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Reforma do Judiciário (III)

A Magistratura - Relações Internas e com a Sociedade

Reforma do Judiciário (III): A Magistratura - Relações Internas e com a Sociedade

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A reforma constitucional que se vislumbra a atingir a Magistratura e o Judiciário está a ensejar um debate profundo acerca do que somos perante a sociedade ante o delineamento traçado pela Constituição de 1988 ao Estado brasileiro.

Conquanto tenhamos que servir ao Povo, não somos os Juízes servidores públicos, mas agentes políticos, integrantes dos órgãos componentes do sistema judiciário, partes do todo denominado Poder do Estado.

Somos, como agentes políticos, mas que meros executantes de políticas estatais, mas os definidores da gestão da coisa pública (república) no campo judiciário, que envolve não apenas a solução dos litígios entre os indivíduos ou Estados, ou entre estes e outros, mas sobretudo os definidores da interpretação das normas inseridas na Constituição e nas Leis de modo a consagrar um ambiente propício à paz social.

Neste sentido, o Juiz tolhido de garantias à livre manifestação de suas convicções e à independência de suas decisões passaria a mero executante das vontades do chefe político do momento, e não daquelas vontades nacionais inseridas no Texto Fundamental e nas Leis que dele decorrem, e que devem ser interpretadas conforme o caso concreto, o espaço e o tempo em que se definam.

Para isto, a Constituição brasileira foi inequívoca ao preceituar garantias à independência dos Magistrados, porque apenas assim haveria verdadeira independência do Poder Judiciário, que depende da aquiescência orçamentária do Parlamento e das armas detidas pelo Chefe de Estado para conseguir implementar suas decisões, e que, ainda assim, paira sobre os outros como único apto a dizer, em definitivo, o que é a Constituição e quais as normas que com ela estão conformes, tornando ímpar a força com se depara tão aparentemente fraco extrato do Poder do Estado, e sábia a Constituição ao inscrever assim a atuação harmônica dos Poderes, porque nenhum segmento consegue atuar sem que o outro reconheça não deter parcela necessária à expressão totalitária do Poder — isto o que distingue o absolutismo do Estado de Direito contemporâneo.

Para isto, não podemos aceitar menos do que sermos parte do Poder do Estado, agentes políticos do Povo, representantes destes na prestação da tutela jurisdicional, do dizer o Direito e a Justiça.

Temos os Juízes, assim, que repelirmos as semelhanças que possam haver com a categoria dos servidores públicos, porque também os detentores legítimos do Poder, os Magistrados em relação à expressão judiciária, devem servir ao Povo, do qual o poder emana, mas para além do funcionalismo estabelecer as diretrizes do Estado Democrático de Direito instituído pela Constituição.


INGRESSO, VITALICIEDADE E PROMOÇÃO

Certamente coadunada com tal questão vem a do modo de ingresso na Magistratura, nos diversos graus, as qualidades para ascensão aos Tribunais, o vitaliciamento, a inamovibilidade, a fixação e irredutibilidade remuneratória, em contraposição, doutro lado, com vias adequadas de aferição de desempenho e conduta que possam inclusive acarretar a censura total decorrente da perda do cargo.

Recentemente o Judiciário, pela via do concurso público, viu-se invadida por Juízes mais novos, em contraste inclusive com aquela imagem de outrora de que os Magistrados eram pessoas sempre de larga experiência na sociedade e por isso mais idosos. Se com isto a Magistratura veio deparar-se com a menor experiência, doutro lado passou a ter que conviver com novas inspirações, novos conceitos sociais, nova dinâmica de esforços para resolver os problemas decorrentes da mais intocada das instituições do Estado: o Forvm. Logo também vieram as críticas aos Juízes novos, como se nestes estivesse toda a culpa por mazelas de décadas (e mesmo séculos) de intocabilidade de preceitos, e como se a própria sociedade não se houvesse modificado nos últimos tempos, principiando carreiras, inclusive judiciárias, muito antes do que outrora imaginado. Decerto não seria legítimo excluir a inspiração do novo em detrimento de critérios objetivos e nem sempre precisos quando se está a falar do espírito pensante do Ser Humano, mas também não seria honesto excluirmos a necessidade da experiência no trato das situações sociais, porque também do conviver os problemas decorre a sabedoria para evitar outros conflitos.

O ingresso na Magistratura, pois, há que passar necessariamente pelo crivo da experiência, que não se confunde, contudo, com o da idade, porque mesmo alguns Juízes mais velhos poderiam vir a ingressar no Judiciário sem qualquer experiência forense, enquanto outros mais novos seriam excluídos embora com muito mais tempo de trato com os problemas decorrentes da vida em sociedade.

Dentre as possibilidades, aquela que parece mais propícia é adaptar-se o modelo que tem sido seguido por diversas instituições no sentido de que o ingresso na Magistratura, com as conseqüentes ampliações dos poderes judicantes, apenas ocorresse com a aprovação do candidato pela respectiva Escola da Magistratura, decorrido período em que, aprovado em concurso público de títulos e provas, seria apenas aluno designado como Pretor, podendo receber funções judicantes menores como assistir os Juízes nas audiências e mesmo presidir aquelas apenas conciliatórias, colaborar nos despachos, e mesmo poder assumir funções maiores nos Juizados Especiais, adquirindo, assim, com o convívio, a experiência necessária, ao mesmo tempo em que confirmando a necessária vocação para a Magistratura. Aprovado, contudo, tal qual os escolhidos para os Tribunais, dos quais supõe-se haver a necessária experiência forense, o vitaliciamento seria efetivado com a posse, sem se aguardar novos decursos de tempo em que apenas perdura a sujeição do agora Magistrado à vontade do Tribunal a que vinculado, desvirtuando às vezes indevidamente tal conceito para o de subordinação daquele a este, na perda inequívoca, assim, da esperada independência do Juiz. Com tal modelo, o candidato apenas se sujeitaria às suas capacidades e à sua conduta, num exame inequívoco de suas qualidades por uma verdadeira Escola da Magistratura, e não mais em meras sessões reservadas dos Tribunais. Assim, o concurso público seria não mais para a Magistratura, mas para ingresso na Escola da Magistratura, e a aprovação por esta habilitaria ao ingresso na Magistratura plena, inclusive com o vitaliciamento a partir da posse, como ocorre nos Tribunais, em que os critérios de experiência são apurados com base em critérios objetivos de idade e/ou de tempo de carreira ou atividade profissional.

