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Da isonômica valorização das provas no processo administrativo brasileiro

Da isonômica valorização das provas no processo administrativo brasileiro

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Analisam-se a produção e a valoração das provas à luz dos princípios do Direito Administrativo.

Sumário: 1 Introdução; 2 Breves considerações sobre o processo administrativo; 3 Princípios constitucionais do direito administrativo; 4 Definição de Provas; 5 A simétrica valorização das provas no processo administrativo nacional; 5.1  Da incidência do princípio isonômico no processo administrativo; 5.2 Da relativização do princípio da supremacia do interesse público; 6 Conclusão; Referências.


1 INTRODUÇÃO

O direito brasileiro na atualidade busca estar em conformidade com o os ditames da Constituição Brasileira de 1988 para que reflita os ideais do Estado Democrático de Direito.

Dentre eles pode-se destacar a busca de um processo rigoroso no atendimento das normas processuais, que haja paridade de tratamento entre as partes, e que seja-lhes oportunizado o direito de discutirem todo o alegado em sede processual nos termos da lei. É o que, em apertada síntese, tratam os princípios instituidores do processo, quais sejam: devido processo legal, isonomia, contraditório e ampla defesa. Inerentes, pois, a todas as espécies de processo – judicial, legislativo e administrativo – buscam garantir os direitos fundamentais tão amplamente divulgados pela Constituição dentre outras leis infraconstitucionais.

No que pertine especificamente ao processo administrativo, além dos princípios asseverados no artigo 37 no texto constitucional, outros princípios mais devem ser admitidos para que revistam o processo administrativo da maior lisura na elucidação da demanda.

Ocorre que, por contar com cidadãos e Administração Pública como partes no feito, em muitos casos se pode verificar certo favoritismo conferido a essa última. Merece destaque a valorização das provas por ela produzida, que, justificada, sobretudo no atendimento do interesse público, é aquela que geralmente é determinante em decidir o feito a seu favor, fiel desprezo aos princípios constitucionais, sobretudo ao princípio da isonomia na paridade processual.

Sob essa ótica, propõe-se com o presente estudo, não exaurir a discussão, mas apresentar argumentos que possam encerrar com tal prática nas decisões sobre as demandas de caráter administrativo.


2 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROCESSO ADMINISTRATIVO

É causa de muito debate entre os operadores do direito administrativo a natureza do processo administrativo: se se trata de processo, propriamente dito, ou um procedimento.

Para tanto, destaca-se a distinção realizada por Hely Lopes Meirelles:

Processo é o conjunto de atos coordenados para a obtenção de decisão sobre uma controvérsia no âmbito judicial ou administrativo; procedimento é o modo de realização do processo, ou seja o rito processual. (MEIRELLES, 2009, p. 691).

Desse modo, considera-se, para este estudo que o processo administrativo é espécie processual com características específicas, dado o teor da matéria em discussão, porém, com características comuns às demais modalidades de processo, principalmente a incidência dos princípios constitucionais como antes mencionado.

O processo administrativo difere-se do processo judicial em vários aspectos, sobretudo no tocante às partes: enquanto no processo judicial a relação estabelecida é trilateral (autor, réu e juiz), no processo administrativo a relação é “inter partes”, posto que em um dos pólos está o administrado, a reclamar uma pretensão, e no outro pólo, a Administração, que age na defesa do interesse  público e nos limites estabelecidos em lei.

Lado outro, o processo administrativo apresenta uma tríplice face: é instrumento de exercício do poder estatal, é instrumento de controle dos atos administrativos e, por fim, é instrumento de proteção dos direitos e garantias dos administrados.

Adotar um modelo democrático para o Estado significa vincular a atuação estatal, no seu conteúdo, ao atingimento de certos valores. Aí se verifica garantia material, que se traduz na compatibilidade entre os atos estatais e os valores constitucionais. (JUSTEN FILHO, 2010, p. 266; grifou-se).

