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Direito Cambial: avais conjuntos e simultâneos

Direito Cambial: avais conjuntos e simultâneos

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Para prevalência do princípio da autonomia e independência das obrigações, o credor jamais poderá liberar o co-avalista, em decorrência de pagamento parcial, sob pena de quitar o título, mediante exoneração dos demais co-obrigados.

RESUMO: Conceito doutrinário. Princípio de autonomia e independência das obrigações. Recebimento Parcial. O legítimo portador pode consentir no recebimento parcial de co-avalista de sua cota-parte no débito, no caso de insolvência do avalizado, visto que este fato não ofende a liquidez do título, frente aos demais co-obrigados da mesma natureza. Para prevalência do princípio da autonomia e independência das obrigações, o credor jamais poderá liberar o co-avalista, em decorrência de pagamento parcial, sob pena de quitar o título, mediante exoneração dos demais co-obrigados. O direito cambial não admite o aval sob condição – RTJ 74/302-4. O co-avalista que pagar o título, por inteiro, adquire o direito de cobrar a cota-parte de cada um dos co-obrigados da mesma natureza, com base no art. 32 da Lei Uniforme. Da remissão no direito privado – conseqüências jurídicas de sua aplicação em obrigações civis, comerciais e cambiais. Embargos do Devedor – Direito Cambial – A defesa do devedor por obrigação cambial está restrita aos arts. 39, 41, 43 e 51 da Lei Cambial – RTJ 92/143.


AVAIS CONJUNTOS OU SIMULTÂNEOS

Por força de disposição legal, o co-avalista quer pagar a dívida decorrente do título adquire por inteiro o direito de cobrar a cota-parte de cada um dos co-obrigados da mesma natureza, com base no art. 32 da Lei Uniforme.

Para os doutrinadores pátrios, os avais simultâneos ou sucessivos sempre foram uma questão tormentosa (1, pág. 125). Contudo, com o advento da Súmula 189 editada pelo STF, a questão tornou-se menos árdua.

Não há, a respeito, a menor discrepância na doutrina italiana. Vidari afirma que, quando são vários os avalistas (por um mesmo obrigado), eles são entre si responsáveis apenas por cota, e nunca obrigados pelo todo (1, pág. 133).

Em relação aos co-avalistas, o que satisfizer a dívida por inteiro tem direito a exigir de cada um dos co-devedores a sua cota, dividindo igualmente por todos a do insolvente, e presumindo-se iguais no débito as partes de todos os co-devedores (art. 913 do Cód. Civil) (1, pág. 198).

E, para haver do avalizado, ou do co-avalista, aquilo que houver pago, o avalista que pagou, embora não disponha de ação cambial específica, em virtude de seu caráter excepcional, e das restrições que dela decorrem, nos termos do art. 51, para a defesa do executado, tem o solvente a ação executiva. Isso resulta dos arts. 913, 915, 985/III e 988 do Cód. Civil. O mesmo resulta claramente dos arts. 566/1, 567/II e III, 585/I e 586, do Código do Processo Civil vigente (1, pág. 198).

As dúvidas que até então pairavam foram definitivamente resolvidas pela Lei Uniforme que assim dispõe, na alínea final do seu art. 32, in verbis:

“Se o dador de aval paga a letra, fica sub-rogado nos direitos emergentes da letra contra a pessoa a favor de quem foi dado o aval e contra os obrigados para com esta em virtude da letra”.

Como se vê, nossa tradução não foi feliz, em vez do “adquire os direitos” do texto oficial da Lei Uniforme, preferiu o “fica sub-rogado nos direitos”, termo esse evitado pelos convencionais de Genebra, porquanto, tal palavra, no preciso significado que tem no direito comum, nem sempre expressará a verdadeira situação de quem, pelo pagamento, adquire o título cambial: não é um sub-rogado daquele a quem pagou, é o novo proprietário do título com todos os direitos dele resultantes (1, pág. 201).

O solvens, em regra, só do avalisado pode reaver o que houver pago, e não dos outros co-avalistas; mas por exceção a esse regra, em caso de insolvência do avalisado, impõe a equidade natural que se reparta o prejuízo entre todos os co-avalistas. RT 125/215(l. pág. 368).


PRINCÍPIO DA AUTONOMIA E INDEPENDÊNCIA DAS OBRIGAÇÕES

Efeitos do Aval – avalista é um obrigado cambial que ocupa, no contexto cambiário, a mesma posição jurídica objetiva da pessoa a favor de quem avalizou e a qualquer equiparado, nos termos do art. 15 (1., pág. 165).

