remodelar a ideologia político-social, fundando normas programáticas. Nesse sentido, André Copetti diz que:

Cede assim o Estado liberal-burguês às exigências dos trabalhadores. Entrega os anéis para não perder os dedos, vendo-se forçado a conferir, constitucionalmente, direitos do trabalho, da previdência, da educação, a ditar o salário, a manipular a moeda, a intervir na economia como distribuidor, a comprar a produção, regular preços, combater o desemprego, proteger o trabalhador, controlar as profissões, enfim, passa a intervir na dinâmica socioeconômica da sociedade civil. (Copetti, 2000, p. 54).

Não se pode dizer que o Estado Liberal garantiu a concretização de todos os interesses da sociedade, pois que a miséria sempre existiu, assim como os abusos de poder; ele conseguiu limitar o poder administrativo e regulou politicamente os direitos subjetivos, mas a esfera das relações entre o governo e povo ainda era muito fraca e tênue, prevalecendo à tese de que cada um deveria resolver seus problemas e o que o governo nada teria a ver com esses. Ora, na medida em que sociologicamente se torna inadmissível a negação política dos deveres sociais de mútua assistência entre todos os cidadãos, o governo, como representante da sociedade, deveria agir para o povo, e não para si mesmo. Pois não seria possível haver coerência no sistema político enquanto o direito administrativo e as leis estivessem voltadas para os interesses dos governantes e não para os interesses sociais (ou dos governados). Sendo o Direito uma criação da cultura social, a sua teleologia política deve ser voltada para o interesse público.

A respeito do direito social, diz Anderson Lobatto:

O processo de constitucionalização dos direitos do homem seguiu a mudança de concepção do Estado de Direito que, partindo de uma compreensão estritamente liberal e individualista do homem, passou a compreende-lo a partir de seu contexto social, econômico e cultural. Trata-se justamente de uma mudança radical no papel do Estado na vida em sociedade que além de garantir os direitos de liberdade, passa a ser compreendido enquanto promotor do bem-estar social, permitindo a necessária correção das desigualdades econômicas e sociais. (LOBATO, Anderson Cavalcante. O reconhecimento e as garantias constitucionais dos direitos fundamentais. Revista dos Tribunais. n. 22, p. 142, jan.– março 1998).

Após esse constitucionalista afirma que "A idéia de Estado social parte da constatação de que a não intervenção do Estado nas relações particulares teria trazido uma desigualdade entre os indivíduos. Os mais fortes economicamente estariam sendo beneficiados em detrimento dos indivíduos menos favorecidos pelas relações econômicas". (LOBATO, Anderson Cavalcante. O reconhecimento e as garantias constitucionais dos direitos fundamentais. Revista dos Tribunais. n. 22, p. 144, jan.– março 1998).

O reconhecimento constitucional dos direitos sociais está na nossa atual Constituição, nos artigos 6 a 11, 170 a 192 e 192 a 232. (Silva, 1998, p. 183). A nossa constituição é liberal no artigo 5o, mas é social no artigo 6º. O artigo 6º da nossa atual Constituição diz que "São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e a infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição". O direito ao trabalho está nos artigos 7 a 11, e do artigo 170 ao 232 temos regulados todos os outros direitos sociais.

Os direitos sociais são, para José Afonso da Silva, "normas constitucionais sócio-ideológicas, as que consubstanciam os elementos ideológicos, de compromisso, de natureza econômica e social, nas constituições contemporâneas". (Silva, 1998, p. 183). Analisando as normas constitucionais sócio-ideológicas, notaremos que elas são programáticas, ou seja, tem programaticidade, pois são normas que determinam as políticas públicas e os fins sociais que o Estado almeja atingir, sendo então princípios programáticos sócio-ideológicos, pois que representam a ideologia social voltada na busca de finalidades comuns à ordem pública e ao princípio do interesse público.

O Liberalismo havia buscado a legalização dos interesses individuais, mas não havia sanado grande parte dos problemas sociais. Pois enquanto havia declarações internacionais de direitos e positivações em inúmeros países dos direitos individuais e das normas constitucionais limitativas, existia ainda muita pobreza e muita carência de recursos. O Estado não atacava mais a liberdade individual como no Absolutismo, e isso era uma garantia importante, mas, ao lado disso, ele era omisso, não realizava intervenções na Economia e não buscava auxiliar diretamente as pessoas.

A ideologia não explícita era de que o Estado estaria desvinculado do interesse público e se constituiria em uma mera máquina reprodutora de leis formais, sem sentimentos e aspirações. Seria indiferente a crise existente, pois se preocuparia somente com os interesses jurídico-formais da nação; dessa ideologia política, que tinha no seio principiológico uma indiferença política a dor moral dos povos, surgiram novas reviravoltas que modificaram a política liberal então vigente. Uma série de revoluções incitaram o governo a notar que a mera formalidade das leis não garante a equidade social, pois é a aplicabilidade ou a efetividade material da norma jurídica que pode assegurar isso. A 1ª guerra mundial, com suas crises humanitárias, não deixou de ser um estímulo ao desenvolvimento da solidariedade pela dor.

Era necessário agregar ou incorporar ao Estado Liberal novos elementos políticos, suprindo as suas lacunas, buscando a evolução dos modelos de Estado e a melhoria das condições sociais; no século XIX pode-se dizer que houveram uma série de revoluções que não deixaram de representar novas forças políticas atuando sobre o governo. Com o acréscimo progressivo das exigências sobre o Estado, com as críticas sucessivas a inexistência e a lacunosidade das práticas estatais necessárias e urgentes, o sistema político, para não entrar em outra crise política, posterior a revolução francesa, teve que se moldar às ideologias sociais.

