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Estratégias corporativas de controle por redes de parcerias.

Um estudo de caso entre as vantagens dos agentes e as consequências no mercado

Estratégias corporativas de controle por redes de parcerias. Um estudo de caso entre as vantagens dos agentes e as consequências no mercado

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Na Braskem, a hierarquia nas redes internas (entre acionistas através de acordos ou da criação de novas sociedades participantes) pode explicar ganhos diferenciados entre acionistas portadores de títulos de mesma natureza e até mesmo vantagens políticas à sociedade.

Resumo: O objetivo do trabalho é demonstrar, pela análise do estudo do caso da Braskem, como a hierarquia nas redes internas (entre acionistas através de acordos ou da criação de novas sociedades participantes) pode explicar ganhos diferenciados entre acionistas portadores de títulos de mesma natureza e até mesmo vantagens políticas à sociedade. O trabalho explica uma realidade nova e que subverte a Teoria das Finanças tradicional: os aumentos de capital baseados na estratégia da emissão de bônus de subscrição com valor de exercício superior ao valor de mercado – analisando as vantagens consequentes das estratégias corporativas internas nestes casos. A partir do cruzamento de dados secundários relacionam-se as cotações das ações emitidas pela sociedade estudada com o anúncio dos fatos relevantes denotando-se as consequências das políticas corporativas adotadas na precificação destes ativos; e, quanto à estrutura do mercado, utilizam-se os registros de fusões e aquisições para obter as taxas de extinção/proliferação das formas organizacionais. Os resultados demonstram que – no caso estudado – as alianças estratégicas para controle corporativo geram vantagens competitivas apreciáveis – comprovando objetivamente as vantagens decorrentes da posição nas redes de acionistas e da sociedade.

Palavras Chave: Estratégia Corporativa; Redes de parcerias; Acordo de Acionistas; Bônus de Subscrição, Braskem.

Abstract: The objective of this paper is to demonstrate, through analysis of case study of Braskem, how the hierarchy in internal networks (among shareholders through shareholders agreements or the creation of new companies involved) can explain gain differentiated among shareholders bondholders of the same nature and even political advantages to the society. The paper explains a new reality that subverts the traditional theory of finance: capital improvements based on the strategy of the issuance of warrants with exercise value than the market value - by examining the advantages resulting from internal corporate strategies in these cases. From the intersection of secondary data from the quotation of shares issued by the company studied and the announcement of material facts denote the consequences of corporate policies adopted in the pricing of these assets; and as the market structure, we use the records of mergers and acquisitions to achieve the rates of extinction / proliferation of organizational forms. The results show that – in the case study – strategic alliances for corporate control drive competitive advantage strategically sensible – objectively demonstrating the benefits of the position in the networks of shareholders and the society.

Key-words: Corporate Strategy, Networks of partnerships; Shareholders Agreement; Warrant; Braskem.


1. Introdução

O texto busca desvendar, em um caso determinado, um fenômeno que desafia as equações das finanças e as lógicas que as apóiam: – porque sócios exerceram bilhões de reais em bônus de subscrição com valor de exercício significativamente superior aos valores de mercado para compra dos mesmos ativos no caso da Braskem?

A hipótese testada surge da noção do capitalismo de laços (Lazzarini, 2010) e dos desequilíbrios que a presença estatal pode propiciar (BASTOS NETO, 2006) interferindo nas redes internas; e, consiste na possibilidade da haver benefícios consequentes de redes de alianças. A hipótese consiste na explicação de que interesses estratégicos estariam sobrepujando os interesses financeiros imediatos, como estudados na teoria clássica.

Esses interesses estratégicos, fora da teoria clássica, foram identificados em duas nuances nesse caso: primeiro, no interesse de certos acionistas – devido a sua posição em rede de alianças – em obter benefícios estratégicos particulares ausentes aos demais acionistas da mesma categoria (perpetuação do controle); e, em segundo, no posicionamento dominante da sociedade no mercado nacional com relações de interdependência com a maior fornecedora do mercado e agora participante da sociedade controladora, a Petrobrás, em uma relação crescente com a empresa estatal necessária para viabilizar a concentração ocorrida.

Essa hipótese deriva da existência de interesses estratégicos – inclusive diversos do poder de controle, situação em que há até previsão legal limitando a diferença de valor dos ativos entre acionistas (Lei 6404/76, art. 254-A); e, da existência de imperfeições do mercado, afastando a aplicabilidade prática dos modelos clássicos em certos casos.

Para responder ao problema de pesquisa proposto, foi executado um estudo de caso – relacionando as estruturas organizacionais e de mercado com as cotações do ativo objeto desses bônus (Gráfico anexo); e, com fatos relevantes – que tornaram públicos os atos de concentração (fusões e aquisições) e o surgimento e evolução das redes de parcerias (desde os acordos de acionistas a formação de uma sociedade para perpetuar o controle social).

Antonio Carlos Gil (1995, p.85) afirma que em um estudo de caso não se pode aceitar um roteiro rígido para sua delimitação, a pesquisa pretendeu: identificar redes de parcerias entre os controladores, comprovados pelos acordos de acionistas (Petrobras e Odebrecht) até a fundação da patrimonial BRK; identificar as características do mercado em que a Braskem se localizava, descritas em pesquisas anteriores, como a de Zilber e Moraes (2004); analisar se houve correta aplicação das normas concorrenciais; e, enfim, responder a pergunta de pesquisa, identificando vantagens consequentes dos acordos de acionistas em benefícios diferenciados para acionistas de mesma classe e para a sociedade em face do Estado.