Como toda obrigação cambial, o aval é obrigação autônoma, independente de qualquer outras decorrentes do mesmo título, inclusive a do avalisado. Firmando o aval, o signatário fica vinculado e solidariamente responsável pelo aceite e pelo pagamento da letra, sem embargo da falsidade, da falsificação ou da nulidade de qualquer outra assinatura (art. 43). Além de autônoma e independente, é a obrigação do avalista abstrata, como o é toda a obrigação cambial (1, pág. 166).

III SOLIDARIEDADE CAMBIAL

O legítimo portador do título poderá dirigir sua ação contra qualquer um deles, sem atenção à posição especial que ocupa em relação aos demais. É a solidariedade tipicamente cambiária, porque, efetuando o pagamento por um dos signatários, poderá ele voltar-se contra qualquer um dos que lhe forem anteriores na responsabilidade cambial, e assim sucessivamente até o principal obrigado (aceitante ou emitente) que suportara sozinho a dívida toda.

Os postulados da solidariedade e da autonomia das obrigações cambiarias permitem que se vá inutilmente contra um obrigado e, depois, contra outro, ou que se chamem a juízo dois ou mais; ou que se desista do processo contra um, para se ir contra outro; ou, tendo-se executado obrigado mais remoto, se volte contra outro menos remoto (5., pág. 473).

IV DO RECEBIMENTO PARCIAL

No caso ora examinado, por tratar-se de aval simultâneo, perfeitamente aplicável o disposto no art. 904 do Código Civil, porquanto este dispositivo de lei material não ofende a regra jurídica de direito cambial inserida no art. 43 do Dec. 2044 de 31.12.1908, bem como o disposto no art. 47 da Lei Uniforme.

Havendo conjunção solidária de devedores, o credor poderá pedir o cumprimento da obrigação a qualquer dos co-devedores, sem que este possa invocar o “beneficium divisionis”; porque cada um dos sujeitos passivos da obrigação é devedor único da totalidade, perante o credor, ainda que a obrigação seja divisível. É lícito, porém, ao credor, acionar pelo pagamento parcial. Se receber o pagamento parcial de algum dos devedores, continuam os outros obrigados pelo resto. A razão é que cada um deve tudo; mas, sendo a solidariedade instituída em benefício do credor, ele pode reparti-la pro rata, em relação a todos os devedores, ou em relação a um só, de modo que, se este pagar a sua parte, aos outros cabe o pagamento do restante, sem prejuízo da solidariedade, de que o credor os não exonerou.

Pode o credor exigir, particular ou judicialmente, de qualquer devedor, a solução da dívida, e, depois, não cumprida a obrigação, volver sobre os outros ou sobre aquele que mais lhe convier (9, pág. 44).

Na solidariedade passiva, se o co-devedor solidário paga a dívida, extingue-se para todos; mas a extinção por este modo é objetiva, da dívida (9, pág. 46).

Na realidade o pagamento parcial constitui forma tolerada em lei, mas tão só para o emitente ou obrigado principal, não se permitindo aos demais obrigados, salvo consentindo o credor (4. Pág. 276).

A exceção de pagamento parcial da soma cambiária apresenta-se mais comum que a argüição de liquidação integral do título, já que esta última não se presume senão com a entrega do título ao pagante, ao passo que no primeiro caso, subsiste o título em poder do credor, não havendo qualquer presunção de pagamento fora do recibo, lançado no título e em documento à parte (4., pág. 276).

Na linha desse raciocínio, pode o credor consentir no pagamento parcial da dívida contraída pelo avalisado, pelo co-avalista, relativamente a sua cota-parte, porquanto este fato não ofende a liquidez do título, frente aos demais co-obrigados, devendo ficar expresso que o recebimento parcial não libera o solvente do pagamento integral do título, tendo em vista que são considerados não escrita a cláusula excludente ou restritiva da responsabilidade e qualquer outra beneficiando o devedor ou o credor (art. 44 da Lei Cambial e art. 9º da Lei Uniforme).

V DA REMISSÃO NO DIREITO PRIVADO

 Direito Civil

A remissão é a liberalidade do credor, consistente em dispensar o devedor de pagar a dívida. Através dela o titular do direito se coloca na impossibilidade de exigir o cumprimento da obrigação (Beviláqua, Cód. Civil, obs. 1 ao art. 1053) (6, pág. 309).

