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Os fundadores do Direito Internacional e a participação do ser humano nas relações internacionais

Os fundadores do Direito Internacional e a participação do ser humano nas relações internacionais

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Analisa-se o desenvolvimento do Direito Internacional, em especial suas formulações teóricas e as características de seus atores, observando o processo de emancipação do ser humano como sujeito de direitos do Direito Internacional dos Direitos Humanos.

Honeste vivere

Neminem laedere

Suum cuique tribuere

(Eneo Domitius Ulpianus)

RESUMO

O presente trabalho pretende analisar a forma como o Direito Internacional tem se desenvolvido ao longo da história, em especial com relação às suas formulações teóricas e às características de seus atores, no intuito de observar o processo de emancipação do ser humano como sujeito de direitos do Direito Internacional dos Direitos Humanos. Para isso, faz-se uma digressão histórica aos séculos XV e XVI, no sentido de abordar as principais teorias jusnaturalistas e, precipuamente, verificar os ideais preconizados pelos Fundadores do Direito Internacional. Os escritos dos espanhóis F. de Vitoria e F. Suárez, assim como a obra do holandês Hugo Grotius, serão fruto de especial análise, visto que, já em sua época, abordavam temas que ainda hoje são vistos como atuais. O estudo, na sequência, busca analisar a evolução da ciência jurídica internacional, observando o processo de criação e cristalização dos Estados Nacionais como os principais agentes do cenário internacional. Nesse ponto faz-se observância ao papel do positivismo jurídico na consolidação das soberanias estatais, ao passo que o ser humano passou a ser marginalizado do Direito Internacional de forma integral e absoluta. Finalmente, ao término desse trabalho, busca-se analisar a transformação do pensamento jurídico após as duas grandes Guerras Mundiais, observando a gradual flexibilização do pensamento positivista e da soberania ilimitada dos Estados, assim como a incipiente participação do ser humano no recém criado Direito Internacional dos Direitos Humanos. A partir de então, assim como defendido por parte da doutrina, haverá uma humanização do Direito Internacional, resgatando princípios basilares às teorias dos Fundadores do Direito Internacional e, de forma rudimentar, mas não menos importante, tentando recolocar o ser humano na posição que lhe foi negada e que lhe é devida: como fim último do Direito Internacional.

Palavras-chave: Direito Internacional, Fundadores do Direito Internacional, Positivismo Jurídico, Direitos Humanos, Sistemas Regionais de Proteção dos Direitos Humanos.

ABSTRACT

The present work intends to analyze the way how International Law has developed on the course of History, giving special attention to it’s theoretical formulations and characteristcs of the actors, while observing the emancipatory process of the human being as subject to International Law of Human Rights. To reach it, a historical digression is made until the fifteenth and sixteenth centuries in order to approach the mainstreaming theories of natural law and, most important, to verify the ideals preconceived by the Founders of International Law. The writings of the spanish F. de Vitoria and F. Suárez, just as the work of the dutch Hugo Grotius, shall be thoroughly investigated, seen that, in their time, actual themes were already studied. During the flow of this paper will be observed the enthronement of the national states as protagonists of the international scenario and the role of juridical positivism in it’s consolidation. On the other hand, during these very same events, the figure of the individual was fully ostracized. Finally, as to the conclusion of this research, the metamorphosis of the juridical mentality, positivistc thought and the states sovereignty after the World Wars is pondered. From that time on a humanization occurs: an incipient presence of the human being grows in the International Law of Human Rights, rescuing the Founders of the International Law’s basilar principles. The goal personified by this doctrinary movement is reposition the human being as the core of International Law.

Key-words: International Law, Founders of the International Law, Juridical Positivism, Human Rights, Regional Systems of Protection of Human Rights


1 INTRODUÇÃO

Este trabalho pretende estudar o desenvolvimento, ao longo da história, da participação dos seres humanos como sujeitos de direito do Direito Internacional dos Direitos Humanos. Além disso, no intuito de estabelecer bases teóricas sólidas, busca-se analisar os escritos daqueles teóricos, dentre eles Francisco de Vitoria, Francisco Suárez e Hugo Grotius, conhecidos como os Fundadores do Direito Internacional. Isso porque, como será visto, muitos dos temas atuais acerca do papel do ser humano na ciência jurídica internacional já eram estudados pelos antigos escritores, ainda no século XVI e XVII.

No primeiro capítulo, procura-se analisar as principais teorias que fundamentam o Direito Internacional, ou seja, verificar a fonte da obrigatoriedade e validade do direito segundo diversas perspectivas, dando maior importância àquelas teorias que já visavam no ser humano as características de sujeito de direitos. A importância de tal análise às relações internacionais se dá pelo fato de que, ao se buscar fundamentar a concepção de que o ser humano é parte do cenário internacional e deve ser visto como tal, a própria noção de relações internacionais é modificada. Um dos objetos de estudo mais relevantes na área são os próprios agentes que permeiam o sistema internacional e, a partir do momento em que se insere nesse sistema um novo agente, as relações internacionais se modificam como um todo.

No segundo capítulo, o estudo toma um caráter histórico, analisando o desenvolvimento do Direito Internacional ao longo dos séculos e o papel do Estado e do ser humano na ciência jurídica. Evidente que, como será analisado, os Estados foram e ainda são os atores mais relevantes do cenário internacional. Entretanto, e aí faz-se de suma importância o retorno aos escritos dos Fundadores do Direito Internacional como fundamento às mudanças no pensamento jurídico, o ser humano vem adquirindo, nas últimas décadas, uma importância e participação nunca antes vistas no Direito Internacional, em especial aquele especializado nos Direitos Humanos.

A partir desse ponto inicia-se o terceiro capítulo, verificando o momento histórico em que o ser humano começou a destacar-se no cenário internacional. A presente análise, para os fins já citados, toma como base de estudos os Sistemas Regionais de Proteção dos Direitos Humanos Europeu e Interamericano. Esses dois organismos, cada um com suas especificidades, são exemplos práticos à verificação de como o ser humano vem adquirindo personalidade jurídica frente ao Direito Internacional. Ainda que de forma limitada ou, em alguns casos, rudimentar, a capacitação processual do ser humano no Direito Internacional dos Direitos Humanos representa uma mudança na mentalidade jurídica, tendo sua devida importância enquanto objeto de estudo nas relações internacionais.


2 NOÇÕES FUNDAMENTAIS ACERCA DO DIREITO INTERNACIONAL

Este trabalho busca, ainda que de forma bastante concisa e não pragmática, analisar a maneira como o Direito Internacional Público tem se transformado, especialmente no que diz respeito à seara dos Direitos Humanos, de um Direito pautado no total voluntarismo dos Estados para um Direito que retoma antigos preceitos do Direito Natural com relação à posição que deve ser dada ao Ser Humano dentro desse corpo normativo.

Essa transformação que se pretende estudar, ainda que possua importantes implicações práticas, caracteriza-se por seu forte caráter teórico. Nesse sentido, entende-se aqui ser da maior importância, logo num primeiro momento, explicitar quais são essas correntes teóricas que tratam de fundamentar o Direito Internacional e que serão fruto de análise mais aprofundada ao longo do texto.

Ao dar-se início a qualquer análise acerca do Direito Internacional, deve-se, primeiramente, estabelecer alguns preceitos que nortearão o método e, principalmente, a visão a respeito do objeto de estudo. O Direito Internacional, assim como o Direito interno de qualquer Estado, está diretamente relacionado à sociedade e ao ambiente em que se situa. Destarte, não se pode pensar como prudente um estudo do Direito Internacional que não tenha como ponto de partida a análise dessa sociedade em que as normas jurídicas estejam situadas.

François Geny já assinalara que não se pode tomar uma posição perante o Direito sem antes termos tomado uma posição perante Deus, o Homem e o Universo [01]. Então, como já colocado, partindo da ideia de que para compreender um corpo jurídico deve-se entender a sociedade em que este se situa, é a sociedade internacional que se buscará estudar primeiro.

A concepção de que a sociedade, em sua essência, não se confunde com a noções conceitual do próprio Estado se mostra de extrema importância pelo fato de que, na sequência do trabalho, os teóricos estudados colocarão o ser humano em posição anterior e superior ao Estado. Essa visão será útil, em especial durante o século XX, para fundamentar o movimento jurídico crescente que busca recolocar o ser humano como figura central do Direito Internacional.

2.1 DA SOCIEDADE INTERNACIONAL

A sociedade, por mais primitiva que seja concebida, surge necessariamente das relações recíprocas entre os indivíduos. No âmbito internacional o conceito é o mesmo, motivo pelo qual deve-se considerar inadequada a fixação de uma determinada data para a criação da sociedade no meio internacional. A formação de coletividades de homens, por necessidade ou conveniência, torna-se o próprio precursor da sociedade internacional e, logo, do Direito Internacional, materializando o aforismo "ubi societas ibi jus" [02].

O próprio conceito de Estado [03] utilizado nos dias de hoje, largamente relacionado ao Direito Internacional Público, é pensado e desenvolvido posteriormente aos primeiros estudos acerca do Direito Internacional. Esse corpo normativo internacional define-se como o direito aplicável exatamente a essa sociedade internacional, claramente distinta da sociedade nacional, interna ou estatal [04]. Essa distinção pode ser colocada à prova na averiguação etimológica do termo Direito Internacional, ligado às relações puramente entre Estados. Entretanto, é pacífico o entendimento de que o termo continua a ser usado mais por observância à tradição do que à realidade já que a existência de novos atores no cenário internacional é incontestada.

A sociedade internacional atual tem nas características de seus próprios agentes o elemento que melhor a define. A pluralidade de sujeitos de direito que compõe o Direito Internacional moderno é uma faceta muito recente de sua história, de forma que, a partir do momento em que foi concebida, tinha tão-somente nos Estados os participantes efetivos do cenário internacional. Não obstante a atual pluralidade de que se falou, os Estados continuam possuidores da maior parte de influência e capacidade jurídica do Direito Internacional.

Porém, atentos aos problemas de caráter global que não podem ser resolvidos de forma autônoma pelos Estados, as Organizações Internacionais, órgãos criados e habitados pelos próprios Estados mas que, de forma relativamente autônoma, possuem personalidade jurídica própria no Direito Internacional [05], ganham a cada dia maior espaço e influência no jogo de poder mundial. Pode-se chamar de uma época de associacionismo internacional esta em que estamos vivendo e, assim como defendido por Celso D. de Albuquerque Mello, os Estados já compreenderam que existe uma série de problemas que não podem ser resolvidos por eles sem o auxílio dessas novas forças internacionais [06].

Outro agente que vem ganhando elevada importância no cenário internacional e que, com a centralidade dada aos Estados após a formação da sociedade europeia interestatal, vinha sendo excluído desse cenário é o próprio ser humano. A internacionalização dos direitos dos seres humanos e sua capacidade processual no âmbito externo serão fruto de análise mais aprofundada na sequência deste estudo.

Não se pode deixar de citar, ainda, haver uma gama de doutrinadores que negam a existência desta chamada sociedade internacional. Os argumentos utilizados por esses autores variam entre o campo prático e teórico. Adolf Lasson, escritor alemão da segunda metade do século XIX, caracterizado como um negador prático, diz que o Direito Internacional é uma simples relação de força já que, sendo o Estado um fim em si mesmo, não poderia haver qualquer normatização que pretenda ser-lhe superior. Dentre os negadores teóricos está Júlio Binder, defendendo em seu trabalho a ideia de que o Direito Internacional não existe pelo fato de não existir uma comunidade internacional. Os negadores teóricos, entretanto, não negam a existência de normas internacionais, mas sim o caráter jurídico dessas, conceituando-as diversas vezes como meramente morais [07].

Frente a esses conceitos surgem as seguintes considerações contrárias aos negadores do Direito Internacional: afirmar que exista um ambiente de guerra constante entre os Estados não necessariamente seria um fundamento para uma negação da sociedade internacional, assim como afirmar que não há autoridade superior a eles seria negar todo um desenvolvimento no sentido de integrações regionais e globais. Com relação à ideia de que o Estado é a forma mais elevada da vida social, seria uma enorme limitação da capacidade humana em superar os conceitos e ideais criadas por ela mesma no intuito de melhorar a vida em sociedade. [08]

Toma-se, neste estudo, como certa a afirmativa de que existe realmente uma sociedade internacional, dada a existência das mais variadas formas de relações entre os agentes internacionais. Outro fator importante é o fato desse trabalho não se limitar à figura dos Estados como únicos agentes do cenário internacional, mas sim, estudá-los como apenas mais um dos componentes de um emaranhado de relações de poder.

Entretanto, não obstante tomar-se como ponto de partida a existência dessa relação entre agentes internacionais, falta-nos discorrer a respeito dos diferentes entendimentos acerca dos fundamentos da sociedade internacional e, por consequência, do Direito Internacional, buscando a sua razão de ser. Esses fundamentos desenvolvidos pelos mais diversos pensadores dos últimos séculos serão da maior importância no momento em que se buscar discutir a validade de suas teorias no Direito atual, assim como a possível mudança de embasamento do Direito Internacional que vem ocorrendo nas últimas décadas.

2.2 FONTES E FUNDAMENTOS DO DIREITO INTERNACIONAL

A análise do fundamento do Direito Internacional, segundo obra de Celso D. de Albuquerque Mello, "consiste na investigação da justificação e legitimidade da norma jurídica internacional. O fundamento do Direito é de onde ele tira a sua obrigatoriedade" [09].

As teorias que buscaram fundamentar o direito internacional, excluídas aquelas antigas que não trazem elevado interesse para este estudo, podem ser divididas, segundo a generalidade de suas concepções, em dois grupos: a voluntarista e a objetivista.

As teorias Voluntaristas são aquelas que defendem estar na vontade dos Estados o fundamento do Direito Internacional, sendo que, para as teorias Objetivistas, existem normas e princípios que se encontram acima da vontade ilimitada dos Estados. No intuito de criar bases para discussões futuras com relação à validade e à vigência das teorias do Direito Internacional, faz-se necessária uma abordagem sistemática das teorias mais importantes constantes em cada uma das vertentes.

2.2.1 Teorias Voluntaristas

Georg Jellinek, escritor alemão da segunda metade do século XIX, foi quem deu a conceituação mais completa para a Teoria da Autolimitação. Segundo essa doutrina o Estado é dotado de soberania absoluta nas suas ações e em seu corpo normativo, não podendo encontrar-se sob o jugo de qualquer poder que pretenda ser superior a essa autonomia. Porém, condizentes com as conceituações de Estado de Direito, os Estados estariam submetidos e deveriam respeitar o direito estabelecido por eles próprios. Dessa forma, "o Direito Internacional se fundamentaria na autolimitação do Estado que não poderia se deslimitar. O Direito Internacional se fundamentaria na vontade estatal. [10]" Assim, como afirma Azevedo [11] em sua obra,

A vontade do Estado é direito, pois, a regra jurídica vale imperativamente para os súditos da comunidade estatal e não para o Estado. Sem qualquer objeção, com uma mudança de situação, o que é direito cessa de sê-lo. Divisando-se do alto do Estado sobre a realidade do direito, um nada jurídico que lhe é e permanece estranho, mas que ele impõe aos seus súditos, e que, para este, é um direito.

Nas palavras de Jellinek, "soberania, portanto, não significa ilimitação, mas unicamente faculdade de autodeterminação exclusiva, ou melhor, de autolimitação do poder do Estado, não obrigado de sua ordem jurídica, por qualquer poder estranho" [12].

Entretanto, a crítica a essa teoria é evidente. Partindo do pressuposto de que o Direito Internacional se fundamenta no princípio da autolimitação dos Estados e esses são absolutamente soberanos, não há como considerar que os Estados se mantenham acorrentados ainda que possuam as próprias chaves de sua libertação. A Teoria da Autolimitação estaria, então, fortemente caracterizada pela necessidade de princípios externos à vontade estatal que os mantivessem limitados em seu próprio direito. Mello, ao parafrasear Aguilar Navarro, coloca que "um Direito que só obriga a vontade do interessado não pode pretender ser considerado como tal" [13]. Verdross ainda critica essa teoria, assim como exposto em obra de Cunha e Pereira [14], dizendo que,

Ou a vontade do Estado é superior ao Direito Internacional, e seu fundamento, e então aquele Direito não vincula o Estado, ou o Direito Internacional funda-se numa ordem supra-estadual e a vontade do Estado está-lhe subordinada e não pode criá-lo.

Heinrich Triepel, famoso jurista alemão, em sua obra Volkerrecht und Landesrecht, datada do ano de 1889, foi quem conceituou e formulou a Teoria da Vontade Coletiva. Segundo essa visão, o Direito Internacional se fundamentaria na expressa vontade coletiva dos Estados, presentes tanto nos tratados-lei como nos costumes. A Vereinbarung (ato-união) é, na concepção de Triepel, "o meio de se entenderem vários titulares de poder", no sentido de que, para Binding, é "a fusão de vontades diferentes com um mesmo conteúdo". Destarte, existiria uma vontade coletiva independente e superior às vontades individuais, limitando a respectiva soberania dos Estados [15].

Assim como a teoria tratada anteriormente, a Teoria da Vontade Coletiva sofreu fortes críticas desde sua conceituação. A forma como estabelece a obrigatoriedade das normas frente aos Estados pela Vontade Coletiva expressa por eles próprios, essa teoria não se vê apta a responder ao porquê da efetividade do Direito Internacional frente aos Estados criados posteriormente às normas. Também os costumes estabelecidos anteriormente à criação do Estado não podem responder ao fundamento da obrigatoriedade do Direito Internacional. Como coloca Mello, o costume caracteriza-se por ser um "produto da vida social", sendo obrigatório a todos os Estados independentemente da sua vontade [16]. Outra objeção importante feita a teoria de Triepel é que a chamada Vontade Coletiva não pode ser demonstrada praticamente, dificultando a demonstração de que a vontade de um Estado é condizente com a coletiva.

A Teoria do Consentimento das Nações, adotada mormente pela doutrina Inglesa em William Edward Hall, influente escritor inglês da segunda metade do século XIX, e L. Oppenheim, escritor alemão do mesmo período, também tem como base, pelo fato de estar ligada às teorias voluntaristas, a vontade dos Estados. Porém, diferentemente da vontade coletiva de Triepel, para os teóricos ingleses a vontade que fundamenta o Direito Internacional é a vontade majoritária. Dessa forma o consentimento mútuo com relação a essa vontade estaria disposto nos tratados e costumes, expresso e tacitamente.

Assim como a Teoria da Vontade Coletiva, a teoria inglesa não dá conta de explicar as motivações obrigacionais ao cumprimento das normas e tratados ao Estados que, por serem novos no cenário internacional, não fizeram parte do consentimento com relação a maioria.

Outra teoria de grande importância ao estudo dos fundamentos do Direito Internacional é a Teoria dos Direitos Fundamentais do Estado. Essa teoria pós-Revolução Francesa busca raízes doutrinariamente em Hugo Grotius, escritor do século XVII, e Christian Wolff, escritor do século XVIII. Segundo essa concepção, por não haver sido criado um "Superestado", os Estados existentes no cenário internacional viveriam em um efetivo estado de natureza. Dessa forma, aos Estados seria aplicada a teoria dos direitos naturais do homem e, assim como a inspiração no ser humano, os Estados possuiriam determinados direitos "pelo simples fato de existirem" [17].

Existem posições opostas com relação ao posicionamento dessa teoria dentre as voluntaristas ou objetivistas. Apesar de ser conceituada por grande parte dos teóricos como parte das teorias pautadas na vontade dos Estados, alguns, dentre eles Celso D. de Albuquerque Mello, acreditam estar ela caracterizada como objetivista, dada a natureza de direitos inatos, ainda que aos Estados e não ao ser humano.

As críticas a essa teoria vão no sentido de que, atribuir determinados direitos aos Estados como inatos seria ligar-se tão-somente a um momento histórico, não podendo generalizá-lo como um fundamento do Direito Internacional de forma completa. Ainda no âmbito das críticas a essa teoria, o estado de natureza alegado pelos seus defensores nunca existiu e, caso existisse, levaria à guerra e não ao respeito aos direitos fundamentais. Diz ainda Celso D. de Albuquerque Mello [18] que

não negamos que existam direitos fundamentais dos Estados, o que sustentamos é que eles não podem dar ao Direito Internacional um fundamento estável, porque eles variam de acordo com a época histórica.

Dá-se aqui por esgotada a observação com relação às Teorias Voluntaristas que buscam dar fundamento e obrigatoriedade ao Direito Internacional. Apesar de desgastantes as apreciações sistemáticas de uma série de teorias acerca do tema, as futuras intervenções com relação às mudanças de visões sobre o Direito Internacional tornam, senão fundamentais, de grande valia um estudo prévio daquilo que se quer citar.

A sequência do estudo toma como objeto de análise as teorias objetivistas, ou seja, aquelas que defendem a existência de normas e princípios naturalmente superiores à vontade dos Estados.