No tempo da criação da Braskem, empresa objeto deste estudo de caso, já havia o entendimento doutrinário – ilustrado, por exemplo, nas palavras de Zilber e Moraes (2004, p.192) – do excessivo grau de competitividade do setor petroquímico brasileiro e que as dramáticas mudanças tecnológicas, estruturais e mercadológicas do setor, ocorridas naquela fase, já exigiam mudanças em relação as estruturas que existiam à época. Os referidos autores chegam a prever mudanças anos antes, justificando os atos de concentração na busca da vantagem competitiva sustentável, na dinâmica competitiva do setor, na formação dos grupos estratégicos e no perfil das forças competitivas em constante mutação.

Porém, a consolidação ocorrida no biênio 2009/2010 tomou, em seus meios e fins, proporção e complexidade acima da capacidade de previsão – e até mesmo de entendimento – da doutrina tradicional.

Para financiar a consolidação da Braskem – tanto no setor petroquímico brasileiro quanto no exterior – a sociedade re-estruturou seus acordos de acionistas e lançou um programa de aumento de capital baseado na emissão de bônus de subscrição que contrariou a lógica teórica das finanças – ao colocar seu valor de exercício bem acima do valor de mercado.

A doutrina tradicional de finanças (ROSS, 2008; COPELAND, 2005; BREALEY, 2003) ensina que o exercício dos bônus só é feita quando o valor do exercício é inferior ao valor de mercado das ações; e, só assim haveria sucesso na captação. Pode-se compreender essa afirmação pelo fato de que o valor dos bônus de subscrições – como das opções como papéis representativos de direitos análogos – são derivadas dos ativos objeto. Caso o valor de exercício de um derivativo supere o valor do ativo objeto na data de seu vencimento o título perde todo seu valor; ou, nos termos do mercado "vira pó".

Essa lógica pode ser demonstrada pela equação de Robert Merton e Myron Scholes para precificação dos derivativos conhecido como modelo ou equação de Black-Scholes – motivo que fundamentou expressamente a atribuição do referido prêmio (RODRIGUES, 2010).

Também se entende que a emissão dos bônus, a princípio, não modifica a estrutura de propriedade (vez que os sócios recebem proporcionalmente direitos); mas, sim, a estrutura de capital (vez que a proporção entre capitais próprios e de terceiros seria modificada). Porém, no caso, essas teorias foram contraditadas.

Para entender o sucesso de um processo que subverte a teoria tradicional das Finanças, a pesquisa não se limitou as observações usuais sobre os processos de concentração e de alianças estratégicas – ao contrário, possíveis elementos para explicação são referenciados em obras que tratam os fenômenos empresariais como as redes de parcerias, usando modelo que combina a ótica da economia evolucionária e da ecologia das populações, como descrito em Bataglia e Meirelles (2009).

Segundo a classificação simplificadora de Wittington (2001, p.11), estratégia tem quatro conceitos particulares nas teorias das organizações: a clássica, a evolucionária, a processualista e a sistêmica. Cada uma dessas leituras consistindo em uma redução com foco em certos aspectos do fenômeno. Na seara das finanças o conceito clássico é mais aplicado; porém, dada a incapacidade desse paradigma de gerar resposta na situação estudada, parte-se para a análise adotando o conceito evolucionário.


2. Referencial Teórico

2.1 Bônus de subscrição – precificação e estrutura de capital

Os bônus de subscrição são títulos mobiliários típicos – previstos na Lei 6404/1976 art. 75 a 79, assim como disciplinado por outras normas – que representam o direito de compra de uma ação por um valor pré-determinado. Assim determina a Lei das S/A's (LSA):

Art. 75. A companhia poderá emitir, dentro do limite de aumento de capital autorizado no estatuto (artigo 168), títulos negociáveis denominados "Bônus de Subscrição".

Parágrafo único. Os bônus de subscrição conferirão aos seus titulares, nas condições constantes do certificado, direito de subscrever ações do capital social, que será exercido mediante apresentação do título à companhia e pagamento do preço de emissão das ações.

É pacífico na doutrina (BREALEY, 2003; DAMODARAN, 2004; COPELAND, 2005) que a emissão de bônus de subscrição é um meio de gerir a estrutura de capital – buscando ampliar o montante de capitais próprios ao tempo que dá aos sócios a oportunidade de subscrever mais ações, como garante o artigo 77 da LSA: "Os bônus de subscrição serão alienados pela companhia ou por ela atribuídos, como vantagem adicional, aos subscritos de emissões de suas ações ou debêntures." e é confirmado em seu parágrafo único: "Os acionistas da companhia gozarão, nos termos dos artigos 171 e 172, de preferência para subscrever a emissão de bônus"

A questão que torna complexo o caso estudado é que além (ou invés) de modificar a estrutura de capital as ofertas de bônus demonstraram ser idôneas a modificar a estrutura de propriedade – possibilitando a tomada ou a perenização do controle caso apenas um grupo exerça seus direitos. E, a forma mais simples e eficaz de impedir que os minoritários exerçam os direitos contidos no bônus é determinar um preço de exercício superior ao preço de mercado.

A relação desse processo com a necessidade de constituição de redes de colaboração também fica clara na LSA, ao instituir requisitos para a emissão desses papeis, como no artigo 76: "A deliberação sobre emissão de bônus de subscrição compete à assembléia-geral, se o estatuto não a atribuir ao conselho de administração.".

