Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/21359
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Indenização de Seguro DPVAT por morte de nascituro: direito ou expectativa de direito?

Indenização de Seguro DPVAT por morte de nascituro: direito ou expectativa de direito?

|

Publicado em . Elaborado em .

Diante das peculiaridades do DPVAT, indubitável que esta modalidade especial de seguro é incompatível com a indenização por “morte” de nascituro.

RESUMO

O Superior Tribunal de Justiça, em recente julgado datado de 2 de fevereiro de 2011, determinou, por maioria, o pagamento de indenização pelo seguro obrigatório DPVAT no caso de morte de nascituro por acidente automobilístico. A fim de demonstrar o equívoco da decisão supramencionada, por meio das interpretações teleológica, histórica e literal da lei, em respeito às regras da nova hermenêutica constitucional, se demonstrará que o nascituro não é pessoa natural, impedindo a ocorrência de seu falecimento nos termos legais. Ademais, diante das peculiaridades do seguro obrigatório principalmente quanto a sua finalidade específica de atender as primeiras necessidades decorrentes de um acidente de trânsito, chega-se a conclusão de que tal modalidade especial de seguro não responde pela interrupção de gestação em qualquer que seja o seu estágio.

Palavras-chaves: seguro obrigatório, danos pessoais, nascituro.

ABSTRACT

The Superior Tribunal de Justiça has decided by majority, in february 2 (two) 2011, for the restitution of payment by the DPVAT insurance in case of fetal death in a car accident. In order to prove the misjudgment of this decision it will be shown, beyond the teleological, historical and literal interpretations of the law, respecting the rules of the new constitutional hermeneutics, that the fetus is not a natural person, which prevents its death in legal terms. Moreover, before the obligatory insurance’s peculiarities, mainly in terms of its specific purpose of attend the first needs due to a car accident, it is concluded that this special modality of insurance does not respond to the interruption of a pregnancy in whatever stage.

Keywords: obligatory insurance, personal damages, fetus.


1 INTRODUÇÃO

A terceira turma do Superior Tribunal de Justiça, em recente julgado datado de 02 (dois) de fevereiro de 2011, nos autos do Recurso Especial n.º 1120676/76, sob a relatoria do Ministro Massami Uyeda, determinou, por maioria, o pagamento de indenização pelo Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre (DPVAT) em razão de acidente automobilístico, o qual ocasionou o aborto do feto da autora que contava, à época, com 35 (trinta e cinco) semanas de gestação.

Diante de periodicidade na ocorrência de sinistro envolvendo veículos automotores, os tribunais brasileiros têm enfrentado diversas questões envolvendo os efeitos patrimoniais oriundos da interrupção da gravidez especialmente quanto à responsabilidade do seguro obrigatório DPVAT pelo fato. Ainda que amplamente debatido, por envolver temas de grande influência moral ou mesmo religiosa, como a determinação do marco inicial da vida humana, a doutrina e a jurisprudência não chegaram a uma resposta definitiva sobre a matéria.  

A fim de demonstrar o equívoco da decisão supramencionada, importante se faz analisar a posição do nascituro no ordenamento jurídico brasileiro, especialmente com fim de determinar se o feto possui direitos ou mera expectativa destes, já que, apenas quando considerado pessoa natural, é que se pode falar em sua morte, consoante prevê o art. 6º do Código Civil de 2002.

Ademais, as peculiaridades do seguro obrigatório DPVAT são questões de extrema relevância, já que este foi criado com a finalidade específica de atender as primeiras necessidades decorrentes de um acidente envolvendo veículo automotor, capaz de originar despesas repentinas e inadiáveis. Independentemente da indenização devida pelo real responsável pelo acidente, nos casos de danos pessoais como a morte da vítima, por exemplo, o seguro DPVAT, diante da especificidade de sua existência, pode ser acionado.

O sofrimento dos pais ante a interrupção da gravidez é assunto inquestionável. Ainda que algumas teorias não atribuam personalidade jurídica ao nascituro, não se pode ignorar a existência de um vínculo afetivo entre os genitores e o feto. Dessa forma, por meio do presente trabalho científico não se busca ignorar a ocorrência deste dano, mas sim identificar o verdadeiro responsável para repará-lo.


2 DA POSIÇÃO DO NASCITURO NO ODENAMENTO JURÍRDICO BRASILEIRO

O início da vida humana, ainda que os gametas isolados sejam indispensáveis para a procriação, se dá com a singamia, entendida pelos biólogos como sendo o momento da fusão entre o gameta masculino e feminino de forma a surgir um genoma diverso daqueles que o deram origem. Assim, o embrião, conseqüência da penetração do espermatozóide no ovócito, passa a ser compreendido como um ser humano em potencial. [1]

O termo nascituro, originado do latim, é utilizado para indicar a existência de um ser concebido que ainda se encontra no ventre materno. [2] Neste diapasão, o art. 2º do Código Civil de 2002 regulamenta que a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida, mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

Indubitável se evidencia que o tema aqui levantado encontra-se em uma situação suis generis, já que o ser em análise possui uma orgânica própria capaz de lhe fornecer a vida, porém não é portador, de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, de “aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações” [3], ou seja, não possui personalidade civil.

O doutrinador Nelson Nery Júnior assim se manifesta sobre o tema:

Independentemente da viabilidade do ser nascido, a personalidade inicia-se com o nascimento com vida e termina com a morte da pessoa natural (CC 6º). O nascimento com vida caracteriza-se pelo fato de o nascituro respirar. A personalidade é atributo da dignidade do homem. É o que faz sua figura viva se distinguir da dos outros seres animados. É o que, no direito, atribui ao homem a condição de direito de direito e de deveres e obrigações. É o atributo que impede que o homem seja objeto de direito. [4]

Diante do fato que a lei brasileira não reconhece personalidade civil ao nascituro, embora garanta genericamente alguns de seus direitos, surge a discussão doutrinária quanto ao posicionamento do feto no ordenamento jurídico, principalmente quanto a divergência encontrada na identificação do marco inicial da pessoa natural. São três as teorias que se destacam quanto determinação da natureza jurídica do nascituro: a teoria concepcionista, a teoria pré-concepcionista e a teoria natalista.