Com a necessária questão da vocação advém outro problema: como compor os Tribunais. O denominado quinto constitucional (que em alguns Tribunais é mais do que tal fração), consistente na reserva de vagas em determinados Tribunais à Advocacia e ao Ministério Público, tem acarretado problemas na aferição da vocação em detrimento do posicionamento nas Cortes apenas como expressão de status na classe jurídica, quando tal também deveria ocorrer no seio das demais categorias, numa valorização por parte dos Advogados e dos Membros do Parquet, inclusive porque a luta por vagas tem desencadeado uma perda significativa do respeito merecido de tais integrantes dos Tribunais, com lógicas e honrosas exceções, e mesmo a incoerência de termos Advogados e Procuradores deixando de submeterem-se a concursos públicos para ingresso na Magistratura, se existente o devido pressuposto da vocação, enquanto se tal pressuposto da vocação se suplanta, igualmente se acaba por suplantar na carreira aqueles que impuseram-se todas as dificuldades pelo respeito íntimo à vocação judicante. E não é ilógico afirmarmos que um bom Judiciário depende de bons Advogados e de um preparado e consciente Ministério Público, nas atividades que lhes são próprias. Por sua vez, se a questão colocada é no sentido da necessidade de integração, certamente seria melhor limitarmos o espectro de Advogados e Procuradores aptos a ingressarem nos Tribunais àqueles cuja inteligência e experiência suplantem em regra as vontades pessoais para interessarem a toda sociedade, mesmo porque no ápice do reconhecimento nas respectivas categorias e, assim, não seria, inclusive com maior proporção do que a atual, que pudessem ser escolhidos para Tribunais Superiores, suplantando a necessidade da passagem pela carreira judiciária para a assunção numa vaga nos demais Tribunais. No caso do Supremo Tribunal, dada a componente política que existe junto ao mesmo, pelo papel peculiar de Corte Constitucional, para que tal não se exarcebe a ponto também de diminuir a necessária componente jurídica da Corte Suprema, o certo poderia ser a adoção de modelos há muito propostos, que reservasse certo número de vagas para preenchimento dentre Ministros dos Tribunais Superiores, preservando, assim, um mínimo de componentes extraídos da Magistratura, com possibilidade das vagas remanescentes serem preenchidos por juristas consagrados, sejam Magistrados, Advogados, Membro do Ministério Público, Professores e outros estudiosos do Direito e da Ciência Política. Tudo leva a uma grande reflexão de como devem portar-se os nossos Tribunais Judiciários, certos de que tudo decorre do modo de composição dos mesmos.

Outro ponto de crucial importância é a explicitação constitucional da independência dos Juízes no julgar, porquanto não há, na Constituição brasileira, a devida clareza quanto à vinculação do Magistrado apenas à Constituição e às leis e à sua convicção nesta aplicação, como ora ocorre noutros Países, inclusive porque dentre Juízes e Tribunais, e mesmo entre estes, não há hierarquia, mas apenas divisão competencial, ainda quando concernente ao aspecto do exame de recursos de um Juízo ou Tribunal por outro. O Judiciário apenas será espelho para a sociedade quando esta tiver a convicção insofismável de que os Juízes apenas temem a Constituição e as Leis com elas conformes, assim julgando as causas que lhe sejam submetidas segundo suas convicções no interpretar o Direito para aplicar a Justiça. Para tanto, não pode o Juiz sequer recear desagradar Tribunal que lhe seja superior, sob pena das garantidas da Magistratura ficarem restrita aos integrantes do Supremo Tribunal e dos Tribunais Superiores, quando toda a Magistratura há de ter plena a intocabilidade de seus integrantes enquanto no legítimo exercício do munus público de julgar.

Por tais razões, explicitar as garantias dos Juízes e Tribunais em verdade traduz garantia à sociedade jurisdicionada de que a Justiça se fará por pessoas idôneas e isentas e não sujeitas a quaisquer pressões, sequer do Príncipe ou do Parlamento, sequer mesmo das Cortes Judiciárias a que se encontrem vinculados e nunca subordinados.


IRREDUTIBILIDADE DE SUBSÍDIOS E PROVENTOS

Questão, também, que merece reflexão, é a da justa remuneração dos Magistrados. O tema é complexo, porque passa perto do ponto de confundir-se a remuneração da Magistratura como assunto apenas corporativo, quando o interesse de que os Juízes vivam com suas famílias em situação condignas, despreocupados com orçamentos familiares e dívidas, e nunca tentados a receber qualquer propina para julgar, tal interesse é da própria sociedade, porque o Juiz independente é aquele que igualmente não tem ninguém a lhe cobrar favores prestados, inclusive no campo financeiro.

Assim, a questão de fixação e irredutibilidade de remuneração deve ter, em relação aos Magistrados, disciplina própria, distinta da que for estipulada para os servidores públicos em geral, eis que, mais que tais, os Juízes são agentes políticos do Estado, por mais diversos que sejam os níveis de decisão em que situados.