2.2.2 Teorias Objetivistas

Após o breve estudo das Teorias Voluntaristas dá-se continuidade ao trabalho com a observação de uma linha de pensamento distinta, as Teorias Objetivistas. Essas, que veem como necessária a existência de um Direito acima da vontade dos Estados, apesar de terem sua aplicação bastante limitada ao longo da história, são de grande importância teórica e, hoje mais do que nunca, podem ganhar a importância que lhes é devida. Serão fruto de maior análise em passagens futuras deste trabalho a aplicação e validade de tais teorias, sendo necessária agora a verificação de seu conteúdo axiológico.

Hans Kelsen [19], brilhante jurista do século XX, foi quem sustentou a Teoria da Norma-Base como fundamento do Direito Internacional. Seu pensamento partia do princípio de que todo conhecimento conduz à unidade e, partindo dessa prerrogativa, Kelsen criou a teoria da pirâmide ou degraus das normas (do alemão, Stufenbautheorie). Segundo a teoria de Kelsen, a validade de uma norma encontra-se diretamente ligada aquela que lhe é diretamente superior, retirando desta seu fundamento e sua obrigatoriedade. Kelsen, então, aplica ao Direito Internacional, especialmente ao problema de suas relações com o Direito interno, os princípios fundamentais de sua Teoria Pura do Direito e "coloca o fundamento do Direito Internacional dentro de um sistema jurídico global, abrangendo aquele Direito e o Direito dos Estados" [20].

No topo dessa pirâmide, o autor trazia a "norma fundamental" (do alemão, Grudnorm). Essa norma tinha um caráter hipotético nos primeiros ensaios do autor acerca do tema, podendo ser qualquer norma, assim como colocado por Kelsen [21] em sua obra,

A norma fundamental de uma ordem jurídica ou moral positivas [...] não é positiva, mas meramente pensada, e isto significa uma norma fictícia, não o sentido de um real ato de vontade, mas sim de um ato meramente pensado.

Entretanto, num segundo momento de estudo e com a participação de outros autores, Kelsen modifica seu entendimento, afirmando que a norma fundamental que daria toda a sustentação e fundamento para o Direito Internacional seria a norma costumeira pacta sunt servanda, ou seja, a ideia de que os tratados devem ser cumpridos.

A própria teoria da pacta sunt servanda é posteriormente rejeitada por Kelsen, passando a considerar como o fundamento do Direito Internacional Público "uma norma que institua como fato gerador do Direito o costume constituído pela conduta recíproca dos Estados" [22].

Segundo Mello, essa teoria conduz a um círculo vicioso, no sentido de que essa norma-base necessitaria ter seu fundamento explicado. Entretanto, a crítica, segundo o mesmo autor, não se faz tão válida pelo fato de Kelsen não estar preocupado em explicar a formação do Direito mas sim o Direito já existente. Dessa forma, diz-se que a teoria de Kelsen encontra-se "a serviço da ordem estabelecida".

Apesar de Kelsen ter modificado sua teoria durante seu estudo e ter limitado em grande parte a validade da norma costumeira pacta sunt servanda, o teórico Anzilotti ainda credita a ela o fundamento do Direito Internacional. Não obstante concordar com parte do trabalho inicial de Kelsen, esse jurista não se encontra atrelado a teoria de pirâmide de normas do alemão.

Para o italiano, essa norma costumeira deve ser entendida como "absoluta e indemonstrável", servindo de critério para diferenciar as normas internacionais das demais. A critica que se faz à teoria segue na linha das críticas feita à teoria de Kelsen, já que ainda não se pode constatar o fundamento de obrigatoriedade dessa norma.

Apesar de Anzilotti relacionar a explicação do fundamento da pacta sunt servanda a outros campos do conhecimento, como por exemplo a ética, esta permanece afastada dos estudos jurídicos e, por consequência, não serve de base para a aceitação dos demais estudiosos.

Léon Duguit, professor de direito francês do início do século XX, e seus seguidores, especialmente Georges Scelle [23], são os principais defensores das chamadas Teorias Sociológicas. Segundo essa doutrina, fortemente baseada nos conceitos do sociólogo francês Émile Durkheim, o Direito é um produto direto do meio social em que está inserido. A partir daí, as necessidades que fazem com que o ser humano seja obrigado a viver em sociedade levam à criação de dois tipos de solidariedade: uma mecânica (relacionada à aproximação de interesses entre as pessoas que convivem num mesmo ambiente) e outra orgânica (relacionada à divisão do trabalho).

Segundo Duguit, é a partir dessas formas de solidariedade que surgem as normas sociais e, também a partir destas, o ser humano tem consciência daquilo que pode causar desordem social e daquilo que pode trazer desenvolvimento social, sendo compelido a não realizar as primeiras ações em favorecimento das que tragam vantagens no âmbito social. Segundo Cunha e Pereira, "essas regras se impõem pela sua necessidade, pois sem elas a vida social não seria possível" [24]. Uma norma moral poderia então transformar-se em norma jurídica caso os próprios indivíduos do âmbito social a considerassem relevante e, por conseguinte, a sanção imposta ao seu descumprimento fosse considerada justa.

Georges Scelle, professor da Universidade de Paris e, como dito, um dos seguidores do pensamento de Duguit, coloca ainda um fator biológico na discussão, sustentando a obrigatoriedade do Direito Internacional na necessidade deste para a sobrevivência do ser humano em sociedade. A partir desse escritor, a Teoria toma um caráter especialmente relacionado ao Direito Internacional. Cunha e Pereira afirmam que

Para Scelle, esta teoria aplica-se a toda espécie de sociedades. O Estado não é mais do que um anel na grande cadeia dos agrupamentos nascidos da solidariedade. É a sociedade mais fortemente integrada, mas não deixa de constituir uma sociedade de sociedades que se sobrepõe a outros grupos de indivíduos [25].

Facilmente perceptível é a crítica que se faz a tal teoria, no sentido de que, apesar de sustentar-se com uma série de elementos de Direito Natural, tenta fazer parte de uma justificação do Direito Internacional enquanto teoria positivista. Além disso, considera-se que as necessidades humanas vão muito além daquelas descritas nas diferentes solidariedades de Duguit e, assim como coloca o autor, os sentimentos de justiça buscados na percepção das pessoas seriam subjetivos demais e levariam a total relatividade.

Dá-se continuidade ao estudo das Teorias Objetivistas com a análise daquela que será de maior importância neste trabalho, a Teoria do Direito Natural. A percepção da existência de um direito superior ao Direito positivo dos Estados advém da mais remota Antiguidade.

Segundo alguns autores, o Direito Natural reflete os princípios da chamada recta ratio. Ainda na Roma antiga, Cícero formulou, segundo análise de Antônio Augusto Cançado Trindade, a mais célebre concepção da recta ratio, ainda que, segundo o mesmo autor, as raízes dessa conceituação remontem aos antigos gregos Platão [26] e Aristóteles e seus estudos acerca do conceito de orthos logos [27].

De acordo com o famoso estudioso romano, a recta ratio prescreve tudo aquilo que é bom e, no mesmo sentido de pensamento, a lex praeceptiva deve estar de acordo com a primeira. Destarte, afirma Antônio Augusto Cançado Trindade [28] que,

consoante os princípios da recta ratio, cada sujeito de Direito deve comportar-se com justiça, boa-fé e benevolência. São princípios cogentes que emanam da consciência humana, a afirmam a relação inelutável entre o Direito e a ética.

Cícero ainda defendia o caráter perene e inderrogável que a recta ratio deveria possuir, sendo válido para todas as nações, em todas as épocas. Pregava em seu De Legibus que não havia "nada mais destrutivo para os Estados, nada mais contrário à lei, nada menos civil e humano, que o uso da violência nos assuntos públicos". No mesmo sentido, trazia em seu também famoso De República a ideia de que, em um país que possua uma Constituição estabelecida, não existia nada tão contrário à justiça do que medidas de violência [29]. Essa mesma obra traz uma passagem que demonstra claramente o fundamento do pensamento de Cícero [30], ao defender o princípio de que

A razão reta, conforme à natureza, gravada em todos os corações, [é] imutável, eterna [...]. Não é uma lei em Roma e outra em Atenas, uma antes e outras depois, mas una, sempiterna e imutável, entre todos os povos e em todos os tempos.

Essa noção de justiça da recta ratio romana é tida como a própria base de pensamento do Direito Natural. Porém, foi somente na Idade Média que os ideais do Direito Natural encontraram possibilidade de maior estudo e difusão, mormente nos ensaios dos padres cristãos, como Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino. Segundo esse, a primeira das leis seria a lei eterna, emanada da razão divina. Em seguida viria a lei natural, ou seja, a lei eterna a partir da compreensão do ser humano, tendo como base sua própria razão e não qualquer tipo de "auxílio sobrenatural da revelação" [31].

Em sua Summa Theologiae, obra do século XIII, Tomás de Aquino, estudioso ligado à Igreja Católica, já analisava o conceito romano de jus gentium, sendo levado a declarar que este sequer necessitava da autoridade do legislador, sendo apreendido pela própria razão natural dos seres humanos. Dessa forma, o Direito não poderia visar à realização dos interesses de uns ou de outros, mas sim do bem comum, ou seja, a própria concepção antiga de recta ratio. Percebe-se claramente a vontade de Tomás de Aquino de caracterizar o Direito e, mais precisamente, os preceitos do jus gentium, como "universalmente válidos e [que] satisfaziam necessidades naturais da vida humana" [32].

Dessa forma, para Tomás de Aquino, o Direito Natural era um direito superior ao Direito positivo, devendo esse último estabelecer-se a partir das autoridades públicas sempre em conformidade com o primeiro, ou seja, em busca da realização do bem comum.

Santo Agostinho, que viveu de 354 a 430 d.C., foi bispo de Hispona e talvez o mais importante teórico cristão da Antiguidade, dá um caráter de revelação na interpretação da lei terrestre à luz da lei divina, diferentemente de Tomás de Aquino, que cultiva visão aristotélica do Direito Natural, creditando à razão humana a interpretação da lei divina. Este ainda prega o ideal de que a ordem vem da natureza. Entretanto, somente no século XVII, com a figura de Hugo Grotius, teórico de grande relevância ao estudo do Direito Internacional e considerado por muitos como o pai deste ramo da ciência jurídica, haveria a laicização do Direito Natural, fundamentando a lei moral simplesmente na razão autônoma do ser humano.

Ao final da análise de tantas teorias, cada uma com diferentes pressupostos e fundamentos, verifica-se que nenhuma delas é capaz de saciar por completo a necessidade de fundamentação do próprio Direito Internacional. Se as Teorias Voluntaristas pecam por faltar-lhes normas superiores a simples vontade dos Estados, às Teorias Objetivistas falta uma clara justificação da origem das normas superiores ao Direito positivo.

Ao justificar seu posicionamento favorável com relação às Teorias Objetivistas e, lembrando que, o Direito tem como objetivo maior fazer reinar a ordem e a justiça, Celso D. de Albuquerque Mello [33] utiliza-se do seguinte escrito, originalmente criado por Delbez, para afirmar que

O fundamento assim dado (ao Direito) tem um tríplice caráter. Ele é objetivo, porque o bem comum da ordem internacional existe em si e não depende das vontades subjetivas dos Estados. Ele é racional, porque é a razão que o concebe. Ele é transcendente, porque visando a assegurar o bem geral da sociedade interestatal, ele é superior aos Estados que perseguem o seu bem particular.

Faz-se necessário ainda lembrar que, como brilhantemente colocado pelo mesmo escritor, o Direito Natural e o Direito Positivo não se opõe, mas o primeiro se concretiza no segundo.

Tendo como ponto de partida os ideais criados pelo Direito Natural, uma série de pensadores conhecidos como Fundadores do Direito Internacional, destacando-se entre eles a figura do holandês Hugo Grotius, passaram a escrever acerca das fontes e fundamentos de onde o Direito Internacional deveria tirar sua essência e obrigatoriedade. As concepções desse grupo de estudiosos são de grande relevância neste estudo por fazerem parte da já citada transformação que possivelmente vem sofrendo o Direito Internacional, de forma que, em momentos futuros, tentará estabelecer-se aqui um cenário a respeito da contribuição de seu pensamento no Direito Internacional contemporâneo.

2.3 FUNDADORES DO DIREITO INTERNACIONAL

A denominação "Fundadores do Direito Internacional" deriva de uma obra francesa organizada por Antoine Pillet chamada Les Fondateurs de Droit International [34]. Datada do ano de 1904, neste livro foram publicados os trabalhos de uma série de pensadores, dentre esses alguns dos mais importantes para o desenvolvimento do Direito Internacional, e que ficaram conhecidos como "clássicos" desse ramo do Direito. Esses escritos buscam, em grande medida, reformular o conceito romano de jus gentium, inicialmente pensado como um Direito que deveria abarcar as relações entre o povo romano e os estrangeiros, além das relações desses entre si. Entretanto, segundo assinala a Cunha e Pereira [35],

Com a concessão, por Caracala, da cidadania romana a todos os habitantes livres do Império, o conceito de jus gentium evoluiu, passando a ser considerado uma espécie de Direito natural comum a todos os povos.

A participação dos Fundadores do Direito Internacional na evolução do conceito de jus gentium é inegável, mormente nas figuras de Francisco de Vitoria, Francisco de Suárez, Hugo Grotius, dentre outros. Aquele que viria a ser chamado de um novo jus gentium dos séculos XVI e XVII, assim como defende A. A. Cançado Trindade, passou a "ser associado com a própria humanidade, empenhado em assegurar sua unidade e a satisfação de suas necessidades e aspirações, em conformidade com uma concepção essencialmente universalista" [36].

Francisco de Vitoria [37], escritor espanhol do século XVI, partia do pressuposto de que a sociedade internacional é "orgânica e solidária" [38] e, por conseguinte, de que os Estados existentes na sociedade internacional possuem sua soberania limitada por um direito superior a sua vontade. F. de Vitoria foi um dos precursores dos conceitos de liberdade dos mares, assim como um dos teóricos que estudaram as concepções de guerra justa e a validade das intervenções humanitárias. Foi ainda o criador da expressão inter gentes, ao substituir a palavra homines por gentes no conceito de jus gentium trazido pelas Institutas de Justiniano, completamente embasado nos preceitos romanos.

O conceito de jus communicationis, também obra dos trabalhos de F. de Vitoria, apesar de datar do século XVI, já foi concebido como um direito para todos os seres humanos. Visava a defesa do direito de imigração, colocando, ainda que de forma primitiva, a participação dos povos e indivíduos como agentes internacionais, excluindo a ideia do Estado como exclusivo participante do cenário internacional. Segundo estudos do brilhante professor Antônio Augusto Cançado Trindade [39],

Desde então se admitiu o aprimoramento do jus gentium na medida em que o sentimento ou noção de uma humanidade comum a todos se desenvolvesse em todas as nações. As raízes do que já se afigurava como o direito comum da humanidade podiam identificar-se nesta considerável evolução do jus gentium.

Em sua obra Relecciones Teológicas, F. de Vitoria contribuiu ainda em larga escala na evolução dos conceitos de Estado de Direito, alertando ao caráter de obrigatoriedade do ordenamento jurídico frente a todos, tanto governados como governantes, assim como a primazia dos interesses da comunidade internacional sobre os caprichos de um Estado individual. Segundo ele, a comunidade internacional é concebida por seres humanos organizados em Estados, não obstante não excluir a própria humanidade dos indivíduos. Defendia, já no século XVI, a necessidade de reparação dos danos aos Direitos Humanos causados por um Estado em conformidade com os preceitos de justiça da recta ratio.

De acordo com a concepção de F. de Vitoria, a comunidade internacional, composta por Estados soberanos, possui uma existência necessária e, sendo uma comunidade de homens, também será uma comunidade jurídica. Por consequência disso, faz-se necessária a existência de um Direito que vise regular tal comunidade [40]. Truyol y Serra [41] reafirma o posicionamento do autor espanhol ao relembrar seus ensinamento no sentido de que

A comunidade internacional é assim o resultado da sociabilidade natural do homem, com alcance universal. O seu vínculo é o jus gentium, o Direito das Gentes, direito que Vitoria concebe num duplo sentido: por um lado, como Direito universal do gênero humano, na tradição romana; por outro, como Direito dos povos como tais nas suas relações recíprocas.

Assim, em um cenário internacional fortemente caracterizado pela pluralidade de agentes e visões culturais, o direito não poderia derivar da vontade de seus sujeitos, senão de uma lex praeceptiva [42]. A partir daí trabalha-se com a ideia de uma societas gentium, ou seja, uma "expressão da unidade fundamental da humanidade" [43]. O jus gentium pensado por F. de Vitoria garantiria então um jus necessarium, e não mais um simples jus voluntarium, confundindo-o por completo com a figura do Direito Natural.

Toda a construção de seu pensamento com relação ao fundamento do Direito Natural pautado na recta ratio, e não na vontade, assim como os ideais de bem comum seguidos pelo Direito encontram-se também na clássica obra do mesmo autor entitulada De Lege. Entretanto, foi somente em sua Relectio De Indis Prior que F. de Vitoria conceitua seu jus gentium totalmente liberto dos preceitos originais de Direito Privado trazidos da antiga Roma. A concepção final do autor busca estabelecer um Direito humanista, universalista, ciente das liberdades dos Estados e dos indivíduos e, mais do que nunca, pautado nos mais preciosos princípios de Direito Natural e da recta ratio.

Já no início do século XVII, surgiu a figura de Francisco de Suárez, teórico jesuíta que iria utilizar-se de muitos dos conceitos de F. de Vitoria ao escrever sua obra De Legibus ac Deo Legislatore [44]. Segundo a concepção de F. de Suárez, notadamente influenciada pelo seu conterrâneo espanhol do século anterior, os Estados, por fazerem parte da sociedade internacional, têm necessidade de um Direito que os regule. Dessa maneira, o jus gentium seria um conglomerado de costumes comuns à humanidade. Essa concepção pode ser perfeitamente retratada a partir de um trecho da obra do prof. Antônio Augusto Cançado Trindade [45], ao lecionar que

Na visão de Suárez, os preceitos do jus gentium encontram-se imbuídos de equidade e justiça; o jus gentium se afigura em completa harmonia com o direito natural, de onde emanam suas normas, revelando, um e outro, o mesmo caráter verdadeiramente universal.

Entretanto, a obra de F. de Suárez distingue-se daquela de seu sucessor em um importante aspecto: não mais confundir o Direito Natural diretamente com o jus gentium. De acordo com sua obra, o Direito Natural é fundamental e goza de imutabilidade, ao contrário do jus gentium que possui caráter evolutivo e contingente [46], apesar de estar necessariamente de acordo com o primeiro. Segundo o próprio pensamento de Suárez [47],

Embora um Estado - monarquia ou república - seja por natureza uma comunidade autárquica e seja dotado de seus próprios elementos constitutivos, qualquer um desses Estados é, no entanto, também em certo sentido e em relação à espécie humana, um integrante dessa comunidade universal, porque, considerados isoladamente, jamais gozam de uma autonomia tão absoluta que não precisem de alguma ajuda, associação ou intercâmbio, às vezes para seu bem-estar, progresso e desenvolvimento, e às vezes por verdadeira necessidade moral e falta de meios, como demonstra a própria experiência.

As clássicas obras dos espanhóis F. de Vitoria e F. de Suárez são consideradas como as bases de um Direito Internacional comum a toda humanidade e, a partir de seus conceitos e ideias principais, especialmente relativos ao segundo, Hugo Grotius [48], pensador do início do século XVII, vê um caminho sólido para traçar seus próprios ideais com relação à matéria jurídica. Os escritos do teórico holandês seriam de tamanha importância que, segundo Nussbaum, trata-se do início da moderna doutrina do Direito Internacional [49].

A concepção de jus gentium de Grotius pode ser vista como uma contribuição imensurável aos estudiosos do Direito Internacional que acreditam na possibilidade de uma maior justiça no cenário internacional, especialmente com relação à participação do ser humano, ponto fulcral desta análise. Alguns não veem na obra de Grotius grandes inovações, mas sim sistematizações de trabalhos anteriores, especialmente dos espanhóis F. de Vitoria e F. de Suárez. Entretanto, ao buscar laicizar o Direito Natural, retira-o do âmbito religioso e coloca-o diretamente ligado à moral e à consciência humana. Graças aos seus esforços, o Direito Natural passa a caracterizar-se como um Direito ligado a razão.

No ano de 1625, em sua obra De Jure Belli ac Pacis, Grotius cria a concepção de que o Estado não deve ser visto como um fim em si mesmo, mas sim "um meio para assegurar o ordenamento social consoante a inteligência humana" [50]. Já nessa obra Grotius busca sustentar a possibilidade de os indivíduos reclamarem seus direitos vis-à-vis o Estado, não havendo, dessa maneira, uma sujeição absoluta do ser humano com relação à instituição estatal.