A primeira destas, que encontrou supedâneo no Direito francês, subdivide-se em duas.  A doutrina concepcionista pura ou incondicionada defende que o marco inicial da personalidade civil se dá com a fecundação do gameta masculino com o feminino, momento este em que surge um ser completamente individualizado, devendo ser visto desde já como um ser humano perfeito, ou seja, uma pessoa natural, possuindo os mesmos direitos daquele que já nasceu.

Por sua vez, a teoria concepcionista impura ou condicionada afirma que o nascituro é um ser detentor de personalidade civil, apenas se vier a nascer com vida. Assim, somente com o adimplemento da condição suspensiva, nascimento com vida, é que se atribui a personalidade jurídica ao nascituro desde a sua concepção.

A doutrinadora Maria Helena Diniz, defensora desta corrente assim se manifesta:

Conquanto comece do nascimento com vida a personalidade civil do homem, a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro (CC, arts. 2º, 1.609, 1.779 e parágrafo único e 1.798), como direito à vida (CF, art.5º); à filiação (CC, arts. 1.596 e 1.597); à integridade física; a alimentos (RT, 650:220; RJTJSP, 150:906); a uma adequada assistência pré-natal; a um curador que zele pelos seus interesses em caso de incapacidade de seus genitores, de receber herança (CC, art. 1.798 e 1.800, §3º), a ser contemplado por doação (CC, art. 542);  a ser reconhecido como filho etc. Poder-se-ia até mesmo afirmar que, na vida intra-uterina, tem o nascituro, e, na vida extra-uterina, tem o embrião personalidade jurídica formal, no que atina aos direitos personalíssimos, ou melhor, aos da personalidade, visto ter a pessoa carga genética diferenciada desde a concepção, seja ela in vivo ou in vitro (Recomendação n. 1.046/89, n.7, do Conselho da Europa), passando a ter a personalidade jurídica material, alcançando os direitos patrimoniais e obrigacionais, que permaneciam em estado potencial, somente com o nascimento com vida (CC, art. 1.800, §3º). Se nascer com vida, adquire personalidade jurídica material, mas, se tal não ocorrer, nenhum direito patrimonial e obrigacional terá.[5] (Destaque da autora)

A corrente concepcionista possui uma visão mais humanista sobre o direito, baseando-se tanto nos direitos fundamentais, como em legislações infra-constitucionais recentes, tais como a Lei 11.804/2008, que prevê o pagamento de pensão alimentícia antes do nascimento do nascituro. Ainda dentro do útero materno, o feto já é considerado, para esta doutrina, um ser humano e, por isso, em consonância com os direitos e garantias individuais trazidos pela Constituição Federal de 1988, deve ter garantido todos os direitos a partir de sua concepção, embora possa ser condicionada sua personalidade jurídica ao seu posterior nascimento com vida.

Por sua vez, para a teoria pré-concepcionista, surgida como uma modernização da doutrina anterior em meio às inovações biotecnológicas, a fecundação ulterina ou mesmo in vitro estariam protegidas pelo mesmo direito. A nidação, ou seja, a implantação do zigoto no útero materno, não seria condição necessária para a efetiva existência da personalidade jurídica. Assim, a simples fecundação, mesmo fora do corpo materno, seria considerada como o início da personalidade jurídica do embrião, atribuindo-se, assim, ao zigoto manipulado fora do corpo da mãe os mesmo direitos atribuídos ao nascituro.

Finalmente, a teoria natalista, adotada pelo Código Civil de 2002, em seu artigo segundo, dispõe que a personalidade jurídica inicia-se com o nascimento com vida. Assim, a respiração[6] do feto após o parto, como prevê o art.53, §2º da Lei de Registros Públicos n.º6.015/73, é o marco inicial da personalidade jurídica e não mera condição para a sua existência.

Assim, se a criança nascer morta esta não chegou adquirir a personalidade jurídica, devendo o Cartório, portanto, registrar o acontecimento em livro específico, conforme art.53, §1º, da LRP. Todavia, se o feto nasceu com vida, tendo respirado, ainda que falecido na ocasião do parto, serão feitos dois assentos, o de nascimento e o de óbito, com os elementos cabíveis e com remissões recíprocas, por força do §2º do mesmo diploma.

O doutrinador Pontes de Miranda, defendendo a teoria natalista, assim se manifesta:

No útero, a criança não é pessoa. Se não nasce viva, nunca adquiriu direitos, nunca foi sujeito de direito, nem pôde ter sido sujeito de direito (= nunca foi pessoa). Todavia, entre a concepção e o nascimento, o ser vivo pode achar-se em situação tal que se tenha de esperar o nascimento para se saber se algum direito, pretensão, ação ou exceção lhe deveria ter ido. Quando o nascimento se consuma, a personalidade começa. Não é preciso que se haja cortado o cordão umbilical; basta que a criança haja terminado de nascer (=sair da mãe) com vida. Se a ciência médica responde que nasceu vivo, porém seria impossível viver mais tempo, foi pessoa, no curto trato de tempo em que viveu. (...) O parto sem vida pré-exclui qualquer efeito por diante; o parto com vida completa o suporte fático para surgir a pessoa, no preciso sentido jurídico. O infans conceptus é suporte fático à parte; o suporte fático entra no mundo jurídico e, como fato jurídico, irradia eficácia. Com os elementos desse suporte fático, mais o nascimento com vida, compõe-se o suporte fático de que exsurge a pessoa. As noções de ficção, de substituição, ou de retroatividade, são, aquelas, supérfluas, e essa, errada.[7]

Dessa forma, há de se entender que quando o legislador atribui direitos ao nascituro, estes não são os mesmos garantidos ao recém-nascido, já que o feto não é considerado pessoa para poder atuar como titular destes. O que as normas brasileiras buscam proteger é a expectativa de surgimento de uma pessoa natural, garantindo-se a viabilidade dos direitos que essa possa vir a adquirir.