A observância do rito processual confere legalidade ao feito e torna legítima a decisão a ser tomada ao final, se isonômica a participação das partes e a interpretação sob as provas apresentadas por elas, como evidência do respeito aos direitos fundamentais dos administrados.

Se o processo administrativo significava meio de observância dos requisitos de legalidade do ato administrativo e garantia de respeito dos direitos dos indivíduos, seus objetivos foram se ampliando à medida que se alteravam as funções do Estado e da Administração, as relações entre Estado e sociedade e as próprias concepções do direito administrativo. (MEDAUAR, 2006, p. 164).

O processo administrativo disciplina, a um só tempo, os exercícios das prerrogativas públicas, legitimando o exercício do poder da Administração, bem como o exercício de direitos subjetivos importantes por parte dos administrados, como o contraditório, a isonomia, a ampla defesa e o devido processo legal.


3 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO ADMINISTRATIVO

No direito administrativo, os princípios revestem-se de grande importância, como ressalta Odete Medauar:

Por ser um direito de elaboração recente e não codificado, os princípios auxiliam a compreensão e consolidação de seus institutos.Acrescente-se que, no âmbito administrativo, muitas normas são editas em vista de circunstâncias de momento, resultando em multiplicidade de textos, sem reunião sistemática. Daí a importância dos princípios, sobretudo para possibilitar a solução de casos não previstos, para permitir melhor compreensão dos textos esparsos e para conferir certa segurança aos cidadãos quanto à extensão dos seus direitos e deveres. (MEDAUAR, 2006, p. 122).

Assim como as demais espécies processuais possuem princípios específicos para suas matérias, o direito administrativo é igualmente norteado por princípios que orientam a interpretação dos institutos que o integram, a saber:

Artigo 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...]. (BRASIL, 1988; grifou-se).

Contudo, muito além dos princípios previstos no artigo 37 da Constituição, outros previstos de forma explícita ou advinda da exegese do seu texto, também merecem acolhida por ocasião de um processo administrativo.

 Como ressalta Alexandre Freitas Câmara:

Os princípios constitucionais devem ser aplicados em primeiro lugar (e não em último) lugar, o que decorre da supremacia das normas constitucionais sobre as demais normas jurídicas. (CÂMARA, 2004, p. 31; grifou-se).

Segundo a doutrina majorante, os princípios constitucionais de maior relevância são:

·                    Princípio do Devido Processo Legal: segundo o qual o processo deve obedecer às respectivas normas para a tramitação do feito processual.

·                    Princípio do Contraditório: pelo qual a parte tem o direito/dever de produzir alegações e apresentar provas de tudo por ela alegado.

·                    Princípio da Ampla Defesa: com o qual à parte é conferido o direito de utilizar os meios processuais disponíveis legalmente.

·                    Princípio da Isonomia: cujo qual confere igualdade legal a todas as pessoas, sem quaisquer tipos de distinções.

Verifica-se que os princípios supra-mencionados são inerentes a todo sistema processual brasileiro, e, por tal razão requerem atenção dos partícipes processuais, porquanto auxiliarão na elucidação da demanda, independente da sua espécie - se judicial, legislativa ou mesmo administrativa.


4 DEFINIÇÃO DE PROVAS

Aquele que ingressa ou é chamado em juízo deve demonstrar o alegado de forma tal que comprove a veracidade do argumentado, a fim de que  contribua para a formação do convencimento do julgador e  este decida o objeto do processo.

Nesse sentido, Alexandre Freitas Câmara:

Todo elemento que contribuiu para a formação da convicção do juiz a respeito da existência de determinado fato. Quer isto significar que tudo aquilo que for levado aos autos com o fim de convencer o juiz de que determinado fato ocorreu será chamado de prova. (CÂMARA, 2006, p. 395).

Segundo Rosemiro Pereira Leal, o instituto processual da prova é de grande complexidade uma vez que: “[...] provar é representar e demonstrar os elementos da realidade objetiva pelos meios intelectivos autorizados em lei”. (LEAL, 2010, p. 204-5).