Grotius defendia ainda a incompatibilidade entre a existência de uma sociedade internacional e o funcionamento desta a partir do completo voluntarismo dos Estados. Extrai-se dessa afirmativa a noção de que o ser humano deve ser colocado em posição central nas relações internacionais, ao contrário da concepção de centralidade estatal. Entretanto, assim como outros escritores fizeram, Grotius não negara a existência de um direito positivo emanado dos Estados; seu entendimento era de que este deveria estar em compatibilidade com relação ao jus gentium. Para Grotius, a lei natural fornecia as bases para uma lei das nações, uma lei na qual "poucos tocaram, e da qual até agora ninguém tratou em termos universais e metódicos, embora seja do interesse da humanidade que se faça isso" [51].

Exatamente pela tentativa de limitar a soberania dos Estados a partir de um Direito superior ao mero voluntarismo, Grotius e os demais pensadores que com ele dividem a concepção de Direito Natural são considerados os fundadores do Direito Internacional.

Entretanto, assim como colocado por vários autores, embora os ideais do Direito Natural tenham correspondido ao espírito racionalista de uma época, este "não resistiu à prova da vida internacional" [52]. Apesar de terem contribuído em larga escala para a criação de um Direito supra-estatal, pouca influência tiveram esses pensadores na elaboração do arcabouço normativo internacional, relegando aos Estados completa e ilimitada soberania.

Assim como coloca o prof. Cançado Trindade, as reflexões dos pensadores do Direito Natural "vieram a ser suplantadas pela emergência do positivismo jurídico, que personificou o Estado dotando-o de vontade própria, reduzindo os direitos dos seres humanos aos que o Estado a estes concedia" [53].

As implicações no cenário internacional ao abandono dos preceitos de Direito Natural e à formação de um Direito Internacional pautado no total voluntarismo dos Estados são o objeto de algumas análises deste estudo. Objetivando galgar alguma luz após a escuridão de séculos de guerras e infrações aos direitos humanos, torna-se necessário observar a forma como o Direito Internacional se estabeleceu durante os últimos séculos e a influência do positivismo jurídico.

Para isso, faz-se imprescindível retornar à época em que o Direito Internacional era ainda um obscuro e incipiente campo de estudo. As discussões acerca do momento exato do "nascimento" do Direito Internacional são acirradas. Há aqueles que o colocam juntamente com o nascimento dos Estados modernos europeus, num período já avançado da história humana (meados do século XVI), mormente pelo fato de que estes seriam os agentes de maior relevância no desenvolvimento da ciência jurídica internacional.

Entretanto, há uma corrente diferenciada de estudo, abraçado por esse trabalho como a mais válida, preocupada em pontuar historicamente o Direito Internacional num período muito anterior ao nascimento dos Estados modernos. Assim sendo, é com base nesse modelo de análise que se partirá para entender os importantes traços históricos do Direito Internacional. Assim como lecionado ao mundo por Michelet, "aquele que quiser confinar-se ao presente, ao atual, não compreenderá o atual" [54].


3 ANÁLISE HISTÓRICA DO DIREITO INTERNACIONAL

Após o necessário aprofundamento com relação às mais importantes Teorias sobre o fundamento do Direito Internacional, tem-se como objetivo aqui expor ao leitor a forma como o Direito Internacional foi criado e desenvolvido ao longo da história. Assim como colocado no fim do primeiro capítulo, pode-se observar ao longo dos últimos séculos, especialmente após o desenvolvimento do Estado moderno europeu, a falta de efetividade e aplicação dos ideais pregados pelos chamados Fundadores do Direito Internacional.

Com essas considerações feitas, abre-se uma lacuna com relação às teorias que tiveram seus conceitos realmente aplicados ao longo do desenvolvimento do Direito Internacional e, a partir desse ponto, dá-se início a esse segundo capítulo. Realizando uma importante digressão histórica, buscar-se-á aqui observar a forma como os diferentes agentes internacionais comportaram-se uns com relação aos outros no desenrolar da história, mormente a história europeia. Essa caracterização da forma como se conceberam as Relações Internacionais nos últimos tempos possibilita a verificação de quais pensadores tiveram suas ideias de fundamentação do Direito Internacional comprovadas no confronto com a realidade.

A estudo das teorias e dos fatos históricos concernentes ao Direito Internacional de forma conjunta se fazem da maior importância, visto que ambos são um produto da realidade social e histórica, não estando desatrelados pelo fato de serem criação e consequência dos mesmos agentes. Assim como defende Juan Antonio Carrillo Salcedo [55] no início de sua obra,

A interpretação histórica do Direito Internacional deve-se fazer desde uma pluralidade de planos, em que se tenham em conta ao mesmo tempo os feitos, as normas, os valores e a reflexão doutrinal. Procurou-se que este planos distintos estejam presentes de modo equilibrado, sem que nenhum deles fique hipertrofiado ou, ao contrário, marginalizado. (tradução nossa).

Como rapidamente citado no capítulo anterior, há divergências com relação ao posicionamento do nascimento do Direito Internacional na história. Pode-se dizer que a maioria dos estudiosos do Direito Internacional o considera como posterior à Antiguidade, inexistindo no seio desta. Alguns dos primeiros a estudar a história da ciência jurídica internacional, como Henry Wheaton, diplomata norte-americano que viveu principalmente durante a primeira metade do século XIX, deram início a suas análises no período posterior à Paz de Vestfália, considerando o período anterior apenas em caráter introdutório. Louis Le Fur [56] é outro desses historiadores ao defender que o Direito Internacional tem suas raízes no cristianismo, condizente com a noção de igualdade entre os homens, posteriormente transcendida à ideia de igualdade entre Estados [57].

Também já citado, o posicionamento deste trabalho com relação a esse embate teórico dá-se no sentido do Direito Internacional ser anterior aos Estados, ainda que estes venham a tornar-se mais tarde o mais relevante agente internacional. Segundo Mello, os primeiros autores a seguir essa linha de pensamento foram o Barão Sérgio A. Korff e Paul Vinogradoff, consagrado historiador russo nascido em 1854. O primeiro considerava um erro estudar o Direito Internacional tão-somente a partir de já avançada história mundial, visto que os povos antigos mantinham constantes relações entre si, utilizando-se de institutos de arbitragem e imunidades diplomáticas. Dizia ainda em sua obra que "o Direito Internacional é uma consequência necessária de toda civilização" [58]. Vinogradoff considera em sua obra que, ao estudar a história do Direito Internacional, deve-se ter em mente as "formas de organização social", como as Cidades gregas e o jus gentium.

Posicionando seu trabalho no sentido de que haveria um Direito Internacional na Antiguidade, Mello diz que não se pode negar a existência de um Direito Internacional antigo simplesmente pelo fato de esse ser distinto do existente modernamente. Para o autor, a ciência jurídica internacional regula as relações entre coletividades independentes, considerando que, já que essas existiram na Antiguidade e mantiveram constantes relações entre si, também existiu um Direito Internacional [59].

Essa coexistência de grupos sociais antigos e a verificação de que por certo havia meios de regulação de suas mais distintas relações levam à concordância de grandes autores modernos de que existiu um Direito Internacional pré-civilização moderna. Quoc Dinh, Daillier e Pellet [60] trazem em sua obra esclarecedora passagem a respeito do posicionamento tomado por este trabalho, data venia, frente às divergentes opiniões, lecionando que

Contudo, o direito internacional deve considerar-se, antes de mais, como um direito intersocial ou intergrupal. Quando se aplica aos Estados, rege-os, não enquanto tais, mas enquanto sociedades políticas distintas e independentes. Ora, não sendo Estados, tais sociedades políticas já existiam na Antiguidade e na Idade Média. Assim, o direito internacional encontra efectivamente no meio social da Antiguidade e Idade Média as condições mínimas necessária ao seu nascimento.

Dessa forma, segundo pensamento dos mesmos autores, se a Europa foi a principal responsável pela consolidação do Estado como agente central do Direito Internacional, foi também no seio de seu território e população que, séculos antes, nascia o pensamento greco-romano, consolidado como grande influência dos futuros desenvolvimentos da ciência jurídica. Carrillo Salcedo [61] brinda o pensamento histórico com a seguinte passagem, a qual se toma aqui, no intuito de unir forças ao empreendimento de compreender séculos de história em tão poucas páginas:

[...] É que, em grande parte, somos o passado, na medida em que nos levantamos sobre o sedimento de formas de vida que ficaram atrás de nós, de formas culturais que outros homens foram ensaiando em distintas etapas históricas. O que importa, por consequência, é uma perspectiva a fim de ver e observar a distância o Direito Internacional para poder apreciá-lo em seu verdadeiro valor (tradução nossa).

Ainda que de forma bastante breve, o início dessa análise histórica deve então acompanhar, com a devida vênia, o entendimento mais adequado com relação ao início do Direito Internacional, ou seja, anterior aos Estados. Já na Antiguidade se pode notar a existência de determinados traços que lembram institutos em uso ainda nos dias atuais, como se verá na sequência.

3.1 A ANTIGUIDADE

Ainda que não tenha havido evoluídos sistemas jurídicos internacionais já na Antiguidade, negá-los em virtude de seu caráter rudimentar seria tomar uma posição demasiado negativa [62]. De fato, havia uma tendência ao isolamento durante a Antiguidade, assim como uma latente estado de guerra entre as diferentes civilizações. A caracterização do desconhecido como "bárbaro" nos dá uma ideia da forma como os povos da Antiguidade enxergavam seus contemporâneos: povos passíveis de luta por conquistas.

O forte caráter religioso dado ao Direito da época caracterizava as relações entre os povos como difíceis de entendimento mútuo. As civilizações consideravam-se eleitas pelos deuses e buscavam lutar contra aqueles que possuíam divindades distintas. Entretanto, apesar de a regra ser esse estado de perigo e guerra entre os povos, a possibilidade de criação de regras de convivência era possível e, séculos mais tarde, observou-se que sistemas jurídicos internacionais bastante interessantes à época foram criados, assim como instituições muito semelhantes àquelas observadas hoje em dia [63].

Nos mais diversos continentes foram observados certos desenvolvimentos no sentido da criação de um primitivo corpo normativo internacional, como se pode verificar na sequência deste trabalho, na antiga civilização chinesa.

3.1.1 China Antiga

Apesar de incipiente e rudimentar, pode-se observar a criação de alguns conceitos muito ligados ao Direito Internacional na China Antiga. Confúcio, importante líder filosófico chinês, nascido em 551 a.C., constituiu uma "teoria geral das relações sociais à escala do universo". Segundo ele, existia uma lei fundamental, comum a todo o universo, que deveria pautar as ações humanas no intuito de mantê-las de acordo com a ordem da natureza [64].

Confúcio não a considerava importante tão somente no interior do povo chinês, mas sim uma lei que deveria regular as relações entre todos os povos. A caracterização desse discurso como ligado a um Direito Internacional se dá pelo fato de possuir traços que buscam a paz entre as diferentes sociedades coexistentes no mundo da época. Ele ainda pregava a criação de uma união dos Estados chineses em uma Associação com personalidade própria, ainda que subsistisse a personalidade de cada um dos Estados participantes. A semelhança com institutos atuais de Direito Internacional torna-se inegável.

Há que se ressaltar ainda a existência de uma instituição legal para a guerra na China Antiga, estabelecendo que essa só poderia ocorrer "entre Estados iguais e não entre um Estado feudal e seus dependentes, e nem entre os Estados chineses e os bárbaros" [65]. Vê-se ainda, a seguir, de que forma esse processo de nascimento de um corpo jurídico se deu no Egito e Oriente Próximo.

3.1.2 Egito e Oriente Próximo

A partir de meados do ano 3000 a.C. até cerca de 1000 a.C., coexistiram, em regiões muito próximas, dois grandes Impérios da Antiguidade: o Egito e a Babilônia. As necessidades econômicas da época obrigaram os dois Impérios a relacionar-se com os povos bárbaros, estabelecendo na região imensas rotas comerciais. Nesse movimento comercial, Egito e Babilônia tornaram-se centros rivais de comércio entre a Índia e o Mediterrâneo.

Assim como coloca Quoc Dinh, Daillier e Pellet, "os partidários da existência de um Direito Internacional desde a remota época dos Impérios baseiam sua tese na existência e desenvolvimento desses contatos" [66]. Os documentos da época mostram a utilização por parte desses Impérios do instituto dos Tratados, assim como a vigência da regra pacta sunt servanda a partir de juramentos religiosos. Esses tratados poderiam ter diferentes sentidos, sendo relacionados a alianças comerciais, alianças bélicas ou delimitações territoriais.

Um dos tratados mais famosos e que demonstram a utilização de institutos modernos de Direito Internacional foi o pactuado ao fim da guerra da Síria entre Ramsés II, rei do Egito, e Hattisuli, rei dos Hititas, em cerca de 1291 a.C.. Esse tratado estabelecia a paz entre os povos, a aliança contra os inimigos, a entrega de refugiados políticos e o estabelecimento de comércio entre os dois Impérios [67]. Há que se observar ainda a existência de privilégios diplomáticos nessa época, como a existência de uma língua e escrita comuns.

Como visto, o possível nascimento do Direito Internacional no berço dessas civilizações antigas se deu de forma muito rudimentar. Entretanto, no mundo helênico que se verá a seguir as transformações e avanços foram muito mais visíveis, colaborando grandemente com a ideia de um Direito Internacional anterior aos Estados nacionais.

3.1.3 Grécia

O mundo helênico pode ser considerado, assim como defendem alguns autores de Direito Internacional, como o exemplo mais evidente de utilização de institutos e sistemas semelhantes, ainda que rudimentares, àqueles evidenciados no Direito Internacional moderno.

O comportamento visto entre as cidades gregas revelava grande rivalidade entre si e com relação aos povos desconhecidos [68], além de um constante sentimento de desconfiança e isolamento, não impedindo, apesar disso, que institutos que visassem a paz e o estabelecimento de missões diplomáticas fossem instituídos e gozassem de vigência. Assim como elucidado por Quoc Dinh, Daillier e Pellet, "permanente é apenas a ameaça de guerra, mas não a guerra em si" [69].

O respeito a períodos de paz foi estabelecido, em determinadas situações, a partir de tratados legalmente estabelecidos [70]. Importante também é a própria criação de um sentimento de unidade com relação ao mundo grego, evidente em passagem de Quoc Dinh, Daillier e Pellet [71], no sentido de que

Enfim, se as Cidades são entidades politicamente organizadas, cuja independência constitui ao mesmo tempo o dial e o critério, os seus povos fazem parte de uma mesma comunidade de raça, de civilização, de cultura, o que cria, forçosamente, entre eles, afinidades particulares.

[...] É graças a esses fatores de unidade e aproximação, ausente no Oriente imenso e complexo, que a contribuição da Grécia para a formação do direito internacional é mais importante e mais substancial.

Pode-se arrolar uma série de institutos que tinham caráter muito parecido a outros atuais, como os chamados asilia, proxenia e as anfictionias [72]. Ainda assim, como sugere a doutrina, esses institutos possuíam sua essência mais ligada ao Direito dos próprios gregos do que ao Direito Internacional.

3.1.4 Roma

Há controvérsias com relação a existência de um Direito que possa ser equiparado a uma espécie de Direito Internacional em Roma. Isso porque o predomínio da mundo romano levava a uma situação de normas impostas, e não a um "ordenamento" criado entre Roma e demais sociedades igualitárias [73]. Dessa característica de unilateralidade, até mesmo a pax romana [74] foi realizada sem que houvesse consentimento de outras nações. Entretanto, algumas ideias nascidas no bojo da ciência jurídica romana não podem ser vistas completamente desconectadas de um Direito Internacional. Aqui se faz importante a análise de dois institutos romanos, o jus gentium e o jus fetiale.

O jus gentium era o direito utilizado nas relações entre os próprios cidadãos de Roma e, principalmente, nas relações desses com os estrangeiros, visando maior facilidade nos entendimentos, mormente comerciais. O processo de criação de tal sistema jurídico dá-se no fim da República e início do Império, ou seja, em um período em que Roma passaria por uma transformação e crescimento econômico e demográfico. A necessidade de criação desse sistema é visível, então, a partir da multiplicação de relações entre os cidadãos romanos e os estrangeiros que rumavam ao seu território. Segundo o pensamento romano da época, a lei deveria harmonizar-se com os princípios racionais, objetivando a edição de "leis uniformes e universalmente válidas que podiam ser reconhecidas por pessoas racionais" [75].

Do caráter comercial desse Direito surge a crítica de que esse era um Direito claramente privado, não podendo ser considerado como um precedente antigo de criação de um Direito Internacional Público. Quoc Dinh, Daillier e Pellet defendem que,

No entanto, responde à ideia fundamental de que deveria existir um direito comum da humanidade que, para valer para todos os povos, deveria fundar-se em princípios extraídos da razão universal [76].

O jus fetiale possuía um caráter público e externo, sendo utilizado nas relações entre Roma e as demais nações estrangeiras. Entretanto, ainda que possua, à primeira vista, uma imagem clara de um incipiente Direito Internacional Público, o jus fetiale não pode ser considerado assim por ser fruto de atos unilaterais do Império Romano.

Esse direito possuía ao mesmo tempo características funcionais aparentemente distintas, ainda que essencialmente conectadas. Eram políticas, ao tempo em que regulavam as ações diplomáticas romanas, especialmente com relação à declaração de guerra [77]. Eram jurídicas ao passo em que estabeleciam regras claras a serem seguidas por Roma no trato com as demais nações. Por fim, tinham caráter religioso, levando-se em conta o fato de que as relações internacionais romanas eram sempre fundamentadas nas premissas de proteção divina.

Em Roma ainda surgiu o importante instrumento da Ratificação dos tratados, assim como se desenvolveu o instituto da inviolabilidade dos embaixadores, largamente utilizados nos dias atuais.

A contribuição romana com a criação do Direito Internacional é esclarecida elegantemente por Quoc Dinh, Daillier e Pellet [78], sendo fundamental a transcrição integral da passagem escrita pelos autores citados, ao dizerem que:

Enquanto elementos do direito romano, as instituições do jus fetiale e a noção de jus gentium sobreviveram a Roma e passam para a nova Europa constituída após a queda do Império do Ocidente. Deste modo, e só deste, pode considerar-se que a evolução não sofreu interrupção durante a época romana.

[...] A ligação que certos autores farão entre direito internacional e direito natural tem mesmo origem nas estreitas relações entre jus gentium e jus naturale. Assim, a despeito da sua política imperialista, o contributo de Roma, embora indireto, está longe de ser desprezível.

O próximo passo ao desenvolvimento do Direito Internacional se daria não mais no seio de uma sociedade, mas sim no interior de um período histórico próprio. A Idade Média, apesar de ter início como uma época sombria, com pouco espaço para desenvolvimento de qualquer ciência, propiciará a construção de importantes conceitos e institutos do Direito Internacional.

3.2 IDADE MÉDIA

No ano 476 a.C., das ruínas do Império Romano, esfacelado pela anarquia interna, invasões bárbaras e declínio econômico, emerge uma sociedade que viria a constituir características muito próprias, a Idade Média. Dado o interesse desse estudo em analisar precipuamente o desenvolvimento do Direito Internacional, o período inicial da Idade Média não traz quase que nenhuma passagem relevante. Somente após vários séculos decorridos desse período é que haverá o retorno do desenvolvimento de algumas futuras ciências, dentre elas a do Direito Internacional.

Sinteticamente, os séculos que se seguiram ao perecimento do Império Romano foram especialmente complicados para a sociedade europeia. Até o século VIII, o que se vê é uma tentativa de superar as dificuldades deixadas pela fragmentação do antigo império e da civilização greco-romana. Assim sendo, pode-se afirmar que, a sociedade que viria a ser criada durante a Idade Média tem na Igreja Católica seu núcleo gravitacional.

Essa instituição religiosa, com a queda de Roma, teve sua importância e crescimento levados a patamares nunca antes imaginados. Isso se deu pela habilidade dos participantes da Igreja Católica em possibilitar a estabilidade necessária à população da época, destroçada séculos antes. Assim como coloca Perry [79],

Servindo ainda de agente unificador e civilizador, ofereceu (a Igreja Católica) às pessoas uma concepção inteligível e significativa da vida e da morte. Num mundo agonizante, a Igreja foi a única instituição capaz de reconstruir a vida civilizada.

Com a doutrina cristã, segundo Moncada, "criou-se para a cultura do Ocidente uma nova situação espiritual que não tem paralelo na História e constitui a maior viragem ocorrida, desde o despertar do pensamento especulativo dos gregos" [80].

A ideia de criação do homem à imagem e semelhança de Deus traz uma noção inteiramente nova de humanidade. O pensamento que embasava a Antiguidade, pautado na relação entre os iguais e os bárbaros, será modificado no sentido de que todos, apesar de cultivarem diferenças importantes, trazem consigo traços que o tornam parte de uma só unidade. Dessa forma, segundo o autor, "trazia consigo o princípio da unidade do gênero humano, mas, diversamente do cosmopolitismo dos estóicos, conciliou o universalismo com um sentido mais positivo e realista das diferenças históricas (étnicas, linguísticas, religiosas, culturais) dos povos" [81].