A emissão é a grande diferença entre as opções e os bônus de subscrição. Ambos são títulos mobiliários representativos de diretos de exercício, mas os bônus são emitidos pelas sociedades e as opções podem ser emitidas por qualquer ente possuidor do objeto sobre o qual recaiam os direitos (RODRIGUES, 2010).

2.2 Estratégias corporativas e redes de parcerias:

As redes de parcerias organizacionais são formadas por corporações ligadas por contratos – neste caso sociedades controladoras da empresa objeto que se ligam por acordos de acionistas. O problema de pesquisa do trabalho é exatamente identificar, no caso, vantagens decorrentes da participação nessas redes – de maneira homologa aos benefícios as pessoas físicas na participação (e na centralidade) de redes de parcerias em redes sociais usualmente expressos como "capital social" (PUTNAM, 1993).

As idéias básicas que fundamentam o estudo das redes de parcerias são encontrados na obra de Granovetter (1985): segundo a Sociologia Econômica os fatores econômicos e tecnológicos, estão imersos em relações sociais, sendo moldados por elas; isso gerou um questionamento nas teorias organizacionais modernas – vez que abordagens contextualizadas seriam necessárias para diferentes tipos de relações sociais. Ora, como o padrão de racionalidade usual das Finanças não foi capaz de explicar o caso estudado, este é um excelente ponto de partida.

Para a doutrina da Sociologia Organizacional (GRANOVETTER, 1985) as relações sociais seriam a maior fonte de fidúcia (e consequentemente da motivação) das relações econômicas – e, então a ênfase dos estudos deveria ser nos entes e em suas relações subjetivas; e, não no critério objetivo das transações (padrão da Nova Economia Institucional).

Ferreira e Bataglia (2010) escrevem sobre as redes de colaboração na indústria farmacêutica, utilizando o critério de ligação entre as sociedades que fazem redes de parcerias na existência de contratos formais entre elas – como os que são encontrados no caso estudado.

Gulati e Gargiulo (1999) adotam a teoria de Granovetter (1985) em um ambiente empírico e tentam ir além, demonstrando que devido ao compartilhamento de conhecimentos organizacionais – alianças prévias propiciam uma maior probabilidade de alianças futuras (em três diferentes setores durante nove anos). O artigo referenciado expressa que sociólogos fizeram grandes progressos em explicar por que as organizações se comportam em termos de enraizamento em redes sociais, mas que eles sequer examinam como se originam essas redes.

2.3 Teorias quanto ao ambiente institucional e poder de mercado:

Como é demonstrado a seguir, os processos sociais e políticos de poder permeiam os mercados. O caso em tela demonstra como a associação com um ente estatal culminou com uma inédita autorização administrativa. Essa poderia ser uma resposta ao trabalho de Lazzarini (2010) quando questiona se a presença estatal como sócio, mesmo minoritário, não aumentaria o valor da empresa e o por quê.

Uma análise baseada exclusivamente na economia evolucionária não consideraria estes processos institucionais internos, como ensina Bataglia e Meirelles (2009, p.95) ao afirmar que economistas evolucionários negligenciam os processos institucionais construindo regras gerais de relacionamentos competitivos e cooperativos entre empresas que não são ligadas a inovação tecnológica nem a seus efeitos na seleção ambiental.

Essa relação é estudada por autores da Nova Economia Institucional, como Douglass North (1990), para quem o processo evolutivo entre instituições e comportamentos econômicos é endógena e recíproca: os países sem instituições adequadas nunca obteriam real desenvolvimento; países sem desenvolvimento não obteriam instituições adequadas. Nee (2005, p.02) critica essa abordagem por desconsiderar a influência ambiental nos comportamentos organizacionais.

Como o Estado tem a capacidade e o poder de criar instituições, ele funciona como fator exógeno aos comportamentos organizacionais e às instituições. Outros estudiosos da Sociologia Econômica (ou New Institutionalism in Economic Sociology), como Granovetter (1985), mesmo partindo do pressuposto que são essencialmente as relações pessoais, diretas ou indiretas, que permitem assegurar a confiança e evitar o oportunismo no mercado, sem que haja necessidade de uma coerção política externa, admitem a idéia de que:

As regras administrativas e jurídicas influenciam obviamente a estrutura dos grupos econômicos, no que diz respeito à propriedade, às formas de autoridade e às relações com as instituições financeiras. [...] O Estado aparece, portanto, como um ator fundamental na regulação da economia, cujo papel consiste essencialmente em fazer respeitar as regras do jogo, estabelecidas por e para os mais fortes (GRANOVETTER, 1985, p.502).

Como síntese, parece existir nas referências um consenso sobre a idéia que o Estado seria o ente exógeno ao mercado capaz (e legitimo) para interferir na sua evolução pela imposição de instituições, como demonstra Nee (2005, p.33) ao considerar que as leis, como as demais normas, são enunciados de comportamentos esperados, idéias emolduradas de moral e autoridade ética do poder do Estado que, querendo ou não, interferem no mercado e nas instituições.

2.4.Destruição e desenvolvimento de mercados

Compreendidas as relações entre as instituições, o mercado e o Estado, é fundamental o entendimento de que certas estratégias devem ser consideradas ilícitas como a concorrência desleal por visar a destruição do mercado – e não seu desenvolvimento. Neste caso o Estado, através das leis, impõe um limite as estratégias de mercado condicionado as definições teóricas de "destruição" e "desenvolvimento" dos mercados.