A Administração Pública ficou vinculada a uma série de interesses sociais e desde então deve viver almejando a concretização dos ideais sociais. É evidente que não foram sanadas todas as mazelas sociais, mas houve uma atenuante as dores do povo, pois o Estado aos poucos foi intervindo na Economia e na sociedade, de forma a buscar auxiliar as pessoas. É evidente que a realidade social do Brasil está em construção e que estamos longe de assegurar as condições almejadas pelo Estado Social, mas temos, ao menos, tido o interesse de realizar esses ideais e certas políticas públicas tem auxiliado para que, aos poucos, a realidade socioeconômica melhore, em um processo lento e progressivo.

No Brasil, o constitucionalismo democrático se consolidou com a nossa atual Constituição Federal, que tem em seus fundamentos ontológicos a idéia de democracia. O princípio democrático foi implementado pelo Poder Constituinte e aceito pela sociedade como um novo ideal a ser atingido. É evidente que estamos em uma fase de construção política e social, e que a Constituição Federal de 1988 não implementou de forma absoluta a democracia, pois o regime democrático de governo pressupõe a aproximação entre a Política e a sociedade, e isso ainda está engatinhando no Brasil. A democracia é muito recente no Brasil, pois não faz muito tempo que o país viveu a ditadura militar. Com a instalação da democracia, pode-se dizer que surgiram muitos direitos e garantias políticas. O constitucionalismo atual no Brasil tende a se aprimorar a etapas cada vez mais aperfeiçoadas.


3. O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

O compromisso democrático, no Brasil, é decorrência da observância de que o constitucionalismo social era insuficiente para a realização do interesse público, pois não bastava somente que o governo se preocupasse com os problemas sociais, era vital que a sociedade pudesse interagir com o governo, influenciar a decisão política, para que o relacionamento mais íntimo entre o governo político e a sociedade pudesse tornar mais evidente ao Estado quais os anseios mais diretos da população. Em certo sentido, a democratização da sociedade pressupõe a valorização de interesses difusos transindividuais, além dos interesses metaindividuais do Estado Social. É nesse ponto que o princípio democrático tende a buscar que a sociedade influa no poder de forma a permitir que haja um relacionamento mais profundo e menos distante com a política.

Sobre o Estado Democrático de Direito, diz André Copetti que os direitos democráticos pressupõem uma intensa valorização do Poder Judiciário e do Ministério Público, no sentido de buscarem concretizar os valores democráticos (Copetti, 2000, p. 56). A seguir, também afirma esse penalista que

"Sucedeu-se com a formação dos modernos Estados constitucionais, que o direito positivo incorporou grande parte dos conteúdos ou valores de justiça elaborados pelo jusnaturalismo racionalista e ilustrado: o princípio da igualdade, o valor à pessoa humana, os direitos civis e políticos, e, também, todas as demais garantias penais e processuais de liberdade e certeza"... (Copetti, 2000, p. 57).

A nossa Constituição de 1988 estruturou a fundamentalidade de uma série de direitos subjetivos, coletivos, difusos, universais e naturais. O constitucionalismo de 1988 não deixou de representar a tutela de novos direitos, e de institucionalizar uma série de garantias ao cidadão. É dessa forma que o constitucionalismo democrático no Brasil abriu brechas para a instalação de uma série de novas garantias às pessoas, moldando no direito constitucional positivo a idéia de que não somente a organização política e administrativa do Estado deve ser consolidada, mas também a proteção de direitos subjetivos liberais e de ideologias políticas devem ser protegidas, ao mesmo tempo em que normas que protegem a Constituição devem ser respeitadas.

É dessa forma que os direitos humanos foram incorporados a nossa Constituição e cabe ao Poder Judiciário, de forma muito intensa, dentro do Estado Democrático, a consolidação da própria democracia, de forma a se tornar uma instituição política aberta aos interesses sociais e capaz de garantir os direitos fundamentais necessários a preservação do princípio da dignidade humana. Ao Poder Judiciário e ao Ministério Público compete também a preservação do interesse público, de forma a garantir que os ideais democráticos da nação possam ser preservados, mesmo contra o governo político, se este buscar viola-los, pois isso é o que a sociedade espera.

Uma outra alteração substancial dentro da lógica do Estado Democrático de Direito foram às novas idéias construídas pelos juristas para a complementação das teorias jurídicas do Liberalismo e do Estado Social. No Estado Liberal a Administração Pública já começava a sofrer certas restrições, mas somente dentro dos parâmetros legais, o que significa dizer que unicamente a lei poderia ser um critério legítimo para reter o poder; os assuntos que a lei não disciplinava representavam um espaço de liberdade quase que absoluta ao poder estatal, pois que o princípio da legalidade instituía a idéia de que somente a lei aprovada dentro de determinadas regras legislativas e com um quorum de votação determinado poderia ter a força política para funcionar com norma limitadora do Estado.

O Estado Democrático de Direito analisa o sistema jurídico de forma diferente que o Estado Liberal. Amplia o conteúdo do Direito e faz com que as leis sejam regidas por princípios, que devem ser respeitados pelo Judiciário, que não pode ficar adstrito a uma ótica meramente liberal, deve interpretar a Constituição com um enfoque democrático. O princípio do interesse público é vital. O Judiciário não deve mais ficar restrito somente a lides interindividuais, mas sim proteger interesses coletivos e difusos, transindividuais e metaindividuais. É necessário repensarmos a função do Poder Judiciário. Ele deve tutelar o interesse público nos casos em que for invocada a sua tutela, agindo imparcialmente, moldando seus fins e estruturas para fins democráticos, fazendo com que os interesses da sociedade não sejam violados.