Assim nascia a noção de uma sociedade internacional que teria como escopo a incorporação de todos os povos e, por conseguinte, a necessidade de convivência pacífica. Sob a égide de tais preceitos surge a Respublica Christiana, ou seja, a "comunidade dos povos cristãos cuja organização figura-se por uma eclipse, cujos focos, o Papa e o Imperador, agrupavam à sua volta todos os Estados" [82]. Sob a influência da doutrina cristã o Direito Internacional apoderou-se de conceitos e instituições que seriam de grande importância para seu desenvolvimento futuro.

A Paz de Deus, movimento cristão que tivera início no final do século X, foi um dos instrumentos que introduziram no Direito Internacional conceitos demasiado importantes sendo, nesse caso, a distinção entre beligerantes e não-beligerantes. Segundo essa regra, os cavaleiros comprometiam-se a não desferir ataques contra camponeses, comerciantes, peregrinos, mulheres, viajantes nem aos seus bens, especialmente àqueles relacionados às colheitas e aos instrumentos agrícolas.

Alguns historiadores não considerem a Paz de Deus um movimento que deve ser tido como de grande relevância para o estudo do Direito Internacional, dado o fato de não ter impedido o acontecimento de novas guerras. Entretanto, é passível de aceitação de que, partindo do pressuposto de que não havia um poder coercitivo, esse instrumento figura como uma tentativa de "construir um consenso cultural e social" [83].

Em 1027, durante o Concílio de Elba, houve a criação da chamada Trégua de Deus. Essa caracterizava-se por estabelecer que, das três horas de sábado até as seis horas da manhã de segunda-feira, as guerras deveriam ser paralisadas, em respeito ao "dever dominical". Esse período de abstenção dos deveres bélicos fora estendido, alguns anos mais tarde, para os dias de festas, na Quaresma, dos principais Santos.

Treze anos mais tarde, em 1040, o Concílio de Marselha estabelece que as batalhas deveriam cessar desde a tarde de quarta-feira até a manhã de segunda-feira. Isso se fazia necessário para que, "nesses quatro dias e duas noites goze todo o homem, em todas as horas, de plena segurança, e possa entregar-se tranquilamente às suas ocupações sem temor algum do inimigo, protegido por esse estado de paz" [84].

As normas que visavam regulamentar as condutas de guerra foram estendidas ainda durante o Concílio de Latrão de 1139. Nesse, ficava banido o uso de arbaletas, dado o fato de que suas setas tinham potencial para furar as armaduras dos cavaleiros. Podem-se ainda observar funções de "polícia" internacional, vigiando as estradas e punindo o banditismo. A essa função distinguiu-se a Ordem de Malta, gozando de personalidade jurídica internacional [85].

Há que se colocar o posicionamento de Celso D. de Albuquerque Mello com relação ao que, segundo ele, tenha sido a maior contribuição ao Direito Internacional durante a Era do Medievo: a noção de guerra justa. Esse conceito, desenvolvido especialmente pelos já citados Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino, encontrou na figura deste último sua melhor formulação. Segundo o teórico cristão, para que uma guerra fosse considerada justa ela deveria possuir três preceitos básicos: ser declarada pela autoridade competente, na época, o Príncipe; estar diretamente ligada a uma causa justa, ou seja, a uma violação de direitos; e que "a intenção dos beligerantes seja reta", visando à promoção de um bem ou prevenção de um mal [86].

Entretanto, o Direito Internacional encontraria bases para um galopante desenvolvimento somente com a desintegração da Republica Christiana, ocasionada especialmente pela queda do poder papal frente à Reforma Protestante. Essa ruptura culminou com o fortalecimento dos Estados nacionais, "fruto de um lento e contínuo processo de concentração e secularização do poder político e de sua irradiação territorial" [87].

O pensamento religioso que permeara as relações internacionais durante toda a Idade Média seria quebrado com o desconhecido monge e teólogo alemão Martin Lutero [88], dando espaço a uma nova linha de pensamento baseada no humanismo do Renascimento. Essa mudança ocasiona efeitos benéficos à normatização do que viria a ser um Direito Internacional. As instituições diplomáticas consolidam-se por entre os países europeus e fica estabelecido o princípio de liberdade dos mares.

Esse processo histórico que viria consolidar o nascimento dos Estados nacionais tem sua primeira expressão sob o regime de Federico II, ainda no século XIII, com relação ao Reino da Sicília, desenvolvendo-se durante os séculos XVI e XVII, culminando ante as Monarquias de Castilha, Aragão, Portugal, França e Inglaterra. A hierarquia medieval criada a partir da Republica Christiana, pautada mormente na figura do Papa como chefe supremo, fora então substituída, segundo Carrillo Salcedo, por uma pluralidade de príncipes soberanos, zelosos com relação a sua independência e fortemente convencidos em não admitir superior temporal algum [89].

Porém, ainda que instituições de Direito Internacional tenham sido criadas desde os mais remotos tempos da Antiguidade, não houve, até então, um sistema que pudesse dar unidade a esses institutos e tratados. Ora, se o que lhes faltava até essa época fora um sistema unificador, baseado em pré-determinadas diretrizes principiológicas, o desenvolvimento dos Estados nacionais será o estopim para uma nova era do Direito Internacional. Assim como expresso na obra de Quoc Dinh, Daillier e Pellet [90],

É precisamente este o sistema que vai aparecer progressivamente durante este período sob o nome de interestatismo ou sistema interestatal. Ligado a esse sistema, o direito internacional adquire os seus traços característicos, completa a sua formação. Qualificado já de clássico, este sistema continua ainda, nos nossos dias, a reger as relações internacionais.

Como visto, a criação do sistema interestatal será o alicerce ao desenvolvimento do Direito Internacional moderno a partir do fim da Idade Média. Assim sendo, se as relações internacionais, a partir de então serão travadas mormente por essas entidades - os Estados nacionais - cabe avaliar os elementos mais importantes à sua existência e conservação.

Os estudiosos que buscaram fundamentar político e juridicamente o Estado foram muitos, optando esse estudo por analisar a participação daqueles que foram reconhecidamente mais importantes. A conceituação e afirmação da soberania dos Estados nacionais foram alguns dos pontos de maior relevância à consolidação dos Estados da época. Dado a forte grau de influência que elementos externos implicavam no seio dos territórios até então, essas novas entidades do cenário internacional tinham como objetivo uma autonomia jamais vista. Como será analisado a seguir, os livros escritos na época que tinham esse escopo tiveram imensa influência, sendo, ainda hoje, de grande importância.

3.3 A SOBERANIA DOS ESTADOS

O conceito de soberania data exatamente da época que se vem analisando, ou seja, o período da criação dos Estados. Assim como representado modernamente, o termo busca garantir o poder supremo do Estado frente à população interna e com relação à sua independência frente aos demais Estados.

Não por coincidência seu nascimento está relacionado ao nascimento dos Estados nacionais. Os territórios medievais encontravam no ambiente social e político da época grandes entraves à consolidação de um poder unificado. A fragmentação interna devida ao feudalismo era tão inoportuna quanto o poder supremo do Papa no momento da concretização dos Estados nacionais. A partir da quebra do poder da cristandade e o crescente desejo dos monarcas em centralizar o poder nas mãos do Estado, a conceituação da soberania passou a ser um fator decisivo ao suporte jurídico desse movimento nacionalista. Com uma lenta evolução conceitual, a soberania deixaria de ser relacionada à posse da terra, passando à figura do rei. "Portanto, soberano era o monarca, soberania era atributo real, era a autoridade do rei" [91].

Talvez o primeiro a tratar do tema, o italiano Maquiavel, ainda nos fins do século XV e início do século XVI, em sua obra O Príncipe, defendia a concentração de todo o poder do Estado nas mãos do rei tão-somente. As motivações do príncipe seriam, dessa maneira, as razões do Estado. Maquiavel buscava aconselhar Lorenzo de Médici no intuito de possibilitar a unificação da Itália em um Estado, defendendo que "o Estado unificado e a soberania nacional eram necessidades que se justificam historicamente, para colocar um fim à desagregação característica do sistema político feudal" [92].

Mais tarde, já na segunda metade do século XVI, surge a figura de Jean Bodin, monárquico francês militante da criação do Estado nacional [93]. Foi somente a partir de seus estudos que a soberania e o Estado moderno ganharam uma doutrina científica, tornando-se ela, a soberania, inclusive um dos elementos essenciais ao Estado. A soberania apresentava para Bodin [94] as seguintes características fundamentais:

O poder de impor lei a todos em geral e a cada um em particular, o der de decretar a guerra ou de fazer a paz, o de instituir os principais cargos, o de resolver em última instância, e enfim, o de outorgar graças aos condenados.

Colocava ao lado desses cinco poderes principais, outro que são corolários como: cunhar moeda, arrecadas impostos, confiscar os bens dos condenados, etc.

Alguns dos pensamentos do pensador eram extremamente ligados aqueles que haviam sido pregados anteriormente por Maquiavel. No que tange às relações internacionais, dizia Bodin [95] que

Parece não existir melhor meio de manter o próprio Estado em sua grandeza do que vendo seus vizinhos se arruinarem uns aos outros. Pois a grandeza de um Príncipe, resumidamente, não é nada mais do que a ruína ou redução da importância de seus vizinhos; e seu poder não é nada mais do que a fraqueza dos outros.

Por fim, também a partir da obra de Bodin seria criada a noção de Soberania que daria suporte jurídico à criação dos Estados nacionais, especialmente o Francês. O autor pregava a existência de dois aspectos da soberania dos Estados, um interno (soberania no Estado) e outro externo (soberania do Estado). Assim, "legitima juridicamente a dupla luta do rei de França contra o papado e o Império, no exterior, contra a feudalidade, no interior" [96]. Dalmo de Abreu Dallari [97] lembra de um importante ponto da obra de Bodin com relação à soberania dos Estados, redigindo que:

Embora não tenha mencionado a inalienabilidade como característica da soberania, o que outros autores fariam depois, escreve Bodin que, seja qual for o poder e a autoridade que o soberano concede a outrem, ele não concede tanto que não retenha sempre mais. Dessa forma, a soberania coloca o seu titular, permanentemente, acima do direito interno e o deixa livre para acolher ou não o direito internacional, só desaparecendo o poder soberano quando se extinguir o próprio Estado.

Durante o século XVII surgiu a obra de Thomas Hobbes e o seu ideário de Contrato Social. Segundo ele, o Estado forma-se a partir da renúncia da liberdade inata aos indivíduos quando em seu estado natural em troca da segurança que lhes é assegurada pelo Estado. Assim sendo, é a partir desse pacto, ou contrato, que surge e se fundamenta a legitimidade do poder supremo. Azevedo leciona, com relação ao tema, o fato de que

O Estado é considerado como um homem artificial de maior força e tamanho que o natural, sendo o caráter de seus poder incondicionado, irresistível, inapelável e ilimitado. [...] é o máximo guarda da paz e a autoridade suprema em matéria de fé, legislador, juiz supremo, tem o direito de premiar e castigar prater legem e de outorgar toda as honras e dignidades [98].

Válido ressaltar, ainda, o pertinente comentário de José Reinaldo de Lima Lopes [99] sobre o assunto, no sentido de que:

Além disso, em Hobbes o voluntarismo e a autoridade do direito positivo tornam-se exemplares: o Estado assume o direito e não restam direitos aos súditos, senão aqueles reconhecidos pelo soberano.

Assim como Bodin buscou fundamentar a criação do Estado nacional francês, Hobbes trabalhou nesse mesmo sentido com relação ao Estado inglês, possibilitando sua formação e libertação frente aos demais poderes instituídos no Antigo Regime. Assim como os citados Estados Francês e Inglês, vários seguiram seu exemplo e transformaram-se em Estados nacionais, consolidando os ideais de soberania desvinculada dos poderes externos. Foram esses agentes que, assim como será visto nas próximas páginas, viriam a formar a sociedade internacional, resistindo até hoje como os principais entes mundiais.

3.4 A SOCIEDADE INTERESTATAL EUROPEIA

A partir da quebra da unidade cristã durante a Idade Média e a ascensão dos Estados nacionais como os principais agentes do cenário internacional, desvinculados, sob a égide da teoria da soberania, de qualquer poder que lhes fosse estranho, verificar-se-ia a formulação das relações internacionais com um caráter completamente novo. Durante o século XVII, mais precisamente no ano de 1648, pôde-se observar a criação dos Tratados de Osnabrük e de Münster, constituindo esses os chamados Tratados de Vestfália. Esses tratados puseram fim à guerra dos Trinta Anos e foram firmados entre os Estados vencedores, mormente França e Suécia, e o lado perdedor, caracterizado principalmente pela Alemanha.

Sua importância é claramente evidenciada pelo fato de que o direito convencional anterior fora revogado, dando lugar a um novo direito que, pela primeira vez, fora deliberado pelos Estados europeus em conjunto [100]. Os Tratados foram qualificados como uma Carta Constitucional da Europa, estabelecendo definitivamente a derrota do Imperador e do Papa, formalizando assim o nascimento daqueles Estados que viriam formar a nova ordem europeia [101]. Além disso, essa ordem, criada a partir de então, colocaria os Estados soberanos como o centro de gravidade de regulação das relações internacionais.

Os princípios fundamentais estabelecidos a partir dos Tratados de Vestfália foram: o respeito aos limites territoriais de cada um dos Estados nacionais; a prevalência do princípio territorial sobre o pessoal em matéria de legislação e administração da justiça, ou seja, a exclusividade de jurisdição; a igualdade soberana dos Estados; e a não-intervenção em assuntos internos dos Estados.

Além disso, houve uma tentativa de estabelecer um sistema de garantias e manutenção da paz e do status quo a partir de alguns pressupostos, sendo eles: a observância ao princípio de que os tratados devem ser cumpridos pelos Estados (pacta sunt servanda); os conflitos relativos à ordem de paz deveriam ser resolvidos por meios pacíficos, dando preferência às discussões político-diplomáticas; o Estado vítima de uma violação da ordem estabelecida poderia recorrer à guerra contra seu transgressor e deveria contar com o apoio dos outros Estados-parte dos tratados de paz; e uma guerra iniciada sem justa causa seria contrária ao Direito, sendo que os Estados-parte dos tratados de paz deveriam ir contra o perturbador da ordem estabelecida de forma conjunta [102].

Garantido aos Estados, a partir desses tratados, que não haveria sobre eles qualquer poder superior, dando-lhes completa autonomia e soberania ilimitada, o que se verificou a partir de então, assim como defende Cunha e Pereira, foi um cenário internacional regido sob o princípio do equilíbrio das forças, do equilíbrio político ou da balança do poder. Antes de possuírem, assim como mostra a história, qualquer intenção de salvaguardar a paz, esse sistema de equilíbrio do poder buscava salvaguardar a onipotência dos Estados frente entes externos [103]. Traduziu-se esse sistema num jogo de intrigas e negociações diplomáticas no intuito de evitar a formação de Estados demasiadamente poderosos. As movimentações para isso foram feitas no sentido de formulação de alianças, sempre na tentativa de quebrar qualquer latente sentimento hegemônico. Cunha e Pereira [104] ainda elucidam de que forma o cenário internacional viria a se comportar nos séculos seguintes, ao escreverem que

A história das guerras europeia nos séculos XVII e XVIII traduz, em grande parte, as vicissitudes do sistema. O Direito Internacional que se desenvolveu nesta época baseava-se no princípio da soberania ilimitada ou absoluta dos Estados que agiam movidos apenas pelos seus interesses egoístas e desprendidos de quaisquer considerações de ordem moral.

Carrillo Salcedo defende que não se pode estranhar que o Direito Internacional da época fosse, antes de qualquer outra coisa, um direito que buscasse regular a guerra, dada a sequência de combates entre as Monarquias absolutas. Segundo ele, o recurso à guerra configurou-se a partir de então, como um direito discricionário dos soberanos, levando a Europa a um estado de guerra perpétua. A preocupação jusnaturalista e ética a respeito das causas justas à guerra, iniciadas na Antiguidade e arraigadas na Idade Média, cederam espaço a uma concepção completamente diferente. A justiça material perdeu importância frente às qualidade formais da guerra jurídico-público, ou seja, aquelas que são deflagradas por e entre soberanos. Carrillo Salcedo [105] demonstra claramente essa característica da época, de forma que

Ainda que as formulações tradicionais sigam sendo utilizadas e se continue falando de bellum iustum e de iusta causa belli, o sentido destas noções terá mudado por completo já que por guerra justa se entenderá aquela que tem lugar entre iustes hostes, ou seja, entre Estados soberanos, titulares da faculdade discricionária de recorrer a guerra em seus conflitos com outros Estados (tradução nossa).

Ora, dada as características já mencionadas a respeito do novo Direito Internacional Interestatal, pode-se afirmar que as relações internacionais se basearam precipuamente nas ações dos monarcas que, desde o Tratado de Vestfália, passaram a se comportar como soberanos absolutos. Como dizem Quoc Dinh, Daillier e Pellet, estes consideravam-se integralmente donos do Estado. O pensamento político da época já observado neste estudo, especialmente relacionado às figuras de Maquiavel e Hobbes, não só encorajava os reis como fundamentava suas ações. O absolutismo monárquico conduzira as relações internacionais a uma constante afirmação da superioridade da vontade do Estado soberano, sendo incompatível essa atitude individualista e nacionalista com qualquer pretensão de criação de uma ordem comum que ultrapasse e transcenda os Estados. Por fim, ainda o mesmo autor afirma que, "produto do absolutismo, o direito interestatal, nascido desta prática, só pode, evidentemente, ratificar outro produto do mesmo absolutismo: a guerra" [106]. Corroborando esse pensamento, Truyol y Serra [107] afirma que:

A sociedade internacional era concebida como a viver em estado de inimizade natural entre os Estados e como resultante de laços contratuais livremente assumidos por estes [...] Efectivamente, a instalação do princípio do equilíbrio irá conduzir a uma série ininterrupta de guerras no decorrer das quais s gabinetes europeus patentearão o seu virtuosismo diplomático, e a inversão das alianças não será fenômeno insólito.

Assim como foi colocado ao fim do primeiro capítulo deste estudo, os teóricos que buscaram fundamentar o Direito Internacional no Direito Natural, especialmente Hugo Grotius, criando um Direito acima do voluntarismo intrínseco à ordem interestatal europeia da época, não obtiveram sucesso na contraposição de suas teorias à realidade internacional. Ainda que tenha contribuído com a afirmação de um Direito Internacional, quando da efetiva criação do sistema jurídico internacional seu pensamento teve pouca, senão nenhuma influência.

Naturalmente, houve, da época da criação do sistema europeu interestatal, aqueles que buscaram dar sustentação jurídica e teórica a essa concepção da realidade internacional. Partindo das premissas fundadas em grande medida pelos espanhóis Vitoria e Suárez e sustentadas pelo holandês Grotius, alguns pensadores modificaram conceitos e pensaram um Direito Internacional quase que reduzido completamente à soberania estatal. Dessa necessidade surgira o positivismo como uma corrente teórica que buscava sustentar o status quo da época. Se os jusnaturalistas não obtiveram o sucesso sonhado na realidade jurídica, os positivistas veem ainda hoje seus preceitos arraigados no Direito Internacional.

3.5 O POSITIVISMO NO DIREITO INTERNACIONAL

Cornelio Van Bynkershock [108], nascido em 1673, é, segundo Mello, o iniciador pensamento positivista do Direito Internacional, abandonando a noção de direito natural de Grotius e reduzindo o Direito Internacional ao direito positivo [109]. Estudou precipuamente em suas obras jurídicas a dimensão dos mares territoriais dos Estados e os privilégios e imunidades dos agentes diplomáticos. Outro autor que contribuiu à criação do pensamento positivista no Direito Internacional foi o renomado filósofo alemão Christian Wolff, contemporâneo de Bynkershock, cuja obra busca instituir que, nas palavras de Truyol y Serra [110],

Os povos e as nações integram-se numa comunidade universal, a que Wolff chama a civitas maxima, expressão de ressonância estóica. A civitas maxima é fundada sobre um consentimento tácito, um quase-pacto; procura a promoção do bem comum dos Estados graças às regras dela emanadas para esse fim. Wolff distingue ainda um Direito das Gentes necessário, próprio do estado de natureza, de um Direito das Gentes voluntário, que emana da civitas maxima.

Assim, no início do século XVIII surge a figura de Emmerich de Vattel, entitulando-se discípulo de Wolff. Esse voltou a sustentar a distinção da existência de um Direito Natural e outro Voluntário indo, porém, mais longe ao extrapolar a soberania dos Estados e reduzir a interferência do Direito Natural a patamares quase nulos, ainda que em seu estudo o classifique como compulsório aos Estados. Como coloca Vattel [111],

Usamos o termo Direito das gentes necessário para aquele direito das gentes que consiste na aplicação do direito natural às Nações. Ele é necessário porque as Nações são absolutamente obrigadas a respeitá-lo.

Em verdade, o direito necessário apresentado por Vattel passa a subordinar-se a vontade e a interpretação do próprio Estado, modificando-o de acordo com os juízos de conveniência e oportunidade. Assim, segundo Vattel, "a lei natural nada decide de Estado a Estado, como decidiria de particular a particular. É partidário, como os monarcas, do voluntarismo integral" [112].