No direito brasileiro, a conduta ilícita de concorrência desleal, além de configurar infração à ordem econômica (em âmbito administrativo) nos termos da Lei 8.884/94 (dispõe sobre prevenção e repressão as infrações contra a ordem econômica), também pode ser considerada crime, nos moldes da Lei 8.137/90 (Crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo), que prevê, em seu art. 4º, pena de até cinco anos para as pessoas físicas atuantes no tipo. A conduta, no caso estudado, estaria tipificada no inciso I: "abusar do poder econômico, dominando o mercado ou eliminando, total ou parcialmente, a concorrência mediante: […] coalizão, incorporação, fusão ou integração de empresas".

Uma explicação possível para o tratamento inédito dos atos de concentração da Braskem pode residir especificamente em sua parcial estatização indireta. A própria Constituição Federal (art.177) dá tratamento diferenciado aos estatais, admitindo inclusive monopólios públicos revelando uma regra deontológica contrária a regra da isonomia: a de que, em certos casos específicos, os entes estatais podem fazer o que é vedado aos particulares.

Ressalte, por azado, que não obstante a insuficiente experiência brasileira em condenações criminais pela prática de tal conduta ilícita, o direito brasileiro seguindo a tendencia das autoridades de outros países de defesa da concorrência tem dado maior enfase ao combate de práticas anti competitivas (FGV DIREITO RIO, 2008B, p.68).

De fato, acordos como os estudados, mesmo entre entes não concorrentes (FORGIONI, 2008) podem ser considerados ilícitos caso "tenham por objeto ou possam produzir" limitação, falseamento ou prejuízo a livre concorrência ou a livre iniciativa ou dominação de mercado relevante de bens ou serviços (FVG DIREITO RIO, 2008A, p.126). A saída usada pelos defensores foi alegar que o mercado relevante seria mundial e não nacional (Lemos, 2009), uma alternativa possível (nos termos da Portaria SEAE/SDE n.50), mas de razoabilidade discutível.

Existe um entendimento generalizado desde os trabalhos de Shumpeter (1985) até autores atuais como Afuah (2003) sobre o relacionamento determinante entre desenvolvimento econômico e inovação. A relação tem natureza positiva: a inovação melhoraria o desempenho das organizações e que um ambiente inovador aumentaria o desempenho econômico e financeiro das organizações.

Afuah (2003) adota um conceito amplo de inovação ao considerá-la em qualquer conhecimento novo, tecnológico ou de mercado, para oferecer um produto ou serviço novo. Essa novidade consistiria em redução do preço ou incremento ou criação de atributo inexistente até então; assim como, poderia haver inovação no âmbito do mercado, do setor e internamente, na própria instituição.

De fato, como cita Doz e Hamel (1998) ao se referir às inovações em alianças estratégicas, a inovação pode ou não gerar vantagem competitiva a depender competências organizacionais e outros fatores do mercado em que atuam – porém, esta referência não nega a inovação como condição para as empresas aumentarem seus negócios e aumentarem sua competitividade quando bem sucedida.

É evidente que certas estratégias empresariais podem criar novas estruturas beneficiando as organizações e prejudicando os consumidores – como na eliminação da concorrência através da formação de cartéis ou atos de concentração com abuso do poder de mercado. Por esse motivo existe tutela estatal sobre os efeitos das estratégias empresariais – se tem o condão de desenvolver ou destruir o mercado.

Como demonstra Coase (1990, p.07-10), mercado é o ambiente em que os agentes econômicos transacionam bens, na análise referenciada, além das influências conjunturais e sazonais, os mercados podem ser criados pela inovação ou mesmo fomentados com o incremento do grau de concorrência (aumento do número de fornecedores) ou com incremento da qualidade dos produtos (pelo efeito de substituição dos produtos).

Em sentido amplo, seria o conjunto de entes capazes de influenciar as vendas de um determinado produto; em sentido restrito, conjunto de dados sobre a evolução das vendas de um produto (RODRIGUES, 2008). Livros de Finanças (BREALEY, 2003; DAMODARAN, 2004; COPELAND, 2005) chegam a idealizar os pressupostos do "mercado perfeito".

A Constituição Federal da República Federativa do Brasil garante, em seu artigo 173, § 4o que "A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros". Dessa maneira, toda atividade econômica que vise à destruição da concorrência (e consequentemente do mercado) é passível de vedação ou sanção estatal – como a conduta da "concorrência desleal genérica" prevista no artigo 209 da Lei 9.279/96.

Desta forma, atos tendentes a reduzir o número de ofertantes ou de produtos (reduzindo a concorrência) seriam atos contrários ao desenvolvimento dos mercados. Porém, a principio, as fusões e aquisições estudadas foram consideradas lícitas – inclusive em consultas específicas a órgãos administrativos citados a seguir – por decorrer de adaptações a conjunturas econômicas na busca da elevação da eficiência pela escala.

Nee (2005, p.33) chega a afirmar que as questões atinentes a obediência as ordens legais da sociologia (legitimação) e da economia (custo) se imiscuem progressivamente – a perder da imagem (legitimação) em face dos consumidores e do setor incidiria em prejuízos e vice-versa.

De maneira análoga à literatura sobre alianças estratégicas de Doz e Hamel (1998), obras específicas sobre estratégias com atos de concentração através de fusões e aquisições (M&A) como a de Trautwien (1990) descrevem as situações em que operações como as estudadas são teoricamente aconselhadas pelas racionalidades (fundamentos) e resultados esperados (consequências).