O princípio democrático pressupõe responsabilidade política de todos os poderes com a sociedade. É necessário pensar que todos os poderes da República tem seus fins, e que estes devem ser buscados com o máximo de eficiência possível, sem permitir que omissões gerem prejuízos às pessoas. O sentido da hermenêutica principiológica é fazer com que se repense a amplitude e as possibilidades do Direito.


4.ESTUDOS JURISPRUDENCIAIS SOBRE O MÉRITO DO ATO ADMINISTRATIVO SEGUNDO O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL E O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Depois que foram brevemente avaliadas dentro de um panorama geral as características que formam o Estado Democrático de Direito no Brasil, é necessário iniciarmos os estudos jurisprudenciais sobre acórdãos do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Antes disso, porém, é necessário questionarmos o que é o mérito do ato administrativo.

Segundo a dogmática tradicional, o mérito do ato administrativo se constitui de critérios de conveniência, oportunidade e justiça. Muitos doutrinadores sustentam que o mérito do ato administrativo está inserido em uma zona de inquestionabilidade absoluta. Essa concepção criaria a incontestabilidade e inquestionabilidade do mérito do ato administrativo. Atualmente, porém, alguns doutrinadores tem submetido essa idéia a crítica. Humberto Ávila alega que não existe a supremacia do interesse público e que cada caso deve ser avaliado isoladamente para se averiguar se o interesse privado está ou não com a razão (ÁVILA, 1999, p. 99). Diz ele que "uma relação de prevalência só pode ser verificada, entretanto, diante do caso concreto". (Ávila, 1999, p. 108). Ele avalia que a proporcionalidade deve ser o meio para se averiguar esses casos concretos (Ávila, 1999, p. 113). Não haveria uma supremacia, definida como um valor inigualável, e por isso o interesse privado poderia se sobrepor ao público. É com base na idéia de supremacia do interesse público que se molda um dos fundamentos do mérito do ato administrativo. Passaremos, agora, a avaliar julgamento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul sobre essa questão. Segundo um julgamento do Tribunal de Justiça [09], disse o relator:

Quanto às demais alegações vertidas pelo autor, no sentido do mérito do ato punitivo, descabem sua apreciação pelo Judiciário, conquanto o procedimento adotado pelo requerido foi legal, tendo sido oportunizada a defesa e o contraditório, conforme as provas documentais acostadas aos autos, tendo, após a abertura do processo administrativo, sido citado o autor, ouvidas testemunhas e apresentada defesa pelo indiciado, e, somente após, imposta a pena disciplinar. Tal caminho observa a norma esculpida no art. 5º, inc. LV da CF/88.

Logo após há o voto, que contém as seguintes afirmações, reproduzindo Hely Lopez Meirellez (Direito Administrativo Brasileiro, 19ª. ed., p. 607).

Ao poder Judiciário é permitido perquirir todos os aspectos de legalidade e legitimidade para descobrir e pronunciar a nulidade do ato administrativo onde ela se encontre, e seja qual for o artifício que a encubra. O que não se permite ao judiciário e pronunciar-se sobre o mérito administrativo, ou seja, sobre a conveniência, oportunidade, eficiência e justiça do ato, porque, se assim agisse, estaria emitindo pronunciamento de administração, e não de jurisdição judicial. O mérito administrativo, relacionado-se como conveniências de governo ou com elementos técnicos, refoge do âmbito do poder Judiciário, cuja missão é de aferir a conformação do ato com a lei escrita, ou, na sua falta, com os princípios gerais do Direito [10].

Veja-se que inexiste comprovação de qualquer ilegalidade praticada pelo Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto, de modo que ao Poder resta impedido de alterar qualquer decisão tomada na esfera administrativa.

Note-se que o relator afirmou que o Judiciário não poderia se manifestar sobre o mérito do ato administrativo, composto de conveniência, oportunidade, eficiência e justiça, porque estaria realizando um pronunciamento de administração. Ele seguiu a idéia clássica de incontestabilidade do ato administrativo e disse que o Judiciário não poderia invadir a esfera de competências da Administração. Aqui ele considerou o princípio da separação dos poderes, e não a supremacia do interesse público, afirmando que não é da competência do Judiciário se imiscuir em questões que são originariamente atinentes a decisões do Município. Ele seguiu a idéia de que o Judiciário somente pode considerar a lei e os princípios, mas nunca poderia adentrar no mérito da decisão administrativa em si mesma. O Judiciário não poderia invadir esfera de competências do município. Outro acórdão [11], na ementa, diz que:

Não cabe controle judiciário do gabarito oficial da prova objetiva realizada em concurso público, porque constitui o mérito do ato administrativo, ainda vigorando, no sistema da Constituição, a separação dos poderes [12], e porque ao órgão judiciário não é dado estabelecer verdades científicas.

No voto, o relator diz que:

E assim porque o Judiciário não interfere ou interferiu no mérito administrativo. Trata-se tão-somente de verificar a legalidade do ato praticado pela Comissão de Concurso. Aliás, a prefacial suscitada já foi corretamente espancada pela origem.

O revisor afirma, citando outro desembargador, que:

Por tal motivo, o Sr. Desembargador José Maria Rosa Tesheiner escreveu artigo, sempre citado, no qual ele examina o problema, objeto de vivos debates, para concluir que não é possível o órgão judiciário adentrar neste tema e substituir o critério técnico escolhido pela banca pelo seu próprio. Permito-me transcrevê-lo (Poder Judiciário e concursos públicos, pp. 353/356, Ajuris/59, Porto Alegre, 1993):

O entendimento tradicional era no sentido de que não cabia, ao Judiciário, reexaminar o mérito dos atos administrativos e, pois, o conteúdo das questões propostas, apresentando-se, agora, o posicionamento contrário como novidade, modernidade e atualidade. O fundamento dessa posição de vanguarda é o princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário, atualmente expresso no art. 5º, XXXV, da Constituição da República. ‘A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de lesão a direito.