Por “autorizados em lei” entendam-se aquelas provas que não foram obtidas por meios ilegais (ao empregar-se a tortura física ou coação, v.g.), bem como quaisquer outros meios, ainda que não especificados em lei, sejam moralmente legítimos, conforme assevera o artigo 332 do Código de Processo Civil brasileiro.

É o que comentam Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco:

A experiência indica que não é aconselhável a total liberdade na admissibilidade dos meios de prova, ora porque não se fundam em bases científicas suficientemente sólidas para justificar o seu acolhimento em juízo [...]; ora porque dariam perigoso ensejo a manipulações ou fraudes [...]; ora porque ofenderiam a própria dignidade de quem lhes ficasse sujeito, representando constrangimento pessoal inadmissível [...]. (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2005, p. 358).

Dentre os meios de prova mais comuns admitidos pelo direito estão: prova documental, testemunhal, pericial, inspeção judicial, vistorias etc.

Ainda que seja manejado o mais adequado ou considerado o melhor meio de prova para que seja comprovado determinado fato alegado pelas partes, não se pode crer que a verdade esteja ali demonstrada em caráter cabal e absoluto. Acreditar na perfeita demonstração da verdade fática através dos autos processuais é, no mínimo, utópico.

A prova não possui o condão de “falar por si só”, ademais, os fatos apresentados carecem de interpretação por todos os atores processuais, interpretação esta associada com os dispositivos legais concernentes a matéria.

Senão, veja o que aduz Dhenis Cruz Madeira:

Decerto, processualmente, um mesmo fato pode ser interpretado e valorizado de modos totalmente distintos, já que a concepção de verdade (factual e jurídica) do demandante é diferente da do demandado, que, por sua vez, é distinta da do juiz. Por isso, muito embora a busca da verdade estimule individualmente um cientista ou mesmo interesse a um filósofo, o discurso processual não a tem como objeto. A noção da verdade de um partícipe processual não pode ser melhor que a do outro. Uma verdade não pode ser imposta. (MADEIRA, 2008, p. 181).

 Há que se conferir destaque para o ensinamento de Madeira no fim da citação supra mencionada: “Uma verdade não pode ser imposta”. Dessa forma, ainda que se entenda que uma determinada prova possua o condão de demonstrar a verdade, esta não pode ser imposta, quer por um ou outro motivo. Nessa feita, não é porque a prova juntada aos autos foi produzida pela Administração Pública, que melhor valor será a ela conferido. Dentre outros princípios constitucionais ignorados com essa prática, aquele que estaria mais olvidado seria o princípio da isonomia, a seguir analisados.


5 A SIMÉTRICA VALORIZAÇÃO DAS PROVAS NO PROCESSO ADMINISTRATIVO BRASILEIRO

À luz do Estado Democrático de Direito não se faz devido conferir maior valor às provas apresentadas por qualquer das partes por ocasião de um processo jurisdicional, e mesmo o administrativo, de forma arbitrária e carente de fundamentação. Tampouco, valorizá-las relevando determinados atributos subjetivos.

Entende-se que ao conferir maior grau de importância às provas apresentadas por uma das partes apenas e tão-somente por esta possuir características tidas como “superiores” à adversa, estar-se-ia infringindo não somente toda a ordem da principiologia processual, como também a própria ordem constitucional vigente.

Em homenagem ao princípio isonômico, ambas as partes devem possuir igualdade de tratamento processual. Em sede de processo de natureza administrativa, hão de ser observados com ainda maior rigor todos os meios de prova admitidos em direito e juntados aos autos, sob pena de privilegiar a Administração Pública em detrimento a parte adversária, na tentativa de justificar o atendimento do interesse público, dentre outras razões.

Nesse sentido, eis o magistério de Dhenis Cruz Madeira:

Não é correto afirmar que os direitos fundamentais e os princípios institutivos do processo possam ser afastados ou suprimidos em prol do interesse público, pois, além de ser impossível a delimitação do que venha a ser o “interesse público”, alguns princípios, como os institutivos (ampla defesa, contraditório e isonomia) são absolutamente inafastáveis. (MADEIRA, 2008, p.131).