A obra de Trautwien (1990, p.01) reconhece a existência de situações de alta complexidade na observação da relatividade do valor dos ativos nas fusões e aquisições; e que isso decorre da existência de três questões subjacentes as estratégias de concentração, como as estudadas, quais sejam: a) o problema da integração ou autonomia das unidades adquiridas; b) o problema da aquisição ou do desenvolvimento interno (substituição); e, c) a questão da aquisição ser relacionada ou não relacionada (com as atividades desenvolvidas).

Trautwien (1990) também afirma que existem três racionalidades que podem servir de causa para processos de concentração (M&A): a) fusão como opção racional, podendo ser fundada na teoria da eficiência (quando há sinergia entre as empresas), na teoria do monopólio (quando o ganho é derivado do fim da concorrência), na teoria da valorização (quando beneficia sócios pela transferência de valor de uma empresa depreciada) ou na teoria da construção de impérios (quando beneficia gestores ampliando seus poderes); b) a fusão como resultado de um processo (quando resultado de conjunturas e não volitivas); ou, c) a fusão como fenômeno macroeconômico (como uma mera adaptação). Na situação estudada as três racionalidades podem ser usadas como fundamento para os atos de concentração.

A visão financista de Donald de Pamphilis (2005, p.11) corrobora as afirmações de Trautwien (1990) sobre as motivações comuns para as operações de M&A – ressalvando que podem existir outras, não classificáveis pelas categorias básicas. Pamphilis (2005, p.28-38) propõe uma questão crucial para o entendimento da operação: se ela beneficiou ou prejudicou aos gestores, credores, acionistas ou a própria sociedade – com a consideração que, muitas vezes, as operações não apresentam os resultados esperados.


3. Metodologia

Edivaldo Boaventura (2004,p.117) indica o estudo de caso como método de pesquisa para obter demonstrações empíricas não experimentais, especialmente usado no Direito e na Administração quando não são possíveis resoluções dedutivas, em normas gerais conhecidas – exatamente como é o caso.

Aceitando a estruturação de Antonio Carlos Gil (1995, p.85) e o plano de Leite (2003, p.42) considerou-se que é possível definir quatro fases que mostram o seu delineamento: a) delimitação da unidade-caso; b) coleta de dados; c) seleção, análise e interpretação dos dados; d) elaboração do relatório.

A delimitação na unidade caso da Braskem ocorreu devido a ocorrência de sua re-estruturação de propriedade e de capital que foi idônea a modificar toda a estrutura do mercado em que se inseria – adquirindo rivais, ampliando a participação societária do seu principal fornecedor e obtendo recursos através de oferta de bônus de subscrição com valor de exercício acima do valor de mercado das ações.

A coleta de dados – tanto das cotações diárias, como das participações societárias com os acordos de acionistas e dos fatos relevantes expressos na emissão e exercício dos bônus e nas aquisições das concorrentes – foram encontrados nos sítios eletrônicos da Bolsa de São Paulo (Bovespa), confirmados pela divulgação destes "fatos relevantes" pela própria empresa e por artigos jornalísticos da época. A interpretação imediata destes dados consistiu na comparação das cotações conseqüentes dos anúncios dos fatos relevantes – revelando a reação imediata do mercado as novas informações.

Usando o modelo integrativo proposto por Bataglia e Meirelles (2009) – que trabalha com as interseções da economia evolucionária com a ecologia populacional para compreender a dinâmica evolucionária organizacional – foi feito um estudo de caso, analisando a divulgação dos fatos relevantes e suas conseqüências na precificação dos ativos e nas estruturas de propriedade e de mercado, quando a Braskem re-estruturou a si e ao setor onde se localiza.

Dessa maneira, será considerada a dualidade entre os processos ambientais (com as mudanças tecnológicas, estruturais e demográficas) e os processos de adaptação corporativa (com a série de medidas expressas nos fatos relevantes).

Bataglia e Meirelles (2009, p.88) explicam as abordagens evolucionarias da firma desde o modelo VSR (Variation – Selection – Retention) de Campbell até os trabalhos de Hannan (1995); assim como explica a economia evolucionária desenvolvida por Nelson e Winters (1982) baseada nos trabalhos de Schumpeter, para demonstrar como os focos macro e micro ficaram dissociados nos trabalhos desenvolvidos até então.

Para superar essa dissociação, é proposta uma análise em diferentes estágios: primeiro analisa-se a firma e sua localização (setor, comunidade e população); depois pelas suas atividades de variação, seleção e retenção identificam-se suas rotinas e capacidades organizacionais. Dessa maneira, é possível relacionar as estratégias (coletivas, corporativas e internas) com o ambiente de seleção (considerando os processos demográficos, a densidade populacional e os processos tecnológicos e organizacionais).


4. Estudo do caso: BRASKEM S/A

Desde o inicio da primeira década do século XXI já havia consenso – indicado inclusive no anuário da Associação Brasileira da Industria Química (2001) – que o setor passaria por profundas transformações visando a ampliação da escala e a redução do número de participantes através de processos de fusão e de aquisições.

Tratava-se então de um ambiente altamente competitivo, onde as estratégias de variação (obtenção de escala por fusões ou aquisições) estavam definidas e apenas quem mantivesse as capacidades organizacionais necessárias poderia manter os níveis de eficiência para sobreviver nesse mercado. Foi nesse ambiente, em 2002, que a Braskem foi criada como sucessora da Copene – Companhia Petroquímica do Nordeste Ltda. – surgida de um acordo de acionistas entre a Odebrecht e o Grupo Mariani.