Sua principal obra, Droit des gens ou principes de la loi naturelle appliqués à la conduite et aux affaires des nations et des souverains [113], publicada em 1758, alcançou enorme difusão entre os Estados da época. Vattel vai então classificar a sociedade internacional como intrinsecamente a "grande sociedade das nações", ou seja, uma sociedade na qual tão-somente os Estados são membros. Assim, acrescenta, "cabe a qualquer Estado livre julgar em consciência o que os seus deveres exigem, o que pode fazer ou não com justiça.Se os outros tentarem julgá-lo, atentarão contra a sua liberdade e ferirão os seus direitos mais preciosos" [114].

A partir desse conceito, chega-se à noção de que a sociedade internacional difere claramente da sociedade política habitada pelos indivíduos. Esses, ao escolherem viver em sociedade e usufruir da segurança por ela dada, aceitam abdicar de parcela de sua soberania, fazendo-o por extrema necessidade de sobrevivência. Já a sociedade internacional, habitada pelos Estados soberanos, constitui-se como um ambiente em que seus participantes não necessitariam uns dos outros, não se fazendo necessária qualquer abdicação de poder. Destarte, a partir da segunda metade do século XVIII, o positivismo começaria a introduzir-se nas ciências sociais, enraizando-se por conseguinte na ciência do Direito Internacional.

Dessa época data o trabalho de Johann Jakob Moser, autor de Principes du droit des gens actuel e considerado por alguns autores modernos como o fundador propriamente dito da Escola Positivista do Direito Internacional, o qual exprime seu ideário com as seguintes palavras, parafraseado por Quoc Dinh, Daillier e Pellet:

Não escrevo um direito das gentes ecolástico baseado na aplicação da jurisprudência natural; não escrevo um direito das gentes filosófico construído segundo algumas noções bizarras da história e da natureza humana; enfim, também não escrevo um direito das gentes político no qual visionários como o abade de Saint-Pierre plasmavam a seu talante o sistema da Europa, mas descrevo o direito das gentes que existe na realidade, com o qual os Estados soberanos regularmente se conformam [115].

Assim como leciona Carrillo Salcedo em sua obra, três características basilares formavam aquele incipiente Direito das Gentes enquanto sistema jurídico regulador das relações entre entidades políticas soberanas e independentes: o voluntarismo, no sentido de que suas normas emanam expressa ou tacitamente da vontade dos Estados, sendo que estes são, ao mesmo tempo, destinatários e criadores do direito das gentes; a neutralidade, no sentido da desvinculação do direito com qualquer inspiração religiosa ou ideológica; e, por fim, o positivismo, no sentido de que o direito das gentes deveria ser um conjunto de normas jurídicas em vigor e não de regras morais [116]. Igualmente pertencentes às noções básicas acerca do Direito Internacional que se desenvolvera a partir de então, a soberania dos Estados fora levada a patamares extremos, assim como ficara consolidada a ideia de que a sociedade internacional permeia-se tão-somente pelos Estados como seus participantes. Assim, Vattel [117] diz que

Para dar, desde agora, esclarecimento geral sobre a distinção entre direito necessário e direito voluntário, observemos que o direito necessário, sendo sempre obrigatório na consciência, uma Nação não deve jamais perdê-lo de vista, quando deliberar sobre decisão a tomar em consonância com seu dever; mas quando examinar o que ela pode exigir dos demais Estados, ela deve consultar o direito voluntário cujos princípios são consagrados à preservação e conveniência da sociedade universal.

Essas teorias acerca do fundamento do Direito Internacional tiveram sua origem nas teorias do Direito Natural, entretanto, como claramente perceptível, tomaram rumos completamente diversos naquilo que pretendiam ser. A recepção dos Estados aos seus ensinamentos foi tamanha que ainda hoje se verifica a sobrevivência de seus conceitos principais. A partir de então, o Direito Internacional passaria a desenvolver-se a largos passos, adquirindo novas ideias e, o mais importante, definindo as bases para sua definitiva cognição entre os Estados. Se o corolário positivista obteve sucesso entre os Estados da época, isso se dá pela conveniência encontrada em aceitá-los. Neles os soberanos encontraram terreno para firmar-se no poder e utilizar-se dos meios possíveis à manutenção desse status quo. Umberto Campagnolo [118], em escritos conjuntos com Kelsen [119], afirma

Não poder existir nenhuma norma em contraste com o Estado: o Estado assim como foi definido é, na sua essência, absoluto [...] Existiram certamente também outras normas, além das normas jurídicas do Estado, e também outras sociedades além da sociedade política por excelência, mas tais normas seriam válidas somente como normas admitidas pelo Estado, e estas sociedades poderiam existir somente no interior e com a autorização do Estado. As outras normas (morais, religiosas, de civilização etc) representam ainda um modo regular segundo o qual a sociedade reage às ações dos seus membros. Mas essa ração não pode ter lugar acima e para além do contexto do Estado. Pelo contrário, essa reação deve conformar-e ao Estado: o Estado admite a reação moral, religiosa, etc.

O Direito Internacional, a partir de então, fora completamente tomado pelos ideais positivistas da época, permanecendo enraizados na ciência jurídica internacional durante os próximos séculos. Assim, o voluntarismo estatal na criação das normas internacionais e a soberania dos Estados permaneceu quase que intacta até metade do século XX. Dado que o foco desse trabalho é a participação do ser humano no cenário internacional e a influência dos Fundadores do Direito Internacional, os séculos em que observou-se a proeminência da sociedade interestatal não serão fruto de detalhada análise. Antônio Augusto Cançado Trindade [120], fervoroso crítico do positivismo no Direito Internacional, coloca de forma bastante clara seu pensamento, dizendo que:

A ideia de soberania estatal absoluta, que levou à irresponsabilidade e à pretensa onipotência do Estado, não impedindo as sucessivas atrocidades por este cometidas contra os seres humanos, mostrou-se com o passar do tempo inteiramente descabido. [...] Criado pelos próprios seres humanos, por eles composto, para eles existe, para a realização de seu bem comum. Em caso de violação dos direitos humanos, justifica-se assim plenamente o acesso direto do indivíduo à jurisdição internacional, para fazer valer tais direitos, inclusive contra o próprio Estado.

A sequência do trabalho buscará os primórdios da transformação do Direito Internacional, analisando as causas e consequências das modificações da ciência jurídica internacional, especialmente no que tange ao ser humano e sua participação no cenário internacional. Juntamente, buscar-se-á verificar de que forma se dá a aplicação das diferentes Teorias acerca do fundamento do Direito Internacional, primordialmente as Teorias do Direito Natural e o Positivismo.


4 O SER HUMANO NO DIREITO INTERNACIONAL

Neste último capítulo estudar-se-á o processo de transformação que houve no Direito Internacional e, mais especificamente, no Direito Internacional dos Direitos Humanos, mormente a partir da metade do século XX. Essa mudança na estrutura da ciência jurídica internacional fez com que os Estados não mais fossem os únicos agentes do cenário internacional, ainda que continuem como os mais influentes. Somente a partir de então, houve a possibilidade de inserção do Ser Humano no recém criado Direito Internacional dos Direitos Humanos como sujeito de direitos e não mais como objeto, consolidando alguns dos ideais pensados pelos Fundadores do Direito Internacional ainda no século XVI.

4.1 O PENSAMENTO JURÍDICO PÓS-PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL

A validade e eficácia do Direito Internacional durante os séculos XVIII e XIX foi largamente criticada pelos estudiosos modernos [121]. A integral adoção dos ideais positivistas pelos Estados nacionais em sua relação com a população interna e com os demais agentes do cenário internacional tornou quase impossível qualquer tipo de regulação externa às fronteiras nacionais. O positivismo e o voluntarismo estatal mostraram-se verdadeiros instrumentos de simples manutenção da ordem estabelecida, independente de sua natureza: justa, pacífica, democrática ou não.

Os recorrentes conflitos internacionais e desrespeitos aos Direitos Humanos ocorridos nos últimos séculos, culminando nas duas Grandes Guerras Mundiais, fizeram com que alguns conceitos do Direito Internacional fossem repensados, especialmente naquilo que tange à soberania e ao voluntarismo estatal. O sistema interestatal, dotado de total soberania por parte de cada um de seus agentes, mostrou-se completamente ineficaz no objetivo de evitar guerras e distorções na paz internacional. O professor Antônio Augusto Cançado Trindade [122], em discurso proferido no ano de 1999, demonstrou o sentimento de muitos escritores com relação ao século que terminava no âmbito jurídico internacional, ao dizer que:

Ao longo deste último século de trágicas contradições, do divórcio entre a sabedoria e o conhecimento especializado, na antinomia entre o domínio das ciências e o descontrole dos impulsos humanos, das oscilações entre avanços e retrocessos, gradualmente se transformou a função do direito internacional, como instrumental jurídico já não só de regulação como sobretudo de libertação.

Esse processo de desenvolvimento do Direito Internacional deu-se a partir de sua primeira crise, datada do período posterior à Primeira Guerra Mundial. Durante o conflito, houve um movimento de intelectuais e pacifistas, assim como diz Juan Antonio Carrillo Salcedo, no intuito de "constituir, ao fim da guerra, uma associação de Estados como meio para resolver pacificamente os conflitos internacionais e prevenir uma nova guerra" [123] (tradução nossa). Logo, as intenções de criação de um órgão internacional passaram da iniciativa privada a autoridades estatais, tornando-se o primeiro desafio dos países vencedores após o término do conflito. Assim, José Alberto Azeredo Lopes [124], em seu livro, evidencia os ideais expostos ao Congresso pelo presidente norte-americano Woodrow Wilson em seu discurso dos quatorze pontos, em 8 de Janeiro de 1918, consagrando que

Deve ser formada uma associação geral de nações através de convenções específicas, tendo em vista conceder garantias mútuas de independência política e de integridade territorial tanto aos grandes como aos pequenos Estados.

Fruto desses esforços conjuntos, no seio do Tratado de Versalhes [125] nasceu a Liga das Nações, uma Organização Internacional com personalidade jurídica própria. Pode-se dizer que a movimentação jurídica, no intuito de criar uma entidade parcialmente desvinculada do voluntarismo estatal, foi importante, porém, ainda que o projeto estivesse cercado de esperança por governos e pela sociedade civil, os motivos que levaram à sua efetividade ser quase nula foram vários. Truyol y Serra [126] aborda dois fatores que, segundo ele, foram determinantes para impedir seus objetivos de garantir a paz e a segurança, sendo o primeiro

O fato de o seu pacto constitutivo figurar nos tratados de paz parecia predestiná-la a ser antes de mais um instrumento ao serviço do status quo. Por outro lado, a ausência dos Estados Unidos, cujo Senado não ratificou o Tratado de Versalhes, cerceava-lhe gravemente a autoridade.

Carrillo Salcedo, em sua obra, cita, apesar das incongruências da Liga das Nações, algumas das importantes manifestações a respeito de sua criação com relação ao sistema internacional e ao Direito Internacional. Em referência ao primeiro, o autor valoriza a institucionalização de técnicas de negociação multilateral; a criação de técnicas de cooperação internacional em matéria política, econômica, social e cultural; a cristalização de um modelo institucional, permanente e pré-estabelecido, fruto das atividades coletivas dos Estados; e a instauração de uma função pública internacional permanente e independente dos Estados. No campo do Direito Internacional, ele observa, dentre outros avanços, a limitação do recurso à guerra pelos Estados e a instituição de um sistema de segurança coletiva e de sanções [127].

Com relação à participação do ser humano no Direito Internacional, o Tratado de Versalhes trouxe um tímido e criticado sistema de reivindicação dos indivíduos frente aos Estados. No seio do Tratado, foram criados os Tribunais Arbitrais Mistos entre cada um dos Estados vencedores da guerra e a Alemanha no intuito de emitir sentenças acerca do mérito das reclamações efetuadas por cidadãos aliados, sobre seus interesses e direitos de propriedade na Alemanha. Como leciona Wolfgang Friedmann, "as decisões desses tribunais desenvolveram alguns interessantes princípios novos de direito internacional, mas sua importância principal foi permitir aos indivíduos efetuarem reivindicações contra Estados estrangeiros" [128].

Entretanto, segundo Friedmann, a posição dedicada aos indivíduos pela Convenção Germano-Polonesa da Alta Silésia, de 1922, tem ainda maior significância ao processo de emancipação do indivíduo no Direito Internacional. Isso porque, perante o Tribunal Arbitral criado na Convenção, os indivíduos, ao demandarem acerca de possíveis limitações de direitos, "gozavam de plena igualdade com os representantes dos governos, aos quais podiam processar segundo sua própria discrição" [129].

Ainda referente aos avanços no processo de participação dos indivíduos no cenário internacional, o Pacto que deu origem à Liga das Nações também estabelecia que o Conselho deveria preparar um projeto de Corte Permanente de Justiça Internacional. Dessa forma, na cidade de Haia, em 1920, reuniu-se um Comitê de Juristas que preparou o estatuto da Corte que entraria em vigor no ano seguinte. Porém, diante da possibilidade de estabelecer um modelo inovador em que o ser humano fosse um sujeito de direitos, o Comitê foi demasiadamente conservador aos velhos paradigmas. Com oito votos contra dois, estabeleceu-se que os indivíduos não poderiam comparecer perante a Corte enquanto partes de um processo. Em especial, quatro membros do Comitê (Ricci Busatti, Barão Descamps, Raul Fernandes e Lord Phillimore) foram duramente contrários aos dois votos vencidos, defendendo que tão-somente os Estados eram pessoas jurídicas no ordenamento internacional [130].

Assim, analisando as modificações no cenário internacional após a Primeira Guerra Mundial, Carrillo Salcedo afirma que o Direito Internacional continuou sendo, fundamentalmente, interestatal. Entretanto, como destaca, um sinal de mudança e transformação foi introduzido na ordem internacional com a criação da Liga das Nações. Esse órgão, tido como a primeira experiência histórica de cooperação permanente e institucionalizada, foi um importante fator de reforma e modernização do sistema internacional [131]. Isso porque, apesar de sua ineficiência, demonstrava, na época, uma mudança de mentalidade dos líderes mundiais, no sentido de possibilitar a criação de um organismo internacional que pudesse interferir de alguma forma na consagrada soberania dos Estados.

Não obstante, segundo Truyol y Serra, foi somente a partir da Segunda Guerra Mundial que os equilíbrios existentes foram, de fato, profundamente abalados. Houve, nessa época, um "surto do processo de organização da sociedade dos Estados" [132], assim como da proteção internacional dos direitos humanos. A evidente incapacidade da Liga das Nações em evitar novos conflitos internacionais não fez com que os ânimos fossem abalados com relação às Organizações Internacionais. O que se viu, especialmente ao término da guerra, foram esperanças ainda maiores num organismo de cooperação que pudesse auxiliar os Estados nos momentos de guerra e paz.

As discussões acerca desse novo órgão foram acirradas e tinham, entre si, claras distinções quanto à estrutura, funcionamento e alcance internacional. Alguns defendiam a manutenção da antiga Liga das Nações, enquanto outros acreditavam ser necessária a criação de uma Organização completamente nova. Outra disputa se deu com relação à competência territorial que deveria ser dada ao órgão. Defendia-se a ideia de que diversas organizações internacionais regionais seriam mais interessantes do que uma única organização de vocação mundial, sendo esse o posicionamento inicialmente abraçado pelo líder britânico da época, Sir Winston Churchill. Entretanto, a ideia regionalista não obteve sucesso, consagrando-se a noção universalista defendida pelo presidente norte-americano Roosevelt [133]. Dessa forma, coloca Carrillo Salcedo [134] que

Prevaleceu, portanto, a ideia de criar uma nova Organização Internacional, ainda que desenvolvida em duas direções: de um lado, uma Organização Internacional geral, a Organização das Nações Unidas, destinada a recolocar e substituir, e não a continuar, a Liga das Nações; de outro, uma série de Organizações Internacionais, Organismos Especializados das Nações Unidas, igualmente universais, mas com competências em setores e matérias particulares em que a cooperação institucionalizada resultava imprescindível e urgente (tradução nossa).

Assim, em 25 de abril de 1945, os Estados que lutaram contra o Eixo (Estados liderados pela Alemanha nazista) durante a Segunda Guerra Mundial e que haviam sido convidados pelas quatro potências da época (Estados Unidos da América, União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, China e Grã-Bretanha) reuniram-se na Conferência das Nações Unidas para a Organização Internacional, preparando a chamada Carta da Organização das Nações Unidas. O documento entrou em vigor em 24 de outubro de 1945, quando foi ratificado pelos países que iriam compor o Conselho de Segurança, o mais alto órgão na hierarquia daquela que seria uma das mais importantes Organizações Internacionais já existentes.

Apesar de haver dezenas de críticas a respeito do mau funcionamento e da falta de efetividade da Organização das Nações Unidas, a contribuição de seus órgãos ao desenvolvimento do Direito Internacional e as tentativas de pacificar as Relações Internacionais são quase inegáveis. Se o seu desempenho frente ao tradicional voluntarismo dos Estados não foi o esperado, não há que se falar que sua existência foi nula ao aperfeiçoamento do cenário internacional e ao bem-estar dos indivíduos. Christian Tomuschat, professor e jurista alemão, membro do Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas [135], denominou, segundo Mello, o ano de 1945 como o da "transição copernicana dos direitos humanos" [136]. Sobre o período após a Segunda Guerra Mundial e a incipiente normatização dos direitos humanos no plano internacional, defende Flávia Piovesan [137] que

É nesse cenário que se vislumbra o esforço de reconstrução dos direitos humanos, como paradigma e referencial ético a orientar a ordem internacional contemporânea. Com efeito, no momento em que os seres humanos se tornam supérfluos e descartáveis, no momento em que vige a lógica da destruição, em que é cruelmente abolido o valor da pessoa humana, torna-se necessária a reconstrução dos direitos humanos, como paradigma ético capaz de restaurar a lógica do razoável.

Seria, então, a partir da Organização das Nações Unidas e de seus organismos especializados que surgiria o Direito Internacional dos Direitos Humanos. A formação e normatização desse novo ramo da ciência jurídica seria um processo longo e constante, permeado por uma série de encontros, declarações e tratados internacionais sobre Direitos Humanos. Esse desenvolvimento será fruto da continuidade desse estudo, buscando analisar de que forma a participação do ser humano no Direito Internacional dos Direito Humanos se consolidou.

4.2 OS DIREITOS HUMANOS NO ÂMBITO INTERNACIONAL

O processo de generalização da proteção aos Direitos Humanos no âmbito internacional deu-se, no âmbito da Organização das Nações Unidas, a partir da Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948. Esse documento, como alega Lima Junior, recriou a concepção de direitos humanos, classificando-os como universais e indivisíveis. Além disso, foi a partir da Declaração que teve início o Direito Internacional dos Direitos Humanos, tendo como princípios basilares e norteadores de seu corpo normativo a ideia de que "os direitos humanos são inerentes ao ser humano, e como tais antecedem a todas as formas de organização política; e sua proteção não se esgota - não pode se esgotar - na ação do Estado" [138].

Entretanto, como destaca Cançado Trindade, ainda no ano de 1947, a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), um dos órgãos especializados da Organização das Nações Unidas, a título de colaboração com a redação da Declaração, realizou um estudo dos principais problemas da época que deveriam constar no documento. [139] As interpretações foram as mais variadas possíveis, de acordo com as correntes filosóficas seguidas por cada um dos estudiosos consultados. Dessa forma, segundo o mesmo autor [140],

Enquanto Teilhard de Chardin insistia na garantia da liberdade do indivíduo perante as forças da coletividade, Aldous Huxley discorria sobre os juízos de valor na sociedade industrial e Jacques Maritain defendia o fundamento jusnaturalista dos direitos consagrados. Edward Carr advertia para a necessidade de inclusão dos direitos econômicos e sociais na [futura] declaração de direitos, ao passo que Quincy Wright ressaltava não só as relações entre os direitos individuais e sociais mas também as diferenças na implementação de cada categoria de direitos.

O plano inicial da Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas, órgão criado simultaneamente à criação da Organização das Nações Unidas e encarregada oficialmente de elaborar a Declaração, era criar uma Carta Internacional de Direitos Humanos, tendo a Declaração como sua primeira parte, sendo complementada posteriormente por Convenções e medidas de implementação, efetivamente estabelecidas somente vários anos mais tarde. Porém, apesar da demora em se implementar medidas operacionais à Declaração de Direitos, Cançado Trindade considera que esse lapso de tempo somente aumentou o impacto da Declaração Universal de 1948. Segundo ele, isso contribuiu para que os princípios constantes na Declaração fossem incorporados ao Direito Internacional Consuetudinário e aos princípios gerais de Direito, tanto internacional quanto nacionalmente [141]. Assim, somente em 1966, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas aprovou o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, entrando em vigor tão-somente em 1976.