Considerando que a Administração Pública venha a manter em seu banco de dados documentos que possam funcionar como provas e que também interessem ao particular, porém, que por uma ou outra razão não estejam ao seu alcance, é imperioso que tais sejam apresentadas nos autos na expectativa do cumprimento do princípio da ampla defesa e do contraditório.

Dessa forma, não somente o princípio da isonomia, como também os demais princípios que compõem a estrutura de toda e qualquer natureza processual, devem ser observados, de sorte que olvidá-los, é eivar o processo de nulidade, sanável somente quando o feito for chamado à ordem para que seja oportunizado às partes – e se possível for - a supressão da falta verificada, de forma tal que não se ameace ou lesione ainda mais os seus direitos.

É o que defende Madeira:

É possível aceitar, em casos expressos em lei, o afastamento de alguns princípios informativos, mas não os dos institutivos, vez que esses formam a própria instituição processual e constituem direitos fundamentais das partes. A ampla defesa, o contraditório e a isonomia são princípios previamente acertados na plataforma constitucional, constituindo direitos fundamentais líquidos (são auto-executivos, não carecendo de regulamentação) e certos (infungíveis, não podendo deles se abrir mão), formando a coisa julgada constitucional. Devem ser aplicados, não admitindo suplantação ou subtração. (MADEIRA, 2008, p.131).

Ora, decisões que se baseiam em argumentos metajurídicos, v.g., o estrito atendimento do interesse público ou aquelas em que consideram a experiência do julgador e do seu (presumível) bom senso para a elucidação da demanda, tais não merecem prosperar, vez que, ainda que o procedimento tenha sido realizado em conformidade com a lei, ao final, a decisão careceu de legitimidade porquanto o que fora demonstrado mediante a produção de provas, foi avaliado de forma unicamente subjetiva.

Ora, se se admitir a aplicação de critérios metajurídicos de julgamento, para quê serve a lei? Se é o agente governativo quem diz qual a concepção de justiça a ser aplicada, para quê existe o aparelho legislativo? Não seria melhor aboli-lo? Indubitavelmente, a única forma de se operar o sistema jurídico racionalmente é admitindo que a lei seja quem diz, previamente, o que deve ou não ser garantido, cabendo ao Judiciário assegurar a efetividade do texto legal e do Direito pela observância do devido processo. O ideal de justiça corresponde ao ideal do texto normativo, ou melhor, à parcela de justiça que foi protegida por lei e que será, pelo discurso processual, explicitada. (MADEIRA, 2008, p. 147).

Na democracia constitucional, a atividade interpretativa deve se analisada sob um contexto principiológico e que não admita a interpretação de uma autoridade “sábia e justa”. 

Assim, em atenção não somente aos princípios institutivos do processo – devido processo legal, ampla defesa, contraditório e isonomia -, como também aos princípios da supremacia da Constituição e da legalidade, o sistema probatório deve ser erigido sobre bases normativas que possibilitem a efetiva participação das partes e, sobretudo, em simétrica paridade de tratamento, tanto no que pertine a produção como na valorização dos meios de prova.

É o que se pode depreender do ensinamento de Rosemiro Pereira Leal:

O procedimento processualizado é a prova das provas. Sem procedimento (relação espácio-temporal formalizada) não há como operacionalizar democraticamente o instituto da prova. A Lei Constitucional brasileira (CR/88), ao adotar o ‘devido processo legal’ (art. 5º, LIV), institui a hermenêutica cognitiva como meio legal amplificado de verificação dos fatos. A cognição é modo legal de verificação pelo procedimento instrumentalizado. A prova procedimental (existência de procedimento) é direito-garantia inafastável da cognição, porque somente a interpretação volitiva das autocracias ou democracias imperfeita é que afastam a prova, em sua plenitude teórica, em troca dos devaneios e ideações judicantes. (LEAL, 2010, p. 187-8).