Em 2005 a empresa assina um contrato de formação de sociedade com a Petrobras – a principal fornecedora do setor – e em 2007 passa a integrar suas concorrentes – tais como a Companhia Petroquímica do Sul (Copesul), Ipiranga Química, Ipiranga Petroquímica, Petroquímica Paulínia e Petroquímica Triunfo. Esse processo de assimilação das concorrentes foi gradativamente financiado pela Petrobras, considerado um stakeholder estratégico por ser o maior fornecedor do setor – a ponto que a Petrobras chegou a deter 30% do capital votante da empresa.

Em 22/01/2010 a BRASKEM S.A. A Odebrecht Serviços e Participações S.A. e a PETRÓLEO BRASILEIRO S.A. - PETROBRAS informam conjuntamente plano de investimento conjunto com a União Industrias Petroquímicas S.A. (UNIPAR) – consistindo no aumento de capital da BRASKEM para a posterior compra da participação da UNIPAR na QUATTOR.

Em 01/02/2010 a BRASKEM S.A. comunica a aquisição de 100% do capital votante da Sunoco Chemicals – representando 13% da capacidade de produção de polipropileno norte-americana – ao preço de US$350 milhões pago a vista no prazo de 60 dias.

Em 12/04/2010 a BRASKEM S.A. comunica que em 12/04/2010 foi encerrado o prazo de exercício das sobras para subscrição de ações emitidas no âmbito do aumento de capital aprovado pelo Conselho de Administração em 03/03/2010; resultando em subscrição de 83,15% do aumento de capital o referido Conselho homologou o aumento de capital em decorrência da emissão de 243.206.530 novas ações ordinárias e de 16.697.781 em novas ações preferenciais classe "A" - perfazendo um valor total de R$3.742.622.078,40 – dos quais R$ 1.363.879.782,62 destinados a reserva de capital; e, R$ 2.378.742.295,78 ao capital social.

Em 27/04/2010 a BRASKEM S.A. e a QUATTOR informam que a primeira já possui 99,32% do capital total da segunda; e, em função da alienação indireta do controle, envia pedido de oferta pública de aquisição das ações remanescentes.

Como se pode observar, em todos os casos descritos, o financiamento no mercado através de ofertas públicas foi sistematicamente insuficiente (na única vez que foi tentado, em 2010, menos de 1% dos sócios fora do bloco de controle exerceram seus bônus); e, assim, politicamente preterido pelas sucessivas gestões – provavelmente pelo auto grau de competitividade; e, consequentemente pelos baixos níveis de lucratividade do setor.

Dessa maneira, mantendo um ritmo crescente de concentração mesmo sem a faculdade de captar novos investimentos através do mercado de bolsa, a Braskem demonstrou deter as capacidades organizacionais de assimilar suas concorrentes de maneira sistemática, buscando financiamento de uma maneira atípica – em vez de recorrer ao mercado impessoal securitizando obrigações – preferiu atrair e promover comprometimento gradativo de parceiros estratégicos para obter os capitais necessários pela composição de redes de colaboração formalizadas pelos contratos de acordos de acionistas.

Estes contratos tomaram um grau de comprometimento tão perpetuo e complexo que um dos pontos do aumento de capital de 2010 foi o surgimento de uma sociedade patrimonial – a BRK investimentos – para concentrar as ações detidas pelos controladores.


5. Discussão e análise

O caso prático da empresa de capital aberto Braskem S.A. apresenta aquisições sucessivas (desde a aquisição da Refinaria Triunfo em 2009, passando pela aquisição da Quattor e da Sunoco Chemicals), no Brasil e no exterior; e, culmina com mudança drástica de controle e da política de estrutura de capital – com um acordo de acionistas que propiciou o estranho lançamento de bônus de subscrição consistente no direito de adquirir ações ordinárias por R$14,40, valor não alcançado nem uma vez após a comunicação da operação pelas ações ordinárias até a data de execício dos títulos.

Como demonstrado no anexo, a determinação deste preço pelo valor venal histórico de um ativo (ação preferencial) para sua aplicação majoritária em outro de menor valor (ação ordinária) foi um estratégia para perenizar o controle da BRASKEM sob os termos do acordo de acionistas, diluindo a participação de todos os acionistas minoritários, exceto a sociedade criada no acordo de acionistas (A Brk Investimentos Petroquímicos S.A detém atualmente 62,32% das ações ordinárias da companhia e foi formada com a integralização das ações possuídas pela Odebrecht e Petrobras). Uma demonstração interessante deste fato são os volumes de negociação de ambos os ativos referidos – mesmo havendo uma quantidade maior de ações ordinárias no mercado (existem 433.668.976 ações ordinárias e 347.163.489 ações preferenciais no mercado) elas não representam sequer a quinta parte do volume de negócios que acontece com a preferencial A (BRKM5) – como descrito em Bovespa (2010).

Assim como existe na doutrina de Fianças Corporativas o conceito de "Poder de controle" (SILVEIRA, 2006; e, COMPARATO, 2005) e de valor pelo controle – consistente no valor que as ações do controlador podem ter além das demais ações devido ao fato de que elas detêm o poder de controle; depois desse caso, pode ser inaugurado o conceito de "perenização do controle" - ou seja, o valor que um grupo controlador poderia estar disposto a pagar para perenizar seu poder.

O grupo controlador certamente pagou um valor, pelo menos, 20% maior do que a cotação máxima do ativo após o anúncio da operação para as ações ordinárias. Isso não foi consequência de erro de calculo; mas sim, meio de uma estratégia que tinha como fins na modificação das estruturas de capital e de propriedade da empresa – com a diluição da participação dos acionistas minoritários perpetuando o controle na sociedade formada com a integralização das ações das empresas controladoras; assim como, na reestruturação do mercado em que se inseria – com a eliminação de concorrentes e a associação societária com o maior fornecedor da cadeia (destruindo a concorrência tanto no mercado tanto nas entradas com os fornecedores quanto nas saídas com os consumidores).