Neste diapasão, a morte, conforme regulamenta o art.6º do Código Civil de 2002, é o fim da pessoa natural. Assim, indubitável se evidencia que não se pode falar, tecnicamente, em morte de nascituro, já que este, diante da inocorrência do nascimento com vida, nunca veio a possuir personalidade jurídica. O Ministro Ayres Britto, em seu voto proferido nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º3.510/DF, que julgou pela constitucionalidade da Lei de Biossegurança, assim se manifestou:

Não se nega que o início da vida só pode coincidir com o preciso instante da fecundação de um óvulo feminino por um espermatozóide masculino. (...) Sem embargo, esse insubstituível início de vida é uma realidade distinta daquela constitutiva da pessoa física ou natural; não por efeito de uma unânime ou sequer majoritária convicção metafísica (esfera cognitiva em que o assunto parece condenado à aporia ou indecidibilidade), mas porque assim é que preceitua o Ordenamento Jurídico Brasileiro. (...) Em suma, e já agora não mais por modo conceitualmente provisório, porém definitivo, vida humana já rematadamente adornada com o atributo da personalidade civil é o fenômeno que transcorre entre o nascimento com vida e a morte cerebral.[8]

No que tange especificamente ao pagamento do seguro DPVAT aos herdeiros do nascituro que não veio a nascer por causa de acidente de trânsito, os tribunais vêm divergindo sobre qual corrente doutrinária aplicar, ora negando o direito a indenização[9], ora determinando o pagamento[10]. Em oposição às determinações do ordenamento brasileiro, que indubitavelmente adotou a teoria natalista, o STJ, por sua vez, na decisão do Recurso Especial nº. 1120676/SC, entendeu por bem ampliar a interpretação do conceito morte e a finalidade do seguro obrigatório, a fim de abranger a feto já formado e plenamente apto à vida extrauterina, embora ainda não nascido.


3 DAS PECULIARIEDADES DO SEGURO DPVAT POR MORTE

Antes de se analisar a decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça quanto a legalidade da indenização pelo seguro obrigatório DPVAT nos casos de acidente automobilístico terrestre com morte de nascituro, importante se faz tecer algumas considerações sobre as peculiaridades deste tipo de seguro.

O Decreto-lei n.º73/66 determina em seu art. 20, inciso l, com redação dada pela Lei nº 8.374/91 que é obrigatório o seguro por danos pessoais causados por veículos automotores de vias terrestres e por embarcações, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não. Assim, com o advento da lei n.º6.194/74, surgiu o seguro obrigatório DPVAT que, conforme leciona o doutrinador Carlos Roberto Gonçalves, “passou a ser tratado como um seguro especial de danos pessoais destinados às pessoas transportadas ou não que venham a ser lesadas por veículos em circulação.”[11]

A finalidade do seguro obrigatório possui cunho estritamente social, já que busca, diante da alta periodicidade na ocorrência de acidente envolvendo veículo automotor, garantir um ressarcimento mínimo às vítimas em face do dano sofrido, capaz de cobrir despesas imediatas. Diante disto, o doutrinador Arnaldo Rizzardo assim se manifesta sobre o tema:

destina-se  a atender  as  primeiras  necessidades  decorrentes  de  um acontecimento  infausto,  que  apanha  de  surpresa  as  pessoas,  e origina  despesas  repentinas  e  inadiáveis.  Em outros termos, visa simplesmente dar cobertura às despesas urgentes de atendimento das  vítimas  dos  acidentes  automobilísticos,  em  risco  permanente  de vida.  .[12]

Complementa Sérgio Cavalieri Filho afirmando que

esse seguro deixou de se caracterizar como seguro de responsabilidade civil do proprietário para se transformar num seguro social em que o segurado é indeterminado, só se tornando conhecido quando da ocorrência do sinistro, ou seja, quanto assumir a posição de vítima de um acidente automobilístico. O proprietário do veículo, portanto, ao contrário do que ocorre no seguro de responsabilidade civil, não é o segurado, mas o estipulante do seguro em favor do terceiro. Em razão de suas características, pode-se, ainda, afirmar que não há contrato nesse seguro, mas sim uma obrigação legal; um seguro imposto por lei, de responsabilidade social, para cobrir os riscos da circulação dos veículos em geral. Tanto é assim que a indenização é devida, nos limites legais, mesmo que o acidente tenha sido provocado por veículo desconhecido ou não identificado e ainda que tenha havido culpa exclusiva da vítima.[13]

Desta forma, indubitável se evidencia que o seguro obrigatório DPVAT, não acoberta danos materiais, como colisão, roubo ou furto de veículo, por exemplo, limitando-se a reparar as lesões que recaiam sobre a pessoa. Diante da especialidade desta modalidade de seguro, a seguradora somente é obrigada a ressarcir os danos por morte, invalidez permanente ou reembolso de despesas de assistência médica e suplementares devidamente comprovadas, conforme prevê o art. 3º da lei n.º 6.194/74.