Outro acórdão [13], na ementa, diz que:

Não se mostra lícito [14] ao órgão judiciário controlar o mérito do ato administrativo. Assim, decidido pelo Conselho Estadual de Educação que certa escola não exibe condições para funcionar, indicando motivos congruentes, não há como reexaminar tal ato de meritis [15].

O voto do relator diz que: "O ato administrativo que se pretende anular está adequado, porque oriundo de autoridade competente, bem fundamentado e sem qualquer vício..". Analisando os acórdãos, notamos que os desembargadores estaduais tendem a considerar que o mérito do ato administrativo dentro de uma visão tradicional, seguindo Hely Lopez Meirellez, eis que consideram o princípio da separação dos poderes e da supremacia do interesse público como superiores ao princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, considerando que somente a legalidade e os princípios podem ser averiguados, mas não a oportunidade, a conveniência e justiça [16], que seriam, respectivamente, espaço decisório da Administração.

Avaliando agora um acórdão do Supremo Tribunal Federal [17], o relator diz que:

Também essa Corte já firmou o entendimento de que não cabe ao Poder Judiciário, no controle jurisdicional da legalidade, que é o compatível com ele, do concurso público, substituir-se [18] à banca examinadora nos critérios de correção de provas e de atribuição de notas a elas. (...) Pela mesma razão, ou seja, não se tratar de exame de legalidade, não compete ao Poder Judiciário examinar o conteúdo das questões formuladas [19] para, em face da interpretação dos temas que integram o programa do concurso, aferir, a seu critério, a compatibilidade ou não, deles, para anular as formulações que não ...

No voto, diz o relator que:

Por outro lado, em relação à violação do art. 5 º, XXXV, da Constituição Federal, não se possibilita ao Poder Judiciário, em matéria de concurso público o exame de critério subjetivos de avaliação, mas tão somente o que diga respeito à legalidade do procedimento [20].

Todos os acórdãos que citamos negaram provimento aos autores, impossibilitando o reexame pelo Poder Judiciário em razão do mérito do ato administrativo. A jurisprudência postulou uma série de teses, e destacaremos as principais:

1. O Judiciário não poderia realizar "pronunciamento de administração".

2. Prevalece na Constituição Federal de 1988 o princípio da separação de poderes.

3. O Judiciário somente pode avaliar a "conformação do ato com a lei escrita" e na ausência usar os princípios jurídicos. Somente é possível exame da legalidade do procedimento.

4. Não compete ao Judiciário avaliar o mérito do ato administrativo, logo não é lícito ou permitido que ele faça isso.

Concluímos que jurisprudência tende a considerar a tradicional concepção do mérito do ato administrativo, considerando que essa é uma área que o Judiciário não tem competência para julgar, eis que se ele o fizesse ele violaria o princípio da separação de poderes e agiria de forma a substituir a Administração Pública na sua função de decidir a conveniência, a oportunidade e justiça do ato administrativo.

4.1. A LEGITIMIDADE DO JUDICIÁRIO FRENTE À ADMINISTRAÇAO PÚBLICA

Depois de considerarmos a maneira como a jurisprudência considera o mérito do ato administrativo, dentro de uma visão tradicional, é necessário questionarmos criticamente quais são as repercussões sociais dessa postura. Qual é o efeito dessas decisões dos magistrados na sociedade? O Judiciário teria legitimidade suficiente para julgar o mérito do ato administrativo? Seria aceitável que ele se imiscuísse profundamente nas questões administrativas?

Devemos considerar que o Judiciário se considera legítimo para usar sua jurisdição somente em relação à lei no caso do mérito do ato administrativo. Ele não afirma que nada pode fazer, mas sim que pode fazer algo até um certo limite. Depois desse limite os magistrados não se julgam legítimos para avançar. A questão que então se coloca é: isso é benéfico ou prejudicial à sociedade?

O Judiciário se considera capaz de controlar os atos administrativos dentro de linhas genéricas, ou seja, havendo leis gerais e princípios constitucionais que manifestem expressamente a ilegalidade ou ilicitude do ato administrativo, é possível a atuação desse Poder, mas somente até ali. Havendo um procedimento formal correto, o Judiciário não se considera capaz de adentrar o espaço da discricionariedade administrativa, pois deixa um espaço considerável de liberdade a Administração Pública.

O mérito do ato administrativo é composto de três elementos:

1.Conveniência;

2.Oportunidade;

3.Justiça;

A conveniência é um poder que tem o governo de saber o que é ou não é bom ou útil ao interesse público e a própria Administração Pública. A oportunidade é a capacidade que tem o administrador de escolher o momento para a prática dos atos administrativos. A justiça seria uma idéia de que a caracterização do que é justo ou injusto ao governo cabe a ele mesmo decidir.

A questão que fica é esta: é possível uma recepção da teoria da não sindicabilidade judicial do mérito do ato administrativo no Estado Democrático de Direito? Dada a força normativa da Constituição e dos princípios constitucionais, como considerar que a conveniência de um ato administrativo possa estar imune ao controle judicial, como se o administrador fosse o "proprietário" do conceito de "conveniência", quando esta é vinculada ao interesse público? E os princípios da razoabilidade e da moralidade administrativa? O mesmo pode ser dito face à oportunidade e à justiça. Como impossibilitar um candidato de ter reexaminada a violação do seu direito pelo Judiciário – por exemplo, quanto ao gabarito de um concurso público – ferindo o acesso à Justiça, com base na teoria da indevassabilidade do mérito do ato administrativo? E se o administrador não achar conveniente anular uma resposta mal elaborada? Será que a garantia da inafastabilidade do controle jurisdicional não restaria ferida? Será que não atenta contra o princípio da igualdade em um concurso público um candidato ser prejudicado por uma questão mal formulada e não que não foi anulada administrativamente?