Quanto ao ativo de maior liquidez também há peculiaridade no comportamento do ativo nos dias subseqüentes ao anuncio da "estatização" do maior grupo petroquímico do Brasil. O valor do ativo (BRKM5) apresentou uma perda categórica por meses após o anúncio do negócio.

Segundo a teoria das finanças (MORITA, 2010) quando uma empresa reduz seu índice de endividamento, aumenta suas perspectivas de lucratividade, amplia suas vantagens estratégicas (fazendo do seu maior fornecedor sócio com parcela significativa e implantando um monopólio em setor fundamental da economia); ou, passa a ter participação pública seus ativos deveriam, ceteris paribus, deveria ganhar valor – o que não aconteceu no caso analisado.

A explicação para a perda do valor dos ativos referidos poderia ser uma perda significa de todos os ativos do mercado – o que não aconteceu, considerando que no fechamento do mercado do dia 30/04/2010 o IBOVESPA fechou aos 67.529,00 pontos; ou seja, apresentando perda de 1,54% em relação ao primeiro pregão do ano. Considerando, entretanto, que no dia 22/01/2010 (dia em que foi divulgada a aquisição e o aumento de capital) o IBOVESPA fechou cotado em 66220 pontos – conclui-se que o índice apresenta ganho desde então.

Uma segunda explicação possível para a redução de valor – mesmo com o aumento de perspectivas em relação a lucratividade – seria o aumento do risco de ingerência política em sua administração. Em outras palavras, a precificação pode ter internalizado o risco de intervenções administrativas do Estado contra interesses privados dos demais acionistas – vez que a impressa especializada chegou a divulgar a "estatização" de seu controle.

A Petrobras, após a implementação do acordo, passou a contar com o direito de indicação de executivos; a Petrobras é uma empresa de economia mista em que o Estado mantém controle majoritário com 55,56% das ações ordinárias e o golden share (direito de veto) independente desse controle.

Tanto evidências empíricas – na valoração de empresas estatais como a própria Petrobras; como previsões teóricas – da doutrina em finanças confirmando a regra do aumento e não da redução de valor de uma empresa pela participação estatal – descartam essa segunda hipótese.

Uma terceira hipótese – a ser observada quando houver amostra representativa e casos semelhantes – é que o valor dos acionistas minoritários foi reduzido; mesmo com a integralização pelo controlador de valores acima dos estabelecidos no mercado; devido a instituição da perenização do controle conseqüente a essa integralização, do estabelecimento de uma situação onde não seria mais viável obter participação política significativa além daquela detida pela sociedade instituída pelo acordo de acionistas.

Como demonstrado, a administração da BRASKEM estudada refletiu uma mudança violenta na política de estrutura de capital da empresa – obtendo, inclusive, autorização do CADE em tempo extraordinário (MORITA, 2010); e, pesados investimentos no setor petroquímico de uma empresa de economia mista controlada pelo Estado, a Petrobras – no momento em que ela tem uma gama de outros projetos mais próximos de sua atividade fim com com maior potencial de lucratividade devido as descobertas do pré-sal, segundo ressalta a impressa especializada referindo-se a diversos analistas de mercado (DEZEN, 2010).

Sem entrar nos cálculos e nas polêmicas estimativas de VPL de investimentos no setor petroquímico em relação aos investimentos necessários a exploração do denominado "pré-sal"; pode-se afirmar que a maioria das grandes empresas de petróleo tem participações na indústria petroquímica – como enumera Lemos (2009). Desta maneira, a intenção deste trecho não é avaliar em termos financeiros ou estratégicos se a decisão da instituição de um monopólio (em âmbito nacional) foi uma decisão certa ou errada; mas sim, discutir as propostas e fatos acerca da autorização administrativa para as aquisições referidas.

O problema como acentua Lemos (2009) é que "a operação dificilmente será aprovada pelos órgãos de defesa da concorrência, e se o for, desmoralizará, definitivamente, a política de defesa da concorrência". De fato, autorizando a aquisição da Braskem, estar-se-ia criando praticamente o monopólio das duas resinas termoplásticas mais importantes (polietileno e polipropileno); assim como, posição dominante em produtos como o PVC.

Segundo Lemos (2009), o argumento em defesa da fusão é que o mercado petroquímico é mundial – e não nacional; e, consequentemente, as considerações acerca da "posição dominante de mercado" deveriam ser feitas considerando o market-share mundial. Esse argumento só resta válido se a competição com produtos importados for viável; ou, se empresa consequente realmente aplicar o preço do mercado internacional dentro do país e não interferir em sua composição de maneira significativa. Fato é que nunca foi admitida concentração dessa ordem no Brasil e que ignorar os limites do mercado relevante em âmbito nacional é contradizer que a disciplina as leis e os custos de transação diferenciados (como transporte e tributos) limitariam os "mercados relevantes" (GABAN, 2009).