Porém, como defende Friedmann, a Declaração Universal dos Direitos Humanos sofria de um mal: pecava por estabelecer tão somente padrões genéricos de aceitação daquilo que buscava estabelecer, ficando delegado totalmente aos Estados o seu atendimento. A Declaração, segundo o jurista alemão [142],

Não cria obrigações legais por parte destes (os Estados) nem reconhece reivindicações exequíveis por parte dos indivíduos para cuja proteção foi concebida. É um marco orientador e uma indicação da tendência dos padrões internacionais de moralidade, no máximo preparatória da criação de padrões legais definidos e não a corporificação de tais padrões.

Pode-se dizer que a Comissão de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas teve um trabalho digno de méritos ao redigir a Declaração e, nos anos seguintes, estabelecer a criação de dois Pactos de implementação dos Direitos Humanos. Isso porque, assim como dizem alguns estudiosos, conseguiu apaziguar ânimos e estabelecer consensos entre os mais diversos pensamentos e correntes políticas da época. Como diz Carrillo Salcedo, "a vida da Organização das Nações Unidas estava dominada pela Guerra Fria e o enfrentamento bipolar, ideológico, político e estratégico entre as duas superpotências, os Estados Unidos da América e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas" [143]. Havia, nessa época, "aqueles que torcessem para que o processo demorasse o máximo possível, devido às diversas posições conflitantes e o secreto desejo de muitos Estados de manter a sua soberania intacta" [144].

A formação de um pensamento unificado acerca da necessidade de proteção dos Direitos Humanos passa, então, a ser algo inédito nas Relações Internacionais. Sobre essa mudança, Friedmann [145] tem importante passagem em sua obra, elucidando o fato de que

A projeção das questões sociais e econômicas para o âmbito das relações internacionais tem um profundo efeito sobre a estrutura dessas relações e, consequentemente, do direito internacional. [...] Antes da Primeira Guerra Mundial, as tentativas de cooperação nesses campos estavam essencialmente confinadas a problema técnicos como a União Postal Internacional ou a Comissão Europeia do Danúbio.

Esse processo de legislação do Direito Internacional dos Direito Humanos passou, em certa medida, de uma fase de implementação dos primeiros instrumentos internacionais à efetiva proteção dos Direitos Humanos no ano de 1968, com a realização da primeira Conferência Mundial de Direitos Humanos, em Teerã. A segunda Conferência Mundial de Direitos Humanos ocorreu no ano 1993, na cidade de Viena. A partir dela houve, segundo Cançado Trindade, uma "reavaliação global da aplicação de tais instrumentos e das perspectivas para o novo século, abrindo campo ao exame do processo de consolidação e aperfeiçoamento dos mecanismos de proteção internacional dos direitos humanos" [146].

Não há dúvidas de que a Organização das Nações Unidas e seus Órgãos Especializados tiveram uma influência benéfica sobre a vida dos indivíduos mais necessitados ao redor do mundo. Entretanto, o que se vê, em grande parte, são medidas fortemente caracterizadas pelo voluntarismo dos Estados, ainda que as Organizações Não-Governamentais tenham adquirido um papel fundamental na proteção dos Direitos Humanos nas últimas décadas. Entretanto, a falta de efetividade dos programas de proteção dos Direitos Humanos ainda é visível, especialmente naqueles que possuem caráter universal. Com relação aos percalços à integral capacidade de ação dessas medidas globais, destaca muito bem Friedmann [147], ao dizer que

O maior obstáculo no caminho de uma carta internacional eficaz de direitos humanos é, naturalmente, a tentativa de unir as nações do mundo, com toda a sua diversidade de valores, praticas e padrões de governo, numa aceitação de princípios comuns. Onde isto foi tentado, como na Declaração dos Direitos Humanos das Nações Unidas, o preço a ser pago foi uma imprecisão de definições que, até certo ponto, anula seus propósitos. [...] Um pacto de direitos humanos pressupõe um grau de acordo que ainda não existe em nível universal sobre assuntos como liberdade de crença, padrões de administração judicial, santidade da propriedade privada ou controle dos recursos naturais.

Exatamente pelos motivos expostos pelo professor alemão, assim como outros que, direta ou indiretamente, tiveram influência no processo de aplicação da legislação do Direito Internacional dos Direitos Humanos, essa ciência jurídica não obteve a aplicação desejada e necessária à população mundial. Se no âmbito universal os Direitos Humanos encontraram enormes obstáculos à efetivação, no âmbito regional, o sucesso na proteção da pessoa humana foi extremamente superior. As Cortes Europeia e Interamericana de Direitos Humanos mostraram-se capazes de dar um passo à frente no desenvolvimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos.

Finalmente, no seio desses Organismos internacionais, o indivíduo encontrou a oportunidade que há séculos almejava: situar-se como sujeito de direitos com capacidade processual autônoma ao Estado, ou seja, consagrar-se como titular do direito de peticionar frente ao próprio Estado. Assim como enfatiza a doutrina, a transformação da ordem internacional, desencadeada com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, não tem acontecido sem dificuldades, especialmente pela necessidade de uma nova mentalidade com relação ao Direito Internacional. Porém, a conquista do direito de petição tem sido vista como uma grande vitória ao ser humano, como coloca o prof. Antônio Augusto Cançado Trindade, visto que

Já nos primórdios do exercício deste direito se enfatizou que, ainda que motivado pela busca da reparação individual, o direito de petição contribui também para assegurar o respeito pelas obrigações de caráter objetivo que vinculam os Estados Partes. Em vários casos o exercício do direito de petição tem ido mais além, ocasionando mudanças no ordenamento jurídico interno e na prática dos órgãos públicos do Estado [148].

A conquista desse direito tem sido relacionada, então, com o reconhecimento de que os Estados devem responder pela forma como tratam todos os indivíduos que se encontram sob sua jurisdição. Friedmann diz que, "o direito que tem um indivíduo de apresentar queixas perante uma corte supranacional, contra violações de seus direitos pelo Estado do qual é nacional, diminuiu um pouco o princípio da soberania estatal absoluta com relação aos nacionais" [149], representando, segundo analisado nesse trabalho, um retorno aos princípios dos Fundadores do Direito Internacional. Cançado Trindade ainda defende ser "da própria essência da proteção internacional dos direitos humanos a contraposição entre os indivíduos demandantes e os Estados demandados em casos de supostas violações dos direitos protegidos" [150]. Com relação à obtenção de tais direitos, em 1969, René Cassin [151], jurista, professor e juiz francês, vencedor do Prêmio Nobel da Paz por seus trabalhos durante a adoção da Declaração Universal dos Direitos Humanos, defendeu que, se na terra ainda subsistem

Grandes zonas onde milhões de homens ou mulheres, resignados a seu destino, não ousam proferir a menor reclamação ou nem mesmo a conceber que um recurso qualquer seja possível, estes territórios diminuem a cada dia. A tomada de consciência de que uma emancipação é possível, torna-se cada vez mais geral. [...] A primeira condição de toda justiça, qual seja, a possibilidade de encurralar os poderosos para sujeitar-se a [...] um controle público, satisfaz-se hoje bem mais frequentemente que outrora. [...] O fato de que a resignação sem esperança, de que o muro do silêncio e de que a ausência de todo recurso estejam em vias de redução ou de desaparecimento, abre à humanidade em marcha perspectivas encorajadoras.

Como visto, a partir das Cortes Europeia e Interamericana, o indivíduo passou a dotar-se de capacidade processual internacional, podendo demandar frente aos Estados as infrações aos Direitos Humanos. Por esse motivo, os próximos alvos de estudo serão exatamente esses Organismos Internacionais, a fim de analisar mais especificamente sua participação nesse desenvolvimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos, assim como a consagração dos preceitos defendidos pelos Fundadores do Direito Internacional, ainda nos séculos XV e XVI.

4.2.1 Os Sistemas Regionais de Proteção dos Direitos Humanos

Friedmann, já citado nesse estudo, considerava a proteção dos direitos humanos no âmbito regional muito mais interessante e viável, dada a possível homogeneidade dos Estados envolvidos e a facilidade nos entendimentos acerca da criação de mecanismos de proteção dos indivíduos. Seu pensamento é corroborado por outros autores atuais, dentre eles Flávia Piovesan, ao afirmar que, a partir do momento em que há menos Estados envolvidos, o consenso político é facilitado. Assim, citando Rhona K. M. Smith, a autora relembra que a cultura, língua e tradições semelhantes apresentam-se como vantagens no desenvolvimento de textos e mecanismos nessa área do Direito [152].

Nesse aspecto, a realidade mostrou-se também condizente com o pensamento de Friedmann, ao passo que os maiores avanços obtidos no âmbito internacional acerca da participação dos indivíduos no Direito Internacional dos Direitos Humanos ocorreram exatamente dentro dos Sistemas Regionais de Proteção dos Direitos Humanos. Assim sendo, o objeto desse estudo em sua sequência será a participação que as Cortes Europeia e Interamericana tiveram no desenvolvimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos e, em especial, no aumento da participação dos próprios indivíduos como sujeitos, e não mais como objetos de direito.

Importante, ainda, citar a existência do Sistema Africano de Proteção dos Direitos Humanos. Ainda que visivelmente menos desenvolvido do que os sistemas europeu e interamericano e, infelizmente, criado sobre bases jurídicas e democráticas menos sólidas, esse não deixa de ser considerado uma mudança no pensamento jurídico internacional daquela região. O presente estudo, não tendo objetivo de abraçar todos os sistemas existentes, não se aprofundará no sistema Africano, ainda que a menção à sua existência e relevância se faça necessária.

4.2.1.1 O sistema europeu de proteção dos direitos humanos

Os acontecimentos ligados à Segunda Guerra Mundial fizeram com que, em 1949, dez Estados europeus [153] se reunissem em Londres a fim de estabelecer um Conselho da Europa [154]. A falta de objetividade com relação aos assuntos ligados aos Direitos Humanos fez com que um movimento europeu pressionasse o Conselho para a adoção de uma Convenção Regional sobre o tema. O Movimento estava motivado especialmente pela aparência de pouca efetividade que a recém criada Declaração Universal de Direito Humanos continha, assim como a baixa expectativa pelos futuros Pactos que se prometia criar [155]. Contrariamente à pluralidade de pensamentos e crenças que se via ao redor do mundo na época do fim da Segunda Guerra Mundial, "elas (as partes do Conselho da Europa) partilham de uma cultura ocidental comum, tradições comuns e, em geral, da crença no sistema democrático de governo e do valor do indivíduo como constituindo mais que uma pequena peça na maquinaria do governo" [156].

Desde logo consagrou-se a ideia de que seria criada uma Corte Europeia, assim como uma Comissão Europeia, no intuito de analisar os casos previamente à Corte. O direito de petição inicial ainda não tinha sido implantado cabalmente, permanecendo inserido em uma clásula facultativa do tratado. Os direitos que se buscava defender eram muitos e variados, assim como destaca Friedmann [157],

A Convenção abrange os direitos à vida, à liberdade da tortura ou escravidão, à liberdade e à segurança da pessoa, ao processo justo e à proteção contra a aplicação das leis penais a infrações cometidas antes da vigência dessas leis. Ela protege a liberdade de pensamento, consciência e expressão e o direito à associação pacífica. Inclui também uma proteção limitada da propriedade privada, da qual o indivíduo só pode ser despojado apenas no interesse público e sujeito às condições estabelecidas pela lei e pelos princíprios gerais do direito internacional.

Entretanto, como aponta Cançado Trindade, já em seus primeiros casos contenciosos se insurgiram críticas à artificialidade da mediação feita pela Comissão Europeia, impedindo o indivíduo de peticionar diretamente à Corte. No caso Lawless vs Irlanda (1960), "a Corte Europeia passou a receber, por meio dos delegados da Comissão Europeia, argumentos escritos dos próprios demandantes, que frequentemente se mostravam bastante críticos no tocante à própria Comissão" [158]. Ele ainda lembra que, uma década depois, em 1960, no caso Vagrancy vs Bélgica, no momento em que o advogado de uma das partes pôde falar perante a Corte, ele criticou o relatório da Comissão com relação ao seu caso.

O desenvolvimento da participação dos indivíduos frente à Corte Europeia deu-se, de forma mais interessante, a partir do Protocolo nº 9, adotado em 1990. Este consagrava, para os Estados que o ratificaram, o direito de acesso direto à Corte, após considerados pela Comissão. A cristalização do locus standi aos indivíduos, ou seja, o direito de falar e justificar seu pedido frente à Corte deve ser enxergado, segundo defende Cançado Trindade, como um "passo significativo para o fortalecimento da posição do indivíduo no contencioso internacional dos direitos humanos" [159]. Porém, ainda que o Protocolo nº 9 tenha sido adotado em 1990, assim como alega Cançado Trindade, o Comitê de Peritos em Direitos Humanos do Conselho da Europa já estava consciente das mudanças necessárias à eficiência do órgão quatorze anos antes, em 1976. Durante esse período em que se construiu a ideia de modificações na forma de atuação dos órgãos de proteção aos direitos humanos, os mais diversos argumentos foram se cristalizando, formando um corpo de ideias que possibilitaram os avanços na participação dos indivíduos frente à Corte.

Assim, da época da adoção do Protocolo nº 9, os argumentos que sustentavam uma maior participação efetiva do ser humano no órgão eram os seguintes: esse representava o desenvolvimento lógico do sistema de controle da Convenção de Direitos Humanos; seriam evitados tratamentos desiguais entre Estados e indivíduos, considerados partes iguais frente ao órgão decisório; daria liberdade aos indivíduos de decidir se havia ou não interesse em peticionar frente à Corte e, por fim, a estrutura existente seria aperfeiçoada ao conceder maior capacidade processual aos indivíduos, possibilitando seu acesso direto ao tribunal de direitos humanos [160].

Entretanto, foi a partir da adoção do Protocolo nº 11 que o direito de petição por parte dos indivíduos configurou-se como uma verdadeira emancipação com relação ao Estado na qual se é nacional. Esse protocolo, adotado em 1998, modificou o posicionamento normativo do direito de petição dos indivíduos, não mais colocando-o dentro de uma cláusula facultativa a ser ratificada pelos Estados, mas sim uma cláusula de conteúdo mandatário, impedindo que os Estados não consentissem ou dificultassem o acesso dos seres humanos autonomamente à Corte. Além disso, o Protocolo nº 11 entrou em vigor com o objetivo de substituir a Comissão e a Corte Europeia, órgãos com funcionamento em tempo parcial, por uma Corte Europeia de Direitos Humanos de caráter permanente, juridicamente vinculante e com decisões de natureza declaratória, "reforçando o caráter jurisdicional do sistema" [161] e estendendo os direitos de petição também às Organizações Não-Governamentais [162].

Dessa forma, o locus standi concedido aos indivíduos a partir do Protocolo nº 9 passou a figurar como um jus standi, ou seja, um avanço no sentido de garantir ao ser humano a posição de verdadeiro sujeito do Direito Internacional dos Direitos Humanos, dotados de plena capacidade jurídica processual internacional. Assim, Cançado Trindade [163] diz que

O aperfeiçoamento institucional da Convenção Europeia, mediante a entrada em vigor do Protocolo nº 11, reflete, em última análise, o reconhecimento inequívoco de que a via judicial constitui a modalidade mais aperfeiçoada de salvaguarda internacional dos direitos humanos. [...] Os direitos humanos devem ser protegidos no plano internacional por um órgão judicial, operando em base permanente e tempo integral, com jurisdição compulsória em matéria contenciosa, ao qual os indivíduos têm o direito de acesso direito (independentemente da aceitação de uma cláusula facultativa pelo Estado em que se encontram).

A jurisprudência que a Corte Europeia de Direitos Humanos vem criando é considerada pelos estudiosos como de grande importância. Os motivos pelos quais os Estados cumprem as determinações da Corte, apesar de meramente declaratórias, variam de: pressões diplomáticas no seio do Conselho da Europa, interesses em integrar a União Europeia e o chamado power of shame ou power of embarrassment, ou seja, a possibilidade de ser considerado um Estado violador dos Direitos Humanos. As penas mais utilizadas pela Corte com relação aos Estados condenados são de natureza pecuniária em favorecimento das vítimas, não excluindo a possibilidade, assim como estipulado no Estatuto do Conselho, de exclusão do Estado infrator do Conselho da Europa, em especial nos casos em que há descumprimento das determinações iniciais da Corte.

Flávia Piovesan conecta o alto grau de cumprimento das decisões da Corte a várias possibilidades. Dentre elas, enumera-se a tradicional observância aos princípios de Estado de Direito pelos Estados-parte do Conselho da Europa, o compartilhamento dos valores democráticos e de direitos humanos, assim como a busca pela integração política e, por último, a credibilidade alcançada pela própria Corte ao longo dos anos, "por atuar com justiça, equilíbrio e rigor intelectual" [164].

A jurisprudência da Corte também tem auxiliado o fortalecimento da noção de indivíduo como sujeito de direitos dentro do Direito Internacional dos Direitos Humanos. Cançado Trindade defende que a Corte tem realizado uma gradual ampliação do conceito de "vítima" sob o âmbito da Convenção, o fortalecimento dos indivíduos enquanto sujeitos perante a Corte, a flexibilização do esgotamento dos recursos jurídicos internos como condição de admissibilidade das demandas perante a Corte Europeia e a própria noção de obrigatoriedade de cumprimento das decisões da Corte por parte dos Estados tem ganhado corpo. Assim, no caso Hornsby vs Grécia, de 1997, a Corte defendeu que o direito a um julgamento justo e imparcial "seria ilusório se se referisse tão só à formulação das garantias processuais e à conduta das partes litigantes, sem abarcar também a implementação das decisões judiciais, o que dificilmente se conformaria com a própria noção de Estado de Direito" [165].

Além das decisões constantes no intuito de garantir ao ser humano sua posição de destaque dentro do aparato processual do Direito Internacional dos Direitos Humanos, em especial na Corte Europeia de Direitos Humanos, a jurisprudência também caminha no sentido de garantir os direitos materiais, e não somente formais, aos indivíduos. A partir de uma série de casos, os juízes da Corte Europeia têm defendido os direitos à justiça no processo civil e penal, as garantias essenciais aos indivíduos encarcerados, a liberdade de expressão, credo e opção sexual, assim como os direitos de imigração e expulsão. Além disso, como escreve Cançado Trindade, outro ponto de grande relevância é a jurisprudência da Corte no âmbito da hermenêutica. A Corte Europeia não se limita a estender a obrigatoriedade de suas decisões aos Estados que integram os pólos passivos ou ativos de uma demanda, mas garantem efeito erga omnes à decisão, podendo ser defendida pelas partes perante qualquer Estado parte da Convenção Europeia [166].

Apesar da necessidade de continuar avançando no sentido de garantir ao ser humano a proteção de seus direitos mais efetivamente, o Sistema Europeu de Proteção aos Direitos Humanos vem se mostrando um grande aliado dos indivíduos no cenário internacional. Muitos dos ideais pensados pelos Fundadores do Direito Internacional e subjugados durante séculos vêm sendo finalmente aplicados graças à contribuição da Corte ao Direito Internacional. A capacidade processual dos indivíduos é algo pensado há séculos, ainda por Hugo Grotius, e que, pelos mais diversos motivos mostrados, permaneceu à margem da realidade internacional.

Se a Corte Europeia trouxe avanços na proteção aos Direitos Humanos, há que se destacar também, em menor medida, provavelmente, a participação da Corte Interamericana nesse processo. O órgão situado em território americano não possui, como o Sistema Europeu, o acesso direto e autônomo dos indivíduos à Corte de Direitos Humanos. Porém, apesar de menos evoluído e, consequentemente, menos efetivo, a observância de sua participação no desenvolvimento do ser humano como sujeito de direitos é, em última análise, válida. Sua criação e evolução serão, de forma concisa, fruto de análise na sequência do estudo, assim como a verificação de sua participação no intuito de cristalizar os pensamentos dos antigos F. de Vitoria, F. de Suárez e Hugo Grotius.

4.2.1.2 O sistema interamericano de proteção dos direitos humanos

O Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos, como será visto com maior precisão na sequência, ainda não alcançou alguns dos significantes avanços percorridos pelo Sistema Europeu. Entretanto, como a análise histórica dos sistemas sugere, o Sistema Interamericano segue numa linha de evolução semelhante àquela europeia. Dessa forma, há que se pensar que, se os desenvolvimentos em solo americano que se têm visto no início deste século XXI são relacionados com aqueles adotados pelo Sistema Europeu na década de oitenta do século passado, os cidadãos americanos hão que aguardar vitórias semelhantes.

A década de 50, como já visto, observou um importante desenvolvimento normativo no âmbito dos Direitos Humanos, com a redação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, instrumento que viria ser a pedra angular do Direito Internacional dos Direitos Humanos. No continente americano, esse período também foi de grande importância para esse ramo da ciência jurídica internacional. A IX Conferência Internacional Americana, realizada em Bogotá, foi o evento que propiciou a adoção da Carta da Organização dos Estados Americanos, criando a Organização que abarca os 35 Estados das Américas (incluindo o Caribe). Na mesma ocasião, foi redigida a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem, representando o marco inicial do Sistema Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos [167].