5.1 Da incidência do princípio isonômico no processo administrativo

A Lei no 9.784, editada em 29 de janeiro de 1999, veio regulamentar o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal direta e indireta, estabelecendo normas básicas sobre o processo administrativo na busca pela “proteção dos direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da Administração” (art.1º do seu texto).

O caput do artigo 2o daquela lei elenca os princípios a serem observados pela Administração Pública, a saber:

Art. 2º. A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. [...] (BRASIL, 1999).

Nota-se que a lei deixou de prever o princípio da isonomia processual entre Administração e administrado no rol dos referidos princípios. Contudo, considerando a sua natureza institutiva para toda a gama de modalidades processuais (judicial, administrativo, legislativo), o mesmo merece acolhida quando da sua incidência sob um caso concreto. Ademais, ao buscar a aludida lei resguardar os direitos e garantias dos administrados face a Administração, o emprego do principio isonômico é uma inequívoca demonstração da simetria processual da análise das provas apresentadas pelas partes também no processo administrativo.

5.2 Da relativização do princípio da supremacia do interesse público

Ao revés, consta como um dos princípios a serem invocados no processo administrativo o princípio do interesse público.

Considerando a complexidade em se definir precisamente o que vem a ser “interesse público” na doutrina nacional, tome-se a simples e genérica (porém, pontual) lição de Marçal Justen Filho, acerca do significado do referido princípio : “A supremacia do interesse público significa sua superioridade sobre os demais interesses existentes em sociedade” (JUSTEN FILHO, 2010, p. 59).

 Contudo, com o advento da Constituição de 1988, matizar direitos fundamentais é infringir o regime democrático. Está-se, portanto, diante de um conflito de interesses, sendo que, ambos, encontram-se resguardados tanto pela lei constitucional como por leis infraconstitucionais.

A fim de se evitar uma maior discussão sobre o conflito principiológico, e, principalmente, a possibilidade da sobreposição de um princípio sob outro, entende-se que, mais uma vez, deve-se buscar a exegese para o caso em discussão, e assim estabelecer uma ponderação dos interesses em conflito, com o propósito de compatibilizá-los ou mesmo conciliá-los. Trata-se, pois, da incidência dos princípios da Proporcionalidade e da Razoabilidade na mitigação dos conflitos entre os interesses público e privado:

[...] não de pode afirmar, de modo generalizado e abstrato, algum tipo de supremacia absoluta produzida em favor de algum titular de posição jurídica. Nem o Estado, nem qualquer sujeito privado são titulares de posição jurídica absolutamente privilegiada em face de outrem. Todo e qualquer direito, interesse, poder, competência ou ônus são limitados sempre pelos direitos fundamentais. [...] não se pode impor uma escolha prévia em favor do interesse dito público – senão quando evidenciar ser a decisão a mais conforme e adequada em face do conjunto da ordem jurídica. (JUSTEN FILHO, 2010, p. 62-64; grifou-se).

Nessa feita, não convém o julgador, ao valorizar as provas produzidas nos autos, favorecer aquela produzida pela Administração Pública entendendo que esta é a que melhor merece acolhida porque contém em seu bojo o atendimento do interesse público. Ressalta-se que não se busca desprezar a prova que, ante as especificidades dos seus elementos, evidencie o atendimento do interesse público; lado outro, entende-se que este não pode ser o único argumento que fundamente determinada decisão em matéria administrativa, em detrimento das demais provas juntadas aos autos.


6 CONCLUSÃO

Por todo o exposto, não será outra a conclusão de que se deve conferir tratamento simétrico às partes no processo administrativo quando da valorização das provas a fim de se cumprir com rigorismo os ditames processuais, e, sobretudo, constitucionais, no que concerne a garantir os direitos fundamentais das partes de um processo isonômico e em conformidade com a lei.


REFERÊNCIAS

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Leandro Flávio Machado de. Da isonômica valorização das provas no processo administrativo brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3239, 14 maio 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21746. Acesso em: 28 mar. 2024.