4.2.A NECESSÁRIA ADEQUAÇÃO DO CONTROLE JURISDICIONAL EXTERNO DO ATO ADMINISTRATIVO AO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

O Estado Liberal era um Estado Legislativo. O Estado Social focalizava suas óticas no Executivo, queria que ele tivesse políticas públicas diretas. O Estado Democrático se focaliza, diversamente, no Judiciário e no Ministério Público, como defensores dos interesses sociais dentro do século XXI (COPETTI, 2000, p. 56). Em outras palavras, o Judiciário do século XXI deve(ria) ser diferente do Judiciário do século XVIII, assim como os demais poderes. Não se deve conceber os três poderes da Federação brasileira com a ótica unicamente liberal ou social. Deveríamos considerar a filosofia política do Estado de forma a unificar esses três modelos políticos, harmoniza-los em um sistema e visualizar tudo com os olhos na civilização globalizada e tecnológica do século XXI.

Atualmente há uma série de fenômenos recentes e até então inéditos que surgiram dentro do nosso constitucionalismo brasileiro. Podemos citar exemplos: 1. a judicialização, jurisprudencialização e politização do Judiciário; 2. a jurisdição constitucional democrática; 3. um enfraquecimento dos postulados do Positivismo Jurídico; 4. o compromisso democrático; 5. a nova hermenêutica. É evidente que outras mudanças poderiam ser analisadas, mas no presente trabalho estas são as mais importantes.

O Judiciário de hoje em dia está muito mais inserido na política de governo. Não há mais aquela separação absoluta entre o Judiciário e os outros dois poderes que havia no modelo liberal, pelo princípio da separação de poderes. O compromisso democrático fez com que os magistrados sejam chamados na participação dos interesses públicos em jogo, rompendo com a idéia de que deveria haver um distanciamento e um julgamento meramente formal dos problemas políticos. O Estado Democrático invoca a atuação da jurisdição como um meio de influir democraticamente no interesse público. Não podemos ver a função dos juízes com uma ótica individualista.

O Judiciário do século XVIII teve a sua vivência em uma época em que não havia maior limite para o Estado que a Lei, em que o tradicionalismo político e o individualismo tendiam a separar formalmente o Judiciário dos outros dois poderes. Na França havia fortemente o princípio da separação dos poderes, de forma rígida, absoluta e inflexível. O Judiciário não poderia influir nas questões do governo, deveria se ater a lides interindividuais. Segundo a visão da época, ele não deveria se intrometer no governo e querer submetê-lo as suas opiniões, eis que então estaria invadindo o espaço de decisão governamental. Essa era a forma como se avaliava esse Poder. Passados mais de duzentos anos, porém, muitas construções teóricas surgiram, novas idéias se implantaram nos Estados, e o gérmem da democracia se expandiu e se consolidou no Brasil. Por isso mesmo deveria haver uma reconsideração do que significaram essas mudanças.

A filosofia política democrática, originária principalmente do movimento constitucionalista de 1988, busca um devir ou um dever-ser democrático para a nação, o engajamento no compromisso da democracia, inclusive pelo Judiciário, eis porque que a sua função política se modificou. Não que esse Poder ainda não esteja atento a legalidade, as lides interindividuais e a valorização da propriedade individual, como estava no Estado Liberal, mas há um plus, que significa toda uma nova hermenêutica jurídica e hoje há vários instrumentos jurídicos adequados à consolidação dos valores democráticos do interesse público. Pode-se dizer, então, que se considerarmos o Judiciário com a visão do passado, a nossa consciência hermenêutica do significado das teorias políticas estará em diacronia com as necessidades do nosso tempo.

Diz Leonel Ohlweiler que "A jurisdição constitucional, com efeito, sempre esteve ligada à própria idéia de constitucionalismo, o que demanda questionar o acontecer histórico desse movimento". (OHLWEILER, 2004, p. 290). Estudando a história do constitucionalismo estamos em busca da compreensão do que ele trouxe de alterações para a ideologia do Judiciário e para o que se espera hoje desse poder. A seguir diz esse administrativista:

Conforme será posto, uma das causas da dificuldade de entender a jurisdição constitucional, na atualidade, reside no atrelamento a alguns pressupostos tradicionais do Estado liberal-individualista e na in-capacidade de algumas construções ultrapassarem o pensamento objetificador, metafísico, calcado na lógica-formal do mundo dos enunciados (OHLWEILER, 2004, p. 301).

Disso notamos que há uma insuficiência teórica de capacidade de explicação da jurisdição constitucional dentro do modelo liberalista atualmente. A jurisdição liberal era distanciada do interesse público, era privatista. A idéia de interesses difusos não existia para o Judiciário do século XVIII.

O que devemos entender por jurisdição constitucional? Todo juiz de direito deve ser um juiz constitucional, pois atua em um Estado Constitucional de Direito. É incoerente negarmos que ele deve seguir o constitucionalismo, que aponta as orientações das leis e do Direito. Suas funções, estando relacionadas ao Estado, devem se vincular a Constituição. A respeito do tema, diz José Maurício Adeodato que "ao conjunto de interpretações, argumentações, decisões apreciadas pelo Poder Judiciário, em questões que envolvem os textos constitucionais, dá-se à denominação de jurisdição constitucional (ADEODATO, 2004, p. 170) ... Dentro do cenário brasileiro, havendo não somente o controle concentrado da constitucionalidade, mas também o controle difuso, qualquer juiz pode avaliar matéria constitucional e todos os magistrados são juízes constitucionais de direito. Nessa ótica, devemos considerar a importância que a Constituição deve representar para os magistrados.