Essa declaração, tão importante ao futuro desenvolvimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos na América, consagrou alguns dos princípios que vinham tomando corpo também naquela década, na Europa, com sua materialização na futura Declaração Universal dos Direitos Humanos. Assim, a Declaração Americana veio cristalizar: a concepção de direitos humanos inerentes à pessoa humana, a reunião dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais como fundamentais à vida humana, a base normativa vis-à-vis Estados não-Partes na Convenção Americana sobre Direitos Humanos e a correlação entre direitos e deveres [168]. O posicionamento que deveria ser adotado pelos Estados-parte da Organização dos Estados Americanos fica claro no preâmbulo da Declaração, trazido pela obra de Lima Junior [169], no sentido de

Que, em repetidas ocasiões, os Estados Americanos reconhecem que os direitos essenciais do homem não derivam do fato de ser ele cidadão de determinado Estado, mas sim do fato de os direitos terem como base os atributos da pessoa humana; Que a proteção internacional dos direitos do homem deve ser a orientação principal do direito americano em evolução; Que a consagração americana dos direitos essenciais do homem, unida às garantias oferecidas pelo regime interno dos Estados, estabelece o sistema inicial de proteção que os Estados americanos consideram adequado às atuais circunstâncias sociais e jurídicas, não deixando de reconhecer, porém, que deverão fortalecê-lo cada vez mais no terreno internacional, à medida que essas circunstâncias se tornem mais propícias.

Assim, em 1959, em Santiago, Chile, durante a V Reunião de Consulta dos Ministros de Relações Exteriores, foi criada, a partir de uma resolução, e não de um tratado, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Segundo seu estatuto, tinha a Comissão, assim como coloca Cançado Trindade, um mandato limitado à promoção dos direitos humanos. Não obstante, já em seus primeiros anos de atuação, a Comissão passou a atuar de forma mais incisiva, lutando por ampliações de seu rol de trabalhos. Dessa forma, durante a II Conferência Interamericana Extraordinária, no Rio de Janeiro, em 1965, a Comissão teve seus poderes ampliados, podendo receber petições ou comunicações sobre violações de direitos humanos [170].

Em 1970, com a entrada em vigor do primeiro Protocolo de Reformas da Carta da Organização dos Estados Americanos, foi reconhecida "a necessidade de dotar de bases jurídicas tanto a Declaração Americana como a Carta da OEA" [171]. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos passou a ter seu posicionamento jurídico muito fortalecido, combatendo as indagações sobre sua competência. Seu caráter de mera promoção dos direitos humanos foi finalmente extinto, passando a controlar e supervisionar a proteção dos Direitos Humanos.

A Comissão passou a incitar os Estados na harmonização de suas Constituições internas com os preceitos de direitos humanos defendidos pelos tratados de direitos humanos. Cançado Trindade expõe o caráter fortemente participativo que a Comissão adquiriu a partir de então. O autor cita como exemplo o caso chileno, em que a Comissão "se engajou na coleta de dados relevantes sobre a situação, realizou missões in loco, e elaborou recomendações e uma série de relatórios a partir de 1973" [172].

A Comissão ainda se mostrou sensível no tocante à hipossuficiência dos reclamantes sobre direitos humanos, flexibilizando algumas questões de admissibilidade, como o esgotamento dos recursos internos. O caráter preventivo da Comissão também teve grande importância, como defende Aguilar, "foram derrogados ou modificados leis, decretos e outros dispositivos que afetavam negativamente a vigência dos direitos humanos, [além de que] se estabeleceram ou aperfeiçoaram recursos e procedimentos para a melhor tutela" dos direitos humanos" [173].

Em 1978, com a ratificação do décimo primeiro Estado, finalmente entrou em vigor a Convenção Americana de Direitos Humanos, assinada quase dez anos antes. Ficou, dessa forma, estabelecido um novo "aparato de monitoramento e implementação dos direitos que enuncia [humanos]" [174], integrado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos e pela Corte Interamericana.

O desenvolvimento procedimental das petições ficou da seguinte maneira: a Comissão tem a competência de receber a petição e decidir acerca de sua admissibilidade, pautado no prévio esgotamento dos recursos internos, salvo injustificada demora processual, e solicitar informações ao governo denunciado. Se, após recebimento dos documentos estatais, verificar-se que existem, de fato, fundamentos à petição, a Comissão realiza um exame da matéria, investigando os fatos quando considerar necessário. O próximo passo da Comissão é buscar uma solução pacífica e, caso não o consiga, encaminhar um relatório ao Estado, dando um prazo de três meses ao cumprimento das recomendações. Decorrido o prazo, a Comissão pode dar parecer próprio sobre o caso, caso tenha decisão fundamentada de maioria absoluta de seu colegiado, publicando-o no relatório anual de suas atividades, ou encaminhar o caso à Corte, de forma compulsória se verificado o não-cumprimento das recomendações por parte do Estado, sendo esse o órgão jurisdicional do sistema interamericano. Quando enviado à Corte, diversamente do sistema europeu, a competência de pleitear frente aos juízes é da Comissão, e não diretamente dos indivíduos, em grupo ou individualmente, e da Organizações Não-Governamentais [175].

Evidente que, assim como observado no desenrolar procedimental do Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos, a participação do ser humano é muito mais limitada do que no Sistema Europeu. A falta de legitimidade no comparecimento frente à Corte mostra-se como um cerceamento de uma efetiva participação dos indivíduos como sujeitos de direito no Sistema Interamericano. Entretanto, como já colocado anteriormente nesse estudo, a agenda atual do Sistema Interamericano apresenta problemas de desenvolvimento semelhantes àqueles vistos no Sistema Europeu em fins da década de oitenta e que, felizmente, são hoje consagrados. A locus standi, ou seja, a representação legal do indivíduo frente à Corte Interamericana ocupa posição central na preocupação dos juristas com relação ao futuro do Sistema Interamericano [176].

Outro ponto que urge um necessário desenvolvimento referente à Convenção Americana sobre Direitos Humanos se configura no plano contencioso da Corte, ao passo que a competência dessa é limitada aos Estados-parte da Convenção que "reconheçam tal jurisdição expressamente; [...] esse dispositivo constitui um anacronismo histórico, que deve ser superado a fim de que se consagre o automatismo da jurisdição obrigatória da Corte para todos os Estados-parte da Convenção" [177]. Cançado Trindade [178] expressa sua preocupação com relação à falta de obrigatoriedade quando defende que

Sob as cláusulas da jurisdição obrigatória e do dirieto de petição individual se ergue todo o mecanismo de salvaguarda internacional do ser humano, razão pela qual me permito designá-las verdadeiras cláusulas pétreas de proteção internacional dos direitos da pessoa humana.

Um verdadeiro "divisor de águas" nesse processo necessário de jurisdicionalização da Corte Interamericana de Direitos Humanos, representado pela concessão de locus standi aos indivíduos, foi o caso El Amparo, em meados dos anos noventa. Durante a audiência pública do processo, realizada em 1996, um dos magistrados da Corte manifestou expressamente que, ao menos naquela etapa do processo, "não podia haver dúvida de que os representantes das vítimas eram a verdadeira parte demandante ante a Corte" [179] e, a partir de então, passou a fazer perguntas diretas a eles e não aos delegados da Comissão.

A importância desse caso foi tamanha que, no ano seguinte, com a vigência do terceiro Regulamento da Corte, ficou estabelecido que, assim como constante no artigo 23 do documento, na etapa de reparações, "os representantes das vítimas ou de seus familiares poderão apresentar seus próprios argumentos e provas de forma autônoma". Porém, somente no ano 2000, com a adoção do quarto Regulamento da Corte, o locus standi aos indivíduos foi finalmente cristalizado no corpo normativo do Sistema Interamericano, estabelecendo que os indivíduos demandantes teriam direito de argumentar perante à Corte em todas as etapas do procedimento contencioso.

As vitórias acerca da participação dos indivíduos no Direito Internacional dos Direitos Humanos, além de terem dado ânimo àqueles descrentes perante o consagrado voluntarismo estatal, não apaziguou os clamores dos juristas, inclusive daqueles que formam o corpo de magistrados da Corte Interamericana. Cançado Trindade, autor citado por diversas vezes nesse estudo, dado seu consagrado saber jurídico, também cresce em importância teórica por ser um desses magistrados. Sem medo, pode-se afirmar que o jurista brasileiro é um dos juristas, dentre aqueles que compõem a Corte, que mais tem dado vida à luta no reconhecimento do indivíduo como sujeito de direito no âmbito americano e mundial. Reflexo desse reconhecimento encontra-se em seus diversos votos diante da Corte americana, sempre reiterando a importância da colocação do ser humano em um lugar de destaque dentro dos processos e, em maior medida, do Direito. Durante o caso Castillo Petruzzi vs Peru, o jurista brasileiro [180] defendeu em seu voto que

é pelo livre e pleno exercício do direito de petição individual que os direitos consagrados na Convenção [americana sobre direitos humanos] se tornam efetivos. O direito de petição individual abriga, com efeito, a última esperança dos que não encontraram justiça em nível nacional. Não me omitiria nem hesitaria em acrescentar,- permitindo-me a metáfora, que o direito de petição individual é indubitavelmente a estrela mais luminosa no firmamento dos direitos humanos.

Após verificar a forma como tem trabalhado o Sistema Interamericano de Proteção dos Dirietos Humanos, há que se falar numa constante necessidade de desenvolvimento, visto que o ser humano ainda não adquiriu, no âmbito americano, total emancipação perante o Estado no que tange à proteção de seus direitos essenciais. Entretanto, seria equivocado não considerar tamanha evolução em tão pouco tempo. Os séculos em que o ser humano foi marginalizado nos assuntos jurídicos internacionais foram muitos e, não por acaso, configuraram-se como extremamente danosos à proteção da pessoa humana.

Se ainda existe uma flagrante fragilidade do Sistema Interamericano, isso se dá pela fragilidade dos próprios regimes internos de cada país, especialmente na América Central e do Sul. A proteção dos indivíduos no âmbito interno ainda se caracteriza por ser incipiente, assim como a democracia não se encontra cristalizada em alguns Estados. Um sistema de proteção que busque abarcar uma série de Estados fica, invariavelmente, ligada à tradição interna dos próprios Estados. Piovesan coloca que, "tendo o desafio de romper com as práticas do legado autoritário ditatorial, é que se delineiam na região, gradativamente, espaços institucionais de cooperação intergovernamental vocacionados à defesa dos direitos humanos, da democracia e do Estado de Direito" [181].

Os Sistemas Regionais de Proteção dos Direitos Humanos foram e são de grande importância ao indivíduo no cenário internacional, devendo ser protegidos quanto à sua funcionalidade e desenvolvidos quanto à participação do ser humano. Assim como visto no início deste estudo, os pensadores intitulados como Fundadores do Direito Internacional, apesar de renegados durante muitos séculos, têm recebido a devida importância nesse início de século. O processo que teve início com o fim da Segunda Guerra Mundial vem tentando recolocar o ser humano na posição que lhe é devida: como fim último do Direito.

4.4 A HUMANIZAÇÃO DO DIREITO INTERNACIONAL

Após a verificação de uma série de teorias acerca dos fundamentos do Direito Internacional, enfatizando as concepções jusnaturalistas dos Fundadores do Direito Internacional, chega-se ao momento em que se pode considerar sua validade no cenário atual. Evidente que não há que se falar na possibilidade de aplicação de tais conceitos nos últimos séculos, marcados pelo voluntarismo estatal ilimitado.

Assim, a partir da metade do século XX, como defende Cançado Trindade, a doutrina mais esclarecida passou a distanciar-se dos ideais de Estado impregnados no Direito Internacional até então. A noção de que o Estado é um fim em si mesmo, não existindo para servir aos indivíduos, seus verdadeiros componentes, passou a ser abandonada por alguns. Ainda que o mundo contemporâneo seja completamente diferente daquele em que viveram os Fundadores do Direito Internacional, a inspiração humana é a mesma: "a construção de um ordenamento internacional aplicável tanto aos Estados quanto aos seres humanos, em conformidade com certos estandartes universais de justiça" [182].

Conforme defendido por F. de Vitoria ainda no século XVI, o Direito Internacional, construído segundo as necessidades das Relações Internacionais e reduzido a uma mera "dimensão relacional", fato que realmente se consagrou durante vários séculos, "esvaziaria o que tem de mais precioso, embora nem sempre positivado - o conjunto de princípios, de parâmetros, de paradigmas, que norteiem a ordenação teleologicamente humana do mundo" [183].

A própria noção de direitos humanos inerentes à pessoa humana é considerada um retorno às origens dos Fundadores do Direito Internacional, exatamente por ser fortemente pautada nos ideais do Direito Natural defendidos por aqueles autores séculos atrás. Os seres humanos têm direitos tão-somente pelo fatos de serem considerados como tal, não podendo restringí-los, assim como prevê a doutrina positivista predominante durante largo período, àqueles que o Estado "concede" aos indivíduos.

A proteção dos direitos humanos vem ganhando corpo gradativamente no âmbito universal e regional, como foi visto, e sua efetividade vem sendo aprimorada ao longo das últimas décadas. Entretanto, apesar de ser uma construção normativa recente, a necessidade de proteção dos seres humanos no âmbito internacional foi idealizada por Hugo Grotius, durante o século XVII. O autor holandês já defendia a ideia, ainda que não tenha sido aplicada durante vários séculos, em decorrência do já citado positivismo.

Entretanto, pode-se dizer que, o incipiente aumento da participação do ser humano como sujeito do Direito Internacional é o ponto crucial desse movimento de proteção aos direitos humanos. Um corpo normativo sem as ferramentas necessárias à sua proteção e sem a possibilidade de petição frente às infrações torna-se letra morta. Por esses motivos, a colocação do indivíduo em posição central no Direito Internacional dos Direitos Humanos é, muito provavelmente, o principal legado jurídico-internacional do último século. A humanidade está, sob a ótica de Cançado Trindade, testemunhando um processo de humanização do Direito Internacional, caracterizado precipuamente pela "identificação e realização de valores e metas superiores" [184]. O mesmo autor [185], em sua obra, afirma que

Desde a obra clássica de Hugo Grotius no século XVII, tem se desenvolvido uma influente corrente de pensamento jusinternacionalista que concebe o Direito Internacional como um ordenamento jurídico dotado de valor próprio ou intrínseco (e, portanto, superior a um direito simplesmente voluntário), derivando sua autoridade de certos princíprios da razão.

Os Fundadores do Direito Internacional, apesar de não haverem tido aplicação em sua época ou nos séculos que se seguiram, têm alcançado êxito, finalmente. Seus ideais revolucionários à época parecem, quase cinco séculos depois, completamente originais e condizentes com a necessidade da realidade internacional. Partindo do princípio de que nenhum Estado pode considerar-se acima do Direito, retornamos à origem conceitual tanto do Estado como do Direito Internacional. Enquanto o primeiro não pode se esquecer de que foi originalmente concebido à realização do bem comum e que existe para o ser humano, e não ao contrário, o segundo não pode se esquecer de que não tem suas origens em um direito estritamente interestatal, mas sim no antigo direito das gentes [186].

O Direito Internacional, após séculos de negação aos preceitos jusnaturalistas e, por conseguinte, de correntes afrontas aos Direitos Humanos, finalmente tem se preocupado com aqueles ideais preconizados pelos Fundadores do Direito Internacional. A amplitude que esse desenvolvimento terá está guardado na história futura, porém, como consolo àqueles ávidos por mudanças, o Direito Internacional, após aceitar parte daquilo que foi pregado pelos antigos, já tem se mostrado um instrumento muito mais condizente com seu fim último: o ser humano.


5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo, como visto ao longo de seu desenvolvimento, buscou analisar a forma como o ser humano vem adquirindo capacidade processual perante o Direito Internacional dos Direitos Humanos, relembrando os escritos dos antigos teóricos Francisco de Vitoria, F. de Suárez e Hugo Grotius, no sentido de que, ainda no século XVI e XVII, esses já defendiam que o ser humano deveria ser colocado em posição de destaque no Direito Internacional. A partir da análise das principais teorias que buscam fundamentar o Direito Internacional, separadas entre Voluntaristas e Objetivistas, viu-se, claramente, a fonte da obrigatoriedade e validade do Direito segundo as mais diversas perspectivas.

Porém, como facilmente observado, deu-se, aqui, maior ênfase às teorias objetivistas, ou seja, aquelas que não colocam o Direito Internacional como fruto tão-somente do trabalho dos Estados, mas como algo anterior e superior a esses agentes internacionais. Muitos dos institutos que foram analisados mais adiante tiveram sua criação ainda com os Fundadores do Direito Internacional, como a necessidade de proteção do ser humano e seu caráter central no Direito Internacional. Até mesmo a capacidade de proteção efetiva de seus direitos frente ao Estado já fora proposta por esses teóricos antigos.

Entretanto, com o advento dos Estados nacionais e a cristalização desses como entes internacionais dotados de soberania absoluta, especialmente após o Tratado de Vestfália, os direitos humanos foram renegados àqueles que os Estados concediam aos indivíduos. Os ideais do direito natural defendidos por Grotius, apesar do forte apelo humanístico, não chegou a ter aplicação prática. O Direito Internacional e as relações internacionais absorveram, por sua vez, os ideais do positivismo jurídico da época, instituindo e embasando a soberania dos Estados e a não observância de qualquer poder que pretenda ser-lhes superior. O fruto de um cenário internacional pautado no positivismo foi uma sequência de guerras e conflitos, tendo como principal vítima, evidentemente, o ser humano, um ente marginal ao Direito Internacional.

Já no século XX, com a deflagração das duas Grandes Guerras Mundiais, o pensamento jurídico sofreu uma grande mudança, repensando a eficácia dos ideais positivistas na manutenção da paz e da sobrevivência dos Estados e dos indivíduos. A partir de então, com a criação da Declaração Universal dos Direitos Humanos e, especialmente nos órgãos regionais de proteção dos direitos humanos, os indivíduos passaram a adquirir maior liberdade frente ao Estado. A segunda metade do século XX foi de grande valia à aplicação daqueles ideais propostos pelo Fundadores do Direito Internacional, no sentido de centralização, ainda que não de forma ideal, do ser humano na ciência jurídica internacional. O melhor exemplo, assim como explicitado no estudo, é o Sistema Regional de Proteção dos Direitos Humanos Europeu, aonde os indivíduos adquiram capacidade processual frente ao próprio Estado, podendo litigar em causa própria dentro do Direito Internacional.

Essas mudanças ainda não representam um ponto final para aqueles que defendem os escritos dos Fundadores do Direito Internacional, no sentido de que o ser humano é um fim em si mesmo dentro da ciência jurídica, e não os Estados. Não obstante estarmos longe de um Direito Internacional que de fato coloque o ser humano como agente máximo e fim último, o progresso que se tem visto nas últimas décadas cria esperanças àqueles que acreditam nos ideais jusnaturalistas, possibilitando, talvez, a concretização de alguns pensamentos do célebre Hugo Grotius.

A partir de então encontra-se, muito provavelmente, o principal desafio à próxima geração de juristas. A aproximação do ser humano com relação ao núcleo do Direito Internacional tem se mostrado um movimento muito benéfico à proteção de direitos fundamentais ao indivíduo e seu desenvolvimento contínuo parece guardar muitos outros aspectos positivos ao cenário internacional. A concentração do Direito no Estado mostrou-se, durante séculos, deficiente na proteção daquele que deve ser visto como o mais importante ente do cenário nacional e internacional, o ser humano.