Assim, se faz necessária primeiramente a existência de uma pessoa propriamente dita, ou seja, um ser humano dotado de personalidade jurídica, nos moldes determinados pelo art. 2º do Código Civil de 2002. Sem pessoa natural, não há o que se indenizar pelo seguro obrigatório, já que esta modalidade especial de seguro só cobre os danos acima arrolados.

Ademais, a indenização proveniente do seguro obrigatório não deve ser confundida com o ressarcimento devido à vitima pelos reais responsáveis  pelo acidente, admitindo inclusive o Superior Tribunal de Justiça, por força de súmula do STJ n.º246, que o valor do seguro obrigatório deva ser deduzido da indenização judicialmente fixada. Diante da finalidade social do seguro DVPAT, o STJ, a fim impedir o enriquecimento ilícito, entendeu pela legalidade de tal abatimento mesmo quando não restar comprovado que a vítima tenha se quer requerido ou mesmo recebido o referido seguro.[14]

O caráter peculiar do seguro obrigatório, inclusive permite que o pagamento da indenização seja efetuado mediante simples apresentação dos documentos e dos danos pessoais sofridos pela vítima, conforme assevera o art.5º da lei 6.194/74, devendo ser prestado inclusive no prazo máximo de 30 (trinta) dias da entrega destas informações, não se questionando a existência de culpa.

O doutrinador Carlos Roberto Gonçalves entende que

Sendo o fato gerador da obrigação unicamente a circulação do veículo, abstraída qualquer discussão em torno da culpa, seja do condutor, seja da vítima, a circunstancia de ter sido o evento deliberadamente procurado pela vítima suicida, por exemplo, não retira o caráter de imprevisibilidade para o motorista e não exclui a cobertura securitária. (...) Naturalmente, a finalidade de tal seguro, de cunho social, é cobrir danos resultantes de condutas normais dentro da sociedade e não amparar criminosos, cujo comportamento atenta contra a própria sociedade.[15]

Na específica questão em comento, o fato gerador do requerimento da indenização é a morte, respeitada a atecnica, de quem não chegou a nascer, ou seja, de um nascituro. A jurisprudência tem enfrentado diversos casos semelhantes a este, sempre levantando-se, além dúvida quanto ao momento de início da personalidade civil, o questionamento da finalidade peculiar do seguro obrigatório DPVAT ante a interrupção de gravidez provocada por acidente automobilístico.

Conforme já explanado no tópico anterior, o art.2º do Código Civil, adotando expressamente a teoria natalista, regulamenta que “a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida, mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”.  Assim, ante a inexistência de pessoa natural capaz de morrer, segundo o art. 6º do mesmo diploma, inexiste fato gerador que dê supedâneo ao requerimento do seguro obrigatório.

Desta forma, diante das peculiaridades do seguro DPVAT, que possui o fim único de minimizar os danos imediatos decorrentes de um acontecimento imprevisível e não de repará-lo in totum, indubitável se evidencia que o seguro obrigatório é incompatível quanto a indenização por “morte” de nascituro.


4 DO EQUÍVOCO HERMENÊUTICO NA DECISÃO DO RERCURSO ESPECIAL Nº. 1120676/SC.

O Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial nº. 1120676/SC, julgado no dia 7 (sete) de dezembro de 2010, em oposição às determinações do Código Civil de 2002, entendeu por bem aplicar a doutrina concepcionista, quanto a aplicação de personalidade jurídica ao feto com 35 (trinta e cinco) semanas completas de gestação, e ignorar as peculiaridades do seguro obrigatório DPVAT, desvirtuando a sua finalidade.

O Ministro Relator do acórdão Paulo de Tarso Sanseverino assim decidiu:

Tenho que a  interpretação  mais  razoável  desse  enunciado  normativo, consentânea  com  a  nossa  ordem  jurídico-constitucional,  centrada  na  proteção dos  direitos  fundamentais,  é  no  sentido  de  que  o  conceito  de  "dano-morte", como  modalidade  de  "danos  pessoais",  não  se  restringe  ao  óbito  da  pessoa natural, dotada de personalidade jurídica, mas alcança, igualmente, a pessoa já formada,  plenamente  apta  à  vida  extra-uterina,  embora  ainda  não nascida, que, por uma fatalidade, acabara vendo a sua existência abreviada em acidente automobilístico. (...) A ciência  cuja missão é  a investigação  da  vida  -  a  biologia  - coadjuvada pela medicina,  racionalizando  as  fases  da  vida intra-uterina,  do  zigoto  ao  feto, externara  a  pré-viabilidade  fetal  desde  a  22ª  semana  de  gravidez  e  a  sua viabilidade  desde a  27ª  (...) Note-se que a filha dos postulantes encontrava-se na 35ª semana de vida, nono  mês  de  gestação,  ou  seja,  era  plenamente  hábil  à  vida  pós-uterina, autônoma  no  seu  desenvolvimento,  apenas  não  independente,  porque necessitava,  ainda,  por  mais  alguns  dias,  da  "alimentação"  que  lhe  provia  sua mãe (alimentação aqui compreendida como o sustento para a sua sobrevivência no ambiente intra-uterino). (...) Se é certo que a lei brasileira previu como aptos a adquirirem  direitos e contraírem  obrigações,  os  nascidos  com  vida,  dotando-os  de  personalidade jurídica,  não  excluiu do seu alcance aqueles que, ainda não nascidos, remanescem no ventre materno, reconhecendo-lhes a aptidão de ser sujeitos de "direitos".[16]

O fato de que o nascituro tinha, ao tempo do acidente, 35 (trinta e cinco) semanas de gestação, sendo hábil, segundo entendimento médico, de vida extra-uternina, foi fator determinante para aplicação da personalidade jurídica a este pelo Ministro Paulo de Tarso Sanseverino. A partir de uma interpretação dedutiva, este entendeu que os direitos atribuídos ao recém-nascido deveriam ser igualmente garantidos ao feto viável.