Após consideramos esses aportes preliminares sobre a jurisdição constitucional e os movimentos constitucionalistas, nos ateremos na questão do mérito do ato administrativo, buscando relacionar a hermenêutica jurídica com a jurisdição constitucional democrática para que possamos compreender o significado da filosofia política que a mentalidade do constitucionalismo atual pretende concretizar.

Nesse sentido, segundo vimos na jurisprudência, o mérito do ato administrativo é visto pelos magistrados dentro de uma visão dogmática e tradicional, positivista e formalista. O Judiciário tende a sobressaltar o princípio da separação dos poderes para motivar suas decisões. O que significa esse princípio? Se considerarmos o constitucionalismo liberal, notaremos que nele há uma demarcação absoluta entre as competências do Judiciário e do governo; representando isso por uma analogia, poderíamos dizer que é como se o Estado fosse dividido em três terras ou terrenos, que representam seus poderes e competências, sendo que o Legislativo caberia a maior parcela de terras, o Executivo ficaria com a segunda maior parcela e o Judiciário ficaria com o que sobrasse. A atuação jurisdicional não era muito valorizada, até mesmo porque antes da Revolução Francesa os burgueses se revoltavam contra as decisões judiciais, que consideravam parciais. No Estado Liberal, o princípio da separação de poderes era sagrado, pois representava uma divisão de competências e fortalecia os interesses do governo.

Modernamente, porém, poderíamos reconsiderar a força desse princípio, dizendo que há mais flexibilidade nas relações dos 3 Poderes. Tendo o Judiciário assumido compromissos constitucionais com o interesse público, ele se aproximou mais do governo, que está nos pólos de muitas ações que dizem respeito a esse princípio, e por isso o Judiciário rompeu naturalmente as barreiras absolutas que separavam a competência dos três Poderes, pois, no Estado Democrático, ele já julgou muitas vezes contra os interesses do governo, ou seja, julgando questões administrativas, que no Estado Liberal ele não julgava. Logo, hoje o princípio da separação de poderes é fluido.

Não devemos dizer que há uma invasão de competências, em razão disso, pois os três poderes continuam atuando em suas funções, mas naturalmente, mas nos casos de ilicitude, ilegalidade ou inconstitucionalidade, e somente nesses casos, o Judiciário poderia rever decisões administrativas [21].

A respeito, José Luiz Bolzan de Morais e Walber de Moura Agra dizem que "O enquadramento das funções estatais dentro do esquema da rígida tripartição de poder não corresponde mais às necessidades das sociedades hodiernas, que devido a sua alta complexidade permite o afloramento das mais diversas necessidades (MORAIS, 2004, p. 226)." Logo após afirmam que:

A concepção tradicional dos poderes é utilizada como argumento contrário ao aumento da extensão da atuação da jurisdição constitucional e, conseqüentemente, da jurisprudencialização da Carta Magna, basicamente devido a dois de seus postulados: que todas as decisões judiciais devem ser proferidas dentro dos parâmetros legais e que a análise de questões, que envolvam elevado grau de discricionariedade são questões essencialmente políticas e, portanto, estão fora do alcance da apreciação pela jurisdição constitucional (MORAIS, 2004, p. 226).

Logo após, sustentam que:

A reestruturação do princípio da separação dos poderes, com a sua concepção de atuação da jurisdição constitucional e do Poder Judiciário, não pode ser concebida como um fator para restringir ou para expandir a jurisprudencialização da Constituição. Da mesma forma que não se pode outorgar à jurisdição constitucional à absoluta interpretação jurídica, chegando a ponto de prescindir do alicerce normativo, também não se pode vincular seu desenvolvimento a modelos ultrapassados que não mais atendem ao interesse da sociedade [22]. ...

Em vistas disso, deveríamos considerar que o princípio da separação de poderes não é legítimo para evitar o controle jurisdicional do mérito do ato administrativo, eis que nesse caso outro princípio se sobressai sobre ele, conforme o Leonel Ohlweiler:

Inclusive, o artigo 5º., XXXV, da CF, estaria a possibilitar uma atuação mais interventiva e transformadora por parte da jurisdição constitucional, na medida em que nenhuma lesão ou ameaça de lesão pode ser afastada do Poder Judiciário. Um dos grandes dogmas do direito administrativo [23] diz respeito à criação de uma zona de imunidade de controle, o chamado mérito do ato administrativo. Para que seja possível a construção de um regime administrativo desobjetificado, faz-se mister que o Poder Judiciário supere esse dogma, através do constante labor de suspensão dos pré-juízos liberais individualistas que impedem o desvelamento do autentico modo-de-ser-dogmático [24]. Aliás, esse trabalho, há algum tempo, já vem sendo defendido pela doutrina (Ohlweiler, 2004, p. 320).

Segundo esse doutrinador, deveríamos considerar que há pré-juízos dogmáticos que deveriam ser desvendados pela hermenêutica, de forma a manifestar as teses liberalistas que encobrem e que, analisadas de forma diacrônica, violam os ideais da democracia. A lesão ou ameaça de lesão a direito seria mais importante que o princípio da separação de poderes, até mesmo porque o princípio da separação de poderes é meramente formalista e, segundo a ontologia democrática, está reconceitualizado. O problema é que os magistrados tendem a considerar esse princípio sob os auspícios do Estado Liberal, como se não vivêssemos em um Estado Democrático de Direito. Eles ficam agarrados a teoria administrativa tradicional. Por que isso ocorre? Por que há essa dificuldade em romper e criar novas idéias?