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Notas de Rodapé

  1. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. Volume 1. 15. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 147.
  2. "Aonde há sociedade, há direito" (tradução livre). Cf. MELLO, 2004, p. 52.
  3. O Estado é tido por muitos autores como agente originário do Direito Internacional Público, caracterizando-se pela existência de três elementos básicos: território próprio, população estabelecida e governo não subordinado a outras autoridades. Sobre esse conceito, Cf. REZEK, José Francisco. Direito internacional público: curso elementar. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 161.
  4. QUOC DINH, Nguyen. DAILLIER, Patrick. PELLET, Alain. Direito internacional público. 4. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1999, p. 29.
  5. REZEK, 2008, p. 248.
  6. MELLO, 2004, p. 53.
  7. Id., 2004, p. 116.
  8. Ibid., p. 56.
  9. Ibid., p. 147.
  10. Ibid., p. 149.
  11. AZEVEDO, Oldemar. Soberania: noções e fundamentos. São Paulo: Editora lex ltda, [19--], p. 68.
  12. JELLINEK, Georg. Teoria general del estado. Buenos Aires: Editorial Albatroz, 1954, p. 388 apud AZEVEDO, [19--], p. 69.
  13. MELLO, 2004, p. 149.
  14. CUNHA, Joaquim Moreira da Silva; PEREIRA, Maria da Assunção do vale. Manual de direito internacional público. Coimbra: Livraria Almedina, 2000, p. 63.
  15. Id., 2000, p. 64.
  16. MELLO, 2004, p. 149.
  17. Id., 2004, p. 150.
  18. Ibid., p. 151.
  19. "Em verdade, Hans Kelsen fez uma verdadeira revolução no vastíssimo campo do Direito, contrariando os pontos de vistas dos tradicionários da Teoria e da práxis do versar jurídico ao tempo corrente. Assim, a posição científica kelseniana é um legítimo divisor do pensamento jurídico universal: o que existe hoje em Teoria do Direito situa-se antes e depois de Kelsen". Cf. KELSEN, Hans. Teoria geral das normas. Porto Alegre: Fabris, 1986, p. XII.
  20. CUNHA; PEREIRA, 2000, p. 69.
  21. KELSEN, op. cit., p. 328.
  22. MELLO, 2004, p. 151.
  23. Francês, foi membro da Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas, vivendo de 1868 até 1961. Este é considerado como "o representante mais qualificado da doutrina solidarista no campo do Direito Internacional". Cf. CUNHA; PEREIRA, 2000, p. 72.
  24. Ibid., p. 72.
  25. Ibid., p. 74.
  26. Em sua obra, A República, Platão busca estabelecer as características necessárias a um Estado justo. Segundo ele, o Estado não pode fundar-se na doutrina da legitimidade do poder ou na tradição, mas em fundamentos e princípios universalmente válidos que visassem o aprimoramento moral do indivíduo. Dessa forma os próprios líderes deveriam trazer consigo sabedoria e virtudes, e não as clássicas inteligência e eloquência sofistas da época. Como observado, esse pensamento será em partes absorvido pelos teóricos do direito natural a partir da ideia de recta ratio. Cf. PERRY, Marvin. Civilização ocidental: uma história concisa. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 65.
  27. Orthos logos, segundo o pensamento de Platão e Aristóteles, é a Ética da razão. Segundo os pensadores gregos, o conhecimento do que é a ética é completamente possível e deve-se basear na razão do indivíduo. Dessa forma, "as pessoas podiam alcançar a felicidade quando exerciam o traço distintivamente humano do raciocínio, quando aplicavam adequadamente à vida o seu conhecimento e quando seu comportamento era regido pela inteligência e não por capricho, tradição ou autoridade". Cf. Id., 2002, p. 68.
  28. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. A humanização do direito internacional. Belo Horizonte: Del Rey, 2006, p. 7.
  29. Id., 2006. P. 7.
  30. Cícero et al. Da república. Traduzido por Amador Cisneiros. Col. Os Pensadores. São Paulo: Abril, 1973. P. 178 apud PERRY, 2002, p. 112.
  31. MELLO, 2004, p. 154.
  32. TRINDADE, 2006, p. 8.
  33. MELLO, 2004, p. 156.
  34. "Os Fundadores do Direito Internacional"
  35. CUNHA; PEREIRA, 2000, p. 22.
  36. TRINDADE, 2006, p. 7.
  37. "Dominicano, formado em Burgos e em Paris, ensinou Teologia no convento de S. Gregório de Valladolid e, de 1526 até à morte, que foi em 1546, na Universidade de Salamanca". Cf. TRUYOL Y SERRA, Antonio. História do direito internacional público. 1. ed. Lisboa: Instituto Superior de Novas Profissões, 1996, p. 60.
  38. MELLO, 2004, p. 176.
  39. TRINDADE, 2006, p. 8.
  40. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 47.
  41. TRUYOL Y SERRA, 1996, p. 62.
  42. Lex praeceptiva, a lei, deriva do jus praeceptivum, ou seja, o direito objetivo positivo. Cf. LOPES, José Reinaldo de Lima. O Direito na história: lições introdutórias. 3. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2008, p. 169.
  43. TRINDADE, 2006, p. 10.
  44. Das Leis e de Deus legislador. Cf. LOPES, 2008, p. 169.
  45. TRINDADE, 2006, p. 11.
  46. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 47.
  47. SUÁREZ, Francisco. De legibus: de iure gentium. org. L. Pereña et al, vol 4, Madrid, 1973. P. 135-6 apud HASLAM, Jonathan. A necessidade é a maior virtude: o pensamento realista nas relações internacionais desde Maquiavel. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 233
  48. "Nascido no ano de 1583 em Delft, nos Países Baixos, desde muito cedo se dedicou aos estudos humanísticos, debruçando-se, posteriormente, sobre os temas jurídicos e teológicos. Participou ativamente da vida política holandesa, dilacerada àquele tempo por violentas lutas religiosas. Esteve encarcerado por motivos políticos, evadindo-se de maneira novelesca. Refugiou-se na França e, depois viver alguns anos na Suécia (chegou ser comissionado embaixador da Suécia em Paris), morreu em Rostock, na Alemanha, pouco após ter sobrevivido a um naufrágio". FLORES PINTO, Felipe. Tradição e modernidade na obra de Hugo Grócio. In: TRINDADE, Antonio Augusto Cançado. A nova dimensão do direito internacional público. Brasília: Instituto Rio Branco, 2003, p. 267.
  49. MELLO, 2004, p. 178.
  50. TRINDADE, 2006, p. 11.
  51. GROTIUS, Hugo. Of the Rights of War and Peace. Londres, 1715. P. 10 apud HASLAM, 2006, p. 284
  52. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 49.
  53. TRINDADE, 2006, p. 13.
  54. MICHELET apud QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 35.
  55. "La interpretación histórica del Derecho Internacional debe hacerse desde una pluralidade de planos, en la que se tengan en cuenta al mismo tiempo los hechos, las normas, los valores y la reflexión doctrinal. He procurado que estos distintos planos estén presentes de modo equilibrado, sin que ninguno de ellos quede hipertrofiado o, por el contrario, marginado". Cf. CARRILLO SALCEDO, Juan Antonio. El derecho internacional en perspectiva histórica. 1. Ed. Madrid: Editorial Tecnos, 1991. P. 13
  56. Louis Erasme Le Fur viveu de 1870 a 1943. Foi professor da Universidade de Paris e é considerado por alguns um dos mais importantes internacionalistas contemporâneos. Cf. CUNHA; PEREIRA, 2000, p. 80.
  57. MELLO, 2004, p. 163.
  58. KORFF, Barão S. Introduction à l’histoire du droit international, in RdC, 1923, t. 1, págs. S e segs, apud Id., p. 163.
  59. Ib., p. 164.
  60. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 36.
  61. "[...] es que en gran parte somos el pasado en la medida en que nos levantamos sobre el sedimento de formas de vida que han quedado detrás de nosotros, de formas culturales que otros hombres han ido ensayando en distintas etapas históricas. Lo que importa, por conseguinte, es una perspectiva a fin de ver y observar a distancia el Derecho Internacional para poder apreciarlo en su verdadero valor". Cf. CARRILLO SALCEDO, 1991, p. 13.
  62. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 37.
  63. CUNHA; PEREIRA, 2000, p. 127.
  64. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 37.
  65. MELLO, 2004, p. 165.
  66. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 37.
  67. MELLO, 2004, p. 165.
  68. "Na idade helênica os filósofos gregos tinham uma concepção limitada de humanidade, dividindo o mundo entre gregos e bárbaros. Cf. PERRY, 2002, p. 75.
  69. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 38.
  70. Exemplos são os tratados de paz entre Atenas e Esparta datados do ano de 446 a.C. e 431 a.C. A entrada em vigor dos tratados gregos se dava a partir do juramento dos embaixadores gregos, sendo seus textos legais inscritos em placas de bronze e colocados em templos, a fim de que fossem passíveis de verificação pelo povo grego. Cf. MELLO, 2004, p. 166.
  71. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, op. cit., p. 38.
  72. "Respectivamente relacionados aos conceitos atuais de asilo, instituições consulares e as alianças do Direito Internacional moderno". Cf. CUNHA; PEREIRA, 2000, p. 128; Esse último instituto, a anfictionias, é, segundo Mello, a origem das modernas confederações. Cf. MELLO, op. cit., p. 166.
  73. Ibid., p. 166.
  74. A pax romana foi um período de duzentos anos em que o Império Romano desfrutou a inexistência de conflitos. Assim como coloca Marvin Perry, "o mundo antigo nunca vivera um período tão prolongado de paz, ordem, administração eficiente e prosperidade", in PERRY, 2002, p.104.
  75. Id., 2002, p.112.
  76. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 40.
  77. Cabia aos fetiales, sacerdotes que exerciam funções primordialmente diplomáticas, a averiguação se a guerra a ser declarada era justa ou não. Caso a resposta fosse positiva dava-se o direito de reparação e um prazo de cerca de 30 dias. Findo o prazo, caso não houvesse a determinada reparação, a guerra passava a basear-se na premissa de que era, enfim, justa. O termo guerra justa voltaria a ser usado mais tarde pelos autores cristãos para designar as guerras com causas legítimas. Cf. MIAJA DE LA MUELA, Adolfo. Introducción al derecho internacional público, p. 171, apud CUNHA; PEREIRA, 2000, p. 128.
  78. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, op. cit., p. 40.
  79. PERRY, 2002, p. 153.
  80. MONCADA, Cabral de. Filosofia do direito e do estado, I, Coimbra, 1949, P. 48-9 apud CUNHA; PEREIRA, 2000, p. 130.
  81. TRUYOL Y SERRA, 1996, p. 32.
  82. VERDROSS, V. Derecho internacional público. 5. ed. Madrid, 1980. P. 489 apud CUNHA; PEREIRA, 2000, p. 131.
  83. MELLO, 2004, p. 169.
  84. CUNHA; PEREIRA, 2000, p. 133.
  85. Id., 2000, p. 133.
  86. MELLO, 2004, p. 171.
  87. "Fruto de um lento y continuo processo de concentración y secularización del poder político y de su irradiación territorial. Cf. CARRILLO SALCEDO, 1991, p. 17.
  88. "A rebelião de Lutero contra a autoridade da Igreja fragmentou, em menos de uma década, a unidade religiosa da cristandade. Iniciada em 1517, a Reforma dominou a história da Europa ao longo de grande parte do século XVI". Cf. PERRY, 2002, p. 231.
  89. CARRILLO SALCEDO, op. cit., p. 17.
  90. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 43.
  91. AZEVEDO, [19--], p. 37.
  92. Id., s/a, p. 38.
  93. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 44.
  94. BODIN, Jean. Lex six livres de la république, Genève, L.I., c. 10, apud AZEVEDO,op. cit., p. 38.
  95. BODIN, Jean. Lex six livres de la république. Paris, 1576. apud HASLAM, 2006, p. 73.
  96. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 44.
  97. DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 31.
  98. AZEVEDO, [19--], p. 39.
  99. LOPES, 2008, p. 174.
  100. MELLO, 2004, p. 171.
  101. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 44.
  102. CARRILLO SALCEDO, 1991, p. 22.
  103. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 46.
  104. CUNHA; PEREIRA, 2000, p. 137.
  105. "Aunque las formulaciones tradicionales sigan siendo utilizadas y se continúe hablando de bellum iustum y de iusta causa belli, el sentido de estas nociones habrá cambiado por completo ya que por guerra justa se entenderá aquélla que tiene lugar entre iustes hostes, es decir, entre Estados soberanos, titulares de la facultad discrecional de recurrir a la guerra en sus conflictos con otros Estados". in CARRILLO SALCEDO, 1991, p. 23.
  106. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 45.
  107. TRUYOL Y SERRA, 1996, p. 76.
  108. "Nascido em Middelburgo, na Zelândia, estudou em Franeker, na Frísia. Depois de se dedicar à advocacia em Haia, tornou-se juiz e, de 1724 até à morte, foi presidente do Supremo Tribunal de apelo para as províncias da Holanda, da Zelândia e da Frísia Ocidental, com sede em Haia". Cf. Ibid., p. 92.
  109. MELLO, 2004, p. 178.
  110. TRUYOL Y SERRA, 1996, p. 96.
  111. VATTEL, Emer de. O direito das gentes. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 2006, p. 3.
  112. QUOC DINH, DAILLIER, PELLET, 1999, p. 50.
  113. Direito das Gentes ou Princípios da Lei Natural aplicados à conduta e aos negócios das nações e dos soberanos.
  114. Ibid., p. 50.
  115. Ibid., p. 51.
  116. CARRILLO SALCEDO, 1991, p. 23.
  117. VATTEL, 2006, p. 12.
  118. "Umberto Campagnolo (1904-1976) foi aluno de Hans Kelsen a partir de 1933 no Intitut Universitaire de Hautes Études Internationales em Genebra, quando ambos ali viviam exilados, e em 1937 defendeu com Kelsen sua tese de doutorado. Segundo Kelsen, "posso afirmar que, entre todos aqueles trabalhos publicados por jovens autores sobre problemas de direito internacional, este é um dos melhores que conheço" in KELSEN, Hans. CAMPAGNOLO, Umberto; organizador Mario G. Losano. Direito internacional e estado soberano. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. XI.
  119. KELSEN, CAMPAGNOLO, 2002, p. 119.
  120. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. A personalidade e capacidade jurídicas do indivíduo como sujeito do direito internacional. in ANNONI, Danielle (Org.). Os novos conceitos do novo direito internacional: cidadania, democracia e direitos humanos. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2002, p. 5.
  121. O brasileiro Antônio Augusto Cançado Trindade é um desses reconhecidos estudiosos que criticam abertamente o legado do positivismo durante os séculos XVIII e XIX dentro do Direito Internacional. O autor coloca a a forma como o positivismo jurídico tende à consubstanciação do status quo, inclusive com uma típica subserviência ao poder em regimes autoritários, ditatoriais e totalitários. Cf. TRINDADE, 2006, p. 14.
  122. Ibid., p. 110.
  123. "constituir, a la finalización de la guerra, una associación de Estados como medio para resolver pacíficamente los conflictos internacionales y prevenir una nueva guerra". Cf. CARRILLO SALCEDO, 1991, p. 45.
  124. LOPES, José Alberto Azeredo. Textos históricos do direito e das relações internacionais. Porto: Universidade Católica Portuguesa, 1999, p. 237.
  125. Tratado, datado de 28 de Junho de 1919, celebrado entre os Estados vencedores da Primeira Guerra Mundial, salvo os Estados Unidos, e a Alemanha.
  126. TRUYOL Y SERRA, 1996, p. 135.
  127. CARRILLO SALCEDO, 1991, p. 67.
  128. FRIEDMANN, Wolfgang. Mudança da estrutura do direito internacional. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1971, p. 122.
  129. Id., 1971, p. 122.
  130. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. A personalidade e capacidade jurídicas do indivíduo como sujeito do direito internacional. In: ANNONI, Danielle (Org.), 2002, p. 10.
  131. CARRILLO SALCEDO, 1991, p. 70.
  132. TRUYOL Y SERRA, 1996, p. 152.
  133. MELLO, 2004, p. 645.
  134. "Prevaleció, por tanto, la idea de crear una nueva Organización Internacional, aunque desarrollada en dos direcciones: de un lado, una Organización Internacional general, la Organización de las Naciones Unidas, destinada a reemplazar y sustituir, y no continuar, a la Sociedade de Naciones; de outro, una serie de Organizaciones Internacionales, Organismos Especializados de la Naciones Unidas, igualmente universales, pero con competencias en sectores y materias particulares en los que la cooperación institucionalizada resultaba imprescindible y apremiante". Cf. CARRILLO SALCEDO, op. cit., p. 74.
  135. Comitê com criação prevista ainda no ano 1949, pela Comissão de Direitos Humanos, que teria como partes, os Estados, e como incumbência, a tarefa de ser uma comissão internacional de inquérito e um comitê de bons ofícios. Cf. CHAUMONT, Charles. ONU. 13. ed. Oeiras: Margens, 1992, p. 112.
  136. MELLO, 2004, p. 868.
  137. PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e justiça internacional. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 9.
  138. LIMA JUNIOR, Jayme Benvenuto (Org.). Manual de direitos humanos internacionais. São Paulo: Edições Loyola, 2002, p. 28.
  139. TRINDADE, Antonio Augusto Cançado. Tratado de direito internacional dos direitos humanos, volume I. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1997, p. 35.
  140. Ibid., p. 35.
  141. Ibid., p. 38.
  142. FRIEDMANN, 1971, p. 122.
  143. "la vida de la Organización de las Naciones Unidas estuvo dominada por la guerra fría y el enfrentamiento bipolar, ideológico, político y estratégico entre las dos superpotencias, los Estados Unidos de América y la U.R.S.S.". Cf. CARRILLO SALCEDO, 1991, p. 98.
  144. LIMA JUNIOR, Jayme Benvenuto (Org.), 2002, p. 27.
  145. FRIEDMANN, 1971, p. 13.
  146. TRINDADE, Antonio Augusto Cançado. A consolidação da capacidade processual dos indivíduos na evolução da proteção internacional dos direitos humanos: quadro atual e perspectivas na passagem do século. In: PINHEIRO, Paulo Sérgio; GUIMARÃES, Samuel Pinheiro (Org.). Direitos humanos no século XXI. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 1998, p. 19.
  147. FRIEDMANN, 1971, p. 123.
  148. TRINDADE, Antonio Augusto Cançado. A consolidação da capacidade processual dos indivíduos na evolução da proteção internacional dos direitos humanos: quadro atual e perspectivas na passagem do século. In: PINHEIRO; GUIMARÃES, 1998, p. 26.
  149. FRIEDMANN, 1971, p. 125.
  150. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. A personalidade e capacidade jurídicas do indivíduo como sujeito do direito internacional. In: ANNONI, Danielle (Org.), 2002, p. 13.
  151. CASSIN, René. Vingt ans après la Déclaration Universelle. Revue de la Comission Internationale de Juristes. (1967) nº 2, P. 9-10. apud PINHEIRO; GUIMARÃES, 1998, p. 27.
  152. PIOVESAN, 2006, p. 50.
  153. Bélgica, Dinamarca, França, Holanda, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Noruega, Reino Unido e Suécia.
  154. O Conselho da Europa não se confunde com a União Europeia. O primeiro, como tratado no estudo, foi criado após o fim da Segunda Guerra Mundial, a partir de dez Estados, e tinha interesses em celebrar a cooperação entre os Estados europeus. A União Europeia, apesar de partilhar do mesmo interesse pela cooperação, foi criada décadas mais tarde, em 1993, fruto do desenvolvimento de uma Comunidade integrada pelos interesses no carvão e aço, ainda na década de 50.
  155. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado de direito internacional dos direitos humanos. Volume III. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 120.
  156. FRIEDMANN, 1971, p. 124.
  157. Id., 1971, p. 124.
  158. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. A personalidade e capacidade jurídicas do indivíduo como sujeito do direito internacional. In: ANNONI, Danielle (Org.), 2002, p. 20.
  159. TRINDADE, 2003, p. 131.
  160. Id., 2003, p. 137.
  161. LIMA JUNIOR, Jayme Benvenuto (Org.), 2002, p. 78.
  162. PIOVESAN, 2006, p. 72.
  163. TRINDADE, 2003, p. 147.
  164. PIOVESAN, 2006, p. 84.
  165. TRINDADE, 2003, p. 147.
  166. Ibid., p. 182.
  167. LIMA JUNIOR, Jayme Benvenuto (Org.), 2002, p. 79.
  168. TRINDADE, 2003, p. 34.
  169. LIMA JUNIOR, Jayme Benvenuto (Org.), op. cit., p. 80.
  170. TRINDADE, 2003, p. 35.
  171. LIMA JUNIOR, Jayme Benvenuto (Org.), 2002, p. 81.
  172. TRINDADE, op. cit., p. 37.
  173. AGUILAR, A. La comissión interamericana de derechos humanos. p. 38 apud TRINDADE, 2003, p. 44.
  174. PIOVESAN, 2006, p. 90.
  175. Id., 2006, p. 96.
  176. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. A personalidade e capacidade jurídicas do indivíduo como sujeito do direito internacional. In: ANNONI, Danielle (Org.), 2002, p. 22.
  177. PIOVESAN, 2006, p. 103.
  178. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. El futuro de la Corte Interamericana de Derechos Humanos. P. 395 apud Id., 2006, p. 103.
  179. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. A personalidade e capacidade jurídicas do indivíduo como sujeito do direito internacional. In: ANNONI, Danielle (Org.), 2002, p. 23.
  180. Corte Interamericana de Direitos Humanos, caso Castillo Petruzzi vs Peru (excessões preliminares), sentença de 04.09.1998, série e, n.41, voto concordante do Juiz A. A. Cançado Trindade, §35. Cf. Id., 2002, p. 26.
  181. PIOVESAN, 2006, p. 140.
  182. TRINDADE, 2006, p. 121.
  183. SILVA, G. E. do Nascimento e; ACCIOLY, Hildebrando; CASELLA, Paulo Borba. Manual de direito internacional público. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 52.
  184. TRINDADE, 2006, p. 393.
  185. Id., 2006, p. 393.
  186. Id., 2006, p. 142.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

REINERT, Thiago Luis. Os fundadores do Direito Internacional e a participação do ser humano nas relações internacionais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2766, 27 jan. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18343. Acesso em: 26 abr. 2024.