Críticos da formação do monopólio como Lemos (2009) chegam a propor uma alternativa – o desmembramento da nova Braskem em duas empresas: uma seria a antiga Braskem e a outra resultante da fusão do Comperj (com todas as unidades de segunda geração incorporadas) com a Quattor. Nessa situação a Petrobras teria de comprar, no todo ou em parte, o controle da nova empresa renunciando ao poder de controle na Braskem. Porém, nesse contexto, os acionistas da Braskem seriam duplamente penalizados – primeiro com a depreciação dos seus ativos, se a Petrobras liquidasse sua posição por meio de oferta pública de ações; e, certamente, pela instituição de uma empresa concorrente controlada pela sua maior fornecedora de insumos. É o paradoxo do monopólio petroquímico – que é conseqüência natural do monopólio na venda da nafta.

Em regra, posições dominantes são as que excedem 20% de mercado relevante (LEMOS, 2009 e GABAN, 2009, p.129) ou também podem ser identificadas como o poder detido pelo agente no mercado que lhe assegure "a possibilidade de atuar um comportamento independe e indiferente em relação a outros agentes, impermeáveis as leis do mercado, e em virtude da ausência de um ambiente concorrencial" (FORGIONI, 2008, p.318). No caso em estudo a Braskem vai deter 100% de três mercados absolutamente relevantes (polietileno, propileno e PVC) possuindo as quatro centrais petroquímicas existentes no país (LEMOS, 2009), o que lhe daria uma absoluta "posição monopolista" no mercado interno.

Cabe citar, por fim, que mesmo que sejam autorizadas todas as aquisições divulgadas, a nova posição da Braskem a deixará na berlinda quanto a fiscalização do CADE, sempre vulnerável a punições em caso de abuso do poder econômico – no caso de usar do domínio de mercado relevante já conquistado.


6 Síntese, conclusões e recomendações

Considerando que uma estratégia de variação por seleção racional foi identificada – no uso de mecanismos de ajuste de estrutura de capital para modificar a estrutura de propriedade da empresa estudada; assim como, a estrutura de todo o mercado em que se inseria foi modificada no processo – pode-se concluir positivamente quanto ao problema de pesquisa proposto: explicou-se o por quê do fenômeno que contraria, prima facie, a teoria das finanças e os padrões de Direito Concorrencial.

É possível – e foi demonstrado segundo o modelo adotado no caso estudado – como uma rede de parceria (identificada nos acordos de acionistas) pode trazer vantagens diferenciadas para portadores de ações da mesma natureza; e, para a sociedade em face do Estado. Ressalvando que a impossibilidade de generalização dos resultados obtidos é uma das grandes limitações de qualquer estudo de casos (VENTURA, 2007, p. 387) os participantes da rede de colaboração (Odebrecht e Petrobrás ligados, primeiro, pelo acordo de acionistas; e, depois pela fundação da BRK) foram capazes de perpetuar seu controle na companhia analisada e em todo o mercado em que ela atuava.

Pode-se compreender, por fim, que o processo de oferta de bônus com valor de exercício acima do preço de mercado não pode ser explicado pelos pressupostos usuais da Teoria das Finanças por dois motivos: a) pela inviabilidade de calculo do poder de controle e da perenização desse poder, no presente; e, b) pelos os benefícios consequentes dessas estratégias podem não ser financeiramente expressos antes de obtidos os resultados em termos de fluxos de caixa, no futuro.

O trabalho associou conhecimentos nos três âmbitos: nos dados de acordos estratégicos (âmbito interno, entre os controladores); nos fatos relevantes das fusões e aquisições (âmbito do setor, entre empresas); e, nas modificações da estrutura de mercado (pela redução do número de concorrentes).

Em face de tantas questões complexas estudadas nos atos de concentração (M&A) e nas alianças estratégicas, duas hipóteses surgiram como explicações parciais possíveis ao problema de pesquisa que poderiam ser estudados pelas Finanças: os controladores podem ter investido valores superiores que os negociados no mercado de bolsa por deterem maior conhecimento sobre essas três racionalidades do que os demais acionistas; e, a compra na bolsa de valor equivalente ao exercido pelos controladores poderia interferir nos valores de cotação a tal ponto que o preço de médio de aquisição através da bolsa fosse maior do que através do exercício dos bônus.

Trabalhos na seara do uso das redes de colaboração internas e nos seus usos – como na aquisição de controle indireto – poderiam aproveitar a pesquisa concentrando-se em outros casos onde já há divulgação de intenções de uso de procedimentos semelhantes (como no caso previsto no acordo e de intenções entre a Portugal Telecom e os controladores da Telemar) ou mesmo dedicar-se a estudar os efeitos de destruição ou desenvolvimento de mercado conseqüentes dessas estratégias, inclusive, para concluir da sua licitude e da possível necessidade de sua mitigação ou vedação.

Por fim, após a análise das normas jurídicas sobre o tema, pode-se, inferir que a decisão sobre a legalidade dos atos de concentração estudados repousaram em um espectro de discricionariedade do CADE – graças aos conceitos abertos usados pela legislação.


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ANEXO

Gráfico comparativo de desempenho das cotações dos ativos

BRKM3 e BRKM5, comparativamente ao desempenho do IBOVESPA.

Fonte: Disponível em:

<http://br.finance.yahoo.com/echarts?s=%5EBVSP#symbol=^bvsp;range=1y;compare=brkm5.sa+brkm3.sa;indicator=volume;charttype=area;crosshair=on;ohlcvalues=0;logscale=off;source=>;

Acessado as 00h50 no dia 16 de dezembro de 2010.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RODRIGUES, Renato Amoedo Nadier; CUNHA, Ilanna P. Fernandes da. Estratégias corporativas de controle por redes de parcerias. Um estudo de caso entre as vantagens dos agentes e as consequências no mercado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3030, 18 out. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20255. Acesso em: 26 abr. 2024.