Em grande parte, isso ocorre em razão de que a instalação de uma consciência democrática é muito recente, e os juristas ainda estão em um processo de assimilação do significado da democracia e das suas possibilidades. A democracia está em construção, está evoluindo e crescendo. Ainda não estamos acostumados com a novidade da democracia. Não estamos assim tão longe da Revolução Francesa. Pouco mais de 200 anos nos separam dela, o que significa que o Liberalismo está em construção há mais de 2 séculos, enquanto que o Estado Democrático, há pouco mais de 20 anos, o que é pouco. É por isso que é muito mais fácil se apegar na tradição, ela tem a força da História no seu seio; mas isso não quer dizer que não devamos estimular a mudança.

A sociedade se interessa muito mais pela proteção aos seus direitos pelo Judiciário do que pela separação de poderes. O Judiciário não vive no século XVIII. O interesse público democrático pressupõe a valorização de todos os direitos do homem e a possibilidade de investigação judicial de toda sorte de ilicitude. É isso o que as sociedades almejam. Segundo Leonel Ohleweiler:

É possível sustentar que a tarefa de compreensão do fenômeno jurídico-administrativo exige, por exemplo, a superação do paradigma liberal-individualista que tanto tem predominado no âmbito da atividade dos operadores jurídicos do Brasil, bem como, cada vez mais, construir um pensar não objetificador, melhor dizendo, aquele que supera o modo-de-ser metafísico e remete a pergunta originária para a questão do ser. (Ohlweiler, 2004, p. 286)

O princípio da separação de poderes, sendo o pilar fundamental da idéia de inquestionabilidade das decisões administrativas, no Estado Democrático de Direito deve ceder ao princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, do contraditório, da ampla defesa e de toda sorte de valores fundamentais da República Brasileira. O Judiciário deve investigar todas as profundezas dos atos administrativos na busca de ilicitudes. Havendo um processo administrativo que vise punir o cidadão, sendo retirado da inércia, o Judiciário tem o dever-poder de averiguar se há ou não violação de direitos.

A interpretação da filosofia política da Constituição no Estado Democrático de Direito deve ser a de que o Judiciário é um dos titulares principais da capacidade de controlar o poder administrativo e, já que de toda força política do Estado podem surgir abusos, os magistrados são o mais legítimo de todos os órgãos para apurar a violação ao Direito, eis que tem todo um instrumental processual e conhecimento jurídico para isso. Eles têm o dever de avaliar se há ou não lesão, eis que sua tarefa, atualmente, também está ligada ao interesse público. Não vivemos mais na era unicamente liberal. O Estado Democrático incorpora o Liberalismo, o Estado Social e a democracia.

É nesse sentido que incumbe ao Judiciário fiscalizar a atuação da Administração Pública e inclusive decidir o mérito do ato administrativo, negando a sua imunidade e sopesando os princípios constitucionais. A fiscalização jurisdicional deve notar a plena constitucionalidade do controle judicial dos atos administrativos em todos os seus aspectos. É evidente que a intervenção do Judiciário no exame do mérito do ato administrativo deve ser fundamentada e necessária, sem buscar se substituir ao administrador público. Mas se o Direito não é somente a lei, porque nele existe também a justiça e os princípios, então eles devem ser considerados diante do mérito do ato administrativo, e não somente a legalidade formal.


CONCLUSÃO

Somente com uma renovação consciencial dos valores dos operadores do Direito, inclusive dos juízes, será possível a reformulação axiológica dos valores políticos. Não podemos ficar presos à tradição. Apesar de jovem, a nossa Constituição é promissora e traz compromissos novos, que devemos seguir. O Direito não é algo estanque, ele muda no tempo. É necessário nos adequarmos as suas novas filosofias. É isso que espera a sociedade brasileira, uma reconversão dos nossos valores.

O Estado Democrático busca concretizar direitos que o Liberalismo não soube buscar. A postura omissiva do Judiciário não é mais aceita. Almejamos atuação e influencia no governo, de todas as formas. Não se quer mais juízes meramente procedimentalistas e sim uma jurisdição constitucionalmente voltada ao interesse público e aos direitos humanos. O Judiciário deve poder fiscalizar todos os detalhes dos atos administrativos, eis que a modernidade conferiu-lhe esses direitos, que ele pode e deve usar, apoiado por todas as construções hermenêuticas que vimos. A realização da justiça e dos direitos fundamentais passa também pela jurisdição.

O constitucionalismo democrático permite que, usando os princípios de direito, os magistrados possam ir ao cerne de todos os méritos (inclusive diante de regimentos internos do Congresso Nacional), em todas as áreas do Direito. Por que negar a força do progresso? Porque não reconhecer as novas filosofias do Estado Democrático de Direito? É nesse sentido que reforçamos a nossas teses de que uma jurisdição plena não é local para arbitrariedades, mas sim um meio de garantirmos a preservação dos direitos subjetivos e uma forma de contermos as lesões aos direitos. Democracia pressupõe solidariedade.

Só queremos que os juízes sintam esse sentimento em si mesmos e que, pela Constituição, sigam todos os rumos que considerarem necessários para preservarem a justiça, pois que este é um dos maiores fins do Poder Judiciário, e as luzes da modernidade são meios de fortalecimento das decisões judiciais, em prol dos direitos humanos e de um Estado volvido à proteção contra toda forma de abuso de poder ou excesso administrativo.

Tal é o sentido axiológico da democracia, como uma grande conquista social, capaz de gerar um Poder Judiciário mais próximo da sociedade e mais harmônico com todas as formas legítimas de interesses, buscando a valorização de todos os direitos que constituem o fundamento de dignidade da vida humana e os valores ideais que devemos preservar.

