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Inconstitucionalidade da Lei Estadual paulista nº 13.160/2008

Inconstitucionalidade da Lei Estadual paulista nº 13.160/2008

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A Lei nº 13.160/2008 enumerou títulos e documentos protestáveis, bem como disciplinou o modo de protestá-los, dentre os quais o contrato de locação e o recibo de aluguel, extrapolando competência legislativa privativa da União e violando o pacto federativo.

A Assembleia Legislativa decretou e o Governador do Estado de São Paulo promulgou a Lei nº 13.160, de 21 de julho de 2008, que altera a Lei nº 11.331, de 26 de dezembro de 2002, a qual dispõe sobre emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro.

Consta no art. 1º da Lei nº 13.160/2008 que "Havendo interesse da administração pública federal, estadual ou municipal, os tabelionatos de protesto de títulos e de outros documentos de dívida ficam obrigados a recepcionar para protesto comum ou falimentar, as certidões de dívida ativa, devidamente inscrita, independentemente de prévio depósito dos emolumentos, custas, contribuições e de qualquer outra despesa, cujos valores serão pagos na forma prevista no item 6, bem como o crédito decorrente de aluguel e de seus encargos, desde que provado por contrato escrito, e ainda o crédito do condomínio, decorrente das quotas de rateio de despesas e da aplicação de multas, na forma da lei ou convenção de condomínio, devidas pelo condômino ou possuidor da unidade. O protesto poderá ser tirado, além do devedor principal, contra qualquer dos co-devedores, constantes do documento, inclusive fiadores, desde que solicitado pelo apresentante" (destacamos).

Ocorre que a inconstitucionalidade do dispositivo legal não tardou a ser reconhecida pelo Órgão Especial do TJSP, por meio da Arguição de Inconstitucionalidade nº 0209782-04.2010.8.26.0000, da Comarca de Itatiba, em que foi suscitante a 36ª Câmara de Direito Privado, tendo sido relator o Des. José Roberto Bedran (j. 25.05.2011).

Por maioria de votos – houve declaração de voto vencido do Des. Cauduro Padin [01] – julgou-se procedente a arguição, ao fundamento de que a Lei Estadual nº 13.160/2008, na parte que alterou os itens 7 e 8, das Notas Explicativas da Tabela IV – Dos Tabelionatos de Protestos de Títulos da Lei nº 11.331/2002, extrapolou competência legislativa privativa da União, violando o pacto federativo.

Conforme ressaltado pelo relator, o protesto "não traduz ato de registro público, mas, sim, notarial, inerente às funções de tabelionato, envolvendo matéria de Direito Civil e Comercial, acerca do que a Constituição Federal atribui competência legislativa privativa à União (art. 22, I), não se cuidando, por conseguinte, de competência concorrente (art. 23)".

No caso, a Lei nº 13.160/2008 enumerou títulos e documentos protestáveis, bem como disciplinou o modo de protestá-los, dentre os quais o contrato de locação e o recibo de aluguel, ferindo o princípio da reserva legal.

Perceba que não socorre o fato de inexistir um rol de documentos protestáveis, elaborado pelo legislador federal, pois seria compreensível a dificuldade da ausência de enumeração. Nesse passo, abeberando-se na fala do Des. Pedro Baccarat, o relator concluiu que melhor seria que a Corregedoria Geral de Justiça editasse normas a fim de orientar os cartórios delegados, já que ela exerce sobre eles poderes de fiscalização e orientação, o que nos parece bastante plausível.

Outrossim, mister não deslembrar que a Lei nº 13.160/2008 veio a lume com a clara intenção de corrigir – ou ao menos minorar – os efeitos do disposto no § 1º do art. 1.336 do Código Civil, que estabelece multa de até 2% em caso de inadimplemento (a Lei nº 10.931/2004, propôs nova redação para este parágrafo, porém o texto sofreu veto presidencial). Sem dúvida, o ínfimo percentual mencionado está muito mais a serviço dos devedores que dos credores, estimulando o crescimento da inadimplência.

Contudo, nem mesmo isso justificaria a desatenção do legislador paulista ao comando constitucional do art. 22, I, sob pena de extrapolação, pelo Estado, do âmbito de abrangência de sua competência material. "O direito material substancial (não-administrativo) concentra-se no inciso I do art. 22, e compreende direito civil, comercial, penal, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho" (José Afonso da Silva, Comentário Contextual à Constituição, 6ª ed., Malheiros, 2009, p. 264 – destacamos).

Diante do exposto, cumpre-nos aplaudir a decisão do Órgão Especial do TJSP que julgou procedente a arguição e declarou a inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 13.160/2008, na parte que, aludindo a protesto de contrato de locação e recibo de aluguel, alterou os itens 7 e 8, das Notas Explicativas da Tabela IV – Dos Tabelionatos de Protestos de Títulos, da Lei Estadual nº 11.331/2002, determinando a restituição dos autos à Câmara suscitante, para prosseguir no julgamento da apelação.


Notas

  1. . O entendimento do Des. Cauduro Padin, constante na declaração de voto vencido nº 17.455, é no sentido de que "a lei impugnada traz instrumentalização para o regime de custeio dos registros notariais do estado dentro da permissão na expressão ‘outros documentos de dívida’ referidos na Lei nº 9.492/97, ausente qualquer ofensa ao pacto federativo ou competência federal".

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LEMOS PEREIRA, Tarlei. Inconstitucionalidade da Lei Estadual paulista nº 13.160/2008. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3052, 9 nov. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20375. Acesso em: 28 mar. 2024.