 Data vênia, em oposição ao entendimento supramencionado, conforme amplamente explanado no tópico 2 deste trabalho, o nascituro não é portador de personalidade jurídica, ainda que a vida deste seja plenamente viável fora do corpo da mãe. O legislador, ao determinar o início da pessoa natural, não adotou o requisito da viabilidade, mas sim o do nascimento com vida.

O doutrinador Clóvis Beviláqua, ao analisar a doutrina da viabilidade, chega a seguinte conclusão:  

Finalmente a doutrina da viabilidade não oferece a necessária segurança às relações jurídicas. O direito precisa de saber quando começa a existência das pessoas, para que o movimento da vida social não se interrompa ou fique indeciso. Mas a inviabilidade não há de ser declarada arbitrariamente, deve ser o resultado de um exame pericial, aliás impossível nas regiões do interior. E, enquanto se não profere o laudo, as relações jurídicas, em que o recemnascido é sujeito, ficam suspensas, o que é altamente incoveniente.[17]

Dessa forma, indubitável se evidencia que não se pode ampliar o marco inicial da personalidade jurídica, atribuindo ao feto viável os mesmos direitos garantidos ao recém-nascido, já que o próprio legislador regulamentou a existência do “direito do nascituro” em separado. A doutrina denominada Clássica, adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro, é clara ao afirmar que ao nascituro somente cabe a perspectiva de direitos, os quais somente se efetivarão com o nascimento com vida do feto.

A questão apresentada pelo Ministro Relator do acórdão compreende-se, em suma, em quais direitos decorrentes do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana podem ser atribuídos ao feto ainda dentro do útero materno, ou seja, quais são os verdadeiros direitos do nascituro.

A resposta para esta discussão não pode se valer somente das regras interpretativas clássicas, tais como a teleologia, historicidade ou literalidade da lei, mas sim das regras da nova hermenêutica constitucional, em que não se concebe a exclusão total de um direito em face de outro, uma vez que a exclusão de qualquer dos direitos em choque, significaria o ferimento do próprio ordenamento, já que possuem a mesma essência nuclear.

Os “direitos do nascituro” são direcionados a garantir a sua potencialidade de existência, resguardando desde já tanto seu patrimônio quanto a sua dignidade. Ocorre que tais direitos não podem se confundir com os direitos garantidos aos que já possuem personalidade jurídica, ou seja, os seres que nasceram e respiraram.

Dessa forma, acertada se mostra a fundamentação apresentada pelo Ministro Massami Uyed, nos autos do mesmo Recurso Especial quando assim se posicionou:

O nascituro, pois, como realidade jurídica distinta da pessoa natural, não titulariza os mesmos direitos desta, nem com ela se confunde. O nascituro, como assinalado, titulariza todos os direitos imprescindíveis para que este ente venha, em condições dignas, a nascer vivo. A diversidade destas realidades jurídicas (nascituro e pessoa natural), no que se refere a sua proteção jurídica, é revelada pelo artigo 2º do Código Civil que adota, expressamente, como marco definidor para a aquisição da personalidade civil, o nascimento com vida. É, pois, pessoa natural aquele que sobreviveu ao parto, nasceu com vida, adquirindo, com isso, personalidade civil.

O Ministro, ante exposto, segue aduzindo que

com exceção dos direitos da personalidade que são conferidos ao nascituro com o desiderato único de assegurar o surgimento da Pessoa Humana (e, por isso, decorrem, reflexamente, ressalte-se, do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana), este ente, por opção legislativa que não comporta alargamento, não titulariza direitos disponíveis/patrimoniais, bem como não detém capacidade sucessória. Na verdade, sobre os direitos patrimoniais, o nascituro possui mera expectativa de direitos, que somente se concretizam (é dizer, incorporam em seu patrimônio jurídico) na hipótese de este ente vir a nascer com vida.[18]

Diante disto, é de se observar que a natureza jurídica do seguro obrigatório por acidente de trânsito não se enquadra em nenhuma destas nos direitos atribuídos ao nascituro, os quais caracterizam-se por terem a finalidade de garantir o desenvolvimento do feto. A dignidade humana do feto em formação, desta forma, surge apenas para impedir que este, após tornar-se pessoa humana, seja prejudicado por atos ocorridos durante seu desenvolvimento, a fim de garantir uma potencial existência digna deste.

Assim, o nascituro não pode ser considerado sujeito de direitos, porque, como dito anteriormente, não há titular respectivo para atribuí-los. Embora, no caso em comento, a vida do feto com 35 (trinta e cinco) semanas seja por completo viável fora do útero materno, o Código Civil é claro quanto ao marco inicial da personalidade jurídica. Sem nascimento com vida não há pessoa natural.

Como no caso em comento o nascituro não chegou sequer a nascer com vida, inexistindo desta forma pessoa natural, a indenização do seguro DPVAT foge dos direitos atribuídos ao feto. Não há que se falar em indenização por morte oriunda de acidente automobilístico terrestre no caso em apreço, já que não há mais potencialidade jurídica de pessoa a ser protegida.

 Neste contesto se apresenta a lição do professor Carlos Roberto Gonçalves:

Não pode o nascituro, todavia, ser titular de pretensão indenizatória, ainda que por dano moral. Já decidiu o Superior Tribunal de Justiça que o “direito de ação por dano moral é de natureza patrimonial e, como tal, transmite-se aos sucessores da vítima”[19]. Desse modo o nascituro, como titular de direito eventual (CC, art. 130), só poderá propor medidas de conservação de seus direitos, por seu representante legal, sob a forma de cautelares inominadas, não se podendo sequer falar em antecipação de tutela, que exige a titularidade da pretensão, titularidade esta que só será adquirida se o nascituro nascer com vida.[20]

 O mesmo raciocínio que se aplica ao instituto da herança, que da mesma forma que a indenização do seguro DPVAT também é um direito patrimonial. Nessa hipótese, não se admite que a herança deixada pelo pai morto enquanto a esposa está grávida seja transmitida para o nascituro, pois se assim pudesse e o feto viesse a não nascer a herança seria da gestante, pois é a sua herdeira direta e natural.

O que ocorre é ao contrário, o nascituro somente terá direito à herança se vier a nascer com vida, mesmo que logo depois morra, o que faria de sua mãe a herdeira da herança deixada pelo pai. Enquanto não nasce o feto tem apenas perspectiva de direito à herança. Portanto, se não nascer a parte que lhe caberia será transmitida aos seus avós (ou a outros herdeiros do pai do nascituro).

Nesse ponto, a moderna doutrina constata que:

a proteção a certos direitos do nascituro encontra, na legislação atual, pronto atendimento, antes mesmo do nascimento, leva-nos a aceitar as argutas ponderações de Maria Helena Diniz sobre a aquisição da personalidade desde a concepção apenas para a titularidade de direitos da personalidade, sem conteúdo patrimonial, a exemplo do direito à vida ou a uma gestação saudável, uma vez que os direitos patrimoniais estariam sujeitos ao nascimento com vida, ou seja, sob condição suspensiva. [21] (Destaque nosso).

Esse mesmo entendimento deve ser aplicado quanto a indenização pelo seguro obrigatório, pois se trata de um direito patrimonial, que não possui nenhuma relação com os direitos fundamentais à vida e à saúde que possibilitariam a mitigação da teoria clássica ou naturalista. Assim, o recebimento da indenização do seguro DPVAT pelos genitores de nascituro morto em acidente automobilístico terrestre se mostra descabida diante dos limites dos “direitos do nascituro” quanto aos direitos patrimoniais deste.

Ademais, importante se faz lembrar que o seguro obrigatório possui finalidade especial de cunho de suma relevância social, qual seja minimizar os gatos surgidos em decorrência de acidente automotivo, atendendo aos gastos repentinos e inadiáveis.

Neste sentido, acertada é o entendimento do Ministro Massami Uyed.

Inicialmente, sobreleva ressaltar o caráter especial do seguro obrigatório DPVAT que assume, indiscutivelmente, relevante finalidade social, tendente a minorar os deletérios danos pessoais causados às vítimas do sinistro, inesperados, como sói acontecer nos acidentes automobilísticos (...) Como bem ponderado pelas Instâncias ordinárias, indiscutível a dor e o sofrimento suportados pelos autores, em especial pela autora, que, em razão do acidente automobilístico, teve a sua gestação, em estado já avançado, interrompida. Entretanto, os fatos delineados nos presentes autos, tal como postulados (morte do nascituro), não dão ensejo, a indenização do seguro DPVAT. Nessa perspectiva, eventual pretensão de obter a reparação do apontado (e inegável) sofrimento pode ser veiculada pela via indenizatória própria contra o causador do acidente.[22]

O seguro obrigatório DPVAT, conforme demonstrado, possui finalidade específica incompatível com a reparação do sofrimento suportados pelos pais que tiveram interrompida a gravidez em qualquer fase de sua gestação.


5 DA CONCLUSÃO.

A decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, nos autos do Recurso Especial n.º 1120676/SC, está eivado de evidente equívoco hermenêutico. Limitando-se ao uma análise legal do assunto, sem adentrar nas argumentações religiosas e morais que envolvem tal discussão, incontestável é adoção pelo ordenamento jurídico brasileiro da teoria natalista, ao delimitar o surgimento da personalidade jurídica ao nascimento com vida.

 Pela análise do acórdão, destaca-se que o voto vencedor do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, além de estar fundamentado na teoria concepcionista, adotou o requisito da viabilidade do feto, o qual, conforme demonstrado, não possui qualquer segurança jurídica. Desta forma, para ele, o feto, por ser dotado dos mesmos direitos do recém-nascido, possui personalidade jurídica, podendo este fato vir a ser indenizado pelo seguro obrigatório DPVAT.

Ocorre que o nascituro, conforme demonstrado, não é pessoa natural pela inocorrência do parto, o que impossibilita, pelos preceitos expressos no art. 2º do CC, atribuí-lo, por meio de uma interpretação dedutiva, os mesmos direitos garantidos aquele que já nasceu, conferindo a este mera expectativa. Assim, ante a inexistência de pessoa natural capaz de morrer, segundo o art. 6º do mesmo diploma, inexiste fato gerador que dê supedâneo ao requerimento do seguro obrigatório.

Diante das peculiaridades do seguro obrigatório DPVAT, criado especialmente com o fim de atender as primeiras necessidades decorrentes de um acidente envolvendo veículo automotor, capaz de originar despesas repentinas e inadiáveis, indubitável se evidencia que esta modalidade especial de seguro é incompatível quanto a indenização por “morte” de nascituro.

O sofrimento dos pais diante da interrupção da gravidez de um feto com 35(trinta e cinco) semanas é incontestável. Mesmo que para o direito este não seja considerado pessoa natural, os pais já possuem uma relação de afeição com o feto. Todavia, o seguro obrigatório DPVAT, por ser um instituto criado em caráter especial, não é o responsável por reparar tal dor, mas sim aquele que deu causa ao acidente.


6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

·                    ALEXY, Robert. Teoria dos Direito Fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva, da 5ª edição alemã. Editora Malheiros, São Paulo: 2008.

·                    ASCENÇÃO, José de Oliveira. O início da vida. vol. 11. n.º 44. Rio de Janeiro: Revista da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, 2008.

·                    BEVILÁQUA, Clóvis. Código civil dos Estados Unidos do Brasil comentado por Clovis Beviláqua. 4.tir. edição histórica. Rio de janeiro: Editora Rio, 1979.

·                    BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 24ª ed. Editora Malheiros. São Paulo: 2009.

·                      CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

·                    CONSCIÊNCIA, Eurico Heitor. Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel. Coimbra: Almedina, 2003.

·                    DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

·                    DPVAT Seguro: banco de dados. Disponível em: <http://www.dpvatseguro.com.br/>. Acessado em: 05 mai. 2011.

·                    FALCÃO, Raimundo Bezerra. Hermenêutica. 3. tir. Editora Malheiros. São Paulo: 2004.

·                    GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume I: parte geral. 7. ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva, 2009.

·                    _______________________. Responsabilidade civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

·                    MARMELSTEIN, George. Curso de Direitos Fundamentais. São Paulo: Atlas, 2008.

·                    MARTINS, Rafael Tárrega. Seguro DPVAT - seguro obrigatório de veículos automotores de vias terrestres. 4. ed. Campinas: Servanda, 2009.

·                    MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado: parte geral. 2. ed. Campinas: Bookseller, 2000.  

·                    NERY JUNIOR, Nelson. Código civil comentado. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

·                    OLIVEIRA, Arnaldo Filipe da Costa. Seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel. Coimbra: Almedina, 2008.

·                    RODRIGUES, Silvio. Direito civil: parte geral. 34. ed. vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2003.

·                    SOUZA, Reindranath V. A. Capelo de. O Direito Geral de Personalidade. Coimbra, Portugal: Coimbra Editora, 1995.

·                    BRANCO, Elcir Castello. Seguro obrigatório de responsabilidade civil e dos proprietários de veículos automotores. São Paulo: Leud, 1976.


Notas

[1] ASCENÇÃO, José de Oliveira. O início da vida. vol. 11. n.º 44. Rio de Janeiro: Revista da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, 2008, p. 17-37.

[2] RODRIGUES, Silvio. Direito civil: parte geral. 34. ed. vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 36.

[3] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume I: parte geral. 7. ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 70.

[4] NERY JUNIOR, Nelson. Código civil comentado. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 207-208.

[5] DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 7.

[6]O doutrinador Carlos Roberto Gonçalves leciona sobre o método tradicional de apuração da respiração “essa concepção se faz, tradicionalmente, pelo exame clínico denominado docimasia hidrostática de Galeno. Baseia-se essa prova no princípio de que o feto, tendo respirado, inflou de ar os pulmões. Extraídos do corpo do que morreu durante o parto e imersos em água, eles sobrenadam. Os pulmões que não respiraram, ao contrário, estando vazios e com as paredes alveolares encostadas, afundam”. (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: parte geral. 7. ed. rev e atual.vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 78).

[7] MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado: parte geral. 2. ed. Campinas: Bookseller, 2000. p.217-229. 

[8] STF. Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º3.510. Ministro Relator Ayres Britto, julgado em: 29 mai. 2008.

[9] Nesse sentido leiamos: “SEGURO OBRIGATÓRIO. Responsabilidade civil. Acidente de trânsito. Perdade filho em razão de interrupção da gestação, por aborto decorrente do aludido acidente. Aquisição da personalidade jurídica, pelo nascituro, somentecom o nascimento com vida. Cobrança improcedente. Recurso desprovido. Voto vencido.” (1º TACSP; Rec. 1224297-0; Nona Câmara de Férias; Rel. Juiz Paulo Roberto Grava Brazil; Julg. 10/02/2004). Nesse mesmo sentido, o Tribunal do Rio Grande do Sul já se manifestou: “APELAÇÃO CÍVEL. SEGUROS. INDENIZAÇÃO. DPVAT. MORTE DE FETO. DESCABIMENTO. MERA EXPECTATIVA DE DIREITO. CONDIÇÃO SUSPENSIVA. NASCIMENTO COM VIDA. PESSOA. SUJEITO DE DIREITOS E OBRIGAÇÕES. 1. A Lei n.º 6.194/74, que criou o seguro DPVAT, alterada pela Lei n.º 8.441/92, é o texto legal que regulamenta os valores das indenizações relativas ao seguro obrigatório, fixando também como beneficiários desta garantia a pessoa vitimada com o advento do risco assegurado. 2. O diploma legal precitado não autoriza que as Resoluções do CNPS ou de qualquer outro órgão do Sistema Nacional de Seguros Privados a regulação para fixar ou alterar os valores indenizatórios atinentes aos danos pessoais causados por veículos automotores, ou sequer tem o condão de ampliar os beneficiários da garantia instituída. 3. No caso em exame, não se pode considerar o feto, na condição de nascituro, com pessoa vitimada para fins de indenização do seguro obrigatório DPVAT, nos termos do artigo 3º da Lei nº 6.194/74, uma vez que não possui capacidade de direito, mas apenas expectativa de direitos, que se submete a uma condição suspensiva, qual seja, o nascimento com vida. 4. Portanto, o feto não é pessoa à luz do direito, nem é dotado de personalidade jurídica, sendo que os direitos que lhe conferem estão em estado potencial, sob condição suspensiva. 5. Destarte, não possui capacidade de direito ou de gozo, que é a aptidão para adquirir direitos e contrair obrigações, e que não pode ser negada a nenhuma pessoa, princípio da dignidade humana que é inafastável do ser que obtém o status de sujeito de direito, cuja condição a ser implementada para tanto é o fato de ser concebido com sinais vitais. 6. Ônus da sucumbência invertido. Prejudicado o exame das preliminares de carência de ação por ilegitimidade passiva e falta de interesse de agir ante o resultado da causa, no mérito, por maioria, dado provimento ao recurso da parte demandada.” (TJRS; AC 70022797542; Novo Hamburgo; Quinta Câmara Cível; Rel. Des. Jorge Luiz Lopes do Canto; Julg. 04/06/2008; DOERS 02/09/2008; Pág. 23)

[10] Nesse sentido, leia-se o seguinte julgado do Tribunal de Justiça de Sergipe: “APELAÇÃO CÍVEL. SEGURO OBRIGATÓRIO. DPVAT. MULHER GRÁVIDA DE 34 SEMANAS ATROPELADA. MORTE DO NASCITURO OCORRIDA EM VIA PÚBLICA. RUA PERCILIO ANDRADE NO MUNICÍPIO DE ITABAIANA. CORREÇÃO MONETÁRIA A PARTIR DO SINISTRO. SENTENÇA MANUTENIDA. APELO CONHECIDO E IMPROVIDO. O nascituro, provido de personalidade jurídica desde o momento da concepção, está coberto pelo seguro DPVAT, visto que seu bem-estar é assegurado pelo ordenamento pátrio. É devido o pagamento da indenização no caso de interrupção da gravidez e morte causadas por acidente de trânsito.” (TJSE; AC 2010202294; Ac. 4366/2010; Segunda Câmara Cível; Rel. Des. Osório de Araújo Ramos Filho; DJSE 24/05/2010; Pág. 26). Vide também a seguinte decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO OBRIGATÓRIO DPVAT. Morte do feto em conseqüência de acidente de trânsito. Indenização. Cabimento. Caso em que a solução da controvérsia diz com a existência do nascituro enquanto pessoa. Indenização devida na sua integralidade. Inteligência da Lei nº 11.482/2007. Apelo desprovido.” (TJRS; AC 70039737721; Porto Alegre; Sexta Câmara Cível; Rel. Des. Antônio Corrêa Palmeiro da Fontoura; Julg. 09/12/2010; DJERS 17/12/2010)

[11] GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 939.

[12] RIZZARDO, Arnaldo. A reparação nos acidentes  de  trânsito.  7. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 202 apud STJ. Recurso Especial n.º1.120.676. Ministro Relator Massami Uyeda. Ministro Relator para acórdão Paulo de Tarso Sanseverino. Julgado em: 07 dez. 2010.

[13] CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p.143.

[14] Nesse sentido, leia-se: “PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO INTERNO. SEGURO OBRIGATÓRIO. DEDUÇÃO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. INDEPENDENTEMENTE DO RECEBIMENTO. 1. O valor do seguro obrigatório deve ser deduzido da indenização judicialmente fixada (Súmula nº 246/STJ), sendo que essa dedução efetuar-se-á mesmo quando não restar comprovado que a vítima tenha recebido o referido seguro. 2. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ; EDcl-REsp 1.198.490; Proc. 2010/0113971-0; DF; Terceira Turma; Rel. Des. Conv. Vasco Della Giustina; Julg. 21/10/2010; DJE 04/11/2010) Vide também o seguinte julgado: “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE CIVIL AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS ACIDENTE DE TRÂNSITO. VÍTIMA FATAL. QUANTUM INDENIZATÓRIO. DEDUÇÃO DO VALOR DO SEGURO OBRIGATÓRIO. SÚMULA Nº 246/STJ. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. DEDUÇÃO DO VALOR. INVIABILIDADE. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADA. I - Em caso de acidente de trânsito com vítima, deve ser deduzido do quantum indenizatório fixado tão-somente o valor do seguro obrigatório (Súmula nº 246/STJ), o mesmo não se podendo dizer quanto ao seguro de vida em grupo, por se tratar de relação jurídica diversa. II - O dissídio jurisprudencial deve ser demonstrado com a similitude fática e jurídica respectiva, além do cotejo analítico entre os julgados paradigmas e o Acórdão recorrido, devendo a citação observar as regras do RISTJ. Na falta do exigido cotejo analítico entre os julgados mencionados, torna-se inviável a irresignação apontada pela alínea "c" do permissivo constitucional. Registre-se, ademais, que a simples transcrição de ementas não é hábil para a configuração da divergência. Agravo regimental improvido.” (STJ; AgRg-AgRg-Ag 1.037.738; Proc. 2008/0068464-3; CE; Terceira Turma; Rel. Min. Sidnei Beneti; Julg. 14/10/2008; DJE 03/11/2008)

[15] GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 940.

[16] STJ; REsp 1.120.676; Proc. 2009/0017595-0; SC, da Terceira Turma. Rel. Min. Massami Uyeda; Julg. 07/12/2010; DJE 04/02/2011

[17] BEVILÁQUA, Clóvis. Código civil dos Estados Unidos do Brasil comentado por Clovis Beviláqua. 4.tir. edição histórica. Rio de janeiro: Editora Rio, 1979. p. 179.

[18] STJ; REsp 1.120.676; Proc. 2009/0017595-0; SC, da Terceira Turma. Rel. Min. Massami Uyeda; Julg. 07/12/2010; DJE 04/02/2011

[19] RSTJ 71/183

[20] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, vol I. Parte Geral. Editora Saraiva: São Paulo, 2010.

[21] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: parte geral. Editora Saraiva: São Paulo, 2010.

[22] STJ; REsp 1.120.676; Proc. 2009/0017595-0; SC, da Terceira Turma. Rel. Min. Massami Uyeda; Julg. 07/12/2010; DJE 04/02/2011


Autores


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MAIA, Daniel; VASCONCELOS, Fernanda Sousa. Indenização de Seguro DPVAT por morte de nascituro: direito ou expectativa de direito?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3189, 25 mar. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21359. Acesso em: 28 mar. 2024.