É necessária uma consciência histórica por parte dos magistrados quanto ao que significam a possibilidades da jurisdição constitucional em relação ao direito administrativo. Este artigo não teve como objetivo realizar uma depreciação das decisões judiciais, que merecem todo o nosso respeito. Conforme manifestamos, a jurisdição constitucional é vital para a concretização da democracia. O que buscamos foi demonstrar como o tradicionalismo influi nas sentenças judiciais. A jurisdição constitucional, no domínio da Política e das Leis, é uma das mais belas conquistas da racionalidade humana.

É compreensível e até mesmo natural que a compreensão do direito administrativo ainda esteja ligada à França revolucionária, pois pouco mais de dois séculos se passaram daquela época até hoje. Não queremos negar a esplêndida conquista da liberdade conquistada à força e o valor do Iluminismo. O que é vital é a idéia de que o Liberalismo e o Estado Social vivem no Estado Democrático, que não morreram ou pereceram, que estão tão vivos como nunca, e, para que o Estado evolua, são necessárias novas diretrizes em busca da maximização das garantias sociais.


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Notas

  1. O itálico é nosso.
  2. O neoliberalismo se molda como uma doutrina econômica e política que surgiu do liberalismo clássico o capitalismo do século XXI e por isso pretende que o Estado não intervenha nas relações econômicas do mercado, dando liberdade às empresas para que realizem uma livre competição; almeja liberdade comercial e desregulamentação do comércio, de forma a permitir que os sistemas econômicos atuem sem a intervenção da mão do Estado e que não tenham que se submeter aos seus critérios. Com relação a tal doutrina, surge a crítica que a intervenção do Estado deve ser regulada pelo princípio da proporcionalidade, oriundo do constitucionalismo alemão, ou seja, a intervenção do Estado é às vezes necessária para evitar a formação de cartéis e monopólios, pois que a legalização das relações jurídicas comerciais faz com que um maior controle seja feito e os abusos possam ser sanados. O livre jogo da Economia, porém, tenderia facilmente a monopolização do capital em torno das empresas de maior porte, pois que as pequenas não teriam força para competir, e por isso é necessário pensarmos que a intervenção do Estado é necessária, mas também não pode ser excessiva de forma a tolher as liberdades de negociação e troca.
  3. Podemos diferenciar liberdade formal e substancial da mesma forma que se diferencia democracia formal e substancial. A liberdade formal é a liberdade presente em uma declaração de direitos ou em uma Constituição, é um fim do Estado, que almeja cumpri-la; a liberdade substancial é a manifestação concreta dessa liberdade, baseada na relação prática entre os interesses presentes formalmente nas normas jurídicas e suas efetivas aplicações, de forma que é a efetividade de liberdade presente nas normas do Estado, e não a sua mera idealização ou positivação formal. (No mesmo sentido, COPETTI, André, 2000, p.54).
  4. O itálico é nosso.
  5. Se considerarmos que o clero e a nobreza tinham 30% das propriedades, mesmo constituindo 1/50 da população, notaremos que os outros 49/50 da população ficavam com os outros 7 % . Logo, o clero e a nobreza tinham quase 1/3 dos territórios, ou seja, quase 33% das propriedades, mesmo constituindo 1/50 da população (HISTÓRIA VIVA. Uma sociedade paralisada desde o ano mil. São Paulo: Duetto, n. 2, 2004).
  6. O itálico é nosso.
  7. É interessante notarmos que Locke e Rousseau concebiam a importância do Poder Legislativo, mas isso está ainda mais vivo em Locke. Rousseau parece focalizar sua atenção no interesse geral da sociedade e concebe a lei como meio de realizá-lo; Locke focaliza a própria lei como sendo representante a sociedade. Locke justifica as leis com base na idéia do estado de natureza, enquanto Rousseau invoca a própria soberania social, o "pacto social", para fundamentar suas teses.
  8. O itálico é nosso.
  9. BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Ação ordinária 7003917770. Laércio Foresti e Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto. Relator: Des. Vasco Della Giustina. 29 de maio de 2002. <http:// www.tj.rs.gov.br/>
  10. O itálico é nosso.
  11. BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível 70003943016. Marcelo Aquini Fernandes e FUNDATEC. Relator: Wellington Pacheco Barros. 8 de maio de 2002. <http:// www.tj.rs.gov.br/>
  12. O itálico é nosso.
  13. BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível 70003997426. Sociedade de Ensinos São Aprovados e Estado do Rio Grande do Sul. Relator: Araken de Assis. 8 de maio de 2002. <http:// www.tj.rs.gov.br/>
  14. O itálico é nosso.
  15. O itálico é nosso.
  16. É irrazoável que um Tribunal de Justiça se alegue incapaz de avaliar a justiça, eis que é a onde está a sua função, conforme diz seu próprio nome.
  17. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo regimental no agravo de instrumento 500. 416-5. Adelino Augusto Pinheiro Pires e Estado do Espírito Santo. Relator: Ministro Gilmar Mendes. 24 de agosto de 2002. <http:// www.stf.gov.br/>
  18. O itálico é nosso.
  19. O itálico é nosso.
  20. O itálico é nosso.
  21. Com isso queremos afirmar que as competências do três poderes existem e são diferentes funcionalmente, mas isso não quer dizer que eles sejam incomunicáveis entre si ou que não possam mutuamente se controlar em seus excessos. O Judiciário é muito mais legítimo para controlar excessos que o Legislativo, por exemplo, em razão do conhecimento do Direito que possuem os magistrados.
  22. Ibid. p. 228. O itálico é nosso.
  23. O itálico é nosso.
  24. O itálico é nosso.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARCELLOS, Logan Caldas. O controle jurisdicional do mérito do ato administrativo no Estado Democrático de Direito. Apontamentos para um Direito Administrativo contemporâneo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2753, 14 jan. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18275. Acesso em: 10 maio 2024.