Por último, o art. 1085, ao estatuir que “ a remissão concedida a um dos co-devedores extingue a dívida na parte a ela correspondente; de modo que, ainda reservando o credor a solidariedade contra os outros, já lhes não pode cobrar o débito, sem dedução da parte remetida, apenas repete, como observa Clóvis o que antes já fora estatuído na parte relativa à solidariedade passiva. Efetivamente, o art. 906 estabelece que:

“O pagamento parcial feito por um dos devedores e a remissão por ele obtida não aproveita aos outros devedores senão até a concorrência da quantia paga ou relevada” (7, pág. 54).

b)Direito Comercial e Cambial

A remissão tanto pode ser aplicada em obrigações civis como em comerciais. No setor cambial, “o portador da letra de câmbio, perdoando a obrigação do aceitante, antes do vencimento, exonera, ao mesmo tempo, os outros co-obrigados “ (3., pág. 313). Também na falência a remissão da dívida não produz efeito contra a massa, dentro de determinado período, consoante estatui o art. 52 da Lei de Falências.

Se portanto, o portador endossatário concede perdão de dívida ao emitente ou aceitante, não pode o endossador acionado aproveitar-se daqueles benefício, por se presumir que a retenção do título equivale a uma expressa reserva de haver o pagamento do mesmo endossador. (4, pág. 293).

VI EMBARGOS DO DEVEDOR

A defesa do devedor por obrigações cambiais está restrita aos artigos 39, 41, 43, e 51 da Lei Cambial, porquanto é defeso ao obrigado por título cambial invocar o disposto no art. 332 do Código de Processo Civil, visto que as provas autorizadas por aquele dispositivo da lei instrumental está condicionada à natureza da obrigação, em que pese a abrangência da matéria de defesa facultada pelo art. 745 do mesmo Código (RTT 93/143).

SUPRIMENTOS JURISPRUDENCIAIS

a)AVAIS SIMULTÂNEOS

STF – SÚMULA 189

Avais em branco e superpostos consideram-se simultâneos e não sucessivos;

2. Alcance da Súmula 189;

3. Em caso de avais simultâneos, ode o avalista, que pagou, cobrar do outro avalista a cota-parte devida por esse co-obrigado.

4. Se três são os avalistas, só pode aquele que pagou cobrar uma terça parte de cada um dos co-obrigados da mesma natureza.

Obs. Vide RT 478/186 – 479/131 – 193/13 – 158/686

b)PAGAMENTO PARCIAL

RT – 489/156 – CAMBIAL – Pagamento parcial – Circunstância que não torna ilíquido o título.

Vide RTJ 74/302

c)DA QUITAÇÃO

RT 320/543 – O pagamento de título cambial prova-se pela entrega do título ao devedor ou, em casos excepcionais, por meio de recibo de quitação de que conste o valor e a espécie da dívida quitada, mormente se o título continua na posse do credor, porque em tal caso, ocorre a presunção “juris” de que foi pago.

Vide RT 311/541 – RF – 108/296


OBRAS CONSULTADAS

a) Monografias

BEVILÁQUA, Clovis. Comentários ao Código Civil -2ª tiragem – edição histórica – editora rio

BORGES, João Eunápio. Do aval - 4ª. Ed. Forense

BULGARELLI, Waldomiro. Títulos de Créditos – Direito Comercial III., Editora Atlas S/A – ano 77/79

MAGALHÃES, Roberto Barcelos. Tratado de Direito Cambiário 1º volume – Editora Jurídica e Universitária Ltda. – 2ª Edição

MARTINS, Fran. Contratos e Obrigações Comerciais - 4ª edição – Forense

MENDONÇA, Carvalho de Mendonça. Tratado de Direito Comercial Brasileiro - vol. V – livro III

MIRANDA, Francisco Cavalcante Pontes de. Tratado de Direito Privado - vol. XXXV

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil - – vol. II - Max Limonard – 2ª edição

b) Artigos, ensaios, etc.

SANTOS, Milton Evaristo. Avais Sucessivos e Simultâneos - RT 194/13-24-DIREITO CAMBIAL / AVAIS CONJUNTOS E SIMULTÂNEOS. Publicado no ESTADO DE SÃO PAULO –


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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANTUNES, Oswaldo Moreira. Direito Cambial: avais conjuntos e simultâneos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3317, 31 jul. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22329. Acesso em: 28 mar. 2024.