Atualmente, os Magistrados têm recebido golpes freqüentes, numa redução oblíqua de sua remuneração por conta de desatualizações monetárias e falta de reajustes condignos, obrigando por diversas vezes à aplicação indevida de legislação de vencimentos próprias dos servidores públicos, numa degradação da situação política especial que possuem para a de meros executores das políticas definidas pelo Legislativo e pelo Executivo, embora integrem o ramo Judiciário do Poder do Estado e, como tal, sejam propriamente os definidores da política de administração da Justiça no País. Hoje, temos os Ministros do Supremo Tribunal Federal, a mais alta Corte de Justiça do País, órgão supremo do Judiciário nacional, com remuneração depreciada, percebendo menos que muitos recém-formados Advogados, e no campo das demais profissões, muito menos que certos executivos, atletas, jornalistas e artistas, embora tenham responsabilidades que ultrapassam as fronteiras que quaisquer deles possam definir: a de intérprete supremo da Constituição brasileira e, assim, a de conceituador supremo dos direitos e deveres de cada brasileiro em particular, inclusive pois o fixador dos limites do próprio Poder Público, nas mais diversas esferas. Hoje, igualmente, a disparidade chega ao ponto de o cargo que espelha o ápice de qualquer carreira judiciária receber, em alguns casos, remuneração inferior à de Juízes de Primeira Instância em alguns Estados da Federação. Ocorre que ao invés de tentar-se corrigir-se a falha pela majoração da remuneração de Ministro do Supremo Tribunal Federal, passam alguns a defender a simples adoção desta como teto, numa subversão das garantias implementadas por alguns Estados à sua Magistratura. Se formos também pesquisarmos a remuneração de Juízes noutros Países, igualmente nos depararemos com remuneração insignificante para o cidadão investido no cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal, tanto mais quando se verifica que qualquer Magistrado apenas pode implementar sua renda familiar por aulas ministradas em cursos superiores, embora tal exceção constitucional haja sido possibilitada exatamente para que os Juízes possam repassar suas experiências àqueles que, no futuro, estarão formando com a classe dos Advogados, dos Membros do Ministério Público ou mesmo da Magistratura, todos componentes necessários ao tripé da administração da Justiça. Não há dúvidas, também, de que no contexto do funcionalismo público há servidores, como os professores, ganhando muito aquém do devido, mas tal não justifica que, por tal motivo, passem os Magistrados a igualmente ter que perceber pouco pela atividade de Estado desempenhada, conquanto tais classes também devam se insurgir contra remunerações desprestigiosas. Retornando ao tema, contudo, surge a indagação basilar de como fixar os vencimentos dos Magistrados, tornando-os imunes às variações econômicas e às vontades do Príncipe da ocasião. No âmbito da União, não há muitas dúvidas de que o Presidente da República, o Presidente do Senado Federal, o Presidente da Câmara dos Deputados e o Presidente do Supremo Tribunal Federal devem balizar o parâmetro de teto para a remuneração no funcionalismo público federal, eis que inadmissível que qualquer servidor, como mero executante de políticas, possa perceber mais que o agente político definidor das mesmas, seja no campo legislativo, seja no campo executivo, seja no campo judiciário. Mas ainda assim não seria o bastante, eis que abaixo de tais níveis também se denota incompatível com uma ordem hierárquica lógica que servidores públicos, ainda que dos mais graduados, possam perceber mais que agentes políticos, seja um Juiz de Primeira Instância, seja o Presidente do Supremo Tribunal Federal, no campo do Judiciário, seja um Secretário Ministerial, seja o Presidente da República, no campo do Executivo, seja Deputados ou Senadores ou os Presidentes das respectivas Casas Parlamentares, no campo do Legislativo.

De toda esta intrincada equação, exsurge como modelo a ser considerado aquele previsto na Constituição das Filipinas, onde a remuneração anual dos agentes políticos do Estado são fixadas originariamente pela própria Constituição, servindo a menor delas de teto do funcionalismo público mais graduado, excetuadas apenas as vantagens meramente pessoais, que poderiam fugir desse limite, embora a remuneração básica pelo cargo ou função pública sempre observaria estar abaixo dos subsídios recebidos por Magistrados, Parlamentares, Secretários, Ministros e o Presidente da República, no âmbito federal, e seus congêneres, no âmbito local. Por decorrência, não bastando garantir o princípio da irredutibilidade como garantia da atuação judicante, cabe firmar na Constituição a auto-aplicabilidade do preceito, no sentido de que qualquer alteração dos patamares dos subsídios dos agentes políticos do Legislativo e do Executivo acarretem imediata alteração dos parâmetros dos agentes políticos, segundo a equivalência, no Judiciário.

No prosseguir do tema, igualmente correlata à garantia de irredutibilidade dos subsídios dos Magistrados, enquanto ativos, é a da garantia de irredutibilidade dos proventos, quando passam à inatividade, por aspectos que, pouco discutidos na mídia, merecem a devida reflexão.

O primeiro aspecto é de que o Magistrado, adquirindo vitaliciedade, é Magistrado até sua morte, e ainda quando aposentado, tendo todas as prerrogativas próprias dos Juízes em atividade, e destes diferenciando-se apenas pelo fato de estarem em inatividade, ou seja, apenas perdendo a capacidade de atuação jurisdicional. O segundo aspecto é que pouca tranqüilidade e imunidade a pressões teria o Magistrado se houvesse que se preparar para os tempos após a aposentadoria, correndo a sociedade o risco de Juízes, à beira da jubilação, curvarem-se às dificuldades financeiras que se aproximariam e com isto curvarem-se a interesses de quem quer que seja, perdendo a isenção no julgar. A dignidade ao Magistrado, portanto, deve perdurar por toda a vida deste em respeito ao princípio constitucional também da vitaliciedade, e de modo a garantir a própria sociedade de que terá Juízes isentos e imunes a qualquer pressão, pois certos de que estarão preservados tanto na atividade quanto também se inativos.

Ocorre que, ao largo dessa discussão, também surge a indagação concernente a quando se deve aposentar o Magistrado. Várias críticas se têm levantado no sentido de aposentadorias precoces, seja porque o Magistrado compulsoriamente aposentado estava em plena e lúcida atividade, seja, doutro lado, porque pouco tempo de Magistratura houve exercido. Em vários Países vigora a regra de que o Magistrado, sendo vitalício, exerce suas atividades até a morte, ou enquanto bem servir, assim traduzindo enquanto tiver condições de exercer plenamente suas atividades judicantes, sob pena de o próprio Tribunal que integre ou a que esteja vinculado declarar sua incapacidade por idade para a função, quando compulsoriamente aposentado. Se é certo que tal regra tem suas vantagens por permitir que Juízes ainda lúcidos e plenamente capazes colaborem com suas inteligências no aprimoramento do Judiciário, igualmente é certo que a não delimitação da idade máxima de exercício também pode trazer a possibilidade de Juízes já debilitados em saúde permanecerem por insistência na Magistratura ativa, enquanto Cortes constrangidas não conseguiriam afastá-los, inclusive porque é certo que, muitas vezes, parar de trabalhar é definhar para a morte. O meio-termo envolve complicadas equações, inclusive porque a cada dia o ser humano, com a evolução que lhe é própria, consegue aumentar o nível de

sobrevivência no mundo com condições plenas, e, assim, fixar-se idades limites de aposentadoria no Texto Constitucional pode, como outrora, acarretar logo que tais parâmetros resultem ultrapassados, e Juízes hoje considerados velhos passem a ser declarados novos, embora septuagenários, mas apenas por isto aposentados e afastados da vida judicante, num prejuízo, inclusive, a toda equação que guarda os planos de aposentadoria, eis que o pessoal em inatividade sempre há de ser fração do pessoal em atividade, sob pena de falência do sistema previdenciário. Melhor, assim, que tais limites de idade para permanência passem a ser fixados por lei complementar, e para que igualmente não se passe a permitir que Juízes sejam antecipadamente aposentados, apenas porque hajam desgostado alguém, bastaria que a idade fixada apenas pudesse ser reduzida pela própria Constituição, ficando preservados os direitos adquiridos.


INAMOVIBILIDADE

Com relação à inamovibilidade, exsurge, a partir da provocação de vários colegas, a questão concernente à amplitude da garantia, inclusive quando referente aos Juízes Substitutos, eis que, se de um lado detém todas as prerrogativas jurisdicionais próprias dos Juízes Titulares, não podendo ficar sujeitos a afastamentos de causas, doutro lado tem como fundamento funcional a da substituição dos Juízes Titulares nos casos de licenças, férias, impedimentos e suspeições declaradas por estes, pelo que,

logicamente, a regra da inamovibilidade, em relação aos mesmos, possui caráter relativo, mas não restritivo, conforme será agora explicitado. Os Juízes Substitutos têm a mesma hierarquia dos Juízes Titulares - e digo mais: todos os Juízes, ainda quando integrantes de Tribunais, têm as mesmas hierarquias; o que difere é a competência atribuída a cada um, inclusive aquelas disciplinares reservadas aos integrantes dos Tribunais - isto não pressupõe superioridade, mas apenas organização lógica do Judiciário. Com relação à impropriedade da inamovibilidade absoluta do Juiz Substituto, temos que considerar situações como o caso de Juízos que não teriam razão de possuir um Juiz Auxiliar, pelo menor movimento processual, mas que dependeria de Juízes Substitutos para os afastamentos do Juiz Titular - se a regra da inamovibilidade vigorasse em absoluto quanto aos Juízes Substitutos, haveria um prejuízo aos jurisdicionados em tais locais, inclusive porque Magistrado algum aceitaria ser titularizado em Juízo que não permitisse seus afastamentos legais, como acabaria acontecendo por impossibilidade do Tribunal deslocar Juiz Substituto para cobrir suas férias ou licenças. De todo modo, tenho defendido que os Juízes Auxiliares, que são designados para determinados Juízos em caráter permanente, destes não possam ser afastados, ainda quando designados para substituir noutro Juízo, por impedimentos ou afastamentos dos Magistrados do mesmo, acarretando, com isto, prorrogação (e não, sob pena de ferida a Constituição, restrição) de jurisdição. Talvez aí houvesse um meio-termo possível, em que os Juízes Substitutos, embora não detendo as funções de comando administrativo do Juízo, próprio dos Titulares (exceto nas ausências destes), tivesse, doutro lado, ao contrário destes, a possibilidade de prorrogação de jurisdição além do Juízo em que designado como Auxiliar, permitindo o deslocamento para outro Juízo, em caráter provisório, para cobrir férias, licenças, impedimentos e suspeições ou outros afastamentos dos Juízes em exercício no mesmo (inclusive Auxiliares que detenham impedimentos tais quais os Titulares, em determinados casos). Isto tem vigorado, embora sem regras escritas, na 10ª Região Judiciária Trabalhista (DF/TO) com efeitos muito bons, inclusive porque Secretarias e Gabinetes e Advogados passam a saber que tal Juiz Substituto, apesar da possibilidade de deslocamento eventual, integra com o Titular específico Juízo. Embora ainda hajam falhas, e as garantias imaginadas não estejam todas implementadas, há mais de dois anos se têm conseguido, em boa medida, evitar deslocamentos abruptos dos Juízes Auxiliares. No concernente aos Tribunais, alguns têm ressentido, em relação a determinadas Cortes, a falta da figura dos Juízes Substitutos de Tribunal, eis que constantes licenças de seus integrantes impedem imediata recapacitação da Corte, sem afetar concomitantemente a instância inferior pela necessária convocação de Juiz, quando, notadamente nos Tribunais de maior dimensão, haveria que se permitir a criação de quadro de Juízes Substitutos do Tribunal, por promoção dentre Juízes Titulares, em experiência, aliás, que já existia em alguns Estados antes do advento da Lei Complementar 35/79.


RESIDÊNCIA

A Constituição de 1988, pretendendo que os Magistrados permanecessem em maior contato com os respectivos jurisdicionados, determinou que o Juiz Titular houvesse que residir na respectiva Comarca. Contudo, em determinados casos o fracionamento das Comarcas para atender determinados Municípios ou Regiões Metropolitanas afeta o cumprimento de tal dispositivo constitucional, porque grandes metrópoles podem abarcar mais de uma Comarca, por questão de funcionabilidade, enquanto o Magistrado, apenas por residir no mesmo Município ou Região Metropolitana, mas em área de Comarca distinta, estaria sujeito a punições disciplinares. Se é certo que o Juiz deve estar o mais próximo possível dos jurisdicionados, tudo isto deve levar em conta regra de razoabilidade, pelo que, inclusive disciplinando a regra também para os Juízes em função auxiliar permanente e para os integrantes dos Tribunais, melhor seria permitir que a fixação da residência houvesse de ocorrer na sede do Tribunal ou do Juízo ou em Município, Comarca ou Região Metropolitana contígua, sem prejuízo de outras exceções mediante expressa autorização do respectivo Tribunal.


DISCIPLINA

Com as discussões acerca do controle externo da Magistratura, por nós já comentado (Reforma do Judiciário II: Controle Externo — Alternativas), ressurgiu a problemática da disciplina do Juiz e punição do mesmo.

Cabe salientar que estranha à opinião pública que Juízes acusados de grave desvio de autoridade sejam aposentados, numa punição que, não poucas vezes, se transmuta em prêmio, com o Juiz aposentado por motivo disciplinar gozando das prerrogativas inerentes à Magistratura. Não há como prever aposentadoria por interesse público senão aquela que decorra do interesse em afastar o Magistrado por incúria na função, eis que motivos de deficiência física ou mental que o inabilitem para o cargo acarretam aposentadoria por invalidez, de caráter distinto. Igualmente, remover-se o Magistrado sob razão de interesse público quebra o princípio da garantia do Magistrado de inamovibilidade, certo que se efetivamente houver Juízo que necessite Magistrado, não havendo candidatos, melhor seria instituir a regra da promoção compulsória, com a impossibilidade do Juiz mais recente recusar a promoção se os mais antigos, detentores dos requisitos legais, o fizeram — tal regra permitira a obtenção de disciplina objetiva caracterizadora do interesse público, afastando remoções de caráter disciplinar, eis que não se pode admitir, igualmente, que um Juiz questionado em sua integridade moral seja deslocado de um Juízo a outro como punição, eis que assim haveria a punição não apenas do Magistrado, mas também da própria sociedade de tal comarca ou circunscrição judiciária, que teria que aceitar, na condução do Juízo, Magistrado sem os requisitos de idoneidade. Por fim, o ato disciplinar de colocação do Magistrado em disponibilidade por razão disciplinar, de modo similar à aposentadoria disciplinar, acarreta inversão da ordem lógica de eventual punição, eis que o Juiz persistiria com as qualidades de Magistrado, embora se mostrasse delas não ser digno.

Neste sentido, melhor seria que os atos de punição disciplinar aplicáveis aos Magistrados houvessem como tais de ser caracterizados, exigindo-se quórum qualificado e assegurada ampla defesa ao Magistrado para eventual censura ou suspensão do Juiz, penas que poderiam ser consideradas inclusive como desqualificativo para posteriores promoções, mas nunca de modo a premiar quem haja que ser punido, nem igualmente punir quem tenha se mantido correto sob espúria justificativa de interesse público.


PUBLICIDADE DOS ATOS JURISDICIONAIS E DE ADMINISTRAÇÃO DO JUDICIÁRIO

Inequivocamente, uma das grandes inovações da Constituição de 1988 foi estabelecer a publicidade de todos os julgamentos e fundamentação das decisões do Judiciário, com as exceções apenas concernentes à preservação de interesses das partes, em determinados casos, acarretando assim inequívoca transparência dos órgãos judiciários, notadamente colegiados.

Pelo preceito vigente (artigo 93, IX), acabaram-se as denominadas sessões de conselho ou de conferência, em que os Tribunais decidiam, em segredo, aspectos das causas, sem que qualquer razão pública houvesse para tanto, acarretando que as partes litigantes muitas vezes não soubessem precisar a razão de eventual infortúnio. Estabeleceu-se, também, a obrigatoriedade da fundamentação das decisões, evitando-se decisões de mera procedência ou improcedência sem razões estabelecidas pelo julgador para tal convencimento, inclusive, pelo aspecto constitucional do tema, permitindo que toda a nulidade sob tal enfoque seja apreciada pelo Supremo Tribunal, o que não poderia ocorrer, por exemplo, se restrito houvesse ficado o tema ao plano processual, de índole infraconstitucional, se a parte se insurgisse, no recurso extraordinário, à inexistência de fundamentação no acórdão recorrido.

No entanto, a par do avanço constituído por tal preceito, outros, na própria Constituição, ficaram à margem de tal necessária publicidade. Refiro-me, sobretudo, ao denominado Tribunal do Júri, que estranhamente é estabelecido pela Carta de 1988 como direito individual e não como órgão judiciário, tal qual, por exemplo, os Juizados Especiais, órgãos parajudiciários vinculados, mas não integrantes da estrutura própria do Poder Judiciário. Ora, em total conflito com o estabelecido no artigo 93, IX, o artigo 5º, XXXVIII, da Constituição estabelece ser "reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: (a) a plenitude de defesa; (b) o sigilo das votações; (c) soberania dos veredictos; (d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida", firmando o caráter definitivo da decisão adotada pelo Júri, tanto assim que a jurisprudência atual de nossos Tribunais tem entendido que apenas se permite recurso tendente à anulação do veredicto, mas não julgamento substitutivo pelo Tribunal, como de regra acontece em relação aos recursos contra decisões de Juízos Criminais, no concernente a outras infrações penais. E, no cúmulo da incompatibilidade, firma como princípio máximo o sigilo das votações, acarretando que o sujeito a julgamento perante o Júri não saberá, jamais, as razões que motivaram os jurados a absolvê-lo ou a condená-lo, embora tal decisão tenha caráter final, apenas alterável por nulidade do julgamento, em regra nulidade que se firma por falha de nível processual e não material, do fato ensejador da absolvição ou condenação.

Ora, o Júri tem sido ao longo dos tempos cada vez mais atacado pelo caráter leigo de seus integrantes na definição de fatos jurídicos complexos, e no Brasil, sobretudo, pela razão de ser sua a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, infração máxima pensada pelo legislador penal porque envolto o Homem no ataque a seu semelhante.

De início, não se tem notícia de ninguém a quem haja sido permitido fazer uso ou não do direito (artigo 5º/CF) de ser julgado pelo Júri em sendo acusado de crime doloso contra a vida; pelo contrário, decisões dos Tribunais nos dão ciência de pessoas que a todo modo tentaram não ser julgadas pelo Júri e que não conseguiram, porque decidido que tal era o foro próprio e exclusivo para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Então é de se questionar que direito irrenunciável é este, que submete todos a julgamento por leigos, em votação secreta, a decidir sobre a existência ou não de fato criminoso em relação ao mais repugnável dos ilícitos, em caráter irrecorrível (senão, quando por vício formal, para a anulação do julgamento e designação de outro).

Em defesa do Júri muito se tem dito que os Homens devem ser julgados por seus pares, e por isto a natureza leiga dos jurados permitiria evitar o tecnicismo próprio dos Magistrados em prol de Justiça. Mas se assim fosse, todos os demais julgamentos procedidos pelo Judiciário deveriam ser tidos como inconsistentes, e tal argumento não prevalece quando se verifica que outros ilícitos penais, muitos de igual relevância social, são excluídos da competência do Júri. E por fim, nada se diz que justifique o sigilo das votações, eis que ao assegurar a integridade e independência do jurado, doutro lado se permite ver ferido o direito do acusado a conhecer as razões de sua absolvição ou condenação, não poucas vezes fruto da própria teatralidade que se tem permitido aos julgamentos do Júri, lamentavelmente, com o fato submetido a relevo inferior, no prevalecer da versão mais ou menos comovente.

O Júri, como direito fundamental da pessoa, apenas poderia justificar-se se fosse ao menos explicitada a possibilidade de opção do acusado a ser pelo mesmo julgado, numa inequívoca opção do julgamento pelos pares leigos em relação ao julgamento por Magistrados isentos; neste sentido, inclusive, o disposto no inciso XXXVIII do artigo 5º constitucional poderia estender a competência para todos os demais crimes, porque o Júri efetivamente passaria a ser o direito da parte ser julgada por órgão especial, não integrante do Judiciário, embora ao mesmo vinculado, na medida da presença de Juiz Togado como respectivo Presidente e enunciador da sentença decorrente do veredicto firmado.

Penso, no entanto, que melhor que estabelecer o Júri como órgão de julgamento seria firmá-lo como órgão de mera pronúncia, ao modo similar do que ocorre nos Estados Unidos com o denominado Grande Júri, em que o Júri passa a permitir ou não a instauração da ação penal pelo Ministério Público se entender existentes indícios da prática do ilícito penal pelo acusado, neste caso sim o Povo autorizando o representante judicial do Povo a perseguir um de seus pares na via criminal, e no caso de pessoas com prerrogativa de foro, com a sinalização inequívoca de que as respectivas Casas Legislativas, como já ocorre presentemente, assumiriam a função do Júri, para permitir ou não a ação penal pretendida. A tal modo, evitar-se-ía que ações penais pudessem ser propostas com o fito de mera perseguição, porque em verdade, sendo órgão alheio ao Judiciário mas vinculativo à atuação, sempre que invocado, transporia o convencimento social acerca da existência do ilícito ou dos indícios de autoria pelo acusado, e, não sendo invocado, não inibiria a instauração da ação penal perante o Judiciário, que igualmente não estaria tolhido a reconhecer a inocência do acusado, inclusive sumariamente, mesmo depois de aceita a pronúncia pelo Júri, se fosse o caso.

No prosseguir do tema relativo à publicidade das decisões dos Tribunais, há que se imprimir melhor redação ao inciso X do artigo 93 da Constituição, adequando aos princípios administrativos do artigo 37 da Carta Política de 1988, aos quais se submetem as Cortes Judiciárias no atuar administrativamente. Neste sentido, necessário se faz explicitar que as decisões hajam que ser motivadas inclusive no caso das disciplinares, adequando-se o quorum qualificado exigido noutros dispositivos constitucionais, a fim de evitar-se dúvidas acerca da votação exigida em tais casos.

Também, cabe analisar a questão dos denominados Órgãos Especiais dos Tribunais, cujo preceito é de inequívoca agilização das Cortes, mas que não pode ser desvirtuado ao ponto de suplantar o órgão maior constituído pelo Pleno, como tem ocorrido em diversos Tribunais, alguns inclusive tendo delegado a atribuição de elaborar o regimento interno, onde fixadas as competências, ao órgão menor, com prejuízo do órgão maior delegante. Igualmente, há que se considerar que a Corte ou Câmara Especial deve ter o pressuposto de representação dos diversos órgãos fracionários do Tribunal, e tanto quanto possível privilegiar, também, a renovação, ainda que parcial, dos seus integrantes, inibindo a permanência apenas de Juízes mais antigos, que passariam a ditar a jurisprudência interna em detrimento da opinião desejada dos Magistrados mais recentes no Tribunal, além de não se permitir a confusão entre a Corte ou Câmara Especial com Seções, Câmaras ou Turmas Especializadas, em que prevalece apenas a divisão de matéria por tema e importância. Há que se garantir que o órgão especial não suplante o Pleno, a tal modo sendo imperioso inibir que o órgão fracionário possa proceder à eleição dos dirigentes do Tribunal e mesmo às dos membros não-natos do próprio órgão especial, assim como imperioso impedir qualquer atribuição de caráter elaborativo ou alterador das normas do regimento interno, pela mera vedação constitucional a que tais sejam delegadas pelo Pleno à Corte ou Câmara Especial constituída. Igualmente, tendo em vista que muitas vezes a uniformização de jurisprudência e conseqüente edição de súmula é adequadamente atribuída a tais órgãos especiais, merece ser dada importância à representação dos órgãos julgadores fracionários na composição do órgão especial, exigindo que as Seções ou Câmaras Especializadas tenham seus Presidentes e Vices como integrantes natos da Corte ou Câmara Especial, e ainda indicando que tanto quanto possível os demais órgãos fracionários (Turmas) devem estar nela representados.


PROPOSTAS

Como tenho ao final de cada ensaio procedido, no sentido de prosseguir o debate, no particular, afastando o contido nas atuais propostas parlamentares, a PEC poderia ter o seguinte conteúdo:

"Artigo A — O artigo 5º, XXXVIII, passa a vigorar com a seguinte redação:

‘Art. 5º.

(...)

XXXVIII — qualquer pessoa acusada de autoria de crime poderá invocar, perante qualquer juízo ou tribunal, que a ação penal tenha curso apenas se previamente acolhida a denúncia por júri integrado por pessoas da comunidade, sempre que possível, com a organização que lhe der a lei, e permitida a conversão de Casas Legislativas em grande júri quando o acusado detenha prerrogativa de foro, assegurados:

a) a presença de magistrado, que presidirá a sessão, sem direito a voto, e procederá, se for o caso, à convocação e ao sorteio dos jurados;

b) a plenitude da defesa prévia;

c) o sigilo das sessões e das votações, resguardada sempre a presença do Ministério Público e do próprio acusado ou seu defensor;

d) a soberania do veredicto: de pronúncia, com conversão da denúncia em ação penal no caso de convencimento pelo júri da existência do crime e de indícios de que o acusado seja o seu autor; de impronúncia, no caso de não convencimento pelo júri da existência de indícios suficientes de autoria pelo acusado, permitindo nova denúncia com outros elementos de prova; ou de absolvição sumária, quando o júri desde logo se convencer da inexistência do crime, da inocência do acusado ou de circunstância que o exclua do crime ou o isente de qualquer pena; permitida apenas a anulação do veredicto pelo juízo ou tribunal competente para o julgamento do réu quando configurado impedimento de jurados ou vícios, se o próprio juízo ou tribunal não se convencer, desde logo, da inocência do acusado.’

Artigo B — O artigo 37 passa a vigorar com a seguinte redação:

‘Art. 37.

(...)

XI — a lei fixará a relação entre a maior e a menor remuneração dos servidores públicos, observados, como limites máximos, os valores percebidos, como subsídios, pelos magistrados, sendo excluídas de tais limites apenas as vantagens de caráter exclusivamente pessoal do servidor;

XII — o cargos públicos serão organizados em carreira, observando os respectivos planos identidade de remuneração entre cargos equivalentes nos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, sem prejuízo da definição de determinadas carreiras como típicas de Estado, organizadas em plano próprio, observados os limites de remuneração do item anterior;

(...)’

Artigo C — Os artigos 93, 94 e 95 passam a vigorar com a seguinte redação:

‘Art. 93.

(...)

I — os juízes e tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar a Justiça em nome do Povo, aplicando a Constituição e as normas conformes, sendo sua independência garantida pela autogestão e disciplina interna, pela vitaliciedade, pela irredutibilidade da remuneração e pela inamovibilidade dos magistrados e sua não sujeição a qualquer ordem ou instrução quando às causas sob sua apreciação, ressalvado o dever de acatamento das decisões proferidas em via de recurso ou em ações constitucionais por tribunais superiores, não podendo ser responsabilizados pelas suas decisões, exceto quando proferidas com dolo ou fraude, nos termos da lei, nem seus títulos e denominações adotadas por quem não integre o Judiciário;

II — ingresso na carreira inicial como juiz adjunto, dentre os aprovados em curso superior da Escola da Magistratura, de duração não inferior a dois anos, observada a ordem classificatória final, exigindo-se para a condição de aluno a aprovação em concurso público de provas e títulos realizado com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil e do Ministério Público, em todas as suas fases, exigida para o concurso de ingresso na Escola da Magistratura experiência forense comprovada e permitindo-se aos alunos, enquanto durar o curso, na forma da lei, o percebimento de ajuda de custo não inferior a um terço dos subsídios percebidos pelos juízes adjuntos e a participação plena, como pretores, em Juizados Especiais ou de Paz ou em audiências de conciliação e a prolação de despachos nos juízos em que designados;

III — promoção, inclusive para os tribunais de segundo grau, ou para o respectivo quadro de juízes substitutos de tribunal, onde houver, alternadamente, por antiguidade e merecimento, dentre os integrantes da primeira quarta parte da lista de antiguidade com mais de dois anos de exercício na precedente categoria ou entrância, exceto se não houver com tais requisitos quem aceite o lugar vago, assim completando-se a lista com os seguintes em antiguidade, inclusive de categoria ou entrância inferior, se for o caso, até que a lista tenha ao menos três candidatos, e vedada a recusa do juiz mais recente quando os mais antigos hajam igualmente recusado a promoção para determinado juízo ou tribunal;

IV — aprovação em cursos oficiais de preparação e aperfeiçoamento realizado pela Escola da Magistratura como requisito à promoção por merecimento, remoção a pedido ou permuta e ainda para substituição em tribunais;

V — instauração de processo disciplinar concomitante à recusa à promoção por antiguidade, após decisão fundamentada de dois terços dos membros do tribunal;

VI — os subsídios dos magistrados serão fixados com diferença de cinco por cento de uma para outra categoria da carreira, tendo por limite os subsídios dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, e permitida verba de representação pela presidência de tribunal não superior a cinco por cento dos subsídios próprios dos magistrados da respectiva corte, sendo a remuneração total do Presidente do Supremo Tribunal Federal, incluindo subsídios e representação, idêntica às dos Presidentes da República, do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, e garantida a imediata alteração

dos subsídios dos magistrados sempre que alterada a dos parlamentares ou dos chefes de Governo e seus auxiliares diretos;

VII — os magistrados serão compulsoriamente aposentados por invalidez ou ao atingir a idade limite para o exercício na ativa, ou, facultativamente, e desde que ocorrido pelo menos dez anos de exercício efetivo da magistratura, ao atingir o tempo mínimo de serviço ou a idade limite fixados em lei complementar, vedada, por lei, a diminuição da idade limite ou o aumento do tempo mínimo de serviço, e não atingindo a alteração de quaisquer deles os direitos adquiridos dos magistrados à contagem do tempo pela legislação anterior;

VIII — os magistrados residirão na sede do juízo ou do tribunal a que servir ou em município, comarca ou região metropolitana contígua, salvo expressa autorização do tribunal a que estiver vinculado;

IX — o ato de censura ou suspensão imposto a magistrado, por falta disciplinar, fundar-se-á em decisão de dois terços dos membros permanentes do respectivo tribunal a que estiver vinculado, acatando necessariamente recomendação do corregedor-geral ou a pedido para instauração de ação penal, em virtude de representação justificada, e acarretará a impossibilidade de promoção do magistrado punido, nos dois anos seguintes, salvo deliberação de dois terços do tribunal entendendo revertida a causa punitiva;

X — todas as sessões e audiências judiciárias serão públicas, podendo a lei, se o interesse público o exigir, limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados ou somente a estes, devendo todas as decisões judiciais serem fundamentadas, sob pena de nulidade, e motivadas todas as decisões de caráter administrativo ou disciplinar, sendo estas adotadas pelo voto de dois terços dos membros permanentes do tribunal;

XI — nos tribunais com número superior a vinte e cinco julgadores poderá ser constituída câmara ou corte especial, para o exercício de atribuições administrativas e jurisdicionais delegadas pelo tribunal pleno, com ressalvas da eleição dos órgãos diretivos e da elaboração ou alteração do regimento interno, sendo constituída com o mínimo de onze e o máximo de trinta e cinco membros, integrado pelos presidentes e vice-presidentes do pleno e de cada seção ou câmara especializada, necessariamente, e ainda dos demais dirigentes do tribunal e juízes que sejam necessários a completar o órgão especial, preferencialmente dentre integrantes de turmas diversas ou ainda não representadas, escolhidos pelo tribunal pleno e observada a renovação conjuntamente com a direção do tribunal, a cada três anos.

(...)

Art. 94. Dois quintos dos lugares em Tribunal Superior será composto de Advogados e Membros do Ministério Público, em paridade, com mais de dez anos de carreira e de notório saber jurídico, indicados, em lista tríplice, para cada vaga, pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e pelo Colégio de Conselhos Superiores dos Ministérios Públicos da União e dos Estados, respectivamente, para nomeação pelo Presidente da República, após aprovada a escolha por maioria absoluta do Senado Federal.

§ 1º. Recebidas as indicações, e não procedida a escolha pelo Presidente da República nos dez dias subseqüentes, a lista será diretamente encaminhada ao Senado Federal, para escolha por maioria absoluta, cabendo, neste caso, a nomeação do eleito ao Presidente do Congresso Nacional.

§ 2º. Não procedida a escolha pelo Senado, nem a nomeação pelo Presidente do Congresso Nacional, nos quarenta dias subseqüentes, a escolha, se ainda não feita, caberá ao próprio Tribunal Superior, e a nomeação ao respectivo Presidente.

§ 3º. Aplicar-se-á o contido nos parágrafos anteriores quando a escolha e nomeação de Ministro de Tribunal Superior para vaga da carreira da magistratura não houver sido procedida nos sessenta dias após o encaminhamento da lista pelo respectivo Tribunal.

Art. 95. (...)

I — vitaliciedade, desde a posse, dependendo a perda do cargo de condenação por crime de responsabilidade ou sentença judicial transitada em julgado, e garantidos aos magistrados os títulos e prerrogativas inerentes, ainda quando aposentados, desde que não estejam em atividade incompatível com a magistratura, nos termos da lei;

II — inamovibilidade, permitidas: a prorrogação de jurisdição aos juízes adjuntos no caso de substituições e sem prejuízo das atribuições no juízo em que funcione como auxiliar permanente, e a convocação por tribunal, inexistindo quadro permanente de juízes substitutos de tribunal e admitida recusa exceto se não houver dentre os titulares quem possa receber o encargo, nos termos da lei;

III — irredutibilidade dos subsídios, ainda quando aposentados, observado o contido nesta Constituição quanto aos limites previstos no artigo 93, V, e à sujeição aos tributos prevista no artigos 150, II, e 153, III e parágrafo 2º, I.

§ 1º. Aos juízes é vedado:

I — exercer outro cargo ou função, excetuados o magistério superior e desde que havendo compatibilidade para o exercício das atividades judicantes ou a direção e magistério em Escola da Magistratura;

II — exercer qualquer atividade consultiva ou de assessoramento;

III — receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo ou, em razão do cargo, doações, contribuições ou auxílios de pessoas físicas ou jurídicas;

IV — exercer atividade político-partidária ou sindical, permitida, contudo, a associativa sem tal conotação;

V — emitir declarações ou manifestar-se sobre o mérito de causas submetidas a seu julgamento ou ao tribunal a que estiver vinculado, salvo as de caráter meramente doutrinárias;

VI — revelar fatos ou informações cobertos por sigilo, a quem tenha acesso em decorrência do cargo.

§ 2º. É vedada, ainda, a nomeação para cargo em comissão ou para função de confiança de cônjuge, companheiro ou parente, em linha reta, colateral ou afim, até o terceiro grau, de magistrado em atividade ou aposentado, para qualquer órgão judiciário a que esteja vinculado o juiz, salvo se titular o servidor de cargo efetivo em órgão do Poder Judiciário, e vedada a qualquer modo a nomeação ou designação para exercício junto ao respectivo magistrado.’

Artigo D — O artigo 98 passa a vigorar com a seguinte redação:

‘Art. 98. A União e os Estados criarão:

I — Juizados Especiais, providos por pretores e conciliadores, preferencialmente dentre magistrados aposentados, alunos da Escola da Magistratura ou bacharéis em Direito, nesta ordem, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis ou trabalhistas de menor complexidade ou valor e infrações penais de menor potencial ofensivo, inclusive delitos militares, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por colegiado de juízes de primeiro grau ou de juízes substitutos de tribunal;

II — Juizados de Paz, providos por pretores, preferencialmente dentre magistrados aposentados, alunos da Escola da Magistratura ou bacharéis em Direito, nesta ordem, competentes, na forma da lei, para celebrar casamentos, verificar, de ofício ou em face de impugnação apresentada, o processo de habilitação e exercer atribuições conciliatórias, sem caráter jurisdicional, além de outras previstas na legislação.

§ 1º. Os pretores e conciliadores dos Juizados Especiais e dos Juizados de Paz exercerão suas funções em caráter honorífico, permitida apenas ajuda de custo para os deslocamentos que se façam necessários, quando volantes.

§ 2º. Nas comarcas onde não haja magistrados aposentados, alunos de Escola Judicial ou bacharéis em Direito desimpedidos para assumir os encargos referidos neste artigo, a direção do Juizado será de responsabilidade do próprio juiz titular, com os conciliadores podendo ser recrutados pelo mesmo dentre cidadãos que gozem de boa reputação na localidade.’

Artigo E. O título de Juiz é próprio dos Juízes de Primeira Instância e dos Juízes Substitutos de Tribunal; o de Desembargador, dos Juízes dos Tribunais Estaduais e Federais de Segunda Instância; o de Ministro de Tribunal, dos Juízes do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores.

§ 1º. Os títulos referidos neste artigo persistem ainda quando aposentado o magistrado.

§ 2º. A denominação de Tribunal é privativa das Cortes Judiciárias integrantes do Poder Judiciário."

Estas as considerações preliminares, para debate no concernente à melhoria das relações internas da Magistratura, em relação aos diversos graus do sistema judiciário brasileiro, e, notadamente, na relação dos Juízes com a sociedade como agentes políticos do Estado.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Alexandre Nery de. Reforma do Judiciário (III): A Magistratura - Relações Internas e com a Sociedade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 2, n. 12, 5 maio 1997. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/216. Acesso em: 28 